REPÚBLICA
Queda do Império, implantação e consolidação da República no Brasil
A queda do Império
A crise do Império brasileiro é explicada, essencialmente, pela inadequação do regime monárquico às transformações processadas na economia e na sociedade, a partir da segunda metade do século XIX. Com efeito, o remanejamento político-administrativo atenderia às necessidades do crescimento econômico do País, bem como aos interesses dos grupos sociais preponderantes. As questões abolicionista e religiosa, agravadas pelas tensões sociais e econômicas, precipitaram a Questão Política. A Questão Militar apresentou-se, num último momento, como o elemento catalisador de todos os problemas, no nível político.
Podemos concluir que a crise fundamental do Império ocorria em nível da base (sócio-econômico); entretanto, o encaminhamento para sua solução se fez na esfera política, conduzindo o País para a forma republicana de governo.
Questão Social: O abolicionismo
Desde o Período Colonial, o escravismo vinha sendo a fórmula adequada para o aproveitamento do imenso território brasileiro. A escravidão moderna foi a forma para o capitalismo se efetivar na periferia do sistema.
No Brasil Imperial, como em toda a América, subsistia o motivo justificativo do trabalho escravo: a predominância da grande propriedade. E, além de sustentáculo da estrutura econômica, o escravismo era também o vínculo da estrutura social.
Foram os próprios negros, com a formação dos quilombos, que pela primeira vez contestaram a escravidão. Nos movimentos emancipacionistas (Inconfidência Mineira, Conjuração Baiana e Revolução Pernambucana de 1817) foi cogitada a abolição da escravatura.
A pressão britânica para a suspensão do tráfico negreiro, desde o início do século XIX, culminou com o Bill Aberdeen (1845), pelo qual a Inglaterra se arrogava o direito de apresar navios negreiros. Esta decisão do Parlamento britânico, por sua vez, provocou a promulgação da primeira lei restritiva ao tráfico negreiro no II Reinado, a Lei Eusébio de Queirós (1850), complementada pela Lei Nabuco de Araújo (1854).
Como conseqüência da cessação do tráfico, elevou-se o preço dos escravos, intensificando-se o comércio interno de negros; paralelamente, apresentou-se a imigração européia como solução para o problema de mão-de-obra.
A Campanha Abolicionista
A abolição tornou-se um imperativo depois da extinção do tráfico, não só pelo decréscimo que se registrava na população escrava (em parte devido a suas precárias condições de vida material), mas porque era mais vantajoso o trabalho livre em virtude de sua maior produtividade e dos menores riscos de investimento. Para a economia cafeeira, o assalariado, além de atender à contínua expansão dos cafezais, constituía um elemento dinâmico na formação de um mercado de consumo e, portanto, de novas áreas de investimento de capital.
Em 1868, o Partido Liberal assumira, publicamente, o compromisso de bater-se pela emancipação dos escravos.
Os conservadores, então no poder, promulgaram, em 1871, uma lei contemporizadora, a Lei do Ventre Livre, obra do gabinete do Visconde do Rio Branco.
Em 1880, organizam-se no Rio as sociedades abolicionistas, posteriormente coordenadas pela "Confederação Abolicionista". Essas sociedades reuniam vultos importantes: Joaquim Nabuco, Rui Barbosa, José do Patrocínio, Luís Gama e André Rebouças.
Em 1884, Ceará e Amazonas antecipam-se, extinguindo totalmente, em seus territórios, o regime escravista.
Em 1885, mais uma tentativa mistificadora é realizada. Promulga-se, nesta data, a Lei Saraiva-Cotegipe (Lei dos Sexagenários), decretando a alforria dos escravos que atingissem a idade de 65 anos.
Multiplica-se a fuga de escravos. O Exército, convocado para dar-lhes caça, se recusa a prestar-se "à condição de capitão-do-mato" (representação de Deodoro da Fonseca em 1887).
A solução definitiva já não admitia maiores delongas.
Um levantamento feito da população escrava em 1887 revelava que, num total de cerca de 13.500.000 habitantes, havia somente 723.419 escravos.
O gabinete conservador de João Alfredo promoveu, então, a votação da Lei Áurea, sancionada pela Regente Princesa Isabel, a 13 de maio de 1888. A escravidão estava extinta no Brasil, mas o Império via definitivamente comprometida suas possibilidades de continuidade.
Com a abolição do escravismo, sem indenização aos proprietários, a aristocracia escravagistas, arruinada, lançou sobre a Monarquia a culpa por sua desgraça, passando a engrossar as fileiras do movimento republicano ("Republicanos de 13 de Maio"). A marginalização sócia econômica do negro liberto tomou-se um fenômeno nacional já nos fins do século XIX, pois à liberdade jurídica não corresponderam as demais liberdades essenciais à sua integração na sociedade.
A Questão Religiosa
A Constituição Imperial de 1824 preservou um dos mecanismos do Antigo Regime, submetendo a Igreja ao Estado (regalismo). Assim, concedeu ao Governo Imperial a faculdade de intervir na criação e preenchimento dos cargos eclesiásticos: o Padroado.
O Imperador exercia também o beneplácito, ou seja, a faculdade de examinar os atos de Santa Sé que, antes de entrar em execução no País, recebiam o placet do Imperador.
Por sua vez, a Maçonaria, atuante no Brasil por ocasião da Independência, assumira um papel mais beneficente que político, sendo composta inclusive pelos principais nomes da política imperial. Apesar de condenada pelo Papa, verificava-se no Brasil certa tolerância por parte das autoridades eclesiásticas, pois seus membros eram simultaneamente católicos e maçons.
A Questão Religiosa (ou Epíscopo-Maçônica) prende-se a vários incidentes ocorridos entre autoridades eclesiásticas e membros da Maçonaria, a partir de 1872: punição do Padre Almeida Martins (RJ), por haver pronunciado um discurso na Maçonaria; interdição, pelos bispos de Olinda (D. Vital Maria de Oliveira) e Belém (D. Antônio de Macedo Costa), de várias irmandades religiosas, pela não obediência ao disposto pela Encíclica Syllabus do Papa Pio IX, que exigia a eliminação dos elementos pertencentes à Maçonaria. Note-se, porém, que a Syllabus não recebera o placet do Governo Imperial.
Forte campanha foi iniciada pela imprensa contra a Igreja, tomando-se necessária a intervenção das autoridades imperiais. Como resultado, foram os bispos de Olinda e Belém condenados a quatro anos de prisão, por influência do Presidente do Conselho de Ministros, Visconde do Rio Branco (Grão-Mestre da Maçonaria). Apesar da anistia concedida em 1875, pelo Gabinete Caxias, evidenciou-se o conflito latente entre a Igreja e o Estado.
As Questões Militares
Até o término da Guerra do Paraguai, o Exército era politicamente ausente do Brasil; porém essa guerra exigiu uma força militar tecnicamente apta e com um quadro de oficiais profissionais, com preparo científico.
O Exército foi dessa sorte, reduzindo a Guarda Nacional a uma posição inexpressiva. Entretanto, o Exército era mantido numa posição de segundo plano político, determinando o descontentamento de muitos oficiais; o principal propagandista contra o governo era Benjamin Constant, oficial e professor da Escola Militar.
Vários fatores concorrem ainda para as questões: a proibição de os militares fazerem pronunciamentos através da imprensa; a influência do positivismo, propagado entre os militares; e o paisanismo do Imperador.
O espírito de classe manifestou-se vivamente entre os militares, não tolerando que os "casacas" pudessem ofender os "homens-de-farda", mesmo quando estes assumissem atitudes capazes de suscitar controvérsias.
A primeira questão refere-se ao tenente-coronel Sena Madureira, que se pronuncia pela imprensa, atacando o projeto de reforma do Montepio militar. Foi a partir desse episódio que o Governo proibiu que os militares se manifestassem pela imprensa.
A segunda questão prende-se à demissão de Sena Madureira do comando da Escola de Tiro de Campo Grande (Rio de Janeiro), pela recepção que dera, naquela entidade, ao jangadeiro cearense Francisco Nascimento, que evitara o embarque de escravos de Fortaleza para o Sul.
A terceira questão resultou de uma inspeção de rotina no Piauí, onde o coronel Cunha Matos verificara o extravio de fardamentos, além de negociatas com soldo das praças, e propusera a remoção do comandante do quartel; acusado de haver agido desonestamente, Cunha Matos defendeu-se pela imprensa, o que lhe valeu uma prisão de 48 horas.
A punição provoca enorme mal-estar, recebendo Cunha Matos a solidariedade de inúmeros oficiais de alta patente, inclusive do marechal Deodoro da Fonseca.
Um manifesto em termos enérgicos foi redigido e o Governo Imperial suspendeu as penas impostas.
A progressiva intervenção dos militares nas lides políticas caracteriza uma fase de acentuada decomposição do Império, motivada pelo enfraquecimento da base que o sustentava: a aristocracia escravista, profundamente abalada pelas campanhas abolicionistas. Aos poucos, surgia a preponderância do "poder militar" sobre o "poder civil".
A Proclamação da República
Durante a segunda metade do século XIX, o Império brasileiro conheceu mudanças na economia e na sociedade. Desenvolvia-se a lavoura do café, principalmente no Oeste Paulista. A exportação de borracha crescia. Esboçava-se um mercado interno, graças à maior utilização do trabalho assalariado, condicionando um "surto" industrial, a partir de 1874. Multiplicavam-se os organismos de crédito, enquanto os transportes se desenvolviam, principalmente através das ferrovias.
A população atingia 14 milhões de habitantes após 1880, ocorrendo, na região Centro-Meridional, entre outras, um fenômeno de urbanização.
O centralismo político-administrativo do regime imperial era incompatível com a nova realidade sócio-econômico. A solução seria a implantação de um sistema federativo, capaz de superar as discrepâncias regionais, impondo maior autonomia local.
Entre os fatores que levaram à República, assumem um papel de destaque os seguintes: predomínio das novas regiões cafeeiras na economia do País, projetando um novo e forte setor social: os modernos empresários do café, reivindicando o atendimento de seus interesses. O ideal de federação, que se adequava aos anseios dos vários grupos políticos do Brasil, só seria atingido com uma República Federativa. O receio do III Reinado, aliado à queda Napo1eão III na França, e o desprestigio da Monarquia em face das questões Religiosa, Militar e Social completam o quadro dos fatores explicativos do remanejamento institucional ocorrido em 1889.
O movimento republicano iniciou-se em 1870, com a fundação do Clube Republicano e do jornal "A República" e o lançamento de um "Manifesto Republicano".
Duas correntes se chocaram no Partido Republicano: a evolucionista (liderada pelos republicanos "históricos"), que preferia a via pacífica para conseguir o poder, e a revolucionária (liderada por Silva Jardim), que pregava a revolução popular. A corrente evolucionista predominou.
Por outro lado, eram também republicanos jovens oficiais do Exército, influenciados pela doutrina de Auguste Comte (positivismo) e liderados por Benjamin Constant.
O visconde de Ouro Preto, membro do Partido Liberal, foi nomeado Presidente do Conselho em junho de 1889. O novo governo precisava remover os obstáculos representados pelo republicanismo e pelos militares descontentes. Para vencer o primeiro, apresentou um programa de amplas reformas: liberdade de cultos, autonomia para as províncias, temporariedade dos mandatos dos senadores, ampliação do direito de voto e Conselho de Estado com funções meramente administrativas.
Acusado tanto de radical como de moderado, o programa foi rejeitado pela Câmara de Deputados. Diante disso, foi ela dissolvida, provocando protestos gerais.
Contra o Exército, Ouro Preto agiu, tentando reorganizar a Guarda Nacional e removendo batalhões suspeitos.
A situação tornou-se tensa. Os republicanos investigavam os militares contra o governo.
O golpe de 15 de Novembro resultou da conspiração na qual se uniram republicanos e militares, colocando-s como chefe ostensivo da mesma o marechal Deodoro da Fonseca, não republicano, mas de enorme prestígio no Exército.
A proclamação resultou da conjugação de duas forças: o Exército, descontente, e o setor cafeeiro da economia, pretendendo este eliminar a centralização vigente, através de uma República Federativa, que imporia ao País um sistema favorável a seus interesses. Portanto, a Proclamação não significou uma ruptura no processo histórico brasileiro: a economia continuou dependente, baseada no setor agroexportàdor; afora o trabalho assalariado, o sistema de produção continou o mesmo e os grupos dominantes continuaram a sair da camada social dos grandes proprietários. Houve apenas uma modernização institucional
A REPÚBLICA VELHA (1889-1930)
"O povo assistiu bestializado à Proclamação da República", escreveu o republicano Aristides Lobo, na época do evento. Referia-se ele ao fato de que a República nada mais foi que uma nova composição das classes dominantes. O novo regime foi uma transformação de cúpula; a velha aristocracia rural, de mentalidade colonial escravista, era substituída pelo setor empresarial cafeeiro, ansioso por apoderar-se do aparelho do Estado para colocá-lo inteiramente a seu serviço. Era, em suma, a ascensão de um governo burguês oligárquico.
No entanto, a República, rompendo com os quadros antiquados e conservadores do Império, abria novas perspectivas mais coerentes com a fase de prosperidade econômica em que o País entrara nos últimos anos do século XIX.
Os primeiros tempos da República brasileira, compreendidos entre 1889 e 1930, receberam a denominação de República Velha ou Primeira República. Esses 41 anos, porém, compreendem duas fases distintas: os cinco anos iniciais, de implantação e consolidação da nova ordem, são conhecidos como República da Espada; a partir de 1894 até 1930, deu-se a instalação do poder civil, configurando-se durante essa fase a República das Oligarquias.
1. A República da Espada
A República da Espada correspondeu ao período republicano de 1889/94, em que o governo foi exercido sucessivamente por dois militares. Isso, porém, não significa que as Forças Armadas tenham assumido o controle do País em seu próprio nome. Na verdade, o papel do Exército (com exclusão da Marinha, cuja ação política divergia do primeiro) foi antes o de consolidar as instituições republicanas e criar condições para que as lideranças políticas CIVIS, representantes das classes dominantes, pudessem assumir diretamente o poder.
Governo Provisório de Deodoro (1889-1891)
Instalado logo em seguida à proclamação de 15 de novembro, sob a chefia de Manuel Deodoro da Fonseca, o primeiro governo republicano foi marcado por uma série de conflitos, em razão de seus componentes representarem interesses antagônicos. Daí, a demissão coletiva do ministério, cujos principais membros tiveram estreitas ligações com a implantação do novo regime. Logo no início do Governo Provisório foram publicados os primeiros atos da República, uma série de medidas modernizadoras que introduziram importantes mudanças na organização institucional do País.
O Encilhamento
O governo republicano herdou do Império uma situação de grande endividamento externo; além disso, os preços do café estavam em baixa. Foi quando Rui Barbosa, o então ministro da Fazenda, procurou implementar uma política econômica e financeira, responsável pela crise conhecida como Encilhamento. O ministro tinha como objetivos o estímulo à produção agrícola e, principalmente, industrial, além da expansão dos negócios. Segundo ele, contudo, o pequeno volume de moeda em circulação era o grande inibidor de qualquer iniciativa econômica, sendo necessária, portanto, a ampliação do meio circulante. Com isso, iniciou-se a emissão desenfreada de papel-moeda por bancos autorizados e o crédito foi facilitado, permitindo-se a fundação indiscriminada de empresas, especialmente das sociedades anônimas cujas ações eram lançadas no mercado.
Com a entrada de um grande volume de dinheiro em circulação, os negócios aumentaram e o País conheceu um momento de euforia. Contudo, boa parte desse dinheiro não foi aplicado na produção, o que traria riquezas e empregos, mas sim na especulação de títulos e ações de empresas fantasmas. Como resultado, o País viveu uma verdadeira desordem financeira, com forte desvalorização da moeda e uma inflação acelerada e, por causa dela, uma acentuada elevação dos preços; na época verificou-se também um grande número de falências.
Muitos pequenos bancos quebraram embora os grandes tenham se fortalecido. Como a maioria desses negócios era realizada em plena rua, a agitação do local assemelhava-se à do Jóquei Clube. Isso porque, naquela época as apostas nas corridas de cavalos eram feitas no mesmo lugar em que os animais eram arreados, ou "encilhados", o que produzia uma grande confusão. Daí o nome Encilhamento dado a essa crise.
A Constituição de 1891
Durante o Governo Provisório, um Congresso Constituinte trabalhou na elaboração da primeira Constituição republicana. Sob a presidência de Prudente de Morais, os deputados constituintes, de uma maneira geral, eram fortemente influenciados pelo modelo norte-americano. Por fim, no dia 24 de fevereiro de 1891, foi promulgada uma nova Constituição do Brasil, confirmando os primeiros decretos do Governo Provisório, como os que instituíram a forma de governo republicana, o sistema presidencialista, a organização federativa do Estado e a extensão do direito de voto a todos os cidadãos.
A Constituição de 1891 estabelecia a tripartição dos poderes. O poder Executivo era exercido pelo presidente da República, eleito pelo voto direto para um mandato de quatro anos (sem direito à reeleição), ou no seu impedimento pelo vice-presidente, auxiliados pelos ministros de Estado, nomeados e demitidos livremente pela Presidência. O poder Legislativo passava a ser exercido pelo Congresso Nacional, formado pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal. Os deputados, representantes do povo, eram eleitos de forma direta para um mandato de três anos; o número de deputados era proporcional à população de cada unidade da Federação, ou seja, de cada estado. Os senadores, por sua vez, em número de três por estado e três pelo Distrito Federal, seriam eleitos para um mandato de 9 anos, renovando-se um terço a cada três anos. O Judiciário, por sua vez, tinha como órgão principal o Supremo Tribunal Federal, incluindo também outros tribunais e juízes federais.
Ficavam instituídas as eleições diretas em todos os níveis e o voto universal, masculino e a descoberto (ou seja, não-secreto) para os maiores de 21 anos. Não tinham direito de voto as mulheres, os soldados e cabos das Forças Armadas e dos corpos policiais, os analfabetos, os mendigos e os religiosos do clero regular.
As antigas províncias, agora transformadas em estados da União, passavam a ter ampla autonomia política, econômica e administrativa; o Município Neutro do Rio de Janeiro passou a se denominar Distrito Federal. e continuou sendo a capital da República. Ficava estabelecida a liberdade religiosa, com garantia para o exercício de todos os cultos. A Constituição assegurava, ainda, a liberdade, bem como os direitos e garantias individuais, abolindo a pena de morte. Contudo, nos casos de instabilidade política e social que comprometessem a ordem interna, esses direitos e garantias individuais poderiam ser suspensos temporariamente, com a decretação do estado de sítio.
A primeira eleição presidencial
As "Disposições Transitórias" da Constituição de 1891 determinaram que os primeiros presidente e vice-presidente da República deveriam ser eleitos indiretamente pelo Congresso Nacional, para um mandato de quatro anos. Essas eleições, reveladoras dos primeiros choques políticos da República Velha, envolvendo positivistas e republicanos históricos, foram disputadas por duas chapas. A primeira, de Deodoro, tendo como vice o almirante Eduardo Vandenkolk, tinha o amplo apoio dos militares, que aceitavam até a idéia de um golpe para garantir sua vitória. A segunda, correspondendo aos interesses dos políticos civis, em especial dos cafeicultores, surgia como a oposição à eleição do chefe do Governo Provisório, a quem responsabilizavam pela crise do Encilhamento. O seu candidato era o paulista Prudente de Morais, tendo como vice-presidente o marechal Floriano Peixoto, que, além de liderar a jovem oficialidade do Exército, tinha amplo apoio do setor cafeeiro.
Com isso, o setor cafeeiro procurava enfraquecer Deodoro, além de provocar a cisão do bloco militar. Na eleição, Deodoro derrotou Prudente, mas Vandenkolk perdeu para Floriano, cuja votação superou a do próprio presidente eleito. Isso porque, conforme previa a Constituição, o voto não era vinculado.
