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HISTÓRIA DO BRASIL MÓDULO II

4 Os Primórdios da Colonização Portuguesa

Nas primeiras décadas que se seguiram ao desco­brimento, o Brasil conheceu um relativo abandono. Salvo o monopólio régio do pau-brasil e a presença de algumas expedições no litoral brasileiro, os portugueses não se interessaram pelas novas ­terras. Os esforços da metrópole, naquele momento, estavam concentrados no rendoso comércio com as Índias e no estabeleci­mento do Império Colo­nial do Oriente. Por essa razão, o período que vai de 1500 a 1530 recebeu a denominação de período pré-colonial.

1. As primeiras expedições
Em 1501, chegou ao litoral brasileiro a primeira expedição oficial portu­guesa. Sob o comando de Gaspar de Lemos e tra­zendo a bordo o navega­dor Américo Vespúcio, o seu objetivo era o reco­nhecimento da costa brasi­leira, denominando os aci­dentes geográficos e ela­borando um mapa do lito­ral. Dois anos depois (1503) uma nova expedição esteve no Brasil; desta feita, organizada por particulares e sob o comando de Gonçalo Coelho, prosseguiu o reconhecimento da nova terra e retomou a Portugal levando o primeiro carregamento de pau-brasil.
Nesse período, intensificava-se a presença de estrangeiros, especialmente dos franceses, no litoral brasileiro. O contrabando do pau-brasil aumentava, visto que os franceses estabeleceram sólidas alianças com os indígenas – os potiguaras no Norte e os tupinambás no Sul – que também eram empregados na extração da madeira. Ação desses entrelopos era apoiada por Francisco I, rei da França, que se recusava a aceitar as determinações do Tratado de Tordesilhas. Diante disso, Portugal enviou ao Brasil duas expedições com objetivos militares. A primeira em 1516 e a segunda em 1526, e ambas comandadas por Cristóvão Jacques: eram as expedições guarda-costas, que dispersaram ou aprisionaram mais de uma dezena de na­vios franceses e espanhóis, que também rondavam as ter­ras portuguesas.
Essas expedições também deixaram no solo brasileiro os primeiros povoadores brancos. Na sua maioria, eram degredados, ou seja, condenados pela justiça ao trabalho nas galés, à prisão perpétua ou à morte, e que tinham suas penas substituídas pelo degredo.

2. Os primeiros passos da colonização
O ano de 1530 marca o início da colonização do Brasil. O lucrativo comércio de especiarias do Oriente mostrava-se deficitário, em razão dos altos custos militares que garantiam o monopólio português nas Índias. Além disso, crescia a presença dos contrabandistas franceses (entrelopos) no litoral brasileiro, intensificando o contrabando de pau-brasil. Diante desse novo quadro, D. João III, rei de Portugal, organizou a pri­meira expedição colonizadora, cujo comando foi dado a Martim Afonso de Sousa.

A primeira expedição colonizadora
Composta de quatrocentos homens, a expedição de Martim Afonso de Sousa tinha três finalidades: iniciar a colonização (povoamento), fazer o reconhecimento (ex­ploração) e proteger o litoral contra a presença estran­geira. Por isso, parte dela navegaria até o Maranhão, reco­nhecendo o litoral e combatendo os franceses que infes­tavam a costa pernambucana. Outra, seguiria para o Sul, até atingir o rio da Prata, além de promover uma entrada para o interior, em Cananéia, São Paulo.

Uma Vila e um Engenho
Em 1532, Martim Afonso de Sousa fundou a vila de São Vicente, a primeira do Brasil, que com sua igreja, Câmara Municipal e Cadeia assinala o nascimento do pri­meiro núcleo de povoamento português na América. Ao redor da vila, surgiram plantações de cana-de-açúcar e um primeiro engenho: Engenho do Governador, depois bati­zado com o nome de São Jorge dos Erasmos. Transpondo a Serra do Mar, Martim Afonso encontrou João Ramalho,náufrago que vivia entre os índios do planalto de Pirantininga, onde foi instalada outra vila, que nunca prosperou.
3 . As capitanias hereditárias
Em 1534, D. João m implantou o sistema de capita­nias hereditárias no Brasil. Com isso, Portugal dava início à colonização efetiva de suas terras na América, visando compensar os efeitos negativos da fracassada empresa mercantil nas Índias, e, ao mesmo tempo, proteger os seus domínios ameaçados pelas ambições estrangeiras. O sistema já fora aplicado com êxito nas ilhas atlânticas, durante o século XV e, mesmo no Brasil, já existia a capitania de São João, doada a Fernando de Noronha, correspondendo ao atual arquipélago que tem o seu nome.

O significado do sistema
O sistema de capitanias refletia a incapacidade eco­nômica da Coroa em promover diretamente a colonização. Ao conceder terras a particulares, o Estado transferia também para a iniciativa privada o ônus da colonização. Os donatários recebiam lotes em caráter hereditário, indivisíveis e inalienáveis no todo ou em parte, e que podiam ser readquiridos somente pela Coroa. Vale dizer que o Estado concedia apenas a posse da terra, reservando para si o domínio, ou seja, a propriedade dela.

As capitanias hereditárias do Brasil
O Brasil foi dividido em 15 lotes que abrangiam de 30 a 100 léguas de costa, aprofundando-se para o interior até alcançar o meridiano de Tordesilhas. Foram criadas 14 capitanias (a de São Vicente compreendia 2 lotes) distribuídas a 12 donatários (Martim Afonso recebeu 2 lotes, e seu irmão, Pero Lopes recebeu 3). A partir daí, os donatários ficavam com a responsabilidade do cultivo, colonização e defesa das terras recebidas. Posteriormente, foram criadas mais duas capitanias: a de Trindade, em 1539, e a de Itaparica, em 1556.

Carta de doação e foral
Eram documentos que representavam as bases jurídicas do sistema. O primeiro garantia a concessão da capi­tania - dimensões e limites - e esta­belecia o conjunto dos direitos e deveres do donatário. O Foral definia minucio­samente os direitos e tributos devidos ao rei, os direitos e obrigações dos colonos e suas relações com os capitães dona­tários. Esses documentos conferiam aos donatários poderes administrativos, jurí­dicos e militares, com responsabilidade somente perante o rei. O sistema, por­tanto, era caracterizado pela descentra­lização administrativa.

O fracasso do sistema
De um modo geral, o sistema de ca­pitanias fracassou. Além da grande dis­tância da metrópole, da hostilidade dos indígenas, da grande extensão dos lotes e do desinteresse dos donatários, faltaram recursos econô­micos para a viabilização das capitanias e um órgão centralizador que coordenasse a empresa colonizadora. Das 14 capitanias criadas, apenas duas conheceram relativo êxito: a de Pernambuco e a de São Vicente, cujos donatários eram, respectivamente, Duarte Coelho Pereira e Martim Afonso de Sousa. Hábeis administradores, ambos souberam captar a amizade dos indígenas e desenvolveram com sucesso a lavoura canavieira, instalando engenhos, que, na sua maioria, tinham a participação de capital italianos e holandês.

4. O Governo-Geral do Brasil
Em 1549, diante do fracasso do sistema de donatarias, D. João III criou o Governo-Geral do Brasil. Com ele, ficava estabelecido um órgão centralizador da ação colonizadora, garantindo-lhe uma unidade administrativa. Com o Governo-Geral, o Estado português assumia dire­tamente a colonização, sem extinguir, contudo, o sistema de capitanias; ou seja: Portugal ainda continuava se valen­do dos esforços da iniciativa privada.

O conselho de Governo
O governador-geral era nomeado diretamente pelo rei por um período de quatro anos e contava com o concurso de três auxiliares, que com ele formavam o Conselho de Governo. Destes três auxiliares, o ouvidor-mor era res­ponsável pela Justiça, o provedor-mor, pelas finanças e o capitão-mor, pela defesa do litoral.
Os governadores-gerais eram nomeados com base em um Regimento, um documento que definia seus encargos, atribuições e direitos no exercício da administração. O Regimento de Tomé de Sousa - o primeiro governador-geral, por exemplo – fixava como seus encargos: a fundação de uma cidade na Bahia, que seria a capital da colônia; a pacificação de índios rebeldes; a construção de fortes; o combate à ação de corsários e a doação de terras em sesmarias, entre outros.

Tomé de Sousa (1549-53)
Foi o primeiro governador-geral do Brasil, responsável pela instalação do novo sistema de administração criado por Portugal. Do conjunto de suas realizações, destacam-se: a fundação de Salvador (1549) – a primeira capital da colônia e sede do governo até o século XVIII – e a instalação do primeiro bispado do Brasil. Com ele vieram os primeiros jesuítas, chefiados por Manoel de Nóbrega, que fundaram na Bahia o primeiro colégio em território brasileiro. No que se refere à economia, houve desenvolvimento da economia açucareira, baseada na mão-de-obra escrava africana, e a introdução das primeiras cabeças de gado.

Duarte da Costa (1553-58)
Durante o seu governo, ocorreram vários distúrbios, motivados na sua maioria pelos conflitos entre colonos e jesuítas, envolvendo a escravização de indígenas. Os colonos tinham o apoio de Álvaro da Costa, filho do governador, que por sua vez entrara em conflito com o bispo d. Pero Fernandes Sardinha, Sua gestão conviveu ainda com a invasão francesa ao Rio de Janeiro, em 1555, onde foi fundada a França Antártica. Sem condições de combater os invasores, Duarte da Costa perdeu a autoridade, comprometendo sua administração. Ainda no seu governo, José de Anchieta e Manoel de Paiva fundaram o colégio de São Paulo, no planalto de Piratininga.

Mem de Sá (1558-72)
Mem de Sá, o terceiro governador-geral, estimulou a lavoura de exportação e acabou com os conflitos que envolviam colonos e jesuítas. No seu governo, iniciou-se a longa campanha que resultou na destruição de França Antártica, quando teve o apoio dos índios de Araribóia e do seu sobrinho Estácio de Sá. Nesse contexto, deu-se a fundação de São Sebastião do Rio de Janeiro (1565), a segunda cidade do Brasil, e a desmontagem da Confederação dos Tamoios – aliança indígena que apoiava os franceses – através do Armistício de Iperoig, negociado pelos jesuítas José de Anchieta e Manoel de Nóbrega.

Divisões e reunificações do governo do Brasil
Mem de Sá governou até 1572, quando faleceu em Salvador. O seu substituto, D. Luís de Vasconcelos, nomeado em 1570, morreu antes da posse, em confronto com franceses no mar. De 1572 a 1578, o Brasil foi dividido em dois governos: o do Norte (Salvador) a cargo de Luís de Brito e Almeida e o do Sul (Rio de Janeiro) com Antônio Salema. Com o fracasso da divisão, deu-se a reunificação. Salvador era novamente a sede, sob a administração de Lourenço da Veiga. Entre 1602 e1612, durante a União Ibérica, ocorreu nova divisão e outra reunificação. Em 1621, o Brasil foi dividido em dois estados: Estado do Brasil e Estado do Maranhão e, desta feita, até 1775, quando foi reunificado pelo Marquês de Pombal.

5. As câmaras municipais
As vilas e cidades da colônia, como previam as ordenações Reais, existiam as Câmaras Municipais. Representativas do poder local, as Câmaras ou Conselhos Municipais garantiam a participação política dos senhores de terras, membros da aristocracia rural, os “homens bons”. Eram presididas por um juiz ordinário e formadas por três vereadores, todos escolhidos localmente. Nas vilas principais, existia também a figura do juiz de fora, cuja nomeação era feita diretamente pela Coroa. A autonomia municipal era simbolizada pelo pelourinho, um marco erigido na praça principal da povoação.

As atribuições das Câmaras Municipais
As Câmaras Municipais possuíam inúmeras atribuições, como a nomeação de servidores locais, o exercício de papel de polícia local, a verificação do peso e do preço das mercadorias e a designação de procuradores, seus representantes perante o governo da metrópole. Além disso, legislavam em nível local, através das posturas municipais.
Em alguns casos, suas atribuições superavam os limites das vilas, influenciando na lotação de cargos da administração metropolitana ou exercendo encargos que eram privativos do ministério público, ignorando a autoridade do governador-geral e relacionando-se diretamente com Lisboa.
O poder das edilidades coloniais é explicado pelo caráter agrário que assumiu a colonização brasileira, uma vez que as vilas eram meras extensões do mundo rural, marcado pelo predomínio dos grandes proprietários de terras e de escravos. Assim, dentro da luta secular contra o centralismo, representado por funcionários e por órgãos metropolitanos, as Câmaras Municipais significaram, sempre, a força viva do localismo político.

6. O Estatuto Jurídico da Colônia
As leis que regiam o mundo colonial estavam assentadas no mesmo estatuto que aplicava na metrópole, isto é, nas Ordenações Reais. Fundada nos códigos romano e germânico e no direito de Justiniano, a ordenação era a sistematização das leis, da administração e da justiça que acompanhou o processo de formação das monarquias nacionais. Daí, possuírem como características fundamentais e centralização e o absolutismo.
Em Portugal, as primeiras bases jurídicas foram esta­belecidas, em 1446, pelas Ordenações Afonsinas, altera­das, em 1512, pelas Ordenações Manuelinas e, em 1603, pelas Ordenações Filipinas, já sob influência do Domínio Espanhol.

7. A igreja e a colonização
Ao lado do Estado europeu, a Igreja Católica ocupou uma posição de destaque na colonização americana. O espírito cruzadista, típico do período medieval, que esteve presente nos grandes empreendimentos marítimos, reapa­receu na Época Moderna, confundindo-se com a própria missão colonizadora. Razão pela qual a conquista da Amé­rica está sempre relacionada, desde o seu início, a dois signos da civilização cristã européia: a cruz e a espada.
A Igreja, representada pelas várias ordens religiosas ­jesuíta, carmelita, dominicana e beneditina, entre outras ­esteve presente no Brasil especialmente com a ação da Companhia de Jesus, participante de nossa História desde o momento em que Portugal assumiu diretamente a empresa colonizadora.

A Contra-Reforma e a companhia de Jesus
No século XVI, a unidade cristã européia foi quebrada com o movimento da reforma protestante. Com a rápida expansão das doutrinas protestantes de Lutero e Calvino, a Igreja Católica reagiu com o Concílio de Trento, que, além da reforma interna, procurou criar instrumentos de combate ao protestantismo. Nessa medida, foi instituída a Congregação do Índice, proibindo a publicação de obras contrárias à doutrina católica, e restabelecido o Tribunal da Inquisição, destinado a perseguir e condenar os inimigos da fé católica.
Nesse quadro, o espanhol Inácio de Loyola criou, em 1534, a Companhia de Jesus, uma nova ordem religiosa com o objetivo de servir e de lutar pela Igreja Católica Apostólica Romana. Portanto, os jesuítas - soldados de Cristo - através da catequese e da educação, serviriam à ação da Contra-Reforma, compensando as perdas do catolicismo na Europa com a conversão das populações nativas do Novo Mundo.
A presença dos Jesuítas no Brasil
A chegada dos primeiros jesuítas ao Brasil data de 1549, quando, liderados por Manoel da Nóbrega, acom­panharam Tomé de Sousa, o primeiro governador-geral.
Desde a sua chegada ao Brasil, os jesuítas estiveram envolvidos com a pacificação dos índios, o que os colocou, muitas vezes, em confronto direto com os colonos, que viam o índio como mão-de-obra abundante.
Voltados para a educação e a catequese, os inacianos fundaram os primeiros colégios do Brasil: em Salvador - ­colégio dos Meninos de Jesus -, em São Vicente e, em 1554, no planalto de Piratininga, ao redor do qual se de­senvolveu a cidade de São Paulo.
Além dos colégios, localizados ou próximos dos pou­cos centros urbanos, os jesuítas foram avançando pelo interior da colônia, criando nos longínquos sertões grandes aldeamentos de índios: as missões ou reduções. No século seguinte, as missões de Guaíra e Tapes, entre outras, eram grandes núcleos de povoamento indígena e verdadeiras unidades auto-suficientes, graças à disciplina imposta pelos religiosos aos nativos.
A existência de um grande contingente de mão-de­-obra nesses aldeamentos acabou atraindo a cobiça dos co­lonos e, assim, a ação predadora dos bandeirantes culmi­nou com a destruição de boa parte das missões jesuíticas. Mesmo com os problemas que marcaram sua atuação na colônia, a Companhia de Jesus conseguiu formar um gran­de patrimônio material, ao mesmo tempo em que se torna­va uma verdadeira força política. No século XVIII, o seu poder foi combatido pelo Marquês de Pombal, resultando na expulsão da ordem do Brasil e de Portugal.
5 A Colonização Portuguesa no Brasil

Dentro do Antigo Sistema Colonial, o Brasil se orga­nizou como uma colônia de exploração. Assim, a eco­nomia colonial brasileira integrou-se ao sistema capitalista nascente como fornecedora de produtos tropicais, ali­mentos, matérias-primas e metais preciosos; daí a defini­ção de algumas de suas características: complementar, es­pecializada, extrovertida e dependente do mercado ex­terno.
A opção do mercantilismo português pelo estabeleci­mento de uma grande lavoura de exportação, onde eram obtidos os produtos tropicais em grande escala, como o açúcar, garantiu à metrópole lusa os lucros auferidos com a sua comercialização no mercado europeu e, ao mesmo tempo, a ocupação efetiva de sua possessão americana. Por essa razão, a economia colonial baseou-se na grande lavoura mercantil, monocultora e escravista.

1. A grande propriedade monocultura

O surgimento da grande propriedade no Brasil, uma das bases da estrutura de produção colonial, não está relacionada apenas à exigência de produção em larga escala, geradora dos lucros com a exportação, mas tam­bém a determinados fatores históricos de origem, como as doações de sesmarias - grandes áreas desmembradas de uma capitania -, a necessidade de ocupação efetiva das terras portuguesas e, principalmente, as exigências criadas pela cana-de-açúcar, que, possuindo uma baixa produtivi­dade por unidade territorial de plantio, não daria os lucros esperados; necessariamente, para obtê-los, seu cultivo teve de se dar em larga escala de produção.
O latifúndio (grande extensão de terras, utilização de farta mão-de-obra, técnica precária e baixa produtividade) foi a grande propriedade predominante no Brasil. Em algumas regiões, como a Bahia e Pernambuco, o apogeu da economia açucareira, entre os séculos XVI e XVII. permitiu o aparecimento de grandes propriedades do tipo plantation (menor número de trabalhadores, nível técnico mais elevado e alta produtividade), que não chegaram, contudo, a ter a mesma produtividade das plantations antilhanas ou do sul dos Estados Unidos.

O escravismo colonial
Como já vimos anteriormente, a implantação da escra­vidão como elemento chave da organização econômica das colônias atendeu as exigências do sistema capitalista nascente e de sua efetivação na periferia do Sistema Colo­nial, ou seja, a escravidão foi fundamental para a realiza­ção da acumulação do capital.
O trabalho compulsório no Brasil abrangeu dois tipos de escravidão: a indígena (o escravismo vermelho) e a negra africana. A primeira, apesar de toda a reação con­trária dos religiosos, foi praticada em determinados perío­dos, até 1759, quando um decreto pombalino aboliu a escravidão indígena. Quanto à escravidão africana, a mão-de-obra negra, além de garantir a instalação de um complexo sistema produtor de açúcar na colônia, era também altamente lucrativa para a burguesia mercantil metropolitana, a partir do tráfico negreiro; existente para abastecer as plantações das ilhas do Atlântico, desde o século XV, portanto, preexistente ao Descobrimento do Brasil.

O Escravo na Economia Brasileira
Os primeiros escravos africanos teriam chegado ao Brasil com a expedição de Martim Afonso de Sousa que portou no litoral paulista (São Vicente), em 1531. Contudo, o tráfico negreiro para o Brasil somente foi regulamentado em 1550, por um ato de D. João III, rei de Portugal na época. Assim, desse ano até meados do século XVII, 350 mil africanos já tinham sido introduzidos nas plantações de cana-de-açúcar brasileiras.
No século XVIII, esse número chegaria a 1.600 mil, exigidos pela mineração e pela lavoura de exportação (algodão e açúcar) e que dobraria na primeira metade do século XIX, com a lavoura cafeeira. Segundo Roberto Simonsen, até 1850, quando foi extinto o tráfico negreiro, foram trazidos para o Brasil, aproximadamente, 3.300 mil africanos.

O tráfico de Escravos
A obtenção de escravos na costa africana se dava de várias maneiras: poderiam ser adquiridos de mercadores muçulmanos ou diretamente de chefes africanos sempre dispostos a vender seus cativos e, até mesmo, seus súditos. Os portugueses também se valiam das desavenças entre grupos tribais, normalmente terminadas em lutas e, conseqüentemente, escravos, além da corrupção dos pais, que não hesitavam em vender seus próprios filhos. Nas trocas para a aquisição de escravos (escambo), usava-se como forma de pagamento desde a aguardente, tabaco e armas, até miçangas, quinquilharias e outras bugigangas. Nas viagens, a bordo dos navios negreiros (tumbeiros). perdiam-se aproximadamente 40% do total de "peças" embarcadas. Em alguns casos, chegavam a mais de 60%.
Já na América, o negro era submetido à violência da escravidão capitalista, sem precedente na História da Humanidade, uma vez que, nesta, o trabalhador era simplesmente um objeto, uma peça (coisa ou res), ao contrário do escravismo praticado na Antiguidade.
Os sudaneses, caracterizados pela elevada estatura, foram introduzidos em grande número nos engenhos de açúcar da Bahia, embora já conhecessem os trabalhos com metais. Os bantus, de estatura mais baixa, eram mais numerosos e preferidos para os trabalhos na agricultura. Por isso, foi o grupo que mais se espalhou pelo Brasil: São Paulo, Rio de Janeiro, Pernambuco, Alagoas, Maranhão e Pará. Os guineanos-sudaneses eram minoritários e foram muito usados nas plantações da Bahia; pelo fato de serem islamizados, souberam expressar a reação contra o branco dominador, sendo por isso temidas as suas rebeliões.

A dinâmica da economia colonial
A economia colonial também foi caracterizada por períodos ou fases, onde se destaca um produto rei ou chave. Esses períodos são denominados por alguns estu­diosos por ciclos econômicos, o que na verdade não cor­responde à realidade da economia dos tempos coloniais. Ela é marcada por fases estanques, sem a recorrência que caracteriza um ciclo. Em outras palavras, numa deter­minada fase, um determinado produto é predominante, mas, exclusivamente, na medida da sua importância na pauta de exportações; a sua decadência nem sempre é seguida da expansão.