Governo Constitucional de Deodoro (1891)
O governo de Deodoro, autoritário e com tendências centralizadoras, sempre esteve em crise: não tinha o apoio da maioria do Congresso Nacional, sofria forte oposição do PRP (Partido Republicano Paulista, representante dos cafeicultores) e era atacado por setores militares ligados a Floriano; além disso, foi acusado de envolvimento em corrupção ao favorecer amigos pessoais, como por exemplo, a construção de um porto na cidade de Torres, no Rio Grande do Sul.
Nesse passo, o Congresso votou o projeto da Lei das Responsabilidades do Presidente da República, tornando possível o impeachment de Deodoro. Este, por sua vez, vetou o projeto e, sabendo que o Congresso poderia derrubar o seu veto e promulgar a Lei, deu um golpe de Estado: fechou o Congresso e decretou estado de sítio.
Deodoro pretendia implantar uma ditadura e, embora contasse com o apoio dos presidentes dos Estados da União (exceto o do Pará) e de alguns setores do Exército, não conseguiu concretizar o seu intento. Contra ele levantaram-se numerosos políticos, articulando a oposição nos estados, e os militares se dividiram; os florianistas posicionaram-se contra o presidente e o almirante Custódio de Melo sublevou a Marinha, apoiado pelo almirante Vandenkolk, e ameaçou bombardear o Rio de Janeiro.
Para evitar uma guerra civil, Deodoro renunciou à Presidência em 23 de novembro, sendo substituído interinamente por Floriano Peixoto, o vice-presidente.
Governo de Floriano Peixoto (1891-1894)
O marechal Floriano Peixoto assumiu o governo com a convicção de que só pela força conseguiria estabelecer a ordem na República. Por essa razão, foi apelidado de Marechal de Ferro.
O Congresso Nacional foi reaberto e os chefes de governos estaduais que haviam apoiado o fracassado golpe de Deodoro foram demitidos. Mesmo apoiado pelos republicanos civis, principalmente do PRP e por amplos setores do Exército e da Marinha, que apoiavam a permanência do vice-presidente à frente do governo até completar o mandato de Deodoro, o governo de Floriano foi considerado ilegal; o artigo 42 da Constituição determinava que, caso o presidente da República não chegasse a completar metade do seu mandato, o vice-presidente assumiria e, em noventa dias, deveria convocar novas eleições presidenciais. Floriano não acatou as determinações desse artigo e, decidido a continuar na Presidência, valeu-se das "Disposições Transitórias" da Constituição, que fixavam em quatro anos os mandatos dos primeiros presidente e vice-presidente, eleitos indiretamente; com isso, provocou o crescimento de uma acirrada oposição, envolvendo grupos civis e militares deodoristas.
O antiflorianismo ganhou amplo espaço durante todo o ano de 1892. Várias unidades do Exército e da Marinha revoltaram-se contra o governo tido como ilegítimo; alguns generais e almirantes publicaram um manifesto (Manifesto dos 13 Generais), exigindo do marechal a realização imediata de novas eleições presidenciais. Foram reformados, isto é, aposentados, presos e deportados para a Amazônia. Além disso, Floriano enfrentaria e reprimiria com violência a Revolução Federalista do Rio Grande do Sul e a Revolta da Armada no Rio de Janeiro.
A Revolução Federalista
Entre 1893 e 1895 a Região Sul do Brasil transformou-se em palco de uma violenta guerra civil. O conflito começou no Rio Grande do Sul, onde dois grupos oligárquicos disputavam o controle político, alcançando as regiões de Santa Catarina e Paraná. Essa foi a mais sangrenta revolta da República, devido à brutal repressão governista, fuzilando inúmeros adversários sem julgamento.
No Rio Grande do Sul, os federalistas, organizados no Partido Republicano Federalista (PRF) e liderados por Gaspar Silveira Martins e Gumercindo Saraiva, opunham-se ao domínio político dos castilhistas, grupo republicano chefiado por Júlio de Castilhos, sobre a política do Estado. Acusados de serem pactários com a monarquia, os maragatos (outra denominação dos federalistas) defendiam um poder central forte e a adoção do parlamentarismo e chegaram a estabelecer um governo em Bagé.
Os castilhistas, por sua vez, também conhecidos como pica-paus, controlavam a política rio-grandense com base em uma Constituição de caráter positivista, a única do País que previa a reeleição do presidente do Estado para o período seguinte, e perseguiam violentamente os adversários maragatos. O apoio do presidente aos castilhistas fez com que a oposição se tomasse francamente antiflorianista. Daí a ferocidade da ação do governo na sua sufocação.
A Revolta da Armada
A partir de novembro de 1891, várias foram as sublevações envolvendo a Marinha: primeiro contra a tentativa de golpe de Deodoro e, depois, em oposição ao continuísmo de Floriano, numa ampla ação dos deodoristas, como é o caso da revolta do encouraçado Primeiro de Março.
Em 1893, o almirante Custódio José de Melo, senador da República e ex-ministro da Marinha, rompeu com o governo Floriano, declarando-o ilegítimo, e deu início à Revolta da Armada. As motivações dessa revolta, entretanto, podem ser explicadas a partir da rivalidade entre a Marinha (Armada) e o Exército, da marginalização daquela no bloco de poder do novo regime, da ação dos florianistas, que viam na Armada a única força capaz de derrubar Floriano, e da própria candidatura frustrada de Custódio de Melo à sucessão presidencial.
Com a eclosão do movimento na capital da República, navios de guerra sob domínio dos rebeldes trocaram tiros com as fortalezas da Baía de Guanabara e chegaram a fazer ameaças, mais uma vez, de bombardear a cidade do Rio de Janeiro. Como o seu antiflorianismo coincidia com o da Revolução Federalista, no Sul, os dois movimentos acabaram fundindo-se, chegando a se fortalecer com a adesão do almirante Saldanha da Gama, chefe da Escola Naval. Como o levante maragato, a Revolta da Armada foi violentamente sufocada pelas forças florianistas.
Depois de governar a ferro e fogo por três anos, enfrentando e reprimindo com violência as reações ao seu mandato, Floriano conseguiu consolidar o novo regime, criando condições para que os civis assumissem o poder. Com a eleição de Prudente de Morais, em 1894, encerrou-se a República da Espada e teve início o segundo e mais importante período da República Velha: a República das Oligarquias.
2. A República das Oligarquias (1894-1930)
A República das Oligarquias recebeu essa denominação porque baseou toda sua ação político-administrativa na existência das oligarquias estaduais. Estas eram definidas como grupos bastante fechados, constituídos por elementos das classes dominantes (latifundiários e alta burguesia, com predominância dos primeiros), e que exerciam o monopólio da política em seus Estados. Naturalmente, as oligarquias mais poderosas, como a paulista e a mineira, tinham uma influência decisiva no cenário político nacional. Não obstante, cada unidade da Federação se encontrava sob o férreo controle de sua própria oligarquia. Assim sendo, o período que vai da posse de Prudente de Morais à Revolução de 1930 caracterizou-se pela defesa dos interesses desses grupos minoritários, com predomínio da oligarquia cafeeira, instituindo-se para isso um verdadeiro esquema oligárquico do qual faziam parte a Política dos Governadores, a Política do Café-com-Leite e o Coronelismo, entre outros. Mesmo com choques e cisões dentro das próprias oligarquias, como durante o governo Hermes da Fonseca ou na sucessão de Epitácio Pessoa, em nenhum momento, porém, a classe média - e muito menos as camadas inferiores da população - teve qualquer participação no processo político-administrativo desse esquema de minorias, apesar da existência do sufrágio universal masculino.
A Política dos Governadores
Delineada por Prudente de Morais e oficializada por Campos Sales, em 1900, a Política dos Governadores era um compromisso firmado entre o Governo Federal e os governos estaduais, representados por grupos oligárquicos regionais. Esses grupos passavam a gozar de ampla autonomia, contando com todo o apoio do presidente da República, sendo reconhecidos como seus únicos parceiros. Em troca, dariam total apoio ao Governo Federal; assim, os deputados federais e senadores, eleitos pelas oligarquias estaduais, não opunham nenhum embaraço à política presidencial no plano nacional.
Com isso, somente seriam empossados os parlamentares eleitos pelo grupo situacionista de cada Estado. Os candidatos das oposições que se elegessem seriam sistematicamente cortados das listas de votação pela própria Comissão Verificadora dos Poderes do Congresso Nacional. Na época, dizia-se que esses candidatos eram degolados, pois não chegavam a assumir seus cargos. Essa política garantiu a supremacia do Executivo Federal sobre o Legislativo e, simultaneamente, consolidou o poder local das oligarquias estaduais.
O coronelismo
Constituía a base do sistema oligárquico e estava assentado na atuação dos chefes políticos locais, os coronéis. Estes eram geralmente grandes proprietários rurais e, na sua maioria, possuidores do posto de coronel da antiga e tradicional Guarda Nacional. Controlando verdadeiros cercados ou currais eleitorais, garantiam a vitória dos candidatos de seu grupo através do voto de cabresto, numa relação de clientelismo político (troca de favores) com seu eleitorado.
O coronelismo foi possível graças à coexistência do voto universal aberto com uma estrutura socioeconômica de dominação arcaica fundada na ordem latifundiária, cujas raízes podem ser encontradas nos tempos coloniais.
A Política do Café-com-Leite
Definida no governo Campos Sales e testada pela primeira vez na eleição de Rodrigues Alves (1902), consistiu na aliança política entre São Paulo e Minas Gerais, visando ao controle da sucessão presidencial. Tinha como base o poder econômico desses dois Estados, conjugados com a união dos interesses de seus representantes políticos.
Afinal, São Paulo e Minas Gerais, ligados respectivamente à cafeicultura e à pecuária, sendo o segundo também um estado cafeeiro, além da grande força econômica alicerçada na importância do café, que era o principal produto das exportações brasileiras, tinham também maior representatividade, porque, sendo mais populosos, possuíam maior número de deputados na Câmara Federal. Daí, a hegemonia do setor cafeeiro durante a República Velha.
Isso permitiu que o mais importante setor da economia brasileira garantisse o seu nível de renda, assumindo o controle da política econômica do governo através da Política de Valorização do Café, com a socialização das perdas.
A Política de Valorização do Café
Ao iniciar-se a República, o setor cafeeiro enfrentava graves problemas. De um lado, as crises do mercado internacional e de outro, a superprodução. Nos dois casos, os preços do café tendiam a cair, diminuindo, assim, os lucros dos cafeicultores. Como o setor cafeeiro controlava a política da República Velha, os produtores procuraram garantir-se através da Política de Valorização do Café.
A valorização do café, em que o governo federal assumia diretamente a proteção dos interesses dos cafeicultores, dava-se através da compra ou da retenção dos excedentes de sua produção, o que mantinha, artificialmente, os preços do produto. Isso se dava através das sucessivas desvalorizações da moeda, da contração de empréstimos externos e das emissões constantes. Essas práticas que marcaram os governos de Rodrigues Alves, Afonso Pena e Venceslau Brás, entre outros, foram em grande parte responsáveis pela instabilidade econômico-financeira assinalada durante a Primeira República brasileira.
Sistema eleitoral fraudulento
Completava o sistema oligárquico um sistema político-eleitoral viciado. Isso porque, além do total desligamento entre o eleitorado e os políticos, o voto a descoberto e a inexistência da Justiça Eleitoral permitiam que as oligarquias praticassem todo tipo de fraudes, para assegurar a vitória de seus candidatos.
De uma maneira geral, a máquina eleitoral governista - fosse ela federal, estadual ou municipal - era sempre acionada, garantindo os resultados, sempre favoráveis, em quaisquer eleições. Assim, voto de cabresto, currais eleitorais ou eleições de bico-de-pena eram expressões comuns na política da época.
3. A sucessão presidencial
Prudente de Morais (1894-1898)
Eleito pelo voto direto em 1894, foi o primeiro presidente civil da República Velha. Denominado o "Pacificador da República", concedeu anistia aos envolvidos nas revoltas ocorridas contra o governo de Floriano Peixoto. Contudo, o seu governo conheceu forte oposição dos florianistas, responsáveis por vários levantes e agitações.
O principal acontecimento de seu quadriênio foi a Campanha de Canudos desenvolvida entre 1896 e 1897, no interior da Bahia. As condições de miséria do sertão nordestino acabaram por dar origem a um movimento de sertanejos caracterizado pelo messianismo e pelo fanatismo, tendo como líder o beato Antônio Conselheiro, fundador do arraial de Canudos, às margens do rio Vaza-Barris. Um incidente envolvendo moradores do arraial e forças policiais deu início a sucessivas expedições, inclusive com tropas federais, que acabaram por destruir Canudos, sempre referido na imprensa como uma revolta monarquista.
No plano econômico-financeiro a situação era grave: os preços do café estavam em queda, o déficit orçamentário crescia com os gastos militares, o balanço de pagamentos também era deficitário, agravado pelos empréstimos externos, o câmbio estava em baixa e a inflação descontrolada. Diante disso, Campos Sales (já eleito presidente) procurou renegociar a dívida externa brasileira com os credores estrangeiros, obtendo destes um acordo chamado Funding Loan. Por ele, o Brasil obteve uma moratória (os pagamentos das dívidas foram suspensos por 13 anos) e um empréstimo de 10 milhões de libras, garantido pelas rendas da Alfândega do Rio de Janeiro, comprometendo-se a não contrair novos empréstimos e a recolher parte do seu meio circulante.
Ao final do seu governo (5/11/1897) o Presidente sofreu um atentado, planejado por florianistas. O episódio, que resultou na morte do marechal Machado Bittencourt, ministro da Guerra, foi repudiado pela opinião pública, granjeando-lhe apoio popular. Ensejava-se, assim, a consolidação do poder civil.
Campos Sales (1898-1902)
Mesmo antes de ser eleito, na condição de ministro da Fazenda do governo anterior, foi o responsável pelas negociações com os credores externos que resultariam no Funding Loan. No seu mandato, Joaquim Murtinho, ministro da Fazenda, iniciou o saneamento financeiro da República, encetando uma política deflacionista, visando ao equilíbrio orçamentário e à valorização da moeda. Para isso empregou medidas austeras destinadas a aumentar a receita, destacando-se entre elas a maior incidência do imposto de consumo, o aumento dos impostos aduaneiros e da taxa-ouro sobre importações, redução das despesas governamentais e limitação do crédito.
Em conseqüência disso, o orçamento passou a apresentar superávit, o câmbio elevou-se, valorizando a moeda, e acumulou-se ouro nos depósitos brasileiros em Londres. O crédito externo também foi recuperado e a balança comercial apresentou saldo favorável, devido à menor importação. Em contrapartida, as atividades produtivas internas foram prejudicadas e o poder aquisitivo da população sofreu acentuada redução.
No plano político, criou a Política dos Governadores e a Política do Café-com-Leite, assegurando o domínio político das oligarquias estaduais e o controle da nação pela oligarquia cafeeira.
Rodrigues Alves (1902-1906)
Seu governo é conhecido como Quadriênio Progressista, devido à excelente administração que realizou, remodelando os portos, ampliando a rede ferroviária e desenvolvendo obras de urbanização e modernização da cidade do Rio de Janeiro, em que se destacou a atuação do prefeito Pereira Passos.
Nessas realizações foram utilizados recursos originários da política financeira desenvolvida na gestão anterior e do aumento das exportações de café e da borracha. O grande destaque do período foi a Campanha de Saneamento no Rio de Janeiro, dirigida por Osvaldo Cruz, e que visava à eliminação da febre amarela e outras doenças. Nesse processo, a imposição da vacinação obrigatória contra a varíola provocou descontentamento popular; disso se aproveitaram os militares e políticos da oposição ao governo, fazendo eclodir a Revolta da Vacina (1904), sob a liderança do senador Lauro Sodré, rapidamente dominada pelas forças legalistas.
Ainda no seu quadriênio foi assinado o Convênio de Taubaté (no qual o presidente, aliás, não teve participação direta), a primeira medida intervencionista em favor da manutenção dos preços internacionais do café, pela compra e estocagem dos excedentes da produção. Os Estados signatários do convênio (SP, MG e RJ) tiveram de recorrer a empréstimos externos, o que contrariava a austeridade deflacionária do governo Rodrigues Alves.
Afonso Pena (1906-1909)
Foi o primeiro mineiro a exercer a Presidência da República, dentro da alternância da Política do Café-com-Leite. Adotando o lema "Governar é povoar", Afonso Pena foi um estimulador da imigração; em 1908, chegaram ao Brasil os primeiros imigrantes japoneses.
Sua gestão foi marcada por atritos com o Morro da Graça, um importante grupo de políticos do Congresso Nacional, liderado pelo senador gaúcho Pinheiro Machado, onde nem mesmo a atuação da bancada governista liderada pelo deputado Carlos Peixoto Filho, denominada pelos primeiros de Jardim da Infância, conseguiu evitar o seu desgaste.
No âmbito econômico e financeiro, promoveu a primeira valorização do café, criando em 1907 a Caixa de Conversão; esta recebia toda a moeda estrangeira, trocando-a por bilhetes conversíveis mantidos a um câmbio baixo. Este instrumento favorecia o setor cafeeiro, pois possibilitava a percepção de um maior volume de dinheiro brasileiro, e, indiretamente, os industriais, graças ao encarecimento das importações.
Faleceu em 1909, tendo sido o seu quadriênio terminado por Nilo Peçanha, então vice-presidente da República.
Nilo Peçanha (1909-1910)
Apesar da brevidade de seu período administrativo, Nilo Peçanha tomou duas iniciativas importantes, criando o Serviço de Proteção aos Índios (SPI) por sugestão do tenente-coronel Cândido Rondon, que foi o primeiro diretor da entidade, e restabelecendo o antigo Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio, que fora extinto por Floriano Peixoto.
Ao final do seu governo, ocorreu a primeira eleição competitiva da República Velha, resultante da primeira ruptura do Café-com-Leite. Nesse pleito concorreram o marechal Hermes da Fonseca, apoiado por Minas Gerais, pelos velhos políticos capitaneados por Pinheiro Machado, o coronel dos coronéis, e pelo próprio presidente, e Rui Barbosa, candidato da oposição que congregava os Estados de São Paulo e da Bahia. Nessa eleição, Rui realizou a Campanha Civilista, na qual defendia a reforma eleitoral com o voto secreto, a necessidade de um Código Civil e a revisão constitucional. Apesar da boa votação, foi derrotado pelo candidato governista.
Marechal Hermes da Fonseca (1910-1914)
Eleito com 403.867 votos contra os 222.822 de Rui Barbosa, seu governo foi conturbado, com as constantes decretações de estado de sítio.
Numa tentativa de rompimento da Política dos Governadores, promoveu a intervenção federal em Estados da Federação, derrubando os grupos oligárquicos adversários, através da Política das Salvações: as velhas oligarquias foram substituídas por outras, inicialmente sob comando do gaúcho Pinheiro Machado, fundador do Partido Republicano Conservador, criado por este para dar sustentação à sua administração.
O fracasso das "salvações", levado a efeito pelo Governo Federal, ficou patente com a eclosão de movimentos de rebeldia contra a nova política presidencial. Entre eles, destacou-se a Revolta do Juazeiro, liderada pelo padre Cícero Romão Batista, responsável pela deposição dos grupos hermistas que controlavam o Ceará e pela recondução ao poder da velha oligarquia dos Accioli.
Em novembro de 1910, eclodiu a Revolta da Chibata, sob o comando do marinheiro João Cândido, o "almirante negro". Os marinheiros dos encouraçados "Minas Gerais" e "São Paulo", os mais modernos da Armada brasileira, rebelaram-se contra os maus-tratos, o excesso de trabalho e contra a chibata, que ainda era usada para punir infratores. A rebelião foi reprimida, mas vários oficiais foram assassinados durante o episódio.
No quadriênio Hermes da Fonseca, devem ser registradas ainda a queda nas exportações de café e borracha, levando o país a uma crise econômica, e uma nova renegociação da dívida externa: o segundo Funding Loan.
Venceslau Brás (1914-1918)
Com a reconciliação de São Paulo e Minas Gerais, selada com o Pacto de Ouro Fino, o mineiro Venceslau Brás foi mais um presidente eleito pelo Café-com-Leite; sem o apoio esperado, Rui Barbosa, mais uma vez encabeçando a chapa de oposição, retirou sua candidatura.