2. O extrativismo do pau-brasil
A fase mais intensa da extração do pau-brasil foi o período Pré-Colonial (do Descobrimento até meados do século XVI), embora tenha sido explorado até o século XIX.
O extrativismo dessa madeira tintorial, chamada pelos índios de ibirapitanga, e muito utilizada na Europa, foi praticado ao longo do litoral brasileiro, desde o Rio Grande do Norte até o Rio de Janeiro, através da criação de feitorias. Por ter sido declarado monopólio da coroa ­estanco - sua exploração foi realizada, no início, pelo sistema de arrendamento do trato (contrato entre o Esta­do e particulares), mediante o pagamento do quinto.
O primeiro contrato que se tem notícia foi firmado em 1502, com a Companhia de Fernando de Noronha. Pos­teriormente, apenas uma prévia autorização do governa­dor-geral garantia a exploração. Somente em 1605 surgiu o Regimento do Pau-Brasil, regulamentando a extração da madeira para evitar o esgotamento da espécie.
Na obtenção do pau-brasil, uma atividade predatória e itinerante, era utilizada a mão-de-obra livre do indígena, remunerada com mercadorias mais diversas e com bugi­gangas (escambo). Sua exploração ilegal foi sempre com­batida por Portugal. Daí, a constante repressão lusa no litoral brasileiro, especialmente contra os entrelopos franceses.
Dada a sua itinerância, a exploração do pau-brasil, caracterizada pela infixação, não chegou a promover o povoamento da colônia, o que só aconteceria com a cria­ção da grande lavoura de exportação.

3. A economia açucareira
Em meados do século XVI, Portugal começou a im­plantar no Brasil um sistema produtor açucareiro, cuja fase, ­áurea abrangeu da segunda metade desse século, até o final do século XVII, com o apogeu entre 1570 e 1650.
A agricultura canavieira determinou a colonização portuguesa no Brasil e, ao mesmo tempo, a criação das pri­meiras formas político-administrativas aplicadas pelo Estado português na colônia, como as Capitanias Heredi­tárias e o Governo Geral, além de ser a grande responsável pela introdução da escravidão africana.
A instalação da economia açucareira no Brasil obedecendo aos princípios do mercantilismo vigente na. época, decorreu de uma conjuntura externa favorável a produto, uma vez que, na Europa, a expansão da demanda provocou um sensível aumento dos preços do açúcar. Além disso, devem ser somados outros fatores, como experiência anterior adquirida pelos portugueses com produção das ilhas atlânticas, a tropicalidade da colônia: (solo, clima, regime de chuvas, entre outros), especial­mente do litoral nordestino, a existência de um tráfico africano capaz de fornecer a mão-de-obra escrava e finalmente, a aliança com o capital flamengo. Os holan­deses foram os responsáveis pelo financiamento da instalação dos engenhos na colônia e pelo transporte, refino e comercialização do açúcar na Europa.

O mundo açucareiro
Nas principais regiões produtoras de açúcar, litoral da Bahia e de Pernambuco, foram rapidamente instaladas dezenas de unidades produtoras, os engenhos.
Entendido como o conjunto formado pelas terras (ca­naviais, pastagens e matas) e demais instalações onde se processava a produção do açúcar, o engenho era o centro de gravitação da vida do mundo açucareiro. Ao lado destes, existiam também as pequenas unidades, voltadas para a produção de melaço, rapadura e aguardente, denominadas engenhocas ou molinetes.
Enquanto unidade industrial, ou seja, o conjunto dos equipamentos que transformava a cana em açúcar, os engenhos podiam ser de dois tipos: o real, movido pela força água, e o trapiche, impulsionado pelos animais. As ins­talações que formavam a grande unidade produtora rece­biam a denominação de casas, cada uma delas envolvida num determinado estágio do processo produtivo: a casa da moenda, a casa das fornalhas e a casa de purgar, entre outras.
No mundo açucareiro existiam diversos tipos de fazendas ou propriedades. A grande propriedade senhorial, ou engenho, constituía-se de quatro edificações que caracterizavam a época: a casa grande, a capela, a senzala e o engenho, propriamente dito. Além desta, havia também as fazendas livres, médias e pequenas propriedades, e as fazendas obrigadas, que eram terras cedidas pelos se­nhores-de-engenho a um colono, com a obrigação de moer a sua cana no engenho do senhor, deixando com ele mais da metade da sua produção.
Essa organização econômica definiu as feições da colônia nos primeiros séculos da História do Brasil, ge­rando uma sociedade patriarcal, conservadora, escravista, em crescente miscigenação com indígenas e escravos e rigidamente estratificada, geradora da imobilidade social.

O declínio da economia açucareira
Na segunda metade do século XVI, teve início o pro­cesso de decadência da economia açucareira, diretamente relacionada à concorrência da produção antilhana. Nessa área da América colonial, os holandeses, depois de terem sido expulsos do Brasil, em 1654, montaram um complexo produtor de açúcar, onde desenvolveram técnicas moder­nas, possibilitando o aumento da produtividade, um custo menor de produção e, conseqüentemente, um menor preço para o mercado.
Com isso, o Brasil, que até então tinha uma relação de monopólio com o mercado de açúcar, não se adaptou à no­va relação de concorrência. Da condição de primeira ex­portadora mundial de açúcar, a colônia portuguesa passava a ocupar a quinta posição entre os principais produtores, recuperando uma posição de destaque, um século depois, ou seja, no final do século XVIII, dentro do Renascimento Agrícola.

4. A pecuária como atividade subsidiária
A pecuária sempre ocupou um papel secundário no conjunto da economia colonial, orientada exclusivamente para o mercado externo. Por essa razão, sempre aparece como atividade subsidiária ou satélite da grande lavoura mercantil e de outras atividades econômicas principais que se desenvolveram durante a colonização.
O gado foi introduzido, e passou a ser criado nos engenhos do Brasil em meados do século XVI, para apoiar a economia açucareira como força motriz, animais de tração e de transporte (animal de tiro); num segundo plano, também era destinado à alimentação, através da produção das carnes em conserva: carne-seca e carne-de-­sol, entre outras.

A primeira expansão do gado
Com o avanço das plantações de cana e o crescimento dos rebanhos, as duas atividades se separaram. O gado se expandiu pelo interior nordestino, em especial ao longo do rio São Francisco, denominado Rio dos Currais, onde surgiram grandes fazendas de criação, graças à existência de bons pastos, água e reservas de sal-gema. Nessa medida, as fazendas de criação de gado foram responsáveis pela ocupação das terras interioranas, constituindo-se num dos principais agentes da expansão territorial. Contudo, embora separados, o grande mercado consumidor da pecuária eram os engenhos de açúcar do litoral.
Nesse processo, a pecuária extensiva e de baixo índice técnico gerou um outro tipo de sociedade no interior do Nordeste, onde predominava o trabalho livre de mestiços, os vaqueiros ou seus auxiliares, os fábricas. A remuneração, de uma maneira geral, baseava-se na parti­cipação do crescimento do rebanho; uma cria a cada quatro nascidas, com o acerto realizado a cada cinco anos.

5. A união Ibérica (1580-1640)
Em 1578, D. Sebastião I, rei de Portugal, morreu em Alcácer-Quibir, no Norte da África. Como não tinha herdeiros, o trono português ficou com seu tio-avô, o cardeal D. Henrique, que veio a falecer dois anos depois.
Com a vacância do trono, uma vez que não havia um sucessor em linha direta, vários pretendentes passaram a disputar a coroa de Portugal, a saber: D. Catarina de Médicis, rainha de França, que se dizia descendente de D. Afonso III (que havia governado Portugal no século XV); D. Catarina, duquesa de Bragança e sobrinha do cardeal D. Henrique (a que reunia maiores direitos); Manuel Felisberto, duque de Savóia e D. Antônio, Prior do Crato, ambos, sobrinhos do rei; Alberto de Parma e Felipe II, rei da Espanha, bisnetos de D. Manuel, o Venturoso.

Um rei e Duas coroas
Em 1580, Felipe II, o monarca espanhol, governante de uma das nações mais poderosas do mundo, exigiu o trono português e ordenou ao duque de Alba a invasão de Portugal. Contando com o apoio da nobreza e da burguesia portuguesas, a quem havia prometido inúmeros favores, Felipe II uniu as duas coroas, dando início a uma a nova fase da política portuguesa, ou seja a União Ibérica, que se estendeu até 1640.
A união das duas coroas peninsulares possibilitou a constituição de um grande império colonial ibérico que durou sessenta anos. Dentro dele, Portugal mantinha a autonomia administrativa e seus domínios continuavam separados das possessões espanholas. Nada disso, entretanto, impediu a aceleração da decadência do reino português, arrastado nas sucessivas e desastrosas guerras que a Espanha sustentava na Europa, contra a Inglaterra (em que ocorreu a destruição da Invencível Armada luso-­espanhola), a França e a Holanda (esta lutando pela independência do domínio espanhol).

As conseqüências da União Ibérica
São diversas as conseqüências do domínio espanhol sobre Portugal, quase todas implicando o agravamento da crise que se abatia sobre o reino, desde as primeiras déca­das do século XVI. Mesmo os seus empreendimentos coloniais sofreram os efeitos negativos do domínio fili­pino.
No caso do Brasil, devem ser destacadas as seguintes ocorrências:
. o fechamento dos portos ibéricos aos navios fla­mengos, inclusive nas colônias, desarticulou o comércio açucareiro. O boicote e confisco dos navios flamengos, levado à termo pela Espanha, acarretaram as invasões dos holandeses à Bahia e a Pernambuco.
. o litoral brasileiro foi marcado pelos ataques de corsários estrangeiros, principalmente ingleses.
. no Maranhão, os franceses tentaram criar um segundo estabelecimento colonial, a França Equinocial.
. a supressão temporária dos limites de Tordesilhas, por outro lado, possibilitou a expansão territorial na colônia.
. a interrupção do tráfico negreiro no contexto das invasões holandesas e o conseqüente incremento da escra­vidão indígena acabaram por estimular o bandeirismo pau­lista.

6. Ataques e invasões estrangeiras
Entre os elementos explicativos dos ataques e inva­sões estrangeiras ao Brasil, encontramos, em primeiro lugar, o Tratado de Tordesilhas (1494), responsável pela marginalização da Inglaterra, França e Holanda em relação à partilha das terras descobertas no Novo Mundo. Em se­gundo, a União Ibérica, que provocou a reação daqueles países ao monopólio ibérico estabelecido em relação ao comércio e navegação coloniais. As principais invasões e ataques ao Brasil, empreendidos por Inglaterra, França e Holanda, ocorreram durante o Domínio Espanhol, entre 1580 e 1640.
A presença inglesa
Desde a década de 1530 os ingleses mantinham um incipiente comércio ilícito com o litoral brasileiro, inclusive com a associação a comerciantes portugueses. Com o Domínio Espanhol, e as conseqüentes proibições decretadas pelos reis espanhóis a qualquer comércio que não fosse ibérico, tiveram início os ataques de corsários ingleses. Esses ataques objetivavam o saque e ocorreram, principalmente, no reinado da rainha Isabel (Elizabeth), na época em guerra com a Espanha.
Em 1583, o almirante Edward Fenton entrou em Santos, mas foi repelido. Na noite de Natal de 1581, entretanto Thomas Cavendish ocupou a vila de Santos, sa­queando-a e exigindo o pagamento de um resgate. No ano seguinte, tentou um novo ataque a Santos, mas sem suces­so. Em 1587, ocorreu um ataque fracassado a Salvador, chefiado por Robert Withrington. Em 1595, nova expe­dição comandada pelo inglês James Lancaster atacou com grande sucesso o povoado do Recife.

A França equinocial (1612-1615)
Mesmo com a destruição da França Antártica, os fran­ceses continuaram a freqüentar o litoral Nordeste do Bra­sil, estabelecendo várias bases, na Paraíba, no Rio Grande do Norte e no Ceará, onde contavam com o apoio dos indígenas. No final do século XVI e início do século XVII, a ação militar portuguesa afastou a ameaça francesa e garantiu o controle dessa extensa faixa litorânea.
O Maranhão, contudo, conheceria a segunda tentativa de formação de uma colônia francesa no Brasil. A origem desta colônia remonta ao ano de 1594, quando alguns náufragos franceses, liderados por Jacques Riffault, se estabeleceram na região. Um outro francês, Charles des Vaux, que havia sido aprisionado no Ceará, regressando à França difundiu a idéia de ser criada uma colônia francesa no litoral maranhense, uma área ainda abandonada.
Em 1612, chegou ao Maranhão uma expedição comandada por Daniel de La Touche, Senhor de La Ravar­dière, estabelecendo as bases da colônia que recebeu o nome de França Equinocial, sendo, em 1612, fundado o Forte de São Luís, futura cidade com o mesmo nome.
A expulsão dos franceses ocorreu em 1615, após um acordo firmado entre estes e os portugueses (e que os últimos não cumpriram). As tropas que derrotaram os franceses foram inicialmente comandadas por Jerônimo de Albuquerque e Martim Soares Moreno e posteriormente
Alexandre de Moura.

As invasões holandesas
As relações mantidas por Portugal com os Países Baixo­s eram intensas desde o final da Idade Média. Na co­lonização brasileira foi destacado o papel dos holandeses na montagem da empresa açucareira, financiando, transportando, refinando e distribuindo o açúcar do Brasil no mercado europeu. Foi importante também o seu papel no comércio triangular (Europa, África e Brasil), sobressaindo-se, o tráfico negreiro.
O início da União Ibérica, entretanto, veio modificar esse quadro, na medida em que a Espanha proibiu a parti­cipação dos flamengos nos negócios do açúcar brasileiro.

A Guerra entre Espanha e Holanda (1568-1648)
Desde 1551, Felipe II, da Espanha, intervinha de forma marcante nas províncias flamengas, sobre as quais possuía direitos legados por herança de seu pai, o imperador Carlos V. A partir de 1568 os flamengos iniciar­am a guerra pela libertação dos Países Baixos do Norte, liderados por Guilherme de Orange. A guerra se tomou mais acirrada quando ocorreu a União de Utrecht (união províncias holandesas) e, em 1581, a proclamação de sua independência, dando origem às Províncias Unidas Países Baixos.
Em vista disso, Felipe II determinou sanções contra o comércio flamengo com as colônias ibéricas (1585, 95 e 1599), decretando o embargo de navios holandeses em Lisboa e estendendo essas sanções às colônias de Portugal, em 1605.
Em 1602, os holandeses fundaram a Companhia das Índias Orientais e iniciaram a penetração no Oriente (Índia,Ceilão e Molucas). De 1609 a 1621, foi firmada a trégua dos 12 anos, período em que se intensificou a compra de açúcar e Amsterdã tomou-se um dos grandes centros refinadores e distribuidores do produto. Com o término da trégua, em 1621, e o início de novos boicotes por parte do governo espanhol, os holandeses criaram a Companhia das Índias Ocidentais (W. I C.), que tinha por alvo direto e claro o Brasil.

A Invasão Holandesa na Bahia (1624-25)
Em 1624, uma esquadra com 3.300 homens, sob o do de Jacob Willekens, invadiu a Bahia, escolhida por ser um grande centro produtor de açúcar e a capital da colônia. O governador Diogo de Mendonça Furtado não Conseguiu evitar a queda de Salvador e a população, sob a liderança do bispo D. Marcos Teixeira, retirou-se para o interior, onde organizou diversos grupos de guerrilhas.
As guerrilhas dos habitantes locais e a chegada de uma esquadra luso-espanhola, sob o comando de D. Fradique de Toledo Osório, colocou um ponto final nas pretensões holandesas. Em 1625, os invasores eram derrotados e expulsos da Bahia - episódio que ficou conhecido como Jornada dos Vassalos.
Em 1628, entretanto, o corsário Pieter Heyn atacou barcos espanhóis carregados de prata nas Antilhas. Este e outros ataques (como um novo saque ao porto de Salvador, em 1627) criaram condições para a W.I.C. se reestruturar e preparar um novo ataque ao Brasil, agora numa região menos protegida e a maior produtora de açúcar do Brasil.

Os Holandeses em Pernambuco (1630-54)
Com 56 navios fortemente armados e 7.300 soldados, a W.I.C. realizou a segunda invasão, agora sob o comando de Diederik van Waerdenburgh e Hendrick Lonck. Os 400 soldados de Pernambuco nada puderam fazer diante de tão desigual situação. Desta forma, os holandeses não encon­traram resistência para ocupar a capitania, em fevereiro de 1630. O governador de Pernambuco, Matias Albuquerque, retirou-se para o interior a fim de organizar a resistência no famoso Arraial do Bom Jesus. Esse movimento guerri­lheiro que reunia senhores-de-engenho, escravos, índios e a população de Olinda e Recife denominou-se Guerra Brasílica.
O Arraial do Bom Jesus conseguiu algumas vitórias, até abril de 1632, quando Domingos Fernandes Calabar juntou-se aos invasores, denunciando a localização do núcleo de resistência, que foi atacado e arrasado. Com isso, os holandeses estenderam suas conquistas, tomando o Rio Grande do Norte e a Paraíba. Em retirada para Alagoas, Matias de Albuquerque retomou Porto Calvo, onde, depois de derrotar os flamengos, aprisionou e executou Calabar. Esta vitória, entretanto, foi infrutífera pois os holandeses obtiveram uma vitória fundamental em Mata Redonda. Em 1637, a W.I.C. entregou a administração do Brasil holandês ao conde João Maurício de Nassau-Siegen.

O Governo de Nassau (1637- 1644)
Nassau consolidou e expandiu as conquistas holan­desas. No Nordeste, ocupou todo o litoral, até o Maranhão, e na África tomou São Jorge da Mina e as feitorias de Angola, assegurando o abastecimento dos engenhos do Nordeste holandês de escravos africanos. Falhou, entre­tanto, nas tentativas de conquistar a Bahia, em 1638.
A administração nassoviana foi favorecida por uma estranha situação de paz. Em 1640, os holandeses apoia­ram os portugueses no movimento da Restauração, encer­rando o domínio espanhol. Por essa razão, Portugal e Ho­landa assinaram a Trégua dos 10 Anos (1641-51), em que a segunda continuava a ocupar sete capitanias brasileiras.
Aproveitando-se dessa condição, Nassau aproximou-­se da população local, principalmente dos senhores-de-en­genho, de quem procurou ganhar a simpatia, financiando a reconstrução de engenhos a juros baixos, encampando suas dívidas, recuperando engenhos abandonados, garan­tindo os preços do açúcar e o fornecimento de escravos.
Conseqüentemente, houve um aumento significativo da produção açucareira. Além disso, Nassau garantiu uma justiça mais igualitária, a liberdade de culto (os holandeses eram protestantes), e chegou a publicar normas protegen­do a alimentação dos escravos (obrigatoriedade de cultivo de 200 covas de mandioca para os escravos). Politica­mente, permitiu a participação dos senhores de terras no Conselho dos Escabinos, espécie de Câmara Municipal, dirigido por um membro da W.I.C., o esculteto. O Recife. foi modernizado e embelezado e uma série de realizações marcaram sua atuação no terreno cultural, como a criação do Observatório Astronômico e de uma biblioteca.
A política de Nassau, entretanto, entrou em choque como os interesses da W.I.C., que considerava a sua administração muito dispendiosa e personalista. Pressionado, o governador acabou por se demitir em 1643, retirando-se pata a Holanda.

A Insurreição Pernambucana (1645- 1654)
Após uma fase inicial de reação ao invasor (1630-35) e um período de acomodação (1635-45), teve início, em 1645, uma forte reação nativista visando à expulsão dos holandeses. Essa reação, que contou com a presença de todas as camadas sociais nordestinas (João Fernandes Vieira, André Vidal de Negreiros, Henrique Dias e Antô­nio Felipe Camarão, o índio Poti), denominou-se Insur­reição Pernambucana e foi destravada com a saída de Nassau do governo de Pernambuco: os novos governantes eram intolerantes, os senhores-de-engenho estavam endi­vidados e as dívidas passaram a ser cobradas de forma diferente da que vinha sendo feita pelo príncipe, os preços do açúcar começaram a cair aceleradamente e as catástro­fes naturais começaram a se abater sobre a produção açu­careira.
Diante das primeiras ações armadas dos pernambuca­nos, o rei de Portugal, D. João IV, censurou as atitudes dos líderes insurretos, chamando-os de "maus vassalos" por não respeitarem o acordo firmado na trégua com os holan­deses.
Em 1645, ocorreu a primeira vitória brasileira no Monte das Tabocas. A partir daí, os holandeses sofreram sucessivos revezes, o que propiciou a libertação de Alagoas e Sergipe. Em 1648 e 1649, ocorreram as duas batalhas de Guararapes, com significativas vitórias dos insurretos. Com isso, em 1653, o rei de Portugal enviou reforços sob o comando de Pedro Jaques de Magalhães, forçando a rendição final holandesa em 1654, com a capitulação da Campina de Taborda.
A guerra dos holandeses contra os ingleses, motivada pelo Ato de Navegação, de Oliver Cromwell (1651), e os efeitos da Guerra dos Trinta Anos contribuíram decisiva­mente para o enfraquecimento dos flamengos.

Conseqüências das Invasões Holandesas
Com a expulsão dos flamengos a economia açuca­reira entrou em crise. A concorrência da produção anti­lhana, desenvolvida pelos próprios holandeses que ha­viam sido expulsos do Brasil, eliminou o açúcar brasileiro dos mercados. Por outro lado, a luta contra o invasor despertou o sentimento nativista; o homem da terra que desafiou a ocupação estrangeira ressentiu-se da volta ao domínio luso.
Na colônia, verificou-se a expansão territorial; no interior nordestino, a pecuária ocupava agora um extenso território; o bandeirismo de apresamento indígena devas­sara os sertões e o litoral Norte e Nordeste estava, agora, totalmente ocupado.
No caso da metrópole, sua fragilidade resultou na assinatura de tratados desvantajosos com os holandeses. Pelo Tratado de Haia (1661), graças à mediação inglesa, a Holanda recebia uma indenização de 4 milhões de cruzados, a cessão pelos portugueses das Ilhas Molucas e do Ceilão e recebia ainda o direito de comerciar com maior liberdade nas possessões portuguesas. Tudo para compensar a perda do Brasil holandês.

7. O bandeirismo
O bandeirismo foi um movimento expansionist2 desenvolvido pela população de São Paulo de Piratininga deslocando-se para o interior da colônia, durante boa parte do século XVII. Ao lado deste, devem ser des­tacadas as entradas, outro movimento de penetração de interior, cujas diferenças, em relação ao primeiro, são mais tradicionais do que efetivas: as entradas teriam organização oficial e não ultrapassariam a linha de Tordesi­lhas, entre outras, ao contrário das bandeiras, que seriam organizadas por particulares e não respeitariam o Tratado de Tordesilhas.