Em seu quadriênio, marcado em toda sua duração pela Primeira Guerra Mundial (na qual tivemos uma pequena participação ao lado dos Aliados), aumentaram as exportações de matérias-primas e alimentos e ocorreu um surto industrial. O conflito propiciou excelentes negócios, pois os Aliados compravam do Brasil tudo o que pudesse ser vendido. Por outro lado, a inibição das importações permitiu a criação de novas indústrias, estimulando a produção nacional, acumulando capitais e especializando um numeroso contingente de operários. O aumento da importância do operariado urbano fez com que eclodissem sucessivas greves, como a de 1917, quando a cidade de São Paulo ficou quase totalmente paralisada.
Seu governo também foi sacudido pela Guerra do Contestado, ao lado da Campanha de Canudos, um dos mais importantes movimentos sociais da República. O problema reportava-se à região limítrofe dos estados do Paraná e Santa Catarina, disputada por ambos. Em 1912, a construção de uma via férrea na região, desalojando milhares de posseiros, deflagrou um movimento de fundo messiânico, caracterizado pelo fanatismo religioso. Vivendo no abandono e oprimida pela miséria, a população sertaneja, liderada pelo "monge" João Maria, opôs forte resistência às forças federais. Em 1915, uma divisão de 6 mil soldados, sob o comando do general Setembrino de Carvalho, sufocou duramente o movimento; o litígio entre Paraná e Santa Catarina, contudo, só foi resolvido em 1916.
Delfim Moreira (1919)
Era o vice-presidente de Rodrigues Alves, candidato vitorioso na sucessão a Venceslau Brás. Embora eleito presidente pela segunda vez, Rodrigues Alves, vítima da gripe espanhola, faleceu antes de tomar posse.
Cumprindo o disposto pelo artigo 42 da Constituição de 1891, Delfim Moreira governou apenas alguns meses e convocou novas eleições.
Epitácio Pessoa (1919-1922)
Nas eleições de 1919, a oposição do Rio Grande do Sul a qualquer candidatura paulista ou mineira, bem como à chapa encabeçada por Rui Barbosa para a qual se inclinava o Café-com-leite, influiu na indicação do paraibano Epitácio Pessoa, que gozava de grande prestígio por sua participação na Conferência de Paz de Paris, após a Primeira Grande Guerra.
Com o objetivo de afastar os militares da vida política do país, o presidente colocou civis nas pastas militares: para os ministérios da Guerra e da Marinha, foram nomeados, respectivamente, Pandiá Calógeras e Raul Soares.
Sua política econômico-financeira no início foi austera, com restrições às despesas, às emissões e ao setor cafeeiro. Depois, porém, com a queda das exportações mudou a orientação: contraiu empréstimos, emitiu papel moeda e criou a Carteira de Redescontos, favorecendo mais uma vez o setor cafeeiro.
No final do seu governo, a oposição dos militares, a insatisfação contra o sistema político e a desmoralização da República Velha provocaram o surgimento do Movimento Tenentista, que apareceria pela primeira vez como manifestação armada no Levante do Forte de Copacabana (Os 18 do Forte), em 5 de julho de 1922. A revolta dos tenentes, parte dos conflitos entre o governo e o setor militar, está relacionada ao episódio das Cartas Falsas, cujo conteúdo eram ofensivas ao Exército e que, supostamente, teriam sido escritas por Artur Bernardes, já eleito presidente na sucessão de Epitácio Pessoa.
Artur Bernardes (1922-1926)
Em 1921, São Paulo já chancelara a candidatura de Artur Bernardes, presidente de Minas Gerais, dentro do velho sistema de alternância entre os dois estados. Contra o candidato governista organizaram-se as forças oposicionistas da Reação Republicana, tendo como candidato o ex-presidente Nilo Peçanha.
O novo presidente recebia, contudo, um país em crise, ameaçado pelas constantes rebeliões, em virtude das agitações militares e pelos primeiros efeitos da crise econômica aberta com o fim da Grande Guerra. Assim sendo, seu governo foi marcado pela decretação e constante renovação do estado de sítio.
Em São Paulo, os tenentes se sublevaram na Revolução de 1924, sob o comando de Isidoro Dias Lopes e dos irmãos Juarez e Joaquim Távora, chegando a ocupar a capital do Estado. No Rio Grande do Sul, a partir de 1924 a Coluna Prestes iniciou uma longa marcha pelo interior do País, que duraria até 1927, em permanente luta contra as força leais ao governo.
Antes desses levantes, no Rio Grande do Sul os antigos maragatos, agora organizados no Partido Libertador e chefiado por Assis Brasil, revoltaram-se contra a quinta reeleição de Borges de Medeiros para o governo estadual. A ampliação do conflito foi evitada com a mediação do general Setembrino de Carvalho. Em 1923, foi firmado o Acordo de Pedras Altas, permitindo a reforma da Constituição gaúcha, da qual era suprimida a reeleição do chefe de Executivo.
Em 1926, foi aprovada a reforma da Constituição Federal, estabelecendo a limitação do habeas-corpus, o veto parcial do presidente e ampliando os limites de intervenção nos Estados, fortalecendo, assim, o poder do Executivo Federal.
Com relação à economia, transferiu o problema do café para os Estados, criando, por exemplo, o Instituto do Café do Estado de São Paulo.
Washington Luís (1926-1930)
Foi o último presidente da República Velha e o seu lema era "Governar é abrir estradas".
Embora nascido no Estado do Rio de Janeiro, Washington Luís fizera sua carreira política no Partido Republicano Paulista (PRP) e, ao contrário de Artur Bernardes, que vivera fechado no Palácio do Catete, tomou-se popular depois que assumiu a Presidência, passeando a pé pela Avenida Rio Branco, no Rio de Janeiro. Conciliador suspendeu o estado de sítio, mas não decretou a anistia, embora tenha dado liberdade a presos civis e militares, desde os governos anteriores. Encetou uma cerrada perseguição a forças de esquerda, nucleadas pelos comunistas, provocando uma frente de oposição que se batia pela anistia e pela liberdade de pensamento. Como represália, promulgou a Lei Celerada de 1927, que se tomou um eficiente instrumento de repressão do governo.
No terreno das finanças, desenvolveu uma política visando ao equilíbrio monetário e cambial. Para tanto criou uma Caixa de Estabilização (1926), que emitia papel moeda de acordo com empréstimos externos ou entradas de ouro.
Seu governo foi marcado pela Crise de 1929, que obrigou o setor cafeeiro a pedir auxílio ao governo federal recusado por este, a fim de não prejudicar sua política de estabilização.
Ao definir sua sucessão na Presidência da República, regime rompeu com a Política do Café-com-Leite e enfrentou as forças oposicionistas que passaram a formar a Aliança Liberal, a qual lançou a candidatura da chapa Getúlio Vargas e João Pessoa. No seu governo deu-se ainda a quebra da Política dos Governadores, jogando por terra o esquema oligárquico.
Foi deposto pela Revolução de 1930, a qual pôs fim à República Velha.
4. A política externa da República Velha
Durante a República Velha, a diplomacia brasileira foi marcada por três tendências gerais. O eixo diplomático deslocou-se de Londres para Washington; os diplomatas brasileiros demarcaram, com êxito, as controvertidas e vagas fronteiras do país e o Brasil começou a representar um papel mais ativo nos assuntos do hemisfério e do mundo.
O grande responsável por tais mudanças foi o ministro das Relações Externas José Maria da Silva Paranhos Júnior, Barão do Rio Branco. Podemos dizer que o período de sua gestão diplomática, entre 1902 e 1912, representa o momento decisivo das relações exteriores da República Velha.
Reconhecimento da República
O primeiro país a reconhecer o novo regime foi à Argentina, apenas quatro dias depois da Proclamação. Na. Europa, entretanto, os países retardaram o reconhecimento da República, à espera de que fossem realizadas as eleições para o Congresso Constituinte. Com a promulgação da Constituição de 1891, as nações européias reconheceram o novo governo brasileiro, tendo sido a França o primeiro país a fazê-lo. A última nação a aceitar o regime republicano foi a Rússia, que só o fez após a morte de D. Pedro II, ocorrida em 1891.
Rompimento com Portugal
Durante a Revolta da Armada - março de 1894 -, Saldanha da Gama asilou-se com seus oficiais e marinheiros a bordo de duas corvetas portuguesas. Como o governo português negou-se a entregar os revoltosos para julgamento e como as embarcações lusas rumaram para o Rio da Prata, Floriano rompeu as relações diplomáticas com Portugal. As relações só foram restabelecidas no ano seguinte, já no governo de Prudente de Morais.
As relações Brasil-Estados Unidos
Nas últimas décadas do século XIX, estreitaram-se as relações entre Brasil e Estados Unidos. Os norte-americanos tomaram-se nossos maiores compradores de café, borracha e cacau. Em 1912, por exemplo, os Estados Unidos compravam 36% das exportações do Brasil, ao passo que a Grã-Bretanha adquiria apenas 15%, situando-se em segundo lugar.
Em 1915, o National City Bank de Nova York fundou duas agências no Brasil. No mesmo ano, instalava-se no Rio de Janeiro a primeira Câmara de Comércio Norte-Americana para o Brasil.
Os investimentos norte-americanos aumentaram consideravelmente a partir da Grande Guerra, ao mesmo tempo em que declinava a preponderância econômica e diplomática da Grã-Bretanha.
Na primeira década do século XX o Brasil vendeu aos Estados Unidos quatro vezes mais do que comprou, formando-se aos poucos, no Rio de Janeiro, um excedente de dólares que permitiu a aquisição de produtos europeus. Todavia, a ligação cada vez maior com o mercado norte-americano aumentou ainda mais a dependência do Brasil em relação àquela nação.
As Questões Limites
O Brasil Republicano herdou da Monarquia várias questões de fronteiras, algumas com suas origens na Época Colonial. Todas foram solucionadas mediante acordos diplomáticos, havendo na maioria delas arbitramento internacional. O principal representante brasileiro nessas questões foi o Barão do Rio Branco.
A Questão de Palmas ou das Missões
O problema, que remontava aos tempos coloniais, era um ponto de atrito entre o Brasil e a Argentina, que disputavam a posição de primeira potência da América do Sul. Os argentinos afirmavam que sua fronteira com o Brasil eram os rios Iguaçu e Chapecó e reivindicavam a posse da região de Palmas, uma área de aproximadamente 30 mil quilômetros quadrados localizada entre os Estados do Paraná e Santa Catarina.
A questão foi resolvida pelo arbitramento do presidente norte-americano, Grover Cleveland, favorável ao Brasil, cuja defesa esteve a cargo do Barão do Rio Branco. De acordo com o laudo arbitral, os limites seriam determinados pelos rios Pepiri-Guaçu e Santo Antônio, o que assegurou ao Brasil a manutenção do território de Palmas ou das Missões.
A Questão do Amapá
Em 1895 surgiram constantes conflitos entre brasileiros e franceses, habitantes da região fronteiriça entre o Brasil e a Guiana Francesa. Isso porque, desde meados do século XIX, a França recusava-se a reconhecer o rio Oiapoque como limite entre o Amapá e a Guiana. Resolveu-se a questão mediante o arbitramento do presidente do Conselho Federal Suíço.
Mais uma vez defendeu os direitos do Brasil o Barão do Rio Branco. Sua argumentação (apresentada nas "Memórias"), fartamente acompanhada de mapas e documentos, convenceu o presidente suíço Walter Hauser, em 1900, da legitimidade de nossos direitos. A sentença reconhecia o rio Oiapoque como o limite tradicional com a possessão francesa, garantindo ao Brasil a soberania sobre uma área aproximada de 260.000 quilômetros quadrados, no atual Amapá.
A Questão da Ilha da Trindade
Em 1895, a Inglaterra, alegando que a Ilha da Trindade, ao largo da costa do Espírito Santo, estava desocupada havia mais de um século, resolveu ocupá-la. O Brasil protestou logo que teve conhecimento do fato, mas recusou-se a resolver o assunto por arbitramento, dado a legitimidade de seus títulos; aceitou, entretanto, a mediação oferecida por D. Carlos I, rei de Portugal, país onde existiam documentos comprobatórios do descobrimento e posse da Trindade pelos portugueses.
Os direitos brasileiros foram defendidos em Londres pelo ministro João Artur de Sousa Correia e pelo representante português, Marquês de Soveral. No ano seguinte, a Inglaterra retirou os marcos de sua efêmera ocupação da Ilha da Trindade.
A Questão do Pirara
A disputa pela região do Pirara - nome dado ao pequeno afluente do rio Maú - arrastava-se desde o início do século XIX, quando a Inglaterra ocupou a região fronteiriça com a Guiana Inglesa.
Com o advento da República, o caso foi submetido ao arbitramento do rei da Itália, Vitor Emanuel m. Apesar da argumentação de Joaquim Nabuco, o soberano italiano favoreceu os ingleses; a região foi dividida, em 1904, entre o Brasil e a Guiana Inglesa, que ganhou uma saída fluvial para o Amazonas.
A Questão do Acre
A região ocupada por seringueiros brasileiros legalmente pertencia à Bolívia, de acordo com os Tratados de 1777 e 1867. A questão apresentava-se extremamente delicada, pois se a Bolívia tinha a posse legal daquele território, a região rica em borracha era essencial para o Brasil.
Em 1902, a Bolívia tentou expulsar os brasileiros da região. Estes resistiram e, sob a chefia de Plácido de Castro, proclamaram o Estado Independente do Acre, com a intenção de anexá-lo posteriormente ao Brasil. Diante do conflito iminente, o Barão do Rio Branco, ministro das Relações Exteriores, deu início às negociações que resultaram no Tratado de Petrópolis: por ele, o Brasil recebia o Acre (cerca de 152.000 km2), em troca de um pagamento de 2 milhões de libras, cederia à Bolívia uma área de 3.200 km2 em Mato Grosso e construiria a Estrada de Ferro Madeira-Mamoré, garantindo assim o escoamento da produção boliviana pelo rio Amazonas.
O Brasil e o Pan-Americanismo
Diferenciado do resto da América durante o século XIX, em virtude de suas instituições monárquicas, o Brasil juntou-se à comunidade das repúblicas americanas em 1889, no mesmo ano em que se iniciou o movimento pan-americano com a Primeira Conferência Internacional dos Estados Americanos, nos EUA, realizada entre 1889 e 1890.
Foi decisiva para a consolidação da harmonia pan-americana a atuação de Rio Branco, por atenuar, contornar e resolver atritos entre as Américas portuguesa e espanhola, bem como para aproximá-las dos Estados Unidos na Conferência do Rio de Janeiro, em 1906.
O Brasil na Conferência de Haia
O Brasil marcou seu primeiro aparecimento importante numa conferência mundial, em 1907, quando se realizou a Segunda Conferência Internacional da Paz em Haia. Naquela ocasião, Rui Barbosa chefiou a delegação brasileira e ocupou a posição de Presidente de Honra.
As manobras das potências mundiais para criar uma Corte Internacional de Justiça ofenderam as suscetibilidades e contrariaram as aspirações brasileiras. Rui Barbosa lançou-se na defesa de uma Corte de Justiça, na qual o princípio de igualdade de todas as nações seria preservado. Com essa atitude, o Brasil despontou como líder das nações latino-americanas, assim como de várias nações européias menores, na luta pela igualdade de representação. Daí o cognome de Rui Barbosa: Águia de Haia.
O Brasil na Primeira Guerra Mundial
Após o afundamento do terceiro navio mercante brasileiro, em outubro de 1917, o Brasil declarou guerra à Alemanha, configurando assim sua participação direta no conflito. Essa posição está vinculada, entre outras, à entrada dos Estados Unidos na guerra, nessa mesma época, e à crescente dependência brasileira das exportações para aquele país.
A participação brasileira, contudo, ficou restrito ao envio de uma unidade médica e de um esquadrão de aviadores à Europa, além da cooperação com os ingleses no patrulhamento do Atlântico Sul.
Em reconhecimento à participação brasileira, Grã-Bretanha, Itália e Bélgica elevaram suas legações no Rio de Janeiro à categoria de embaixadas e o Brasil fez o mesmo em relação àqueles países. Além disso, o Tratado de Versalhes, elaborado durante a Conferência de Paz de Paris, da qual o Brasil participou com uma delegação chefiada por Epitácio Pessoa, incorporou duas reivindicações do governo brasileiro: pagamento, com juros, do café vendido à Alemanha em 1914 e apropriação de navios alemães apresados em portos brasileiros durante a guerra.
O Brasil participou ainda da formação da Liga das Nações, retirando-se desta em 1926, por não ver reconhecida sua importância no hemisfério ocidental.
A penetração econômica estrangeira
Durante a Primeira República, o predomínio do capital estrangeiro foi encarado como um fenômeno natural num país em expansão, necessitando dele e de suas técnicas superiores.
O capitalismo inglês foi o grande privilegiado por esta política: o London & River Plate Bank, do grupo Rotschild, foi o intermediário entre o governo brasileiro e a Inglaterra nos empréstimos negociados durante o período. Além dos benefícios financeiros, a indústria inglesa vai ser favoreci da com as possibilidades abertas pela crise industrial de 1901 e cujo resultado foi o aumento da exportação industrial britânica para o Brasil.
Rodrigues Alves consolidou ainda mais esta ligação com sua política de prosperidade e estabilidade cambial; definiu-se por uma política de moeda estável, para satisfazer a entrada de capitais e braços estrangeiros. Como conseqüência, instalou-se no Brasil um grande número de empresas estrangeiras: das 201 empresas fundadas entre 1889 e 1910, 160 eram estrangeiras.
Os fatos se repetiram no decorrer de toda a Primeira República, numa concordância entre as classes dirigentes brasileiras e o capital internacional: em 1915, representantes do grupo Rotschild telegrafaram diretamente a Venceslau Brás para saber se haveria intervenção no Rio de Janeiro, pois tinham interesses naquele estado.
Durante a Grande Guerra verificou-se uma natural retração de capital estrangeiro. Contudo, a necessidade de abastecer os países em conflito possibilitou a instalação de um grande número de frigoríficos estrangeiros no Brasil, como o Armour e o Swift.
Com o fim da Primeira Guerra Mundial, os países europeus e os Estados Unidos voltaram a investir maciçamente no Brasil.
No Amazonas concederam-se terras ao empresário norte-americano Henry Ford. Este, com o objetivo de participar do comércio da borracha, feito até então por ingleses e holandeses, apresentou em 1928 um projeto para a plantação científica da borracha. Conseguiu então o privilégio para explorar certas áreas da Amazônia brasileira por 50 anos. Daí, a origem de povoações como Fordlândia e Belterra.
Outro ramo marcado pela penetração, de capitais americanos e ingleses foi o da eletricidade. Desde o começo do século, a Light and Power, empresa anglo-canadense, dominou sua produção e distribuição em São Paulo e Rio de Janeiro. Entre 1928 e 1929 a Electric Bond & Share adquiriu as pequenas companhias de eletricidade de todo o Brasil.
De 1889 a 1930, a dependência econômica brasileira perante as potências estrangeiras cresceu. Os empréstimos constituíram formas de controle das receitas do País. Durante boa parte do período, alfândegas e estradas de ferro ficaram sob o controle dos capitais estrangeiros, como garantia dos juros e prestações devidas.
5. A cultura brasileira na República Velha
Durante a República Velha a produção cultural brasileira refletia nas suas várias modalidades, a influência dos padrões e modismos estrangeiros; a cultura, como na época da Monarquia, continuava restrita a uma pequena parcela da população, uma vez que a instrução continuava sendo um privilégio das elites.
Na literatura, salvo exceções, predominavam o diletantismo acadêmico e o preciosismo vocabular dos parnasianos, erigindo um obstáculo intransponível entre a linguagem literária e a fala das ruas; as artes plásticas obedeciam ainda aos rígidos cânones da pintura acadêmica européia e o teatro, seguindo as pegadas do teatro francês, demonstrava a preferência do público pelas operetas, vaudevilles e revistas com acento parisiense. As encenações eram, em sua maioria, de textos importados traduzidos e adaptados ao público brasileiro.