As razões do bandeirismo
Pode-se dizer que a penetração dos bandeirantes a partir de São Paulo, em direção ao Rio Grande do Sul. Mato Grosso, Goiás e Minas Gerais foi facilitada pelas melhores condições da vegetação, relevo, clima e rios navegáveis, além do fato de os homens de Piratininga estarem livres, no planalto, dos ataques estrangeiros que assolavam o litoral na época. Contudo, foi a pobreza do, habitantes de São Paulo que impulsionou o movimento bandeirista.
Antes que terminasse o século XVI, a capitania de São Vicente já estava mergulhada em profunda decadên­cia. O solo pobre das terras litorâneas e o limite imposto pela serra do Mar, além da distância da metrópole, invia­bilizaram a economia açucareira. Parte da população vicentina abandonou o litoral, deslocando-se para o pla­nalto de Piratininga, onde o quadro econômico, contudo. não apresentava alterações sensíveis.
Dessa forma, isolados no planalto, desprovidos de uma lavoura de porte capaz de atrair os interesses metro­politanos e produzindo uns poucos gêneros, destinados basicamente à subsistência, os bandeirantes foram impul­sionados a buscar novas riquezas nos sertões: índios que poderiam ser vendidos como escravos e metais preciosos.

São Paulo na época dos bandeirantes
A vila de São Paulo, no início do século XVII, era bas­tante pobre e sua população se constituía, na sua maioria, de mamelucos (mistura do branco com o índio). Como era forte a influência indígena, eram homens rudes, que dormiam em redes e se alimentavam à maneira nativa: carne de caça, peixes, frutas e um pouco de farinha, milho, feijão e mandioca.
Para o trabalho, valiam-se do braço indígena, que muitas vezes eram caçados e vendidos como escravos, sendo comum referir-se a estes como os "negros da terra". As bandeiras de caça ao índio mobilizavam todos os homens da vila e, embora dela participassem muitos brancos, sua maioria era constituída de mamelucos e de índios, vitais para o sucesso da empreitada. Portanto, o apresamento de índios para a escravidão era uma prática comum antes mesmo da fase áurea dos grandes ciclos do bandeirismo.

O ciclo de preação do índio
No início do século XVII, havia a necessidade de complementação de braços escravos nos engenhos lito­râneos e, a partir daí, o apresamento de indígenas tornava­-se uma atividade lucrativa, o que levou o bandeirante a trocar a caça ao índio bravio das matas pelo ataque às missões ou reduções jesuíticas, onde o nativo, já cristia­nizado, conhecia determinados ofícios e estava acostu­mado ao trabalho regular. Assim, entre 1612 e 1628, o bandeirante paulista Manuel Preto atacou sucessivas vezes a missão jesuítica de Guairá, trazendo para o cativeiro milhares de índios. Seguiu-se em 1629, bandeira de Antônio Raposo Tavares, cuja violência do ataque acabou obrigando os jesuítas a se fixar em outras áreas como Tapes, no Rio Grande do Sul, e Itatim, em Mato Grosso. Essas missões foram destruídas entre 1637 e 1648 pelo mesmo Raposo Tavares, um dos grandes nomes do bandei­rismo de preação.
A época das grandes bandeiras de preação coincidiu com a ação holandesa, tomando as feitorias africanas e desviando o tráfico de escravos para o Nordeste, sob sua ocupação desde 1630. Tanto é que a normalização do tráfico africano na década de 1640 provocou o declínio do ciclo de apresamento.

O ciclo do bandeirismo de contrato
Na segunda metade do século XVII, os bandeirantes passaram a servir aos grandes proprietários rurais do Nordeste e à própria coroa portuguesa, fazendo a guerra aos· índios hostis e destruindo os quilombos, onde se concentravam escravos foragidos. Nessa medida, a atividade bandeirista implicava um contrato e uma forma de remuneração ou compensação, revestindo-se, além disso, de um caráter essencialmente militar.
Nesse ciclo, situam-se as guerras justas contra indí­genas, inclusive do Norte do Brasil, e a guerra dos bár­baros que culminou com a destruição da Confederação dos Cariris, no Ceará e Rio Grande do Norte. A ocorrên­cia mais importante, contudo, foi a destruição do quilom­bo dos Palmares (1695), situado no território alagoano e um dos mais importantes movimentos da resistência negra à escravidão. O responsável pelo aniquilamento do reduto quilombola foi Domingos Jorge Velho, um dos mais importantes bandeirantes do bandeirismo de contrato.

Ciclo de prospecção ou do ouro
Ainda no século XVI, os habitantes de Piratininga encontraram o ouro de lavagem, nos arredores da vila de São Paulo, bem como em Iguape, Paranaguá, Curitiba e Santa Catarina. As pequenas proporções das jazidas e a atração exercida pelo apresamento indígena levaram os bandeirantes a abandonar a exploração aurífera.
Nas últimas décadas do século XVII, contudo, a coroa portuguesa passou a estimular os bandeirantes a buscar os metais preciosos, tão esperados pela metrópole desde o início da colonização e tão necessários a Portugal, no momento em que se agravava sua crise econômico-finan­ceira. De próprio punho, os reis de Portugal- D. Afonso VI e D. Pedro II - pediam aos bandeirantes que explorassem a região das Gerais, oferecendo, em troca, títulos e hon­rarias.
As primeiras bandeiras de prospecção alcançaram o território de Minas Gerais na década de 1670, destacando-­se aí a figura de Fernão Dias Pais, o "caçador de esme­raldas". Em 1690, Garcia Rodrigues Pais, seu filho, anun­ciava a descoberta das primeiras jazidas auríferas; três anos depois, Antônio Rodrigues Arzão encontrou ouro em Caeté, seguido das descobertas das minas de Vila Rica e de Sabará, por Borba Gato, em 1700. Seguindo na busca de novas jazidas, Bartolomeu Bueno da Silva desloca-se para o Centro-Oeste, e, em 1725, descobre as minas dos Goiáses.

As Monções
Com a concentração da extração aurífera em Minas Gerais, provocando a maciça migração de reinóis, não tardaram a surgir os conflitos entre paulistas e portugue­ses, que acabaram por provocar a Guerra dos Emboa­bas. Em desvantagem e derrotados nos confrontos armados, os paulistas deslocaram-se através do rio Tietê, em busca de outras regiões auríferas.

Essas grandes expedições fluviais, que subiam e desciam os rios Tietê, Paraná, Paraguai e outros rios do território mato-grossense, foram denominadas monções. A denominação resultou do ciclo de cheias e vazantes dos rios, determinando ou não a possibilidade de navegação. Além do seu caráter explorador, as monções atuaram co­mo expedições de abastecimento dos núcleos que se for­mavam nos sertões.
Uma das conseqüências mais importantes das mon­ções foi a descoberta do ouro em Cuiabá, por Pascoal Moreira Cabral, em 1718.

O Significado do Bandeirismo
A atuação do bandeirismo foi de fundamental impor­tância para a ampliação do território português na Amé­rica. Num espaço muito curto, os bandeirantes devas­saram o interior da colônia, explorando suas riquezas e arrebatando grandes áreas do domínio espanhol, como é o caso das missões do Sul e Sudeste do Brasil. Antônio Raposo Tavares, depois de destruí-Ias, foi até os limites com a Bolívia e Peru, atingindo a foz do rio Amazonas, completando, assim, o famoso périplo brasileiro.

O bandeirante tornou-se, assim, um dos agentes da expansão territorial que deu ao Brasil sua configuração geográfica atual.

8. A expansão territorial
Durante o primeiro século da colonização, apenas um trecho do litoral brasileiro era ocupado e efetivamente povoado, mesmo assim, de forma intermitente. Isso se explica pela concentração, nessa área da colônia, das únicas atividades lucrativas para a metrópole: a produção de açúcar e a extração do pau-brasil.
No século XVII, teve início a expansão territorial, interiorizando a colonização lusa, em que se destacaram três figuras humanas: o bandeirante, organizando as ex­pedições de apresamento indígena e de prospecção mine­ral; o vaqueiro, ocupando as áreas de pastagens nordes­tinas e criando o gado, e, finalmente, o missionário, prin­cipalmente o jesuíta, envolvido na catequese e na funda­ção das missões.
O restante do litoral brasileiro e o Sul da colônia fo­ram marcados pela expansão oficial, onde a ação das for­ças militares portuguesas afastou a ameaça estrangeira.

A conquista da regiões setentrionais
No final do século XVI, toda a faixa litorânea acima de Pernambuco permanecia intocada. Franceses, ingleses e holandeses freqüentavam a região, procurando sempre estabelecer alianças com os indígenas, criando as con­dições para futuros projetos de colonização. Nesse passo, a intervenção militar portuguesa acabou por assegurar os domínios dessas áreas, a partir de uma série de conquistas, conforme o quadro que se segue:
● Paraíba: Na região da atual Paraíba, ainda despo­voada, os franceses estabeleceram boas relações com os índios do litoral, com os quais traficavam. Em 1584, a ação portuguesa para conquistar a re­gião começou com Frutuoso Barbosa, que, depois das primeiras derrotas, recebeu o apoio de uma esquadra espanhola, comandada por Diogo Valdez. A fundação do forte de São Felipe e São Tiago e da cidade de Filipéia de Nossa Senhora das Neves, hoje João Pessoa, garantiu a incorporação dessa região à colônia.
● Rio Grande do Norte: Um dos últimos redutos dos franceses, a conquista do Rio Grande do Norte foi encetada a partir de Pernambuco com a participação de Manuel de Mascarenhas Homem, Alexandre de Moura e Jerônimo de Albuquerque. Acossados pelos portugueses e vitimados pela varíola, os fran­ceses foram expulsos em 1597. Neste mesmo ano. foi fundado o forte dos Reis Magos (atual Natal). que se tornou o núcleo de ocupação da região.
● Ceará: Em 1603, Pero Coelho de Souza tentou inutilmente desalojar os franceses do litoral cea­rense, apoiados pelos indígenas. O aprisionamento de tabajaras e potiguaras como escravos, na volta do conquistador, provocou o aumento das hostili­dades indígenas contra os portugueses. A conquista do Ceará somente se realizaria em 1611, com a expedição comandada por Martim Soares Moreno.
● Grão-Pará: A ocupação de um extenso território, junto à foz do rio Amazonas, teve início com os ataques de Francisco Caldeira de Castelo Branco contra franceses, ingleses e holandeses, presentes na região. Na ocasião, deu-se a fundação do forte do Presépio, em 1616, origem da atual cidade de Belém. Posteriormente, o Grão-Pará passou a constituir o Estado do Maranhão, criado em 1621.
● Amazonas: No início do século XVII, era intensa a exploração desenvolvida por holandeses e ingleses, que, valendo-se dos rios da bacia Amazônica, adentravam o interior em busca das drogas do sertão - madeiras, ovos de tartaruga, plantas me­dicinais e aromáticas, entre outras. Depois de lutas contra os estrangeiros e os índios da região, Pedro Teixeira fixou os primeiros marcos, garantindo a posse da Amazônia para Portugal. Na ocupação desse território, foram fundamentais a ação das tropas de resgate, expedições que corriam a região fazendo a guerra justa contra os indígenas, e a atuação dos missionários, especialmente dos car­melitas, criando missões e usando a mão-de-obra do índio na coleta de drogas do sertão.