Os limites da Educação
Durante o período, a Educação enfrentou diversos problemas: inexistiam dispositivos constitucionais que garantissem um projeto amplo e sistemático de educação, bem como órgãos especializados (ministérios e secretarias) para tratar exclusivamente do assunto nos seus vários níveis; faltava um Plano Nacional de Educação e um sistema escolar que integrasse graus e ramos.
Apesar dessa situação, alguns intelectuais mostraram suas preocupações com a questão educacional. É o caso de Olavo Bilac, que em 1915 iniciou suas pregações cívico-patrióticas, defendendo o Serviço Militar, para fazer frente ao perigo externo (representado pela cobiça internacional), e o aprimoramento da instrução para combater o perigo interno (manifestado pela quebra da unidade nacional, pelo depauperamento do caráter e pelo definhamento do patriotismo).
No plano das realizações, o agrupamento das Escolas Politécnica e de Medicina e uma das Faculdades Livres de Direito deu origem à Universidade do Rio de Janeiro, a primeira universidade pública do País, criada em 1920.
Quanto à escola primária, cabia aos Estados, de acordo com a Constituição de 1891, o cumprimento dos seus deveres com a instrução, coisa que nunca acontecia. De acordo com o Relatório de 1922, a matrícula nas escolas primárias de todo o País era de 1.030.752 alunos; a freqüência, contudo, era de apenas 29% da população escolar.
% 41 43 44 56 94 95
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A Escola Normal, por sua vez, destinada à formação de professores primários, era basicamente voltada para a formação geral. Não constava de seu programa o ensino de disciplinas como Metodologia, Pedagogia e Psicologia, específicas da formação de professores. Em 1907, dos 5.020 matriculados no "ensino pedagógico" apenas 786 eram do sexo masculino; essa tendência predominará posteriormente, pois em 1929, para 23.808 alunos matriculados, somente 3.401 eram do sexo masculino. Portanto, a escola normal era uma instituição destinada fundamentalmente à educação de moças burguesas.
A Literatura
Com o advento da República, mesmo com a influência européia, surgiram os primeiros autores cujas obras tratavam da realidade brasileira: Euclides da Cunha, Lima Barreto e Monteiro Lobato. Coube a estes escritores revelar, com profundo senso crítico, as tensões existentes na sociedade brasileira da época. O primeiro, em Os Sertões (1902), descreveu toda a campanha de Canudos; a visão do drama urbano, por sua vez, é fornecida pela obra de Lima Barreto, cujo cenário é o Rio de Janeiro, onde focaliza os subúrbios cariocas. Na sua obra Triste Fim de Policarpo Quaresma (1915), ridiculariza o nacionalismo ufanista através da figura do major Quaresma, cuja visão fragmentária da realidade o conduz a situações patéticas, como personagem típica da tradição quixotesca.
Como último representante dessa literatura realista tem-se Monteiro Lobato, autor de uma coletânea de contos, Urupês (1918), na qual imortalizou a figura do "Jeca Tatu", símbolo da miséria e ignorância do camponês brasileiro. Na coletânea seguinte, Cidades Mortas (1919), retratou a decadência do Vale do Paraíba, outrora uma próspera região cafeeira. Caracterizador de tipos, de gestos e ambientes, chegando muitas vezes ao anedótico, deve-se destacar sua literatura para crianças, associando objetivos pedagógicos à ficção.
Na década de 1920, contra o elitismo e o europeísmo que marcavam a cultura brasileira, rebelou-se o movimento modernista brasileiro. Seu ponto alto foi a Semana de Arte Moderna (1922), realizada em São Paulo com o objetivo de criar uma cultura moderna, baseada em elementos genuinamente brasileiros.
Os modernistas foram buscar inspiração nas imagens da indústria, da máquina, da metrópole, do burguês e do proletário, do homem da terra e do imigrante.
Entre os escritores modernistas, o que melhor reflete o espírito da Semana é Oswald de Andrade. De maneira geral, sua produção literária reflete a sociedade em que se forjou sua formação cultural: o momento de transição que une o Brasil agrário e patriarcal ao Brasil que caminha para a modernização.
Ao lado de Oswald de Andrade, destaca-se como ponto alto do Modernismo a figura de Mário de Andrade, principal animador do movimento modernista e seu espírito mais versátil. Cultivou a poesia, o romance, o conto, a crítica, a pesquisa musical e folclórica.
Poetas de relevo da época foram também Manuel Bandeira, Cassiano Ricardo e Antônio de Alcântara Machado. Este, inovando a estrutura do conto, em suas coletâneas Brás, Bexiga e Barra Funda (1927) e Laranja da China (1928) retrata, numa linguagem que se aproxima da jornalística, a vida social de São Paulo, destacando a figura do imigrante, sobretudo do italiano, responsável por marcantes alterações na fisionomia cultural de São Paulo.
As Artes Plásticas
Até 1922, as artes plásticas eram marcadas pelo predomínio dos modelos europeus, principalmente da França. Logo após a Primeira Grande Guerra surgiram duas novas correntes: o Art Nouveau e o Nativismo, este último uma campanha iniciada por Ricardo Severo e Lúcio Costa.
Com o crescimento urbano e industrial de São Paulo no início do século - para onde convergiam numerosos imigrantes -, os meios artísticos nacionais entraram em contato com as mais recentes tendências da arte européia. Em 1913, Lasar Segall mostrou em São Paulo, para um público ainda apático, telas expressionistas de intenso conteúdo dramático.
Pouco depois, em 1917, a capital paulista foi agitada pela revolucionária pintura fauve, introduzida no Brasil por Anita Malfatti, que voltava de viagem de estudos pela Alemanha e Estados Unidos. Sua obra, apesar de duramente criticada por Monteiro Lobato, contou com o apoio de um grupo de literatos e artistas que, mais tarde, desencadearam o Movimento Modernista no País.
A esse grupo de artistas pertenciam Rego Monteiro, Di Cavalcanti (o pintor da mulata brasileira), Ismael Néri (primeiro surrealista do Brasil), Tarsila do Amaral e Cândido Portinari, que utilizou como temas de sua obras as estradas secas do Nordeste e seus retirantes.
Na escultura, a figura de relevo foi Victor Brecheret, autor da famosa obra Monumento às Bandeiras, atualmente exposta no Parque do lbirapuera, em São Paulo.
A Arquitetura
Na virada do século XIX, a alta burguesia paulistana, ainda dependente do café, mas com vistas à indústria nascente, tratou de fazer suas construções de acordo com as novidades européias; procurava-se acompanhar o cenário cultural do Velho Continente, inspirado, sobretudo em Paris, a "meca" dos ricos fazendeiros paulistas.
Os estilos variados, combinados entre si e até inventados pelo ecletismo romântico, sempre permitindo manifestações personalistas e evocações da' terra de origem, surgiam às vezes puros e concretos em sua concepção original, a exemplo da casa Art Nouveau projetada pelo sueco Carlos Eckman para o cafeicultor e industrial Álvares Penteado (Vila Penteado, o bairro de Higienópolis, em São Paulo). Nem sempre, porém, as misturas de soluções arquitetônicas foram felizes. Exemplo disso é o palacete projetado em 1896 pelo alsaciano Matheus Haussler para o fazendeiro Elias Chaves (hoje Palácio dos Campos Elíseos), que misturava soluções renascentistas com elementos alsacianos.
No início do século XX, Vítor Dubugras e outros introduziram o neocolonial, estilo que não ultrapassou o simples uso da ornamentação portuguesa palaciana barroca estilizada. Surgiram, assim, exemplares como o que foi construído no Caminho do Mar, entre Santos e São Paulo em 1922.
A partir da segunda metade dos anos 20 e durante a década de 30, as manifestações modernistas resumiram-se, praticamente, a trabalhos personalistas. Ainda não havia uma consciência de modernidade unindo os arquitetos em tomo de uma tendência. O primeiro exemplo de um projeto desligado dos padrões culturais da época foi à casa de Warchavichk, de 1927. No seu exterior a influência é do cubismo, enquanto nos interiores sobressai o estilo da moda, o art déco.
Warchavchik, no entanto, não fez escola, nem teve seguidores. Comparáveis a ele são: Flávio de Carvalho, arquiteto de poucos projetos e raras obras, Júlio de Abreu, Luís Nunes e também Vital Brazil.
A Música
Na música erudita, coube a Heitor Villa-Lobos, ainda hoje o compositor brasileiro mais conhecido no Exterior, a consolidação de uma linguagem musical caracteristicamente brasileira. Aproveitando elementos do folclore dos mais diversos pontos do Brasil, coletados durante suas inúmeras viagens, Villa-Lobos deixou uma vasta produção que abarca quase todos os gêneros musicais. São suas obras mais famosas: "Choros", "Bachianas Brasileiras", "Cirandas" e os ciclos da "Prole do Bebê".
A Semana de Arte Moderna de 1922 iria estimular as discussões sobre os caminhos que deveriam ser trilhados pela música brasileira. Dessas discussões, que procuravam definir uma posição de distanciamento em relação às tendências européias presentes na música brasileira, resultaram na publicação, em 1928, do Ensaio Sobre a Música Brasileira, de Mário de Andrade. A proposta central do livro era que os compositores buscassem a inspiração prioritariamente na realidade nacional, com especial atenção para o rico folclore musical brasileiro.
Na música popular, firmaram-se cada vez mais os elementos da nossa herança africana. Em 1889, surge a marcha "ô Abre Alas", de Chiquinha Gonzaga, a primeira composição destinada especialmente às festas de Carnaval.
Na época, a música era divulgada principalmente nos teatros de ópera ou então ao ar livre, em apresentações que exigiam dos cantores uma série de recursos vocais, para evitar que fossem abafados pela massa orquestral ou pelas bandas. A marcha de Chiquinha Gonzaga também refletia essa preocupação, exigindo para a sua interpretação uma voz possante. Por outro lado, a simplicidade da letra e a descontração rítmica permitiam que todos entoassem, nas ruas, a nova marcha, que teve assim uma rápida aceitação popular.
Até às vésperas da Primeira Grande Guerra, o Carnaval ainda não ganhara o ritmo capaz de lhe conferir um denominador musical comum. Porém, a partir de 1917, quando Ernesto dos Santos, o Donga, gravou em disco a música "Pelo Telefone", o primeiro "samba autêntico" (cujo rótulo, entretanto, classificava-o como marcha carnavalesca), as músicas nitidamente brasileiras popularizaram-se rapidamente.
Durante a República Velha, davam seus primeiros passos musicais Alfredo Viana Filho - Pixinguinha -, Noel Rosa e Ari Barroso, que no período seguinte (Segunda República) seriam os responsáveis pela época de ouro da música popular brasileira.
O Teatro
No final do século XIX e início do século XX, o teatro no Brasil não passava de uma imitação dos modelos europeus.
Nesse panorama surgiu Artur Azevedo, que reagiu contra o teatro da época através de sátiras musicais, nas quais apontava e analisava problemas sociais. Autor de quase duzentas peças, Artur Azevedo encerrou um ciclo do teatro brasileiro, iniciado com as comédias de Martins Pena. Duas de suas peças, O Mambembe e A Capital Federal, são consideradas obras-primas da literatura dramática nacional.
Com a Grande Guerra interrompendo o contato com os centros culturais europeus, surgiram as companhias teatrais brasileiras, encenando peças que valorizavam a vida do campo - seus homens são fortes e sadios, em oposição à vida nas cidades - ou que retratavam o conflito entre a "nascente" classe média e os latifundiários, o Brasil era valorizado como o melhor país do mundo.
Foi nesse período que apareceram três atores do teatro brasileiro: Procópio Ferreira, Apolônia Pinto e Leopoldo Fróes. Os autores mais encenados foram: Cláudio de Sousa (Flores de Sombra), Gastão Tojeiro (Onde Canta o Sabiá) e Armando Gonzaga (Cala a Boca Ete1vina).
No entanto, o espetáculo teatral continuava sendo, basicamente, um roteiro sobre o qual as "estrelas" improvisavam. O teatro brasileiro era um teatro de ator, não existindo a idéia de um diretor que coordenasse o espetáculo, respeitando as idéias do autor.
Em 1927, Eugênia e Álvaro Moreyra fundaram, no Rio de Janeiro, o Teatro de Brinquedo, que estreou com a peça "Adão, Eva e Outros Membros da Família". Foi uma tentativa de trazer para o teatro brasileiro as proposições estéticas da Semana de Arte Moderna.
O Cinema
Em 1896, os jornais do Rio de Janeiro noticiavam a chegada do primeiro aparelho de projeção ao País - o omniógrapho, numa sala da Rua do Ouvidor -, que exibia "vistas naturais". Como o grande sucesso do novo invento (Irmãos Lumière) exigia a renovação constante dos programas, o proprietário do salão da Rua do Ouvidor, Pascoal Segreto, enviava periodicamente emissário a Paris ou Nova York, a fim de obter novas 'vistas' e aparelhos mais modernos. Retornando de uma dessas viagens, Afonso Segreto, irmão de Pascoal, filmou algumas cenas da Baía de Guanabara, a bordo do navio francês Brésil. Esta data, 19 de junho de 1898, marca o início das primeiras cenas filmadas no Brasil.
Até 1907, a produção cinematográfica brasileira resumia-se às "vistas naturais". Somente a partir do ano seguinte começaram a surgir filmes de enredo, ou "filmes posados". O primeiro filme de ficção realizado no Brasil (1908) foi Nhô Anastácio Chegou de Viagem, um curta-metragem que contava as aventuras de um caipira no Brasil. Vinte dias após a sua exibição, foi apresentado ao público o filme Os Estranguladores, baseado num crime ocorrido no Rio de Janeiro e produzido pela firma Photo Cinematographia Brasileira, de Antônio Leal e José Labanca. O sucesso desse filme fez surgir outros que relatavam a crônica policial da época: Noivado de Sangue ou Tragédia Paulista, Um Drama na Tijuca, A Mala Sinistra.
De 1914 a 1918, mais de doze firmas produtoras foram criadas em São Paulo e Minas Gerais. Nesse período, vários técnicos em direção teatral e em cinegrafia chegaram ao Brasil, fugindo do conflito europeu. Em 1915, Paulo Benedetti montou o primeiro laboratório profissional do País e lançou o primeiro filme sonoro brasileiro. A partir de 1918, ocorreu um surto de filmes inspirados na literatura brasileira e na participação do Brasil na Grande Guerra.
Na década de 20, aumentou a produção de filmes, agora com sensível melhora na qualidade; importante, neste último aspecto, foi a atuação de Pedro de Lima e Adhemar Gonzaga, que através da revista Cinearte procuravam orientar o trabalho dos vários grupos que atuavam no campo cinematográfico.
Na época, Cristóvão Guilherme Auler e Frederico Serrador, concorrentes de Leal e Labanca, realizaram filmes "cantantes" e "falantes", isto é, filmes cujas cenas eram acompanhadas, na hora da projeção, pela voz de artistas escondidos atrás da tela. Além de filmarem operetas, produziam também o "filme-revista", inspirado na tradição teatral das "revistas de fim de ano" que satirizavam os principais acontecimentos políticos do ano. O maior sucesso artístico-financeiro da época foi o filme Paz e Amor, escrito por José do Patrocínio Filho, filmado por Alberto Botelho e produzido por Guilherme Auler. Outro grande sucesso foi a película O Crime dos Banhados, um longa-metragem que contava o massacre de toda uma família do Rio Grande do Sul, em conseqüência de lutas políticas recentes à época.
A Imprensa
O Estado de S. Paulo, dirigido por Júlio de Mesquita, foi o grande órgão político na capital paulista, onde se desenvolviam mais rapidamente as atividades industriais e burocráticas. Em 1907, o jornal tinha tiragens diárias de 35 mil exemplares, com 16 a 20 páginas, tendo como colaboradores, entre outros, Coelho Neto e Euclides da Cunha.
Em 16 de maio de 1906, começava a circular, em São Paulo, A Gazeta, dirigida inicialmente por Adolfo Araújo e, a partir de 1918, por Cásper Líbero.
A imprensa estrangeira de São Paulo, cidade de imigrantes, particularmente italianos, foi reforçada com o aparecimento, em 1908, de II Picolo.
Um exemplo que caracteriza o engajamento político da imprensa na época foi o da Campanha Civilista de 1909; a imprensa dividiu-se: tomaram posição em favor de Hermes da Fonseca o Jornal do Brasil, O País e O Malho; ao lado da candidatura de Rui Barbosa, ficaram o Correio da Manhã, O Estado de S. Paulo e Careta.
As revistas (na maior parte humorísticas) mais famosas da época eram O Malho (1902), O Tico-Tico (1905), Fon-Fon (1907) e Careta (1908).
Dentre os jornais estrangeiros publicados em São Paulo, destacou-se o italiano Fanfulla.
A Propaganda
Na primeira década do século XX, apareceram as primeiras revistas semanais ilustradas. Nelas, os pequenos classificados do século anterior foram substituídos pelos anúncios de página inteira impressa em até sete cores.
As figuras do governo, parlamentares e até mesmo personalidades ilustres e internacionais passaram a ser explorados pela propaganda, através de caricaturas e de diálogos que davam a aparência de testemunhos; os versos reforçavam o tom de glosa, com humor e uma certa alegria extremamente liberal.
Imagine um presidente da República fazendo referências elogiosas aos artigos de uma loja ou posando com seus ministros diante de um bazar, todos vestidos de quimonos, dizendo que acabaram de fazer compras fabulosas. Foi o que aconteceu com Afonso Pena em 1909, nas páginas da revista Fon-Fon.
O Barão do Rio Branco, ministro das Relações Exteriores, apareceu em um anúncio tendo a seu lado um menino que lhe perguntava: "Seo Barão, o que devo fazer para ficar forte e bonito como o senhor?" Respondia Rio Branco: "Deves te alimentar com o milagroso Manah, que, além de ser atualmente a salvação das crianças, ainda oferece um prêmio de $500.000".
Há muitos outros exemplos utilizando-se das personalidades mais em voga de cada fase. Como o desta frase de um quadrinho famoso, atribuída a Olavo Bilac: "Aviso a quem é fumante / Tanto o Príncipe de Gales como o Dr. Campos Salles / Usa Fósforo Brilhante".
Em 1914, instalou-se em São Paulo a primeira agência de publicidade do Brasil: A Eclética, que em 1918 abriu uma filial no Rio de Janeiro, a qual acumulava também as funções de representante do jornal O Estado de S. Paulo. Mais tarde surgiram agências publicitárias norte-americanas, como a Thompson e a Ayer, desenvolvendo e atualizando a publicidade de estradas e melhorando o acabamento gráfico dos anúncios.
Nessa época, os anúncios de moda apareciam em páginas em cores. A Nestlé vendia sua Farinha Láctea em três palavras: "Força, Vigor, Robustez". A Colgate-Palmolive promovia o Extract Vision de Fleurs como sendo um perfume "agradável, persistente e delicioso"; o Colgate's Baby Talc Powder era "indispensável na toalete das crianças". Anúncios de remédios eram constantes, como por exemplo os da Adalina, Bayaspirina, Instantina, Rapé Medicinal Oxau, Mitigau e Tônico Bayer.
É importante salientar o aparecimento do personagem "Jeca Tatu", de Monteiro Lobato, que nos anúncios do Biotônico Fontoura, Ankilostomina e Maleitosan foi chamado de Jeca-Tatuzinho. Era a história de "um pobre caboclo que morava no mato, numa casinha de sapé. Vivia na maior pobreza em companhia da mulher, muito magra e feia e de vários filhinhos pálidos e tristes. Quando a família bebeu os produtos do Laboratório Fontoura, todos se tomaram saudáveis, fortes, felizes e até melhoraram seu padrão de vida". As histórias de Jeca- Tatuzinho tomaram-se extremamente populares. Seu autor, Monteiro Lobato, aproveitava para, além de anunciar o produto, também ensinar alguns princípios básicos de higiene, como por exemplo, escovar os dentes etc. Vendiam, ensinando. Atualmente, nos Laboratórios Fontoura, existe uma sala especial, onde estão os originais, desenhos, aquarelas e layouts para capas de almanaques, feitos por Monteiro Lobato.
6. As Telecomunicações
O Rádio
Marconi, inventor do rádio, teve como precursor um padre brasileiro: o padre Landell de Moura, verdadeiro inventor da válvula de três pólos (ou tríodo), que conseguiu transmitir notas musicais a longa distância, sem fios. em 1893. No entanto, na época, o sacerdote foi acusado por seus contemporâneos de "lunático, louco, bruxo e diabólico", sofrendo inclusive perseguições de seus superiores. Na verdade, há poucos documentos sobre os trabalhos científicos do padre Landell de Moura. Mas esses poucos papéis e anotações são suficientes para comprovar suas idéias no que tange ao telégrafo sem fio e ao rádio. Já em 1894, ele fazia experiências na Avenida Paulista, transmitindo suas mensagens para outra estação no Morro de Santana. Em 1901, viajou para os Estados Unidos e lá patenteou seus inventos no U.S. Patent Office, onde se encontram até hoje suas patentes de números 771.917 (transmissor de ondas), 775.337 (modelo original de telégrafo sem fio) e 775.846 (telefone sem fio).
Oficialmente, o rádio nasceu no Brasil no dia do centenário da Independência, no Rio de Janeiro. Aos 7 de setembro de 1922 havia o grande desfile no Campo de São Cristóvão. O discurso do Presidente Epitácio Pessoa foi ouvido no recinto da Exposição do Centenário, em Niterói, Petrópolis e em São Paulo, graças à instalação de uma estação transmissora no Corcovado. O serviço fora feito pela Rio de Janeiro and São Paulo Telephone Company, pela Westinghouse Internacional Company e pela Western Electric Company.
À noite, no recinto da Exposição, em frente ao posto de "Telephone Público", por meio do "telephone-alto-falante", a multidão teve uma sensação inédita. A ópera "O Guarani", de Carlos Gomes, que estava sendo apresentada no Teatro Municipal, "foi ali, distintamente ouvida, bem como os aplausos aos artistas", como descreveu o jornal "A Noite do dia 9 de setembro de 1922".
Essa transmissão pioneira foi o coroamento dos esforços de homens como Roquete Pinto, que liderou o movimento para a instalação da primeira estação de Rádio do Brasil: a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro, com estações transmissoras no Corcovado e na Praia Vermelha. A emissora foi inaugurada no dia 20 de abril de 1923.
A primeira emissora paulista nasceu em 1924: a Rádio Educadora Paulista, cujo presidente-fundador foi Steidel. Ainda naquele ano, foi fundada no Recife a Rádio Clube de Pernambuco, graças à iniciativa dos irmãos Moreira Pinto.
A CRISE DA REPÚBLICA VELHA
1. Introdução
Durante a Primeira Guerra Mundial, a economia brasileira alcançou um relativo grau de diversificação; desse modo, a estrutura da sociedade diferenciou-se, desenvolvendo as camadas sociais urbanas: classe média e operariado. A classe média era a mais prejudicada pelas medidas defensivas da economia cafeeira, pois as contínuas desvalorizações cambiais, ao encarecerem os produtos importados, atingiam diretamente suas possibilidades de consumo.
A estrutura política da República Velha, como vimos, foi marcada pela dominação das oligarquias agrárias lideradas pelo setor cafeeiro e a corrupção eleitoral excluía, os grupos urbanos de qualquer representação. Foram, na década de 1920, as camadas médias urbanas e o proletariado que mais pressionaram por uma abertura política, questionando o poder da velha oligarquia do café-com-leite.
2. O Tenentismo
Características
Dessa forma, a década de 1920 foi marcada por agudas tensões políticas e sociais. Descontente com o aumento do custo de vida, o povo reclamava voto direto e secreto, eleições controladas pelo Poder Judiciário; em suma, a "verdade eleitoral".
No âmbito militar, ocorria um forte descontentamento em certos setores do Exército. A alta oficialidade freqüentemente se chocava com os grupos dominantes, como durante o governo de Epitácio Pessoa, ao apoiar o candidato oposicionista Nilo Peçanha contra a candidatura oficial de Artur Bernardes.
Paralelamente, os oficiais jovens formavam um movimento que predominou a partir de 1922: o Tenentismo.
O Tenentismo representou, dentro do Exército, uma cisão entre os oficiais mais graduados, que após suas desavenças com Epitácio Pessoa haviam se acomodado no governo de Artur Bernardes, e os jovens oficiais que pretendiam mudanças políticas e sociais.
Do ponto de vista ideológico, o movimento tinha, até 1930, as seguintes características:
Ideal de Salvação Nacional - Os tenentes viam-se como agentes da regeneração, defensores das instituições republicanas, em nome de um povo ignorante e infeliz.
Elitismo - A insurreição caberia a um grupo, e não ao povo, despreparado e incapaz. Os tenentes, contraditoriamente, defendiam a "verdade eleitoral", mas entendiam que as camadas populares votavam mal, e que seria mais razoável substituir o voto universal pelo voto de uma "elite eleitoral".
Reformas - Centralização dos poderes do Estado, moralização, nacionalismo econômico, novo sistema de ensino.
Os participantes
Alguns tenentes pertenciam à classe média, outros vinham de farm1ias tradicionais. Levar em conta sua origem social é importante, mas não basta para explicar o movimento. É preciso considerar também o fato de os tenentes pertencerem às Forças Armadas, uma instituição peculiar da sociedade, o que dava ao movimento a característica do "ideal de salvação nacional" e a possibilidade de utilização da via armada para atingir seus objetivos.
Dentre os principais componentes do movimento, podemos citar: Luís Carlos Prestes, Joaquim e Juarez Távora, Isidoro Dias Lopes, Eduardo Gomes, Siqueira Campos, João Cabanas e Miguel Costa.
As etapas do Tenentismo
Os "18 do Forte" de Copacabana, 1922
A sucessão presidencial em 1922 provocara uma cisão interna no Exército. Parte da alta oficialidade apoiava Nilo Peçanha em oposição ao candidato oficial, Artur Bernardes. Mesmo encerradas as eleições, que, é claro, deram vitória a este último, a agitação continuava. Hermes da Fonseca, então presidente do Clube Militar e anteriormente envolvido no episódio das Cartas Falsas, incitou as guarnições de Pernambuco a não obedecerem a Epitácio Pessoa.
Repreendido pelo ministro da Guerra, o civil Pandiá Calógeras, Hermes confirmou a incitação e não aceitou a repreensão. Foi, então, preso e o Clube Militar fechado por seis meses, o que agravou a tensão. Em 5 de julho de 1922, dezoito elementos jovens do Forte de Copacabana rebelaram-se contra o governo. Da luta que se seguiu, restaram apenas dois sobreviventes: Eduardo Gomes e Siqueira Campos.
A Revolução de 1924 - São Paulo
Desde o célebre episódio das Cartas Falsas, as quais lhe haviam sido atribuídas antes mesmo de sua eleição para a Presidência da República, Artur Bernardes despertara a animosidade de numerosos oficiais do Exército, sobretudo entre os mais jovens. Na qualidade de representante típico da República das Oligarquias o presidente era um alvo natural para os ataques dos tenentes. Quanto aos oficiais-generais, porém, a maioria o apoiava, pois eram militares perfeitamente identificados com o sistema, ao qual serviam e do qual recebiam benefícios.
A Revolução de 1924 foi um movimento de cunho essencialmente tenentista, embora seu chefe fosse o general Isidoro Dias Lopes (daí a denominação popular de Revolta do Isidoro). O levante irrompeu em São Paulo no dia 5 de julho de 1924, exatamente dois anos após a revolta dos 18 do Forte. O presidente do Estado, Carlos de Campos, resistiu aos revolucionários, apoiado em algumas unidades da Força Pública até a chegada de tropas federais. Aumentando a pressão governista, os revolucionários decidiram retirar-se da cidade, após 22 dias de ocupação. A retirada ocorreu em boa ordem, em direção ao interior do Estado de São Paulo, e depois para o oeste do Paraná. Nas proximidades da foz do Iguaçu, em abril de 1925, a coluna paulista efetuou sua junção com outra coluna revolucionária que, sob a chefia do capitão Luís Carlos Prestes, vinha do Rio Grande do Sul.
A Coluna Prestes - 1924/1927
Assim se chamou a coluna que, sob o comando de Miguel Costa e tendo Luís Carlos Prestes como chefe de Estado-maior, percorreu mais de 24.000 km (somando-se os itinerários de seus quatro destacamentos) pelo interior brasileiro. A marcha da Coluna Prestes representou o momento máximo do Movimento Tenentista, com seu objetivo de conscientizar a população do País e incitá-la contra as estruturas políticas vigentes.
Militarmente, a Coluna Prestes pode ser considerada um sucesso. Com efetivos que jamais ultrapassaram 1.500 homens (as perdas geralmente eram compensadas por novas adesões) e sempre prejudicados pela insuficiência de munições, os revolucionários conseguiram evitar o cerco e a captura por parte das forças, numericamente superiores, que os perseguiam. Ao todo, a Coluna Prestes travou 53 combates, sem ter sido derrotada em nenhum deles.
Politicamente, porém, a Coluna fracassou. O povo, de um modo geral, permaneceu apático (exceto certos elementos da classe média e membros de oligarquias dissidentes), quando não, hostil ao movimento. Os "coronéis", com suas forças irregulares, deram um importante apoio às unidades do Exército que lutavam contra a Coluna. Até mesmo cangaceiros, como o célebre Lampião, foram mobilizados contra os rebeldes.
Em fevereiro de 1927, já no governo de Washington Luís, os últimos remanescentes da Coluna Prestes (cerca de 800 homens) internaram-se na Bolívia. O Tenentismo provara, definitivamente, sua incapacidade em conquistar o poder apenas com seus recursos.
A Revolução de 1930 e a Era de Vargas (1930 – 1945)
A REVOLUÇÃO DE 1930
1. Introdução
No fim da década de 1920, os setores que contestavam as instituições da República Velha não tinham possibilidade de êxito: os tenentes, após vários insucessos, estavam marginalizados ou no exI1io; as classes médias urbanas não tinham autonomia para se organizar. Todavia, uma oportunidade abrir-se-ia para esses setores: uma nova divergência entre as oligarquias regionais e o golpe sofrido pelo setor cafeeiro com a crise mundial de 1929.
2. Fatores da Revolução de 1930
• A dissidência regional: a indicação de Júlio Prestes pelo presidente Washington Luís como candidato do governo à Presidência na eleição de 1930, ao que parece, para que sua política de estabilização financeira não fosse interrompida, não foi aceita por Antônio Carlos Ribeiro de Andrade, presidente do Estado de Minas Gerais. Rompia-se a Política do Café-com-Leite.
Antônio Carlos, a fim de enfrentar o governo federal, realizou uma aliança com o Rio Grande do Sul e a Paraíba. No Rio Grande do Sul, o Partido Republicano e o Partido Libertador tinham chegado a um relativo acordo, o que fortalecia o Estado no plano nacional. Ao Rio Grande do Sul foi oferecida a candidatura à Presidência, e à Paraíba, a candidatura à Vice-Presidência. Juntaram-se a eles o Partido Democrático de São Paulo e outras oposições dos Estados, dando origem a uma coligação denominada Aliança Liberal (1929). Dela faziam parte velhos políticos como Borges de Medeiros e Antônio Carlos Ribeiro de Andrade, e os ex-presidentes Epitácio Pessoa, Artur Bernardes e Venceslau Brás. Foram lançadas as candidaturas de Getúlio Vargas para presidente e de João Pessoa para vice.
O programa da Aliança Liberal satisfazia as aspirações dos setores opostos ao cafeeiro, ao proclamar que todos os produtos nacionais deveriam ser incentivados, e não somente o café, cujas valorizações prejudicavam financeiramente o País. Outrossim, pretendendo sensibilizar as classes médias urbanas, o programa defendia as liberdades individuais, o voto secreto, a participação do Poder Judiciário no processo eleitoral, leis trabalhistas e anistia política.
Apesar da grande repercussão de sua campanha nos centros urbanos, os candidatos da Aliança Liberal foram derrotados, pois a grande maioria dos Estados alinhava-se com o presidente Washington Luís.
• A crise de 1929: embora seja certo que a crise mundial repercutiu com mais intensidade no Brasil em 1931, é preciso considerar que seus efeitos iniciais já abalavam o setor cafeeiro. Esse fato foi percebido pelos adversários da oligarquia cafeicultora, que nele viram uma oportunidade de derrubá-la.
Por outro lado, o setor cafeeiro e o governo federal estavam distanciados por este ter recusado auxílio no início da crise. Os grupos dominantes de São Paulo, embora tivessem marchado com a candidatura de Júlio Prestes, não estavam dispostos a uma luta armada.
3. O movimento
Com a derrota eleitoral, os velhos políticos da Aliança Liberal - como Borges de Medeiros - pretenderam compor-se com os vitoriosos, como geralmente acontecia na República Velha. Mas existia na Aliança uma ala de políticos jovens (Maurício Cardoso, Osvaldo Aranha, Lindolfo Collor, João Neves, Flores da Cunha, Virgílio de Melo Franco e Francisco Campos) que não se conformava com uma situação na qual sua ascensão política permanecia dependente. Portanto, optaram eles pela via armada e, para isso, aproximaram-se dos tenentes, como Juarez Távora, Ricardo Hall e João Alberto.
A conspiração sofreu várias oscilações por causa da posição conciliatória dos velhos oligarcas da Aliança Liberal, inclusive do próprio Getúlio Vargas, o que provocou seu esfriamento. Porém, foi alentada pela "degola" de deputados federais eleitos por Minas Gerais e Paraíba (maio de 1930), quebrando a Política dos Governadores e pelo assassinato de João Pessoa (julho de 1930) em Recife, por motivos ligados a problemas locais, mas explorado politicamente pelos conspiradores, e pela adesão do gaúcho Borges de Medeiros, em agosto do mesmo ano.
Os tenentes foram aproveitados por sua experiência revolucionária, mas a chefia militar coube ao tenente-coronel Góis Monteiro, elemento de confiança dos políticos gaúchos.
No dia 3 de outubro eclodiu a revolta no Rio Grande do Sul, e no dia seguinte, sob a chefia de Juarez Távora, no Nordeste. Dela participavam tropas das milícias estaduais e forças arregirnentadas por "coronéis". Das tropas do Exército, várias aderiram ao movimento, algumas mantiveram-se neutras, e poucas resistiram. Em vários Estados os governantes puseram-se em fuga. Quando se esperava um choque de grandes proporções entre as tropas que vinham do Sul e as de São Paulo, o presidente Washington Luís foi deposto, no dia 24, por um grupo de altos oficiais das Forças Armadas, que tinham a intenção de exercer um papel moderador. Formou-se uma Junta Governativa Provisória, intitulada Junta Pacificadora, integrada pelos generais Mena Barreto e Tasso Fragoso, e pelo almirante Isaías Noronha.
Após algumas hesitações, a Junta passou o poder para Getúlio Vargas no dia 3 de novembro.
4. Conclusão
Em 1930, a crise que se configurara ao longo da década atingiu sua culminância: as oligarquias regionais dissidentes optavam pela luta armada, o descontentamento militar ganhava novo alento, as classes médias urbanas, insatisfeitas, constituíam um amplo setor de apoio. Nesse momento, o setor cafeeiro era atingido pelos primeiros efeitos da Crise de 1929 e se distanciava do Governo Federal. Daí a possibilidade de vitória de uma revolução.
Portanto, um fator externo - a Crise Mundial de 1929 - combinou-se com o agravamento de contradições internas.
O setor cafeeiro continuou representando o papel fundamental na economia do País, mas, com a derrota, perdeu a hegemonia política.
A Revolução levou a uma nova composição de equilíbrio entre setores da classe dominante. Não houve uma ruptura no processo histórico, e sim apenas uma acomodação de interesses e uma atualização de instituições.
A ERA DE VARGAS (1930-1945)
1. Introdução
A mudança de liderança política resultante da ascensão de Vargas à Presidência tomou-se conhecida como a Revolução de 1930. O movimento tinha dois objetivos. Em primeiro lugar, pôr fim à estrutura republicana criada a partir de 1889. Por outro lado, modernizar o aparelho governamental para atender às necessidades criadas pelo crescimento do País.
A Revolução de 1930 pôs fim à hegemonia da burguesia do café. O episódio revolucionário representava a necessidade de reajustar a estrutura do País, cujo funcionamento, voltado essencialmente para um único gênero de exportação, tomava-se extremamente precário.
O agravamento das tensões no curso da década de 1920, as peripécias eleitorais de 1930 e os primeiros efeitos da crise econômica mundial propiciaram a criação de uma frente difusa e heterogênea, cujo único denominador comum era a derrubada da velha República Oligárquica.
A classe dirigente paulista - onde o setor cafeeiro era predominante - perdia a hegemonia política com a Revolução de 1930. Daí para a frente - como tendência - São Paulo ampliaria sua importância econômica, mas a representação política fugiria de suas mãos.
O "tenentismo" - que desde 1922 se apresentara como sintoma das transformações estruturais da sociedade brasileira, conseguindo catalisar os descontentamentos de vários grupos nacionais - a partir de 1930 perde sua força autônoma. Derrubadas as velhas instituições, é para a figura de Getúlio Vargas que se voltam as esperanças, esvaziando a imagem dos tenentes. Individualmente, com raras exceções, os tenentes foram atraídos para a órbita do Poder Central, onde sua ação e influência têm papel significativo mas subordinado.
O novo governo revelou a disposição de centralizar progressivamente em suas mãos tanto as decisões econômico-financeiras como as de natureza política, mostrando-se inovador mais na forma que no conteúdo.
É importante frisar que a Revolução de 30 e o Governo de Vargas levaram a uma acomodação, um rearranjo no próprio seio de oligarquia dominante, sem, contudo, destruir o poder deste grupo. Testemunha disso foi, como veremos, a política de proteção ao café.
2. O governo provisório
"Assumo provisoriamente o governo da República, como delegado da Revolução, em nome do Exército, da Marinha e do Povo". Com estas palavras, Vargas recebia da Junta Governativa Provisória, em 3 de novembro de 1930, a chefia do Governo Provisório da República. Contudo, jamais um provisório foi tão permanente, pois uma vez no poder, Vargas iria permanecer por quinze anos à frente dos destinos do País.
A organização política
Em 11 de novembro de 1930, por força da Lei Orgânica que conferia plenos poderes a Vargas, era declarada suspensa a Constituição de 1891 e dissolvidos todos os órgãos legislativos: Congresso Nacional, Assembléias Legislativas Estaduais e Câmaras Municipais, pois "a Revolução não reconhece direitos adquiridos". Assim, Vargas tinha o direito de exercer não apenas o Poder Executivo, mas também o Legislativo, "até que uma Assembléia Constituinte, eleita, estabeleça a reorganização constitucional do País". Da mesma forma, todos os antigos governadores, com exceção do novo governador eleito de Minas Gerais, foram demitidos e em seu lugar nomeados interventores federais. Os interventores, escolhidos entre os tenentes, recebiam plenos poderes e eram diretamente responsáveis perante o Governo Provisório. O Código dos Interventores (agosto de 1931) limitava a área de ação dos Estados, que ficavam proibidos de contrair empréstimos externos sem a autorização do Governo Federal; gastar mais de 10% da despesa ordinária com os serviços da Polícia Militar; dotar as polícias estaduais de artilharia, aviação ou armá-las em proporção superior ao Exército.
O primeiro ministério de Vargas exprimia bem o conjunto de forças diversas que o presidente tinha de manipular: a Osvaldo Aranha, gaúcho e amigo íntimo do presidente, coube o Ministério da Justiça; ao "tenente" Juarez Távora, cearense, foi dado por três semanas o Ministério da Viação e Obras Públicas, que depois foi ocupado pelo paraibano José Américo de Almeida; ao mineiro Francisco Campos, futuro ideólogo do Estado Novo, foi entregue o recém-criado Ministério da Educação e Saúde Pública. Com Lindolfo Collor, gaúcho e protegido de Borges de Medeiros, ficou o novo Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, enquanto a José Maria Withaker, banqueiro e membro do Partido Democrático Paulista, que mantinha boas relações com grupos financeiros internacionais, foi entregue a pasta da Fazenda.
Quanto aos ministérios militares, os tenentes não conseguiram controlá-los, pois estes foram entregues à alta oficialidade do Exército e da Marinha.