A presença portuguesa no sul
Os portugueses sempre tiveram interesse na região Sul, atraídos pela prata que escoava pelos rios da bacia Platina e pelo rico comércio peruleiro (peruano). Desde cedo, portanto, alimentavam o sonho de criar um esta­belecimento na região.
Em 20 de janeiro de 1680, D. Manuel Lobo fundou a Colônia do Santíssimo Sacramento, à margem esquerda do estuário do Prata - atual cidade uruguaia de Colônia, garantindo a presença portuguesa em uma área importante dentro do império colonial espanhol e, ao mesmo tempo, abrindo espaço para o contrabando inglês na bacia do Prata. A fundação de Sacramento abriu um período de sucessivos conflitos e debates diplomáticos entre os dois países, que se estenderam até o século XVIII.
A ocupação do Rio Grande do Sul e Santa Catarina está inserida nesse processo. No caso do território gaúcho, os ataques às missões foram os responsáveis pelo apare­cimento de um rebanho de gado pelos campos sulinos que, unido ao gado trazido da Europa, garantiram a sua ocupação durante o século XVIII. Ainda neste século, foram introduzidas milhares de fanu1ias de colonos açorianos no litoral do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina, possibilitando o aparecimento e a consolidação de importantes núcleos de povoamento, como Laguna, Florianópolis e Porto dos Casais, atual cidade de Porto Alegre.

A expansão da pecuária
Da sua introdução nos engenhos do litoral nordestino, o gado se expandiu em direção ao sertão, no primeiro século e meio da colonização. Com isso, o Sertão do Nordeste e o Vale do Rio São Francisco surgem como as principais regiões pecuaristas da colônia, o que garantiu a ocupação de um grande território do interior brasileiro.
Outra região que se voltaria também para a pecuária seria o sul de Minas Gerais, já no século XVIII. Ali, a criação de gado envolvia certa técnica superior, fazendas com cercados, pastos bem cuidados e rações extras para os animais; no manejo dos rebanhos era utilizada a mão­-de-obra escrava. O seu mercado era representado pelas zonas urbanas mineradoras, o que provocou uma diver­sificação da produção: gado bovino, muares, suínos, ca­prinos e eqüinos.
Também os Campos Gerais, correspondendo ao interior de São Paulo e Paraná, foram outra região de pecuária, com a produção de animais de tiro para a região mineradora. Nessa região predominava a mão-de-obra livre, constituída pelos tropeiros.
Por fim, a pecuária seria desenvolvida ainda no Rio Grande do Sul, no século XVIII. Nesse caso específico, a pecuária promoveu não apenas a ocupação do território rio-grandense, mas, também, o seu povoamento. A ativi­dade criatória gaúcha utilizava-se do trabalho livre, havendo, contudo, o emprego paralelo de escravos e dos indígenas oriundos das missões. Voltada também para o abastecimento da região das Gerais, a pecuária gaúcha desenvolveu a indústria do charque e a criação de gado bovino, muar, eqüino e ovino.

9. A Restauração Portuguesa
A União Ibérica trouxe enormes prejuízos para Portugal, que ao final do período conhecia uma profunda crise, Os inimigos dos reinos unificados entre 1580 e 1640, especialmente os holandeses, tomaram grandes porções do Império colonial português, invadindo e estabelecendo, inclusive, uma colônia no Brasil.
Em 1640, o movimento pela restauração do trono português alcançou o seu ápice. Capitalizando o descon­tentamento geral do reino, a nobreza portuguesa liderou o movimento, aclamando D. João, duque de Bragança, como o novo rei de Portugal, com o nome de D. João IV, em dezembro desse ano. Tinha início a dinastia de Bragança, que governaria até o início do século XX.
Como conseqüência disso, teve início uma guerra entre Espanha e Portugal que se estenderia até 1668, obrigando os portugueses a estabelecer inúmeras alianças na Europa. Essas alianças, que num primeiro momento garantiram a Restauração, revelaram-se, posteriormente, desastrosas e maléficas, agravando ainda mais a crise que se abatia sobre Portugal.

As conseqüências da restauração para Portugal
Na guerra da Restauração, D. João IV aliou-se à In­glaterra, à França e à Holanda. Acordos políticos e vantagens comerciais foram firmados, com enormes prejuízos para Portugal. Com a Holanda, que ocupava o Brasil desde 1630, foi assinada a Trégua dos Dez Anos (1641-51), justamente quando no Brasil se organizava a 1ltima grande reação ao invasor. Por fim, após a expulsão dos holandeses do Brasil, D. João IV firmou com a Holanda o Tratado de Haia (1661), cedendo a esta as Ilhas Molucas e o Ceilão, além de pagar uma indenização de quatro milhões de cruzados pela perda do Nordeste brasileiro.
Com a Inglaterra foram firmados vários tratados comerciais que levaram Portugal à total subordinação econômica aos interesses ingleses. Em 1642, foram reduzidas as tarifas alfandegárias que incidiam sobre as manufaturas inglesas, quando entrassem em Portugal, e deu-se a permissão para a burguesia inglesa fazer o comércio direto com o Brasil, desde que não envolvesse os produtos estancados. Esses primeiros acordos comerciais abriram caminho para a assinatura do Tratado de Methuen, em 1703, e que consagrou em definitivo o domínio econômico da Inglaterra no mundo português.
Esse último tratado versava sobre os panos ingleses e os vinhos portugueses, um dos principais produtos de exportação do reino. Daí, a denominação de Tratado dos Panos e Vinhos. Por ele, os panos ingleses receberiam tarifas preferenciais nos portos portugueses; em con­trapartida, o vinho português recebia uma redução nas taxas, quando fosse admitido no mercado inglês. O Tratado de Methuen teve conseqüências desastrosas para Portugal, arruinando suas manufaturas, gerando, assim, a dependência dos produtos ingleses e conduzindo os portugueses à catastrófica especialização na produção vinícola, o que gerou em pouco tempo as crises de abastecimento.


A política colonial após a Restauração
A Restauração foi marcada por importantes modifi­cações na política colonial, especialmente no que se refere ao Brasil, uma das poucas fontes de riquezas que ainda sobrava a Portugal.



A ADMINISTRAÇÃO COLONIAL APÓS A RESTAURAÇÃO

Em 1642, foi criado o Conselho Ultramarino, órgão metropolitano que passava a centralizar toda a adminis­tração do Império português, caracterizada agora pelo crescente fiscalismo; proibia-se qualquer tipo de comér­cio estrangeiro na colônia (salvo para a Inglaterra) e criavam-se as companhias privilegiadas de comércio: em 1649, a Companhia Geral do Comércio do Brasil e, em 1682, a Companhia Geral do Comércio do Estado do Maranhão, que tinham o monopólio de todo o comércio em suas respectivas áreas de atuação. A carga tributária e as restrições sobre os colonos aumentaram e a autonomia municipal foi anulada, com as limitações impostas às Câmaras Municipais, agora sob a autoridade do juiz de fora, nomeado pelo Conselho Ultramarino.
Para garantir o cumprimento das determinações im­postas pela nova política colonial, marcada, agora, pela centralização e pelo progressivo enrijecimento do Pacto Colonial, foi aumentado o efetivo militar português na colônia. Com isso, surgiram os primeiros protestos dos colonos prejudicados por essa nova política, geradores das primeiras rebeliões contra a Metrópole.

10. Os movimentos nativistas
A partir de meados do século XVII, um conjunto de movimentos políticos exprimiu a repulsa dos colonos aos abusos do colonialismo português, endurecido depois da Restauração. Esses movimentos, denominados nativistas, podem ser caracterizados pela não contestação ao domínio português como um todo e sim por rebeldias ou conflitos regionais contra aspectos isolados do colonia­lismo, principalmente após 1640, quando a "relativa harmonia" entre interesses da aristocracia rural local e os da Metrópole foram-se rompendo, na medida em que se intensificava a exploração colonial portuguesa.
A Insurreição Pernambucana (1645-54) contribuiu para o advento desses movimentos, visto que durante a sua ocorrência registrou-se a divergência entre os interesses dos colonos e os objetivos pretendidos pela Metrópole. Daí estarem os movimentos nativistas menos relaciona­dos com um ideal emancipacionista, ligando-se mais a um sentimento de defesa de interesses locais ou regionais.

Um Rei de São Paulo?
Em abril de 1641, Amador Bueno da Ribeira foi aclamado Rei de São Paulo. Essa aclamação, entretanto, resultou da divergência entre clãs locais (Garcia-Pires, portugueses, e Camargos, espanhóis), diante da notícia da Restauração em Portugal. Este fato fora interpretado como uma ameaça aos interesses espanhóis na região. Mais tarde, evidenciou-se a tensão entre jesuítas e bandeirantes, devido à escravidão indígena, ocorrendo então a Botada dos Padres para Fora, por parte dos colonos paulistas. Este episódio repetir-se-ia em 1661, no Pará, e em 1684, no Maranhão.

A revolta contra os governadores
No Rio de Janeiro, entre 1660 e 1661, ocorreu uma revolta devida à forte política fiscalista aplicada pelo governador português Salvador Correia de Sá e Benevides. Seu líder foi Jerônimo Barbalho, que, após ter deposto o governador devido à decretação dos novos tri­butos, foi preso e executado. Na Revolta de "Nosso Pai", em Pernambuco (1664-65), também houve a rebelião local contra o governador português Jerônimo de Mendonça Furtado, alcunhado "Xumbrega", acusado de corrupção e de ser conivente com os franceses. Na realidade, nesse acontecimento já havia indícios da rivalidade entre Olinda e Recife.

O Bequimão
Na Revolta de Beckman ou Bequimão, no Mara­nhão, em 1684, mais uma vez evidenciou-se a divergência de interesses entre colonos locais, repre­sentados pelos irmãos Manuel e Tomás Beckman e a Companhia Geral de Comércio do Estado do Ma­ranhão, que possuía o monopólio do comércio e de introdução de escravos africanos. A rebelião ocorreu contra os abusos da Companhia de Comércio, que não cumpriu os acordos feitos com os colonos, e contra a Companhia de Jesus, que se opunha à escra­vidão indígena.

A Guerra dos Emboabas
Outro movimento nativista foi a Guerra dos Em­boabas, ocorrida em Minas Gerais (1708-09), resul­tante da rivalidade entre os paulistas e os "emboa­bas" - forasteiros, principalmente portugueses, que acabavam sendo protegidos pelos órgãos do governo colonial, com o monopólio de diversos ramos co­merciais. O movimento eclodiu devido a uma série de incidentes, nos quais sempre havia de um lado os paulistas e do outro os emboabas.

A Revolta de Vila Rica
Em 1720, novamente na região de Minas Gerais, em Vila Rica, ocorreu a revolta de Felipe dos San­tos, em que mais uma vez encontramos a rebelião contra os abusos do fiscalismo português, caracteri­zados pela elevação dos impostos decretada pelo governador, conde de Assumar. Os mineradores re­voltados reivindicavam a redução dos impostos, abolição dos monopólios exercidos pelos portu­gueses e a extinção das Casas de Fundição.
Guerra dos Mascates
Um dos mais famosos movimentos nativistas foi a Guerra dos Mascates (1710-12), em Pernambuco, moti­vada pela forte rivalidade entre os senhores-de-engenho de Olinda e os comerciantes portugueses de Recife, apeli­dados de mascates, e que contavam com o apoio do governador Sebastião de Castro Caldas. O conflito irrompeu quando Recife foi elevado à categoria de vila, o que favo­recia o grupo português. Ao terminar o movimento, em 1712, Recife passava a ser cidade e capital de Pernambuco, o que acentuou ainda mais a rivalidade da aristocracia pernambucana contra os portugueses.
Neste movimento, como nos demais, deve ser perceb­ido o seu sentido não-emancipacionista e a inexistência de interesses que visassem ultrapassar os limites locais ou regionais.