A política trabalhista
No plano social destacaram-se, ainda em 1930, a criação do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio (também foi criado o Ministério da Educação e Saúde Pública) e a decretação da Lei dos Dois Terços, chamada vulgarmente de Lei da Nacionalização do Trabalho; diante do desemprego crônico, as empresas de origem estrangeiras eram obrigadas a ter em seus quadros, pelo menos, dois terços de trabalhadores brasileiros natos.
Em 19 de março de 1931, o governo decretou a Lei de Sindicalização, reguladora dos direitos das classes patronais e operárias. De acordo com ela, os estatutos dos sindicatos deveriam, a partir de então, ser aprovados pelo Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, ficando a ele atrelados. Com isso, delineava-se o sentido da política trabalhista de Vargas, rumo ao controle do movimento operário e à criação de condições para o desenvolvimento da indústria, fazendo dessa lei uma mera adaptação da Carta del Lavoro de Mussolini, em que a participação política dos sindicatos era cerceada.
Em 1931, foi apresentado o anteprojeto da Lei do Salário Mínimo, que só se tomaria realidade durante o Estado Novo. Algumas medidas, entretanto, foram implementadas: o trabalho feminino foi regulamentado, assim como trabalho de menores e o trabalho noturno; a carteira profissional foi instituída em março de 1932, para pessoas maiores de 16 anos que exercessem um emprego, tendo valor idêntico à carteira de identidade; a jornada de trabalho foi fixada em 8 horas de serviço diário, com obrigatoriedade de descanso semanal remunerado e o direito das férias anuais, já estabelecido em 1926, mas não cumprido, foi reafirmado com quinze dias úteis sem prejuízo dos vencimentos.
A Revolução Constitucionalista de São Paulo (1932)
Em meio a grande instabilidade, com a sucessão de quatro interventores, em menos de dois anos, São Paulo, que perdera a hegemonia política no plano nacional e a autonomia em virtude da nomeação de interventores, começou a articular os mais diferentes grupos para derrubar Vargas. As reivindicações paulistas iam desde a nomeação de um interventor civil e paulista, passando pela exigência de eleições até a reconstitucionalização imediata do País.
Vargas, por sua vez, procurava "atender" ao desejo dos paulistas, nomeando como interventor em São Paulo o ex-embaixador Pedro de Toledo, um civil e paulista. O atendimento desse pleito, no entanto, não aliviou a tensão e o mal-estar existente entre os paulistas; tampouco adiantaram as medidas que tomara, criando comissões para elaborar o Código Eleitoral e o anteprojeto de Constituição, marcando até a data das eleições para maio de 1933. Para as lideranças de São Paulo, tais atos eram tidos como suspeitos.
Na verdade, a insatisfação dos paulistas devia-se à extensão da crise cafeeira e à política governamental de proteção ao café, que não atendia totalmente aos interesses dos cafeicultores. A insatisfação da elite cafeeira estendeu-se pelo Estado, contagiando os mais variados segmentos da população. Numa atmosfera de entusiasmo, alimentada por marchas militares, criaram-se batalhões e recrutou-se a juventude das escolas, exacerbando o sentimento regionalista de São Paulo, sob a égide do constitucionalismo.
Uma revolução em marcha
No dia 23 de maio de 1932, uma grande manifestação popular investiu contra a sede da Legião de Outubro agremiação política ligada a Getúlio. No tiroteio que então se travou, morreram quatro manifestantes (Martins, Miragaia, Dráusio, Camargo), cujas iniciais serviram para designar o grupo mais extremado do constitucionalismo paulista: MMDC.
Desencadeou-se, então, intensa campanha de agitação contra Vargas, baseada em slogans, como: "Convocação imediata da Constituinte!", "São Paulo conquistado!", "São Paulo dominado por gente estranha!" ou, ainda, "Tudo pela Constituição!"
Em 9 de julho desse mesmo ano irrompia em São Paulo a Revolução Constitucionalista que contava, segundo seus líderes, com o apoio do Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Pernambuco e outros Estados do Nordeste.
São Paulo tomava-se uma praça de guerra: estudantes, profissionais liberais e até trabalhadores se preparavam para a luta; as mulheres, "senhoras da alta sociedade", se ofereciam para seguir para as frentes de batalha; fábricas transformavam-se, do dia para a noite, em produtoras de armas e munições e as patrióticas campanhas, como a do Ouro Para o Bem de São Paulo, procuravam levantar os recursos necessários para a luta.
O núcleo militar dos paulistas estava sob o comando dos generais Bertoldo K1inger e Isidoro Dias Lopes, auxiliados pelo coronel Euclides Figueiredo e era constituído pela tropa da Força Pública do Estado de São Paulo e por tropas federais rebeladas.
Entretanto, foi tudo inútil, pois Vargas fechou as fronteiras paulistas valendo-se de forças policiais, batalhões provisórios e de forças do Exército do Sul e do Norte, sufocando as comunicações e bloqueando as possibilidades de abastecimento. A "grande Revolução" transformou-se numa pequena guerra de trincheiras, que durou apenas três meses.
Nos principais confrontos armados as forças legalistas, comandadas pelo general Góis Monteiro, conseguiram vitórias decisivas; no início de outubro os revolucionários aceitavam os termos da rendição. Os generais K1inger e Isidoro Dias Lopes e os principais responsáveis pelo governo revolucionário de São Paulo se renderam em Cruzeiro, daí seguindo para o Rio de Janeiro como prisioneiros. Euclides Figueiredo não se rendeu; com alguns companheiros fugiu para o Sul num barco de pesca, onde foi capturado pela Marinha e em seguida exilado em Portugal, juntamente com Artur Bernardes, Júlio de Mesquita Filho, Bertoldo K1inger e Pedro de Toledo. A pacificação completou-se quando Armando de Sales de Oliveira (civil e paulista), diretor do jornal "O Estado de S. Paulo", foi nomeado interventor federal em São Paulo, em cuja administração foi criada a Universidade de São Paulo (25/01/1934).
Costuma se dizer que, não obstante a derrota dos paulistas, o espírito da Revolução de 1932 prevaleceu, obtendo em 1934 a almejada Constituição.
Na verdade, a Revolução Constitucionalista de São Paulo não foi a explosão do sentimento liberal pelo Estado de Direito. Foi um ato deliberado e calculado da velha oligarquia visando à retomada do poder, do qual havia sido desalojada em 1930.
3. O Governo Constitucional (1934-1937)
A Assembléia Constituinte
As eleições para a Assembléia Constituinte foram realizadas, conforme programado, a 3 de maio de 1933. Uma novidade no tradicional método de representação era a inclusão de 40 deputados classistas (representantes eleitos pelos sindicatos profissionais) ao lado dos 214 deputados estaduais eleitos diretamente pelo povo.
A Assembléia Constituinte foi transformada na primeira Câmara de Deputados com poderes para eleger pelo voto indireto o presidente da República.
Instalada a 15 de novembro de 1933, sob a presidência de Antônio Carlos Ribeiro de Andrade, a Assembléia Constituinte discutiu o anteprojeto elaborado por Góis Monteiro, Osvaldo Aranha e João Mangabeira, aprovando-o em 16 de julho de 1934.
No dia seguinte, 17 de julho, foram realizadas as eleições para a escolha do presidente da República. Getúlio Vargas foi eleito por 175 votos, enquanto os outros candidatos, Borges de Medeiros (59 votos), Góis Monteiro (4 votos) e mais 8 outros nomes receberam um voto cada.
No dia 20 de julho, Vargas foi à Assembléia sendo recebido com aplausos e pétalas de rosas. Prometeu publicamente defender a nova Constituição, mas não refletiu sua opinião sobre o documento. Vargas deveria exercer seu mandato presidencial até 3 de maio de 1938.
A polarização ideológica
Quando, em julho de 1934, Vargas foi eleito presidente pelo Congresso, a situação estava longe de estabilizar-se. As lutas regionais ainda prosseguiam. Havia ameaças, de esquerda e de direita, ao regime. As próprias Forças Armadas estavam divididas.
O Estado definira uma política conservadora em relação aos operários e às camadas rurais, o que tranqüilizou os velhos grupos dominantes, especialmente os de São Paulo. Embora a política trabalhista de Vargas houvesse, de início, alarmado esses setores, acabou, por final, a acalmá-los, pois nem sequer tocou no problema da propriedade rural.
O modelo político instituído em 1934 seria transitório. A tendência centralizadora esboçada em 1930 se afirmaria rapidamente, frente às radicalizações ideológicas de direita e de esquerda.
O chamado período constitucional de Vargas (1934 a 1937) foi marcado pelo aparecimento de duas forças ideológicas no Brasil: a Aliança Nacional Libertadora (ALN) de tendências esquerdizantes e a Ação Integralista Brasileira (AIB) de caráter fascista. Enquanto isso, a política de Vargas vai se mostrando cada vez mais centralizadora e autoritária, até o desfecho final em novembro de 1937, quando Vargas implantou a ditadura do Estado Novo.
A Ação Integralista Brasileira
Liderada pelo jornalista Plínio Salgado, a Ação Integralista Brasileira era fundamentalmente um movimento social e político de orientação fascista e reivindicava um governo ditatorial com um partido único e um chefe único.
As paradas de "camisas-verdes" (integralistas) eram um espetáculo comum. Por toda parte, viam-se integralistas cumprimentando-se no seu estilo habitual: com o braço direito erguido e a saudação indígena "Anauê". Crescia cada vez mais o número dos que juravam lealdade a Plínio e a seu lema "Deus, Pátria e Farrníla".
Os integra1istas tinham esperança de que um dia o Brasil tivesse um único partido nacional - o seu - e que, a partir desse dia, não haveria mais eleições diretas.
A AIB pretendia estabelecer o Estado totalitário ou integral estruturado mediante as corporações, representativas das profissões, em uma rígida hierarquia sob o controle do Chefe, subordinando todos os elementos à construção do ideal de nação identificada com o próprio Estado.
A AIB era apoiada por muitos representantes das Forças Armadas e sobretudo pela Igreja Católica.
A Aliança Nacional Libertadora (ANL)
Uma tradição oral que vem do Estado Novo identifica a Aliança Nacional Libertadora, fundada em março de 1935, com o Partido Comunista. Há aí uma simplificação. Na verdade, a ANL correspondeu ao encontro de algumas correntes ideológicas que até então haviam seguido caminhos independentes e mesmo opostos: tenentismo esquerdizante, socialistas, comunistas e outros.
As reivindicações básicas da ANL eram:
1) suspensão definitiva do pagamento das dívidas externas "imperialistas" do Brasil;
2) nacionalização de todas as empresas estrangeiras;
3) proteção aos pequenos e médios proprietários e lavradores; entrega das terras dos grandes proprietários aos camponeses e trabalhadores rurais que as cultivam;
4) gozo das mais amplas liberdades populares pelo povo brasileiro;
5) constituição de um governo popular.
No dia 5 de julho de 1935, aniversário das revoltas de 1922 e 1924, Luís Carlos Prestes, líder da ANL, pronunciou violento discurso denunciando o fracasso de Vargas ante os ideais de 1922. O discurso terminou com o grito:
"Abaixo o governo odioso de Vargas! Abaixo o fascismo! Por um governo popular nacional revolucionário! Todo o poder à Aliança Nacional Libertadora!"
A reação governamental foi imediata. O chefe de Polícia do Rio de Janeiro, Filinto Müller, revelou em seu relatório ao ministro da Justiça as ligações da ANL com os grupos comunistas internacionais.
A 12 de julho, com base na Lei de Segurança Nacional, recém-decretada, determinou-se o fechamento da sede da ANL por seis meses e muitos de seus líderes foram presos.
Enquanto isso, outros membros da ANL conduzidos por Prestes, secretamente conspiravam a revolta que redundaria na Intentona Comunista.
4. O Estado Novo (1937-1945)
Por sucessivas prorrogações da Câmara dos Deputados, o Brasil viveu em estado de emergência, logo equiparado a estado de guerra, de novembro de 1935 a junho de 1937. A criação de um clima de tensão justificava os pedidos. O estado de sítio, inicialmente foi concedido por 30 dias; antes de seu término o governo pediu prorrogação de 90 dias e a autorização para equiparação a estado de guerra. Isso se devia ao exagero e à amplificação da ameaça comunista. Em 1936, enquanto prosseguia a "caça aos comunistas", os políticos preparavam-se para a eleição presidencial marcada para 3 de janeiro de 1938. Em meados de 1937 já estavam definidos os candidatos. Armando de Sales Oliveira, governador de São Paulo, autêntico porta-voz do constitucionalismo liberal, era apoiado pela União Democrática Brasileira. Outra candidatura era a de José Américo de Almeida, um antigo tenentista, romancista e político da Paraíba. Era, de modo geral, considerado candidato do governo, apesar de Getúlio não se pronunciar sobre o assunto.
Os integralistas, em junho de 1937, apresentaram a candidatura de seu líder, Plínio Salgado. Desenvolveram intensa propaganda, pela imprensa e pelo rádio, onde se propunham a salvar a democracia por meio da autoridade integralista. Afirmando que se inspirava em Cristo, Plínio Salgado declarava: "Por Cristo quero um grande Brasil! Por Cristo vos conduzo! Por Cristo batalharei".
A impressão era de que Getúlio havia perdido o controle da situação e era obrigado a "engolir" essas candidaturas. No Palácio do Catete, porém, a conspiração avançava. No dia 30 de setembro, os jornais e estações de rádio de todo O País alarmaram o povo com informações sobre a descoberta do Plano Cohen. O texto do documento encheu as páginas dos jornais, acompanhado pela mensagem do ministro da Guerra: a visão da tomada violenta do poder pelos comunistas, em que as igrejas seriam queimadas e centenas de pessoas massacradas, apavoravam a população.
As versões sobre a origem do Plano Cohen são as mais variadas. Segundo o historiador John W. Foster Dulles, "um capitão integralista (Olímpio Mourão Filho) tinha sido encontrado datilografando um Plano Comunista no gabinete de um oficial do Estado-Maior (Góis Monteiro)".
Durante o mês de outubro, os preparativos para o golpe arquitetado pela cúpula governamental foram acelerados. O mineiro Francisco Campos preparava já algum tempo, o esboço de uma nova Constituição. O general Eurico Gaspar Dutra persuadia o Alto-Comando das Forças Armadas a assinar uma declaração de apoio à mudança de regime. O deputado Negrão de Lima foi enviado com a missão de convencer os Estados indecisos a apoiarem medidas federais mais fortes. Os integralistas organizaram um impressionante desfile de 50.000 "camisas-verdes" para "afirmar sua solidariedade com o presidente da República e com as Forças Armadas, na luta contra comunismo e a democracia anárquica e para proclamar os princípios de um novo regime." O discurso que Plínio Salgado proferiu nessa ocasião marcou sua retirada da competição pela Presidência: "Desejo ser não o presidente da República, mas simplesmente o conselheiro d meu País."
Tudo estava pronto.
Na madrugada chuvosa de 10 de novembro de 1937, as portas do Senado e da Câmara dos Deputados estavam fechadas e guardadas por soldados, que impediram a entrada dos legisladores.
Não houve muitos protestos. Oitenta congressistas federais enviaram congratulações a Vargas. Somente seis expediram mensagem de protestos. Um dos poucos militares que se opôs ao golpe foi o coronel Eduardo Gomes; outros opositores foram Júlio de Mesquita Filho e Armando de Sales Oliveira.
Nesta mesma manhã entrou em vigor a Constituição de 1937.
À noite Vargas falou à Nação pelo rádio, do Palácio a Guanabara, anunciando e justificando o novo regime.
O golpe fora dado, o Estado Novo estava instaurado.
A organização política do Estado Novo
Preparada desde fins de 1936, a Constituição de 1937 foi chamada de "A Polaca", por ter sido inspirada na Constituição autoritária da Polônia. A nova Carta Magna beneficiava-se de muitos elementos da Constituição de 1934, alguns deles tirados da Carta del Lavoro e da Constituição fascista italiana. O trabalho de Francisco Campos era uma mistura de fórmulas fascistas, nacionalistas e até mesmo liberais (estas últimas como solução de camuflagem).
O presidente (com mandato de 6 anos) seria a autoridade suprema da Nação e a preponderância do Poder Executivo facultava-lhe legislar através de Decretos-Leis. A Constituição continha disposições sobre salário mínimo, horas de trabalho, férias etc. Proibia greves e instituía a pena de morte. Os recursos minerais, fontes de energia, bancos, companhias de seguro e as indústrias de base foram nacionalizados.
A palavra escrita ou oral era passível de censura, exercida pelo Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), do Ministério da Justiça.
Todas as lojas, restaurantes e outros locais de negócio deviam exibir a fotografia de Vargas, que preferia ser chamado de "Presidente" em vez de "Ditador".
Os principais órgãos surgidos durante o Estado Novo foram: DASP (Departamento Administrativo do Serviço Público) de caráter aparentemente burocrático, encarregado de supervisionar os interventores nos Estados, além de funcionar como cabide de empregos; e o DIP (Departamento de Imprensa e Propaganda), grande arma ideológica do Estado Novo, atuando como órgão de censura, planejando a propaganda de governo e controlando a opinião pública. A ação de propaganda do governo incluía a “Hora do Brasil", que os inimigos do regime chamavam "Hora do Silêncio".
O “Putsch" Integralista
Com o advento do Estado Novo, os integralistas pensavam, erroneamente, que iriam ser os beneficiados pelo novo governo. No entanto, Vargas, desde o começo da ditadura, mostrou que não tinha nenhuma inclinação para “camisas-verdes". Além de tudo, Getúlio queria prover um forte vínculo de lealdade do povo para com o “Brasil Unido"; lealdade não a grupos nem a lemas propostos por Plínio Salgado.
Em dezembro de 1937, os partidos políticos foram suprimidos, assim como o uso de uniformes, estandartes, distintivos e outros símbolos, o integralismo era posto fora da lei. As decisões nacionalistas do presidente e do ministro da Justiça afetaram também as colônias estrangeiras: italiana, japonesa e alemã. Os diretores de jornais de língua alemã foram convidados a abandonar a propaganda hitlerista. Tornou-se obrigatório o ensino primário em língua portuguesa.
As atitudes do governo levaram os integralistas a prepararem o golpe de maio de 1938. O preparo contou também com a colaboração de alas liberais dissidentes e militares descontentes - Otávio Mangabeira, Júlio de Mesquita Filho (que em janeiro de 1938 foram presos por atividades subversivas), coronel Euclides Figueiredo, Aureliano Leite e general Castro Júnior.
O grupo de conspiradores, liderado pelo tenente Severo Fournier, planejou um ataque ao Palácio Guanabara na noite de 10 de maio. Por motivos vários, o que quase sempre acontece nesse tipo de "quartelada", o plano não pôde ser seguido à risca pois os assaltos aos quartéis, ao Ministério da Marinha, a chefes políticos e generais haviam fracassado antes de haverem começado, pelo pavor que se apoderou dos assaltantes. Mas o ataque ao Palácio Guanabara, onde residia Getúlio, foi levado a efeito com violência, embora com pouca decisão, pois não conseguiram superar a minguada resistência que lhes foi oposta. Cercados, os insurretos abandonaram as armas, tratando de fugir pelos morros vizinhos. Muitos foram presos e sumariamente fuzilados nos fundos dos jardins do palácio.
Severo Fournier acabou entregando-se às forças governamentais. Condenado há dez anos de prisão, morreu tuberculoso, antes de cumprir toda a sentença.
Plínio Salgado, refugiado em uma fazenda do interior de São Paulo, foi convidado, em 1939, a abandonar o País, partindo para Portugal, onde se dedicaria ao ensino na Universidade de Coimbra. Armando de Sales Oliveira e Júlio de Mesquita Filho (diretores de "O Estado de S. Paulo") - democratas irrecuperáveis - foram induzidos. a deixar o Brasil. Partiram para a França, onde denunciaram a ditadura brasileira.
No Brasil, o jornal de Mesquita, "O Estado de S. Paulo", tentava continuar a luta contra Vargas, a despeito da censura - usando, por exemplo, o termo "interventor federal" sem iniciais maiúsculas. Mas, em março de 1940, o governo se apoderou do jornal e transformou-o no porta-voz do regime.
O Brasil na Segunda Guerra Mundial
No final da década de 30, delineava-se no cenário internacional o quadro de antagonismos que levaria à II Guerra Mundial. De um lado, os regimes fascistas europeus (Alemanha e Itália); de outro, as democracias ocidentais, lideradas pelos Estados Unidos, Grã-Bretanha e França.
Do ponto de vista estratégico, o extenso litoral brasileiro era um ponto nevrálgico cobiçado tanto pelos Estados Unidos como pela Alemanha. Por outro lado, é importante lembrar a existência, no Brasil, de significativos núcleos alemães e italianos, engajados no movimento político de seus países de origem. A Alemanha defendia os interesses desses grupos, enquanto os Estados Unidos pressionavam o Brasil no sentido de cercear a infiltração nazi-fascista.
A política externa de Vargas, nessa delicada questão, dirigia-se no sentido de tirar o máximo proveito tanto dos Estados Unidos, como das potências do Eixo. Um exemplo elucidativo do duplo jogo de Vargas foram as viagens em janeiro de 1939 de oficiais da FAB à Alemanha (onde foram efusivamente recebidos por Goering e Hitler) e de Osvaldo Aranha aos Estados Unidos, para discutir assuntos financeiros. Meses depois, o Brasil era visitado pelo general Marshall (chefe do Estado-Maior do Exército Norte-Americano) e por Edda Ciano (filha de Mussolini).
O duplo jogo de Vargas era uma forma de aproveitar as possibilidades da conjuntura mundial para consegui: recursos para a implantação de indústrias de base r Brasil. Assim, em maio de 1940, quando chegou a Washington a notícia de que o grupo Krupp, da Alemanha, estava disposto a construir a usina siderúrgica reivindicada pelos brasileiros, o Export-Import Bank (Eximbank) dos Estados Unidos, adiantou-se, aprovando o financiamento norte-americano para o projeto. A Usina Siderúrgica de Volta Redonda começou a ser construída em 19 graças, a um empréstimo de 45 milhões de dólares.
A posição política de Vargas não se definira ainda. ,'tomava medidas para a contenção do nazismo no Brasil por outro lado, discursava a bordo do "Minas Gerai louvando as vitórias de Hitler. Segundo sua filha Alzira. objetivo do ditador era forçar os Estados Unidos a concluírem os acordos para a construção de Volta Redonda. Getúlio achava que Estados Unidos demonstrariam maior interesse pelo Brasil, se pairasse no ar alguma dúvida sobre a posição internacional do País.
Conseguindo assim preservar sua neutralidade, mantendo-se parcialmente afastado da Segunda Guerra Mundial de 1942, o Brasil rompeu relações diplomáticas com o Eixo (Alemanha, Itália e Japão), após a II Reunião de Consulta dos Chanceleres americanos, realizada no Rio de Janeiro, em janeiro de 1942.
O afundamento de navios brasileiros por submarinos, presumivelmente alemães, determinou a declaração do estado de guerra entre o Brasil e as potências do Eixo. A contribuição brasileira ao esforço de guerra dos Aliados efetivou-se através da instalação de bases aéreas e navais no Nordeste brasileiro e do fornecimento de gêneros e matérias-primas para as tropas aliadas, além da participação direta no conflito, através da FEB (Força Expedicionária Brasileira) e de um grupo de caça da FAB (Força Aérea Brasileira).
Devido à guerra, o Brasil foi vítima de todo o tipo de pressão inflacionária, e o custo de vida subiu muito, comparado com os padrões dos anos do pós-guerra. Por outro lado, o retomo de nossas tropas trouxe também a certeza da insustentação da ditadura de Vargas. A vitória dos Aliados sobre o Eixo significou a vitória das democracias e o questionamento da ditadura de Vargas.
A redemocratização do País
A derrubada de Vargas em 1945, pelas mesmas forças que o haviam levado ao poder absoluto, quando do Golpe de Estado de 1937, deve ser entendida como mais uma manobra política de acomodação ou, em outras palavras, a atualização institucional. As bases dessa "atualização" estão relacionadas com a queda do totalitarismo europeu. A queda do fascismo italiano em 1943 estabelecera um marco na mudança da linha política de Vargas. A vitória final dos Aliados estabeleceu o questionamento da ditadura.
Vargas já percebera, desde 1943, que o fim da guerra e a derrota do Eixo colocariam um fim em sua ditadura. Getúlio procurou assim legitimar ideologicamente o seu regime, através da aproximação das massas urbanas. A partir de então, a política populista de Vargas acionou todos os seus mecanismos: peleguismo (política sindical a serviço dos interesses do governo); política trabalhista (Consolidação das Leis do Trabalho).
O ano de 1943 foi marcante pelos sintomas de abertura democrática: Vargas prometeu eleições para o fim da guerra. Em outubro do mesmo ano, tomou-se público o Manifesto dos Mineiros: timidamente, os assinantes do manifesto - entre eles Magalhães Pinto - exigiam a redemocratização do País. Em janeiro de 1945, os protestos começaram a se avolumar: o Primeiro Congresso Brasileiro de Escritores pedia liberdade de expressão e eleições livres. Em 28 de fevereiro, Vargas, através de um Ato Adicional, assegurava as eleições a serem marcadas em prazo de 90 dias, com sufrágio universal (excluindo-se os analfabetos). As eleições foram marcadas para 2 de dezembro do mesmo ano, com a campanha eleitoral ganhando vulto e animação, pelo surgimento dos partidos políticos
A UDN (União democrática Nacional) foi o primeiro partido político a surgir, dentro da reabertura do processo político, já em abril. Agrupava a oposição liberal a Vargas, radicalizando-se na luta contra o comunismo. Apoiava, para a sucessão presidencial, o nome do brigadeiro Eduardo Gomes.
Em junho foi lançado o PSD (Partido Social Democrático) - o partido dos interventores - liderado por Benedito Valadares e que apoiava a candidatura do general Eurico Gaspar Dutra.
O PTB (Partido Trabalhista Brasileiro) surgiu em agosto, organizado pelo Ministério do Trabalho e presidido pelo próprio Vargas.
Plínio Salgado fundou o PRP (Partido de Representação Popular), que conservava algumas linhas políticas do integralismo.
Houve também a legalização do PCB (Partido Comunista Brasileiro), que lançou um candidato próprio à Presidência, o engenheiro Yedo Fiúza.
O populismo de Vargas atingiu o seu auge em 1945 com o queremismo. As massas populares foram agitadas por lideranças trabalhistas e comunistas e passaram a exigir a permanência do ditador, aos gritos de "queremos Getúlio". Isto acelerou sua queda, uma vez que as oposições o acusavam de querer permanecer no poder.
Outros elementos apressaram o fim do Estado Novo: o discurso do embaixador norte-americano Adolf Bearle Jr. (29/09/1945), aconselhando a normalização do processo eleitoral; um decreto antitruste (que contrariava violentamente os interesses estrangeiros) e o célebre decreto-pretexto (nomeação do irmão de Getúlio, Benjamin Vargas, para o cargo de chefe da Polícia do Distrito Federal).
Pretextando a ameaça de uma "guinada" de Vargas para a esquerda, em função de sua política populista, os generais Eurico Gaspar Dutra e Góis Monteiro colocaram um fim na ditadura, através de um golpe militar, na noite de 29 de outubro de 1945. Assumiu interinamente o poder o presidente do Supremo Tribunal Federal, José Linhares.
O resultado das eleições deu a vitória ao candidato representante do PSD / PTB - Eurico Gaspar Dutra eleito com 3.251.000 votos, contra 2.039.000 de Eduardo Gomes (UDN) e 579.000 de Yedo Fiúza (PCB).
A ECONOMIA E O DESENVOLVIMENTO NA SEGUNDA REPÚBLICA
1. Introdução
Desde a Revolução de 1930, o nacionalismo econômico tomara-se o centro da política econômica brasileira. Isso pode ser explicado em virtude da crise do setor agroexportador, e pela necessidade de atender às aspirações dos setores sociais urbanos, muito sensíveis às aspirações nacionalistas.
Em 1929, a lavoura cafeeira, base da nossa economia, já se encontrava abalada por uma crise de superprodução. A Crise Mundial refletiu diretamente sobre a economia brasileira, diminuindo nossas exportações, aumentando nossos estoques de café e baixando o preço do produto, o que levou em 1931 à crise do café. Nesse clima econômico, eclodira a Revolução de 1930.
O intervencionismo estatal na ordem econômica acentuou-se nos anos 30 e início da década de 40, estimulado depois da proclamação do Estado Novo, em 1937.
Procurou-se criar no País uma política econômica que permitisse impulsionar o desenvolvimento. O projeto de Vargas era levar o Brasil à modernização econômica, integrando-o no capitalismo industrial. Nesse sentido pode-se apontar na política de Vargas: 1930 - criação do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio. 1931 Conselho Nacional do Café e Instituto do Cacau da Bahia. 1932 - Ministério da Educação e Saúde Pública. 1933 Departamento Nacional do Café e Instituto do Açúcar e do Álcool. 1934 - Conselho Federal do Comércio Exterior, Instituto Nacional de Estatística, Código de Minas, Código de Águas, Plano Geral de Viação Nacional e Instituto de Biologia Animal. 1937 - Conselho Brasileiro de Geografia e Conselho Técnico de Economia e Finanças. 1938 - Conselho Nacional do Petróleo, Departamento Administrativo do Serviço Público (DASP). Instituto Nacional do Mate e Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). 1939 - Plano de Obras Públicas e Aparelhamento da Defesa. 1940 - Comissão de Defesa da Economia Nacional, Instituto Nacional do Sal e Fabrica Nacional de Motores. 1941 - Companhia Siderúrgica Nacional e Instituto Nacional do Pinho. 1942 - Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI). 1943 - Coordenação da Mobilização Econômica, Usina Siderúrgica de Volta Redonda, Consolidação das Leis do Trabalho, Serviço Social da Indústria (SESI). Plano de Obras e Equipamentos e I Congresso Brasileiro de Economia. 1944 - Conselho Nacional da Política de Desenvolvimento Industrial e Comercial e Serviço de Expansão do Trigo. 1945 - Superintendências da Moeda e do Crédito (SUMOC).
2. A política cafeeira
Em 1931, Vargas criou o Conselho Nacional do Café, substituindo em suas funções o Instituto do Café de São Paulo. Foi posta em prática a política de sustentação do produto, através da compra e queima parcial das safras. Entre 1930 e 1932, as compras de café atingiram o valor de 39% da receita de exportação, destruindo-se aproximadamente 12,1 milhões de sacas, em operações financiadas por impostos, Banco do Brasil e Tesouro Nacional.
Por volta de 1937, adotaram-se medidas radicais visando à manutenção do equilíbrio dos preços. Partindo de um esforço gigantesco, prosseguiu o governo a política de compra e queima de excedentes. A queima de 17,2 milhões de sacas de café, em 1937 e nos anos que se seguiram, contribuiu para melhores preços, principalmente a partir da fixação das taxas de exportação para os EUA, em 1940.
Capitais que antes eram investidos no setor cafeeiro foram desviados para outros setores importantes da agricultura, como por exemplo o algodão.
3. A industrialização
Vários fatores alinham-se na explicação do impulso dado à industrialização do Brasil, na Era de Vargas.
A guerra, em que se envolveram os nossos principais fornecedores de artigos industrializados, contribuiu diretamente para a redução da oferta desses bens, em cerca de 40%.
Isso propiciou a substituição das importações pelo fornecimento das indústrias locais, em desenvolvimento. Ao lado dessa situação conjuntural, podemos citar a grande quantidade de matéria-prima - entre elas, o algodão, com a diversificação agrícola, elemento importante do surto industrial. A desvalorização da moeda, encarecendo as importações, e o crescimento do mercado consumidor urbano completaram o quadro de fatores ligados ao processo de industrialização do Brasil nesse período.
Aliados aos elementos acima dispostos, surgiram as medidas inovadoras de Vargas, elaboradas dentro de um Plano Qüinqüenal em 1939. Uma usina de aço, fábricas de aviões, usina hidrelétrica em Paulo Afonso eram alguns dos itens constantes do Plano. Em 1942, quando se tomaram amistosas as relações Brasil/EUA, e após a espetacular manobra de Vargas junto ao Departamento de Estado americano, teve início com empréstimos do Eximbank a aplicação de investimentos estatais em indústrias de base. Em 1941, instalou-se a Usina de Volta Redonda, criando-se a Companhia Siderúrgica Nacional. Ansioso por "colaborar" no esforço de mobilização de Vargas, o governo norte-americano enviou ao Brasil a Missão Técnica de Moris Llewellyn Cooke, em 1942, que culminou com a realização em nível de infra-estrutura, instalando-se a Cia. Vale do Rio Doce e a Hidrolétrica de Paulo Afonso. Vargas garantia assim o controle da matéria-prima para a siderurgia e a iniciava a produção energética estatal.
4. A política do petróleo
Já no Governo Provisório (1933), esboçava-se a definição da política estatal no setor das riquezas minerais, consolidada em 1934 pelo Código de Minas. Em 1938, criou-se o Conselho Nacional do Petróleo, organismo autônomo subordinado ao presidente da República. O governo declarava de utilidade pública toda a importação, transporte, distribuição e comércio de petróleo e derivados, em território nacional.
Garantia-se, assim, o programa de ampliação dos meios de transporte e de desenvolvimento industrial, procurando prover a distribuição, em todo o território nacional, de petróleo e seus derivados, em condições de preço mais uniformes possíveis.
5. A legislação trabalhista
Entre 1930 e 1937, iniciou-se a promulgação das leis sociais, atendendo às reivindicações trabalhistas dos operários. Essas leis sociais que se acumulavam desde 1930, entravam, às vezes, em choque com a Constituição Fascista de 1937, e tomou-se necessário atualizar e codificar todo esse conjunto. Em 1943, promulga-se a Consolidação das Leis do Trabalho. De forma geral, a política trabalhista de Vargas revelou os interesses das classes dominantes em estabilizar a camada operária e criar condições para a modernização industrial do País, buscando o reajuste das relações entre patrões e empregados. A política paternalista de Vargas tentou anular o operariado, transformando-o num setor controlado no jogo das forças sociais.
A CULTURA NA SEGUNDA REPÚBLICA
1. Introdução
Terminados os alegres anos 20, começavam os sombrios anos 30. A recessão mundial e a situação política nacional e internacional favoreceram no Brasil a Revolução de 1930, consolidando o poder de Vargas. Os intelectuais cindiram-se entre o centrismo católico, a ordem fascista e as tendências socialistas. Tudo isso favoreceu o golpe de Estado (1937) que prolongaria o governo Vargas até 1945.
O movimento modernista rompeu de vez, separando nacionalistas críticos e acríticos. Entre os primeiros, Tarsila do Amaral substituía as cores alegres de suas paisagens caipiras pelos tons terrosos da "Paisagem Proletária". E nascia o romance nordestino, social e regionalista, com os cangaceiros desesperados de José Lins do Rego (1901-1957), a Bahia romântica e rebelde de Jorge Amado, a angústia da seca e da vida interiorana esboçados por Graciliano Ramos (1892-1953).
Parte dos nacionalistas deixou-se atrair pela retórica do regime. Vila-Lobos, por exemplo, defendeu sinceramente a obra de Vargas, mesmo depois de sua queda. A "Sinfonia Brasileira" que compôs exprimia a idéia de grandeza nacional, como era concebida no período.
Outros artistas, finalmente, por identificarem Vargas com o fascismo, sem maiores sutilezas, mantiveram-se distantes, empenhados na construção de uma lírica própria, como ocorreu a Carlos Drummond de Andrade e Murilo Mendes.
À margem da polêmica política, manteve-se tão-somente a arquitetura, talvez porque seus impulsos modernizadores só tivessem ocorrido após a ascensão de Vargas ao poder. De fato, só em 1929 é que Le Corbusier introduziu no Brasil o conceito de funcionalidade e idéias sobre a "máquina de morar"; Lúcio Costa, nomeado diretor da Escola Nacional de Belas Artes em 1931, aderiu à tendência imprimindo-lhe suas próprias concepções, com as quais veio a criar o edifício do Ministério da Educação (1939), que revolucionaria os rumos da arquitetura nacional.
Em 1939 Oscar Niemeyer associou-se a Lúcio Costa no projeto para a construção do pavilhão brasileiro na feira internacional de Nova York. Décadas depois, a mesma dupla de arquitetos projetaria a cidade de Brasília (inaugurada em 1960), levando às últimas conseqüências as idéias dos anos 40. Nesses anos, contudo, Niemeyer limitava-se a testar a elasticidade do concreto armado em obras como o Corsino e a Igreja de Pampulha (Minas Gerais), em cuja decoração o pintor Cândido Portinari (1903-1962) recorreria à tradição colonial, empregando o ladrilho pintado com cenas bíblicas (no Ministério da Educação, já se usaram azulejos decorados).
A vitória das democracias na II Guerra Mundial condenou ao fracasso o regime ditatorial de Vargas, que em 1945 era apeado do poder. A queda de Vargas foi seguida por um período de intenso desenvolvimento cultural e artístico.
2. A Literatura
A partir de 1930, o Modernismo brasileiro entrou em nova fase. A poesia afastou-se do primitivismo e nacionalismo, predominantes entre 1922 e 1930, e volta-se agora para questões relativas à existência humana. Também a construção formal passa por uma série de transformações; restauraram-se formas poéticas tidas como ultrapassadas: o soneto, os versos longos e o recurso às rimas. Sobressaem, nessa nova fase do Modernismo, Carlos Drummond de Andrade, Cecília Meireles e Vinícius de Morais.
Carlos Drummond de Andrade, considerado um dos maiores poetas da literatura nacional, caracteriza-se pela capacidade de recriar em seus versos as vivências do cotidiano, num tom ao mesmo tempo lírico e humorístico, Sob a influência da II Guerra Mundial, abandona o traço irônico de suas primeiras obras e evolui para uma poesia participante, incorporando o "Sentimento do Mundo". A essa fase de Drummond pertencem as coletâneas "Sentimento do Mundo" (1940), "José" (1942) e "Rosas do Povo" (1945).
Enquanto Drummond expressa de forma dramática o drama coletivo, Cecília Meireles (1901-1964) representa o ponto alto da poesia intimista. Suas obras "Nunca mais..." e "Poema dos Poemas" (1923) e "Baladas para El-Rei" (1925) revelam a influência neo-simbolista; mas, a partir de "Viagem" (1939), sua poesia se liberta dos esquemas anteriores e ganha força inovadora. Nesse momento, delineiam-se com nitidez as características literárias que serão constantes em sua obra: técnica esmerada, misticismo e universalismo. Empenhada em alcançar o máximo de perfeição, Cecília Meireles não vacila em utilizar recursos tradicionais, como no "Romanceiro da Inconfidência", onde articula, de forma original, elementos líricos e épicos para reconstituir o clima de tragédia inerente a esse episódio da História do Brasil.
Como Cecília Meireles, Vinícius de Morais (1913-1980) iniciou sua obra poética influenciado pelo Neo-Simbolismo. Dessa fase são "O Caminho para a Distância" (1933), "Forma e Exegese" (1935) e "Arina, a Mulher" (1936), nas quais já transparece a temática de fundo erótico que percorrerá toda a sua produção poética. Com a publicação de "Cinco Elegias" (1943), a força sensual de sua poesia se acentua e encontra expressão através de uma linguagem livre e direta. Após 1945, sua linguagem e sua temática vão ganhando novos contornos, sua poesia se amplia, adquirindo conotação social e política.
O ano de 1930 marca o início de uma nova fase também na ficção brasileira. Passado o período experimental do Modernismo, a prosa segue novos caminhos, acompanhando as mudanças políticas e sociais do País. Uma das mais fecundas tendências literárias da época foi o romance nordestino. Armados de rigorosa consciência crítica e adotando um estilo neo-realista, os prosadores ligados ao romance nordestino analisam a realidade social e os problemas do homem do Nordeste. Seu ponto de partida é a publicação de "A Bagaceira" (1928), romance regionalista do paraibano José Américo de Almeida.
José Lins do Rego (1901-1957), baseado nas recordações da infância e da adolescência passadas no engenho do avô, traçou um vasto painel da decadência da aristocracia açucareira, quando o primitivo engenho de açúcar foi substituído pela usina moderna. O "ciclo da cana-de-açúcar", como ficou conhecida parte da obra de José Lins do Rego, é formado por seis romances que alcançam sua maior expressão literária em "Fogo Morto". Uns do Rego também abordou outros aspectos da vida nordestina, como o messianismo ("Pedra Bonita", 1938) e o cangaço ("Cangaceiros", 1953), elementos que compõem a saga da região.
O movimento mais significativo da ficção nordestina está na obra de Graciliano Ramos (1892-1953). Compõem sua produção literária quatro romances, contos, crônicas, narrativas populares, recordações da infância e memórias ligadas à sua experiência de vida, com a paisagem física e social da região agreste do Estado de Alagoas, mundo em que se desenrola o drama de seus personagens. Seu romance de estréia foi "Caetés" (1933). A essa obra seguiu-se "São Bernardo" (1934). "Angústia" (1936) e "Vidas Secas" (1938).
Ainda dentro do romance nordestino ganha importância a obra de Jorge Amado, o romancista brasileiro mais conhecido no Exterior. Realismo crítico e lirismo romântico, documento e fantasia unem-se ao humor, para compor seu mundo artístico, alicerçado na diversidade da vida social da Bahia. No chamado "ciclo-do-cacau", Jorge Amado registra a saga da luta pela posse da terra no início da lavoura cacaueira, "terra adubada com sangue", que tem em "Terras do Sem-Fim" (1942) sua expressão mais perfeita. Em "Suor" (1933), "Cacau" (1937) e "Capitães de Areia" (1937), manifesta preocupação com os oprimidos e clama por justiça social. Em "Jubiabá" (1935) e "Mar Morto" (1936), introduz um clima de magia e sentimentalismo lírico, atitudes revolucionárias, sincretismo religioso e tragédia ligada à vida do mar.
É ainda na década de 30 que a produção literária do extremo sul do Brasil passa a ocupar um lugar de destaque no panorama literário brasileiro, com a ficção de Érico Veríssimo (1905-1975). Numa primeira fase, representada pela temática urbana, girando em tomo dos dramas da pequena burguesia, Érico Veríssimo escolhe como ambiente a capital da província ou pequena cidade do interior. Nessa linha temática, estrutura "Clarissa" (1933), "Música ao Longe" (1935), "Olhai os Lírios do Campo" (1938), "Saga" (1940) e "O Resto é Silêncio" (1943), romances nos quais os mesmos personagens aparecem e desaparecem segundo as necessidades do desenvolvimento da história.
3. A Pintura
Após a Semana de Arte Moderna
O período de crise econômica internacional do início dos anos 30, coincidindo com a ascensão de Vargas ao poder abriu novos caminhos à produção artística pelo enriquecimento de sua temática. A preocupação que surgiu em todos os meios com o operário e com o homem do campo levou os pintores a transportá-los para as suas telas. Sem grandes cuidados de ordem formal, passou-se a focalizar o cotidiano das cidades, dos subúrbios e as festas populares do interior.
As novas tendências mostradas na Semana de Arte Moderna se desenvolveram e se firmaram. No entanto, o público freqüentador de exposições permaneceu hostil às novidades. As reações agressivas do público, o não amparo da crítica e as promessas não cumpridas acabaram por abafar e desanimar os novos artistas brasileiros. Anita Malfatti, a grande esperança do expressionismo brasileiro, depois de duramente criticada por Monteiro Lobato, passou a ser pintora de modestas telas folclóricas. Tarsila do Amaral, criticadora da plástica do antropofagismo, depois de ver suas telas serem recusadas acabou por mudar seu estilo para torná-lo mais aceitável e compreensível do público. Antônio Gomide sobreviveu abrindo uma escola de pintura para moças em expectativa de casamento. Vicente do Rego Monteiro, depois de grande sucesso em Paris, quando voltou ao Brasil, apresentou suas telas em Recife, obtendo fracasso total; acabou montando um engenho e produzindo a pinga Guaratá.
Apesar deste quadro desolador, alguns artistas não esmoreceram. Flavio de Carvalho, pintor de estilo expressionista, organizou os Salões de Maio, a partir de 1937, na tentativa de angariar freguesia para a idéia modernista. Com esta mesma intenção, o arquiteto Lúcio Costa realizou no Rio de Janeiro uma exposição coletiva de artistas modernos.
Ismael Néri também se recusou a abandonar seus propósitos modernistas. Personalidade excepcional, o contato com Paris contribuiu de maneira decisiva para a definição de sua pintura: captação de intimidades espirituais, sonhos e marcações de caracteres. Suas pinturas são mais desenhos fantásticos, com melancolia e pesadelos.
A ação de Emiliano Di Cavalcanti se traduz na pintura de raça, cuja surpreendente poética exalta a mulata, produto da miscigenação das etnias coloniais.
Os pintores dos anos 40
Cândido Portinari foi o grande destaque entre os pintores dos anos 40, criando uma figuração onde expressou os sentimentos humanos que mais o preocuparam. Pintou a terra, as aldeias, os meninos numa animada "pelada" de bola de meia, os retirantes, os dramas e as alegrias populares. Pintor também alegórico (exemplo é sua tela Tiradentes), Portinari foi o autor de "Guerra e Paz", na sede da ONU e "Descoberta e Colonização", na Biblioteca do Congresso em Washington. Em 1935, sua tela Café obteve a segunda menção honrosa na I Exposição Internacional de Arte Moderna, realizada nos Estados Unidos. O estilo de Portinari é bastante pessoal, apesar da utilização de recursos cubistas e expressionistas.
Em São Paulo, teve atuação um círculo de pintores apelidado de Grupo Santa Helena (num edifício com este nome, alguns deles tinham atelier), como Alfredo Volpi, Francisco Rebolo Gonzales, Mário Zanini, Paulo Rossi Osir, Fúlvio Pennacchi, Joaquim Lopes Figueira Júnior e outros. De todos, destacou-se Volpi, que soube acompanhar os tempos mediante mutações lógicas e boa intuição. Colorista de gosto, pintou paisagens, aldeias e exaltou-se em solenes telas repletas de bandeirinhas, o mesmo espírito do povo que enfeita as ruas nos dias de festa.
4. A Arquitetura
O primeiro agrupamento de arquitetos brasileiros em torno de novas idéias ocorreu no Rio de Janeiro, a partir da década de 30. O ensino da Arquitetura, ministrado na Escola Nacional de Belas-Artes, passou por uma total reformulação, graças, em grande parte, à presença renovadora de Lúcio Costa. Por outro lado, as visitas de Le Corbusier ao Rio de Janeiro e a divulgação de suas concepções funcionalistas contribuíram para o surgimento de obras marcadas por uma grande preocupação plástica, traduzidas nos critérios de composição e nos sistemas estruturais de concreto armado, que seguem uma orientação funcional. A sede da Associação Brasileira de Imprensa, projetada pelos irmãos Mílton e Marcelo Roberto, é uma construção pioneira dessa época. Nesse edifício, pela primeira vez, são empregados racionalmente quebra-sóis de concreto armado, para moderar a luz e controlar o calor ambiente. Esses novos conceitos deram origem a várias outras obras representativas, como o Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro.
Em São Paulo, a arquitetura modernizou-se com as soluções empregadas por Vital Brasil. Autor do primeiro prédio moderno e apartamentos em São Paulo - o Edifício Esther - construído entre 1935 e 1936, segundo as concepções racionalistas da nova arquitetura.
Oscar Niemeyer teve seu nome projetado definitivamente com sua obra em Minas Gerais. Em 1943, concebeu um conjunto de construções em torno do Lago da Pampulha, em Belo Horizonte. Essa obra é considerada a primeira criação inteiramente livre na moderna arquitetura brasileira. Desse conjunto da Pampulha faz parte a Igreja de São Francisco de Assis, que representa o nascimento da moderna arquitetura religiosa brasileira.
Em 1942, estava concluído o edifício do Ministério de Educação e Cultura, considerado o marco inaugural da nova arquitetura brasileira. O risco original desse edifício pertence a Le Corbusier e foi desenvolvido com alterações que deram origem a novos conceitos de área livre na implantação urbana de prédios em lotes restritos. Essa obra marca a adoção dos princípios de Le Corbusier pelos arquitetos cariocas ali representados por Lúcio Costa (o líder), Oscar Niemeyer, Carlos Leio, E. Vasconcelos, Affonso Eduardo Reidy, Sérgio Bernardes e outros.
5. A Música A Música Eruditra
A partir da obra de Mário de Andrade - Ensaio Sobre a Música Brasileira (1928) -, começou a se delinear no Brasil duas tendências musicais; a primeira delas representada por aqueles que se apoiavam na obra de Mário de Andrade. Encabeçados por Camargo Guarnieri, aluno de Mário de Andrade, os principais representantes dessa tendência, conhecida como "nacionalista", são: Luciano Gallet (1893-1931), Oscar Lorenzo Fernandes (1897-1948), Francisco Mignone, Radamés Gnattali e Guerra Peixe. Apresentando uma produção muito diversificada, esses autores tinham em comum a procura de uma linguagem nacional, que ao mesmo tempo não perdesse a característica universalista da linguagem musical.
Adotando uma postura estética radicalmente oposta, uma outra tendência começou a se afirmar no Brasil, a partir de 1939, como resultado, principalmente, do trabalho efetuado por Hans Joachim Koellreuter, criador do "Grupo Música Viva". As idéias desse grupo - formado por Guerra Peixe, Cláudio Santoro, Eunice Catunda, Edino Krieger e outros - assentavam-se sobre a premissa do universalismo da linguagem musical, e seus adeptos apoiavam-se na utilização de recursos composicionais do atonalismo e do dodecafonismo. Estes compositores iniciaram um intenso trabalho de divulgação de suas idéias, que culminou com o lançamento, em 1946, do Manifesto Música Viva. Tempos depois, porém, Guerra Peixe e Cláudio Santoro abandonaram o "Grupo Música Viva" para adotar outras posições estéticas.
Com respeito à instrução musical no Brasil, a partir da década de 30 começaram os primeiros passos. Em 1931 a declamadora Helena Magalhães de Castro fundava a Instrução Artística do Brasil (IAB), com a finalidade de promover concertos em todo o território nacional. Seus artistas eram itinerantes, percorriam vários pontos do País, e em cada cidade deixavam instalada uma IAB local.
Em 1932, Vila-Lobos foi nomeado Diretor da Superintendência de Educação Musical e Artística (SEMA) da Prefeitura do então Distrito Federal. Neste mesmo ano, ele cria o Curso de Pedagogia da Música e Canto Orfeônico. Institui o Orfeão de Professores e realizou corais com milhares de jovens, chegando a reunir 44.000 elementos sob sua direção.
A necessidade de uma infra-estrutura, consistente na formação de magistério especializado, levou-o à criação em 1942 do Conservatório Nacional de Canto Orfeônico, pois fora decidida a introdução do ensino de música e canto orfeônico nas escolas do Distrito Federal.
A prática de suas idéias foi consubstanciada na Portaria Ministerial n° 300 de 1946, que orientava o ensino de música nas escolas secundárias.
Música popular
Juntando aos instrumentos herdados da tradição musical européia (violão, piano, flauta) e toda uma variedade rítmica produzida por frigideiras, cuícas e tamborins, a música popular se enriqueceu e alcançou na década de 30 sua "época de ouro". Para isso também contribuiu o rádio que, a partir dessa época, passa a se impor no Brasil como um poderoso veículo de comunicação de massas.
Destacou-se nesse período o compositor e instrumentista Alfredo Viana Filho, Pixinguinha (1898-1973). Iniciando sua carreira na década de 20, como integrante dos pequenos grupos orquestrais que acompanhavam os filmes mudos nos cinemas, organizou o conjunto Oito Batutas, destinado a se exibir na sala de espera do Cine Palais, no Rio de Janeiro. Flautista de talento e dono de sólidos conhecimentos técnicos, Pixinguinha foi o autor do primeiro "choro orquestral". Capitalizando para a sua técnica a escrita orquestral da época, forneceu os dados básicos para a formação de uma linguagem instrumental caracteristicamente brasileira. Como solista de flauta, gravou várias músicas consideradas verdadeiras obras primas pelos críticos. Entre elas destacam-se "Carinhoso", "Teu Cabelo não Nega" e "Linda Morena".
Da mesma época, também, é o chamado compositor de Vila Isabel, Noel Rosa (1910-1937). Explorando temas sentimentais ("O Último Desejo"), o aspecto social ("O Orvalho Vem Caindo" e "Três Apitos") ou a caracterização de tipos populares ("Conversa de Botequim"), Noel Rosa abriu caminho para a evolução temática da música popular. Sua influência se faz notar até hoje em vários cantores e compositores, como Chico Buarque de Holanda, Maria Bethânia e Martinho da Vila.
Um dos compositores populares brasileiros mais conhecidos internacionalmente Ari Barroso (1903-1964) também viveu "a época de ouro" da música popular. As composições de Ari Barroso caracterizaram-se pela elaboração metódica, pela ênfase dada ao aspecto rítmico e pela exaltação à terra brasileira, como se pode notar em sambas como "Aquarela do Brasil", "No Tabuleiro da Baiana", e outras. Suas obras obtiverem boa receptividade no Exterior, 1evando-o ao estabelecimento de vínculos com orquestras, gravadoras e com o cinema norte-americano. O samba "Aquarela do Brasil" serviu de fundo musical para o desenho de Walt Disney "Alô, Amigos" que conta as aventuras de Zé Carioca. Entusiasmado com as músicas de Ari Barroso, Walt Disney mais tarde incluiu "No Tabuleiro da Baiana" e “Os Quindins de raia” no desenho "Os Três Cavaleiros". A ligação de Ari Barroso com o cinema norte-americano desencadeou uma série de críticas por parte dos nacionalistas da época. No entanto, Ari Barroso apenas refletiu o clima de ufanismo que então se vivia, não se podendo negar o seu importante papel na divulgação da música brasileira no Exterior. Essa divulgação se deu sobretudo através de sua principal intérprete, Carmen Miranda, que se tomou internacionalmente conhecida ao estrelar uma série de filmes em Hollywood.
Outros grandes nomes da música popular brasileira desta época foram Ismael Silva ("Se Você Jurar", "Para me Livrar do Mal", "Nem é Bom Falar" etc.), Ataulfo Alves ("Ai, que Saudades da Amélia", "A Você", "Mulata Assanhada" etc.) e Lamartine Babo ("No Rancho Fundo", "Eu Sonhei Que Tu Estavas Tão Linda", "O Teu Cabelo Não Nega" etc.).
6. O Teatro
Em 1932, Joracy Camargo (1898-1973), do Teatro de Brinquedo, estréia sua comédia "Deus lhe Pague", interpretada por Procópio Ferreira. Sem grandes qualidades dramáticas, a peça, no entanto, obteve êxito, pois refletia um estado de espírito da época, marcada por preocupações políticas provocadas pela crise econômica mundial.
A verdadeira renovação do teatro brasileiro se daria em 1933, quando Oswald de Andrade (1890-1954), um dos porta-vozes da Semana de 22, escreve "O Rei da Vela". A peça, que viria a ser encenada na década de 60, investe contra as imagens idealizadas e preconceituosas existentes na época sobre a cultura e a sociedade brasileira. Ao "O Rei da Vela" vieram se juntar "O Homem e o Cavalo" (1934) e "A Morta" (1937). Anticonvencionais e revolucionárias, as peças de Oswald de Andrade representam o que causaria, na ocasião, a grande transformação do teatro nacional. No entanto, não encontraram encenadores, tendo sido apenas publicadas em livro.
O teatro brasileiro continuava carente de profundas mudanças formais e começaram a surgir algumas experiências nesse sentido. Um dos pioneiros foi Renato Viana (1894-1953) que, junto com Ronald de Carvalho e o compositor Heitor Vila-Lobos, criou o movimento teatral "Batalha da Quimera". Pela primeira vez no Brasil tentava-se fazer um espetáculo integrado em todos os seus aspectos, usando-se luz, som e planos diferentes para obter efeitos dramáticos. Para escândalo do público, pela primeira vez num palco brasileiro, um ator dava as costas à platéia. Surgiu aí a primeira tentativa de direção, com o objetivo de se fazer um teatro de síntese. É nessa época que Antoine, Copeau, Max Reinhardt, Stanislawsky, Gordon Craig e outros inovadores do teatro europeu se tomam conhecidos e comentados nos meios teatrais brasileiros. Sob a influência da revolução cênica que ocorria na Europa, surge o Teatro do Estudante, fundado em 1938 no Rio de Janeiro por Paschoal Carlos Magno. A partir daí o teatro encontraria um novo terreno fértil.
A formação do grupo "Os Comediantes" em 1938, no Rio de Janeiro, dá início ao teatro contemporâneo no Brasil. A princípio, um grupo de amadores. "Os Comediantes", imbuídos do espírito de renovação que caracterizava a época, trabalharam no sentido de reformar esteticamente o espetáculo de teatro. Sem programa traçado, seu objetivo era fazer, de qualquer peça, um bom espetáculo. Para isso, contrariando o que acontecia no Brasil, onde o ator principal garantia o sucesso do espetáculo, transferiram para o encenador a responsabilidade por esse sucesso. Entretanto, o trabalho de "Os Comediantes" não foi suficiente para mudar o panorama do teatro nacional. Isso só veio a acontecer em 1941, quando, fugindo do nazismo, chegou ao Brasil o polonês Zbigniew Ziembinsk.
7. O Cinema
Nos finais da década de 20, foi criada a Companhia Cinédia, cujo primeiro filme, "Lábios sem Beijos", foi realizado por Humberto Mauro em 1930. No estúdio da Cinédia, logo depois nasceria o lendário filme "Limite", de Mário Peixoto. Objeto de classificações diferentes obra de vanguarda, filme surrealista - "Limite" aborda os conflitos gerados pelos condicionamentos que impedem a realização humana. Em 1933 Humberto Mauro termina a filmagem de sua mais importante obra: "Ganga Bruta", produzido pela Cinédia. Considerado um clássico da cinematografia brasileira, este filme penetra profundamente no meio social em que transcorre a ação. Ao mesmo tempo, delineia todo o contexto simbólico sugerido pela história do engenheiro que mata a mulher na noite de núpcias, absolvido, tenta esquecer tudo trabalhando na construção de uma fábrica, mas não consegue resistir ao envolvimento de uma adolescente. A mesma companhia lança, ainda em 1933, "A Voz do Carnaval", filme de estréia de Carmen Miranda e prenúncio de um dos rumos que tomaria o cinema brasileiro.
A partir de 1933, o Rio de Janeiro entra numa fase de intensa produtividade, passando a dominar por muito tempo a cinematografia nacional. Um dos nomes de maior destaque continua sendo Humberto Mauro, já agora na Brasil Vita Film, fundada no início dos anos 30 pela atriz e empresária Carmen Santos. O principal filme da nova empresa, "Favela dos Meus Amores", é uma visão sentimental dos morros cariocas, assinada pelo cineasta de Cataguases. Entretanto, a produção cinematográfica da época girou mesmo em tomo da Cinédia, que realizou o primeiro grande sucesso do cinema falado brasileiro: o musical "Coisas Nossas", do americano Wallace Downey. Nesse período, já começava a se desenvolver a chanchada, gênero que dominaria durante muito tempo a cinematografia nacional,
Em 1945, a Cinédia produziu "O Ébrio", dirigido por Gilda de Abreu, e tendo como ator o cantor Vicente Celestino. História folhetinesca sem grande valor cinematográfico, "O Ébrio" alcançou enorme popularidade, sendo o filme nacional do qual mais cópias se tirou até hoje. Paralelamente, a Cinédia tentava fazer um cinema de nível mais elevado - uma de suas realizações nesse sentido foi a filmagem do romance "Pureza", de José Uns do Rego. No início dos anos 40, foram realizadas pouquíssimas fitas de enredo, mas esse panorama iria mudar no decorrer dessa década.
Em 1943, funda-se a companhia Atlântida