11. A mineração
A época da mineração no período colonial abrangeu basicamente o século XVIII, com o seu apogeu entre 1750 e 1770. Nessa fase da vida econômica da colônia que se voltou quase que exclusivamente para o extrativismo mineral, as principais regiões auríferas foram Minas Gerais, Mato Grosso e Goiás. Anteriormente, já haviam ocorrido as explorações do ouro de lavagem, em São Paulo, Paraná e Bahia, mas, com resultados inexpressivos.
A mineração dos anos setecentos foi desenvolvida a partir do ouro de aluvião, tendo como características o baixo nível técnico e o rápido esgotamento das jazidas. No extrativismo aurífero, as formas de exploração mais comuns encontradas eram as lavras e a faiscação. A primeira representaria uma empresa em que era utilizada a mão-de-obra escrava e se aplicava uma técnica mais apurada. Já a faiscação era a extração individual, realizada principalmente por homens livres.

Legislação, órgãos e tributos da mineração
A organização da exploração aurífera começou em 1702, quando o Estado português editou o Regimento das Terras Minerais, disciplinando a exploração aurífera estabelecida pela Carta Régia de 1602, que declarava a livre exploração, mediante o pagamento do quinto; em outras palavras, a quinta parte do que se extraía (20%) era o imposto devido à metrópole. Por esse regimento, organizava-se a distribuição das jazidas que eram dividi­das em datas - porções das jazidas que representavam a unidade de produção - e passadas para os exploradores mediante o sistema de sorteio, promovido pela Intendên­cia das Minas, principal órgão de controle e de fiscaliza­ção da mineração do ouro.
No que refere a tributação, inicialmente existia o quinto, cuja cobrança era dificultada pela circulação do ouro em pó, que permitia a prática cotidiana do contra­bando; como exemplo, o ouro era contrabandeado na carapinha dos escravos ou nos famosos santos de pau oco. Com o intuito de efetivar sua 'cobrança e evitar o contrabando, em 1720, foram criadas as Casas de Fundição - que só vieram a funcionar em 1725, em Vila Rica - com a finalidade de transformar o ouro em barras timbradas e quintadas. Em 1730, o quinto foi reduzido para 12% e, em 1735, foi criado um novo imposto, a capitação, onde se cobrava 17 gramas por escravo em atividade na mineração.
Em 1750, época do apogeu do ouro, foi instituído o quinto por estimativa, conhecido como tinta, ou seja, a fixação de uma cota fixa de 100 arrobas que incidia sobre toda a região aurífera. A partir daí, já com o prenúncio da decadência da mineração, essa cota não era alcançada, gerando-se o déficit que se avolumava a cada ano. Com isso, em 1765, foi instituída a derrama, forma arbitrária de cobrança do quinto atrasado, que deveria ser pago por toda a população da região, inclusive com bens pessoais. E esse quadro, marcado pela extorsiva tributação, aumen­tou o descontentamento contra os abusos da metrópole.

A exploração dos diamantes
Por volta de 1729, Bernardo da Fonseca Lobo des­cobriu as primeiras jazidas diamantíferas no arraial do Tijuco ou Serro Frio, hoje Diamantina. Teve início, as­sim, a exploração dos diamantes, que, como a do ouro, também era considerada um monopólio régio.
Em 1733, foi criado o Distrito Diamantino, única área demarcada em que se podia explorar legalmente as jazidas. A exploração era livre, mediante o pagamento do quinto e da capitação sobre o trabalhador escravo. Em 1739, a livre extração cedeu lugar ao sistema de con­trato, que deu origem aos ricos contratadores, como João Fernandes, estreitamente ligado à figura de Xica da Silva. Diante das irregularidades e do desvio dos impos­tos, além do alto valor que alcançavam as pedras na Europa, em 1771, foi decretada a régia extração, que contava com o trabalho de escravos alugados pela coroa. Posteriormente, com nova liberação da exploração, foi criado o Livro de Capa Verde, contendo o registro dos exploradores, e o Regimento dos Diamantes, procurando disciplinar a extração. Contudo, o monopólio estatal sobre os dia­mantes vigorou até 1832.

As conseqüências da mineração
A mineração foi responsável por impor­tantes conseqüências que se refletiram sobre a vida econômica, social, política e administrati­va da colônia. De saída, provocou uma grande migração portuguesa para a região das Gerais. Segundo alguns autores, no século XVIII, aproximadamente 800.000 portugueses trans­feriram-se para a colônia, o que correspon­deria a 40% da população da metrópole.
No Brasil, paralelamente a isto, ocorreu um deslocamento do eixo econômico e demo gráfico do litoral para a região Centro-Leste, acompanhado da inten­sificação do tráfico negreiro e do remanejamento do contingente interno de escravos. Com isso, a colônia co­nheceu uma verdadeira explosão populacional, ultrapas­sando com folga a casa de um milhão de habitantes, no século XVIII.
O entorno da região mineradora, compreendendo o eixo Minas-Rio de Janeiro, passou a ser o novo centro de gravidade econômica, social e política da colônia; em 1763, um decreto do marquês de Pombal transferiu a capital de Salvador para o Rio de Janeiro.
Geradora de novas necessidades, a mineração condi­cionou um maior desenvolvimento do comércio, associa­do ao fenômeno da urbanização. Desenvolveu-se o mer­cado interno, possibilitando a dinamização de todos os quadrantes da colônia, que se organizaram para abastecer a região do ouro. A vida urbana e o próprio caráter da exploração aurífera geraram uma sociedade mais aberta e heterogênea, convivendo lado a lado o trabalho livre e o trabalho escravo, embora este fosse predominante. Co­mo conseqüência, a concentração de renda foi menor, en­riquecendo, principalmente, os setores ligados ao abaste­cimento.
Finalmente, a "corrida do ouro" promoveu a penetra­ção e o povoamento do interior do Brasil, anulando em definitivo a velha demarcação de Tordesilhas.

Uma cultura mineira
Todo o conjunto de conseqüências, anteriormente ci­tadas, refletiu-se na vida cultural e intelectual da mine­ração, marcada por um notável desenvolvimento artístico.
Na literatura, destacaram-se os poetas intimamente relacionados ao Arcadismo. Na arquitetura e na escultura, emergiram as figuras de Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho, e mestre Valentim, nomes importantes do barroco mineiro.
Na música, além da disseminação de uma música popular - modinhas e lundus - sobressaíram-se os gran­des mestres da música sacra - barroca, com as missas e réquiens de Joaquim Emérico Lobo de Mesquita e do pa­dre José Maurício Nunes Garcia.
Nesse contexto, a influência européia, com os novos princípios liberais disseminados pela Enciclopédia, ali­mentaria o primeiro movimento de caráter emancipacio­nista: a Inconfidência Mineira.


12. A colônia no final do século XVIII

O Renascimento Agrícola
A economia colonial conheceu no século XVIII, uma fase intermediária - de transição - entre a mineração e o advento do café. Na verdade, a passagem da colônia para o Estado Nacional, surgiu com a independência em 1822.
Nessa fase, que abrange o final do século XVIII e as primeiras décadas do século XIX, a mineração entra em crise, ao mesmo tempo em que a economia colonial se reorganiza com base na grande lavoura mercantil expor­tadora, dando origem ao renascimento agrícola.

As razões do renascimento agrícola
O renascimento agrícola foi possível devido a conju­gação de uma série de condições favoráveis, principal­mente externas.
A Revolução Industrial inglesa em pleno desenvol­vimento no século XVIII exigia cada vez mais o algodão, a matéria-prima da indústria têxtil, grande alavancadora desse processo de mecanização da produção. A ela se relacionam o crescimento demográfico da população eu­ropéia, a Independência dos Estados Unidos (1776), suspendendo o fornecimento de algodão para o industria­lismo britânico, e as guerras napoleônicas, provocando entraves ao comércio dessa matéria-prima que vinha também do Egito e da Índia.
Outra condição, responsável por uma conjuntura internacional favorável, é a crise da produção antilhana de gêneros tropicais - açúcar, tabaco etc. -, devido a instabi­lidade gerada pelas lutas de independência, rebelião de escravos e a supressão do tráfico negreiro, caso específico da Jamaica, uma colônia inglesa.
Por fim, a política do marquês de Pombal, ministro do reino na época, previa uma recuperação de Portugal, a partir dos lucros que a colônia pudesse oferecer, nova­mente se organizando para abastecer o mercado europeu. Para isso, com a garantia dos monopólios pelo Estado, a burguesia mercantil lusa organizou as companhias de comércio, importantes para o investimento, estímulo e fomento das atividades agrícolas de exportação na colônia. Foram criadas as Companhias de Comércio do Grão-Pará-Maranhão e do Pernambuco-Paraíba. A pri­meira foi fundamental para o desenvolvimento da cotoni­cultura maranhense.

Principais Produtos de Exportação
O mais importante foi o algodão, matéria-prima bási­ca para a industrialização inglesa. Era uma lavoura em grande propriedade escravista, porém sem necessidade de instalações tão complexas e onerosas quanto os engenhos. O principal produtor, na época, foi o Maranhão (região de Caxias), destacando-se também Pernambuco, Bahia e Rio de Janeiro.
Outro produto que voltava ao mercado, e que por essa razão teve a sua produção novamente estimulada, foi o açúcar, neste momento favorecido pela decadência da produção antilhana, inclusive com a abolição do tráfico negreiro para a Jamaica. O Brasil passava a ser o terceiro produtor mundial de açúcar de cana, com destaque para a produção da Bahia, de Pernambuco e do Rio de Janeiro.
O tabaco, desde o século XVII utilizado para o es­cambo de negros na África e considerado monopólio ré­gio desde 1642, teve também impulso nesse período. Seu maior desenvolvimento se deu na Bahia e sul de Minas Gerais, sendo que sua produção, exigindo cuidados espe­ciais - adubo, galpões etc. -, era também desenvolvida na grande propriedade escravista.
Outro produto de exportação foi o cacau, que, de ati­vidade extrativista praticada no Pará e Rio Negro, acabou sendo desenvolvido como agricultura na Bahia e Mara­nhão, empregando também a mão-de-obra escrava negra. O arroz, o anil e outros produtos agrícolas chegaram a ser exportados também em larga escala, nesta fase que provocou a recondução do eixo econômico para o litoral.
Neste período, um novo produto começava a se destacar na economia brasileira: o café. Introduzido no Pará ao final do século XVIII, foi trazido para a Baixada Fluminense e Vale do Paraíba onde se desenvolveu rapi­damente.
A época do Marquês de Pombal
A partir de 1750, a política e a administração portu­guesa conheceram grandes mudanças. Por vinte e sete anos, o poder foi exercido por Sebastião José de Carvalho e MeIo, o marquês de Pombal, ministro de Estado de D. José I. Fortemente influenciado pelo Iluminismo, Pombal se insere no quadro do despotismo esclarecido, em que monarcas, sem abandonar o poder absolutista, adotam algumas práticas e princípios liberais. Daí, uma série de medidas e reformas que acabaram por torná-lo uma figura polêmica na História portuguesa.

Portugal e as Reformas Pombalinas
Procurando ampliar e consolidar os poderes do Estado nas mãos da coroa, o ministro português entrou em choque com a nobreza e com a Igreja, detentores de privilégios seculares e outras vantagens, típicas da sociedade do Antigo Regime. Após submetê-los, abriu espaço para a participação de membros da burguesia no governo, que procurou dirigir dentro dos preceitos do racionalismo. Modernizando a máquina do Estado, melhorou o sistema de arrecadação, recuperando as finanças do reino.
No plano econômico, estimulou a re­cuperação das manufaturas nacionais em crise desde o século anterior, devido a concorrência dos produtos ingleses. Com relação à produção vinícola, um dos principais produtos de exportação de Portugal, fortaleceu a vinicultura em pequenas propriedades e criou a Companhia das Vinhas do Alto Douro, procurando aumentar a produção e a exportação do vinho. Fomentando, também, a produção agrícola da colônia, Pombal pretendia subtrair Portugal à dominação inglesa que se iniciara no século XVIII.
Os Conflitos com a Igreja
A Igreja Católica preponderava em Portugal, desde o nascimento do Estado português, no século XIV. A Inquisição e a ação das ordens religiosas, principal­mente a jesuíta, dona de um grande pa­trimônio em bens e propriedades na me­trópole e nas colônias e detentora do mo­nopólio da educação no mundo portu­guês, fortaleciam a posição da Igreja, permitindo-lhe as constantes interfe­rências em assuntos de Estado.
A escalada de Pombal, marcada pelo anti-clericalismo, típico do Iluminismo, teve início com a expulsão dos jesuítas de Portugal e seus domínios, onde se inclui o Brasil, em 1759. Para justificar seu ato, o ministro acusou a ordem de participar de uma tentativa de regicídio (contra o rei D. José I) e de tentar fundar no Brasil um Império Teocrático. Com isso, proces­saram-se importantes mudanças na educação com a laicização do ensino, isto é, contrária àquela praticada pelos religiosos.
Em 1768, para garantir a volta dos capitais da burguesia de origem judaica, ordenou a destruição da lista de réus feita pelos padres inquisidores. Com a proibição dos autos-de-fé - a morte nas fogueiras em praça pública dos condenados à pena capital -, a Inquisição era praticamente desmantelada em Portugal.

As Reformas Pombalinas na Colônia
A atuação de Pombal eivada das práticas e enuncia­dos iluministas revestiu-se, de certa forma, de um caráter liberal, e isso, no caso específico do Reino, centro do império português. No que se refere à colônia, a política pombalina caracterizou-se pela excessiva centralização e pelo fiscalismo.
Durante o seu governo, para garantir a arrecadação dos tributos da mineração, foi criada a odiosa derrama, bem como reavivados os monopólios através da criação das Companhias de Comércio do Grão-Pará-Maranhão (1755) e do Pernambuco-Paraíba (1759), responsáveis pelo estímulo às lavouras do algodão e da cana-de-açúcar. Com isso, ocorreu a intensificação da exploração colonial, estabelecendo-se, inclusive, mecanismos para evitar a prática do contrabando.
Com a expulsão dos jesuítas da colônia, foram cria­das as aulas régias do ensino laicizado (agora mantido e definido pelo Estado), o que levou à criação de mais um tributo, o subsídio literário. Este tributo, ao lado de ou­tros, como, por exemplo, a contribuição para a recons­trução de Lisboa, destruída por um terremoto em 1755, caracterizam o arrocho fiscal de sua administração.
Uma série de outras medidas tomadas por Pombal reflete também a tentativa de modernização da adminis­tração colonial: o sistema de capitanias hereditárias foi extinto (1759), a capital do Brasil foi transferida de Salvador para o Rio de Janeiro (1763), o Maranhão uniu-­se novamente ao Brasil, agora reunificado politicamente e a escravidão indígena foi abolida. Com isso, substituindo a ação dos jesuítas, foi criado o Diretório dos Índios, cuja função era administrar as missões indígenas.
No plano das relações exteriores, o marquês de Pom­bal preocupou-se com os problemas do Sul do Brasil que envolviam contínuos conflitos com os espanhóis. Assim, fortaleceu o sistema defensivo meridional estabelecendo um sistema de fortificações no litoral de Santa Catarina e envidou esforços que resultaram na assinatura dos Tratados de Madri, em 1750, e de Santo Ildefonso, em 1777.

A "Viradeira"
Com a morte de D. José I, em 1777, Portugal passou a ser governado por D. Maria I, sua filha. Educada na tradição católica e cercada por membros da velha nobreza, D. Maria procurou anular gradativamente a polí­tica de Pombal, que, demitido, passou a ser perseguido pela rainha e seus adeptos, até sua morte alguns anos depois.
A essa política de D. Maria I, dá-se o nome de "Vira­deira", sempre associada ao Brasil colonial pelo Alvará de Proibição de Indústrias e Manufaturas, de 1785, e pela extinção das companhias de comércio, evidenciando a retomada da dominação inglesa em Portugal.
Contudo, algumas medidas da administração pomba­lina na foram mantidas, como, por exemplo, a participação de membros da burguesia nos negócios do Estado e os estímulos à educação e à ciência, com a criação de vários órgãos e instituições voltados para a pesquisa científica.

A solução dos problemas de fronteiras
A separação dos domínios ibéricos na América remontam ao Tratado de Tordesilhas, de 1494. Com o Domínio Espanhol, entretanto, essa divisão tornou-se le­tra morta, permitindo a penetração portuguesa em regiões muito além do meridiano de demarcação.
Com a Restauração, em 1640, os conflitos entre por­tugueses e espanhóis aumentaram, principalmente no extremo Sul, com a fundação da colônia lusa do Santíssimo Sacramento, em 1680, no estuário do Prata. Em 1715, com a ascensão dos Bourbons ao trono da Espanha, colocando fim à Guerra de Sucessão Espanhola, foi assinado o Tratado de Utrecht. Por este, a Espanha reconhecia a permanência portuguesa na colônia de Sacramento, o que de forma nenhuma reduziu os atritos entre os colonos espanhóis e portugueses.

Os Tratados de Limites
Em 1750, os dois países assinavam o Tratado de Madri, quando o representante de Portugal, o luso-brasileiro Alexandre de Gusmão, assumiu a defesa dos interesses portugueses, a partir do princípio do uti possidetis (direito de posse). Com este tratado, ficava incorporada à colônia uma área três vezes maior do que aquela fixada por Tordesilhas, garantindo ao Brasil sua configuração geográfica atual. Entretanto, a Espanha punha como condição a entrega da colônia portuguesa _o Sacramento, cedendo, em troca, para Portugal, a região os Sete Povos das Missões, ocupada por jesuítas espanhóis e índios guaranis.
Os inacianos e os indígenas da região das missões não aceitaram a troca, e o resultado foi a Guerra Guara­nítica, em que espanhóis e portugueses destruíram as sete grandes missões jesuíticas, onde se desenvolvia uma verdadeira civilização missioneira. Como resultado disso, o Convênio de El Pardo (1761) anulava as decisões de Madri relacionadas ao Sul da América.
Em 1777, para recuperar o território de Santa Catarina invadido por uma esquadra espanhola, Portugal aceitou os termos do Tratado de Santo lldefonso, que outorgava à Espanha os direitos de soberania sobre Sacramento e os Sete Povos das Missões.
Mesmo com as determinações que passavam para as mãos espanholas o Sul do Brasil, colonos brasileiros ocuparam os Sete Povos, conquistando, a partir daí, o ter­ritório que corresponde atualmente ao estado do Rio Grande do Sul. A presença de brasileiros na região pro­vocou a assinatura do Tratado de Badajós, de 1801, reconhecendo definitivamente a incorporação daquela área aos domínios lusitanos.

Cultura e sociedade colonial
O objetivo puramente mercantil da empresa coloniza­dora não privilegiou o desenvolvimento cultural. Somente depois de muitos anos começou a se esboçar uma socie­dade com tendência a assumir suas próprias feições, possibilitando, assim, o aparecimento de manifestações cul­turais nos campos literário e artístico.
O primeiro documento literário que se relaciona ao Brasil é a Carta de Pero Vaz de Caminha, em que o es­crivão registrava suas impressões sobre o primeiro con­tato com a nova terra. No século XVI, alguns cronistas também registraram em suas obras descrições da vida cotidiana na colônia, hoje de fundamental importância para o estudo da História do Brasil colonial. A exemplo, podem ser mencionados Pero de Magalhães Gandavo, autor do Tratado da Terra do Brasil, de 1576, e Gabriel Soares de Sousa, com seu Tratado Descritivo do Brasil, de 1587.
No século XVII, surgiram os primeiros homens de le­tras nascidos na colônia, como o Frei Vicente do Salva­dor, que escreveu a primeira História do Brasil, e o baiano Gregório de Matos, poeta satírico e às vezes líri­co, em cujos versos a sociedade da época é descrita com grande mordacidade. Efetivamente, porém, é no século XVIII que a cultura colonial assume um aspecto mais na­tivista. Rocha Pita, membro da Academia dos Esqueci­dos, escreveu a História da América Portuguesa; José Mirales, da Academia dos Renascidos, aparece com sua História Militar do Brasil, e Frei Gaspar da Madre de Deus descreve, em suas Memórias, a vida na Capitania de São Vicente.

Minas e a Cultura no Século XVIII
Nesse século, a região das Gerais destacou-se pelo desenvolvimento literário e artístico da chamada Escola Mineira, representada por ilustres figuras da Literatura, como Cláudio Manuel da Costa, Tomás Antônio Gonzaga, Inácio de Alvarenga Peixoto e Manuel Inácio da Silva Alvarenga, entre outros.
A Arquitetura, a Escultura e a Pintura, desenvolvidas nas igrejas, conventos e seminários, foram possíveis gra­ças ao trabalho de artistas, na sua maioria ligados e patro­cinados pelas ordens e confrarias religiosas. Essa produção cultural foi marcadamente influenciada pelos estilos euro­peus, notadamente pelo estilo barroco. Segundo Lúcio Costa, "resulta que se pode razoavelmente falar de um classicismo barroco, de um romanicismo e de um gótico barrocos e, finalmente, de um renascimento barroco".
O período de apogeu desse barroco mineiro foi a segunda metade do século XVIII, com a construção das igrejas de Minas Gerais, Bahia e Rio de Janeiro, onde se destacou particularmente Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho. As marcas da ge­nialidade desse artista - escultor e arquiteto - podem ser observadas nas igrejas de Ouro Preto, Congonhas do Campo, Sabará e São João del-Rei, entre outras. Na igreja de São Francisco de Assis, em Ouro Preto, também se encontram os traços de Manuel da Costa Ataíde, um dos grandes pintores do final do século XVIII.

A Sociedade Colonial
A sociedade colonial brasileira era um reflexo da própria estrutura econômica, acompanhando suas tendências e mudanças. Suas características básicas, entretanto, definiram-se logo no início da colonização segundo padrões e valores do colonizador português. Assim, a sociedade do Nordeste açucareiro do século XVI, essencialmente ruralizada, patriarcal, elitista, escravista e marcada pela imobilidade social, é a matriz sobre a qual se assen­tarão as modificações dos séculos seguintes.
No século XVIII, a sociedade brasileira conheceu transformações expressivas. O crescimento populacional, a intensificação da vida urbana e o desenvolvimento de outras atividades econômicas para atender a essa nova realidade, resultaram indubitavelmente da mineração. Embora ainda conservasse o seu caráter elitista, a socie­dade do século XVIII era mais aberta, mais heterogênea e marcada por uma relativa mobilidade social, portanto mais avançada em relação à sociedade rural e escravista dos séculos XVI e XVII. Os folguedos e festas populares das camadas mais pobres conviviam com os saraus e outros eventos sociais da camada dominante. Com relação a esta, o hábito de se locomover em cadeirinhas ou redes transportadas por escravos, evidencia o aparecimento do escravo urbano, com destaque para os chamados negros de ganho.
A nova elite urbana desse século passou a se preocupar com a educação dos seus filhos, enviando-os à Europa e possibilitando o surgimento dos intelectuais e dos homens públicos que ajudarão a mudar os destinos da colônia, no século seguinte.

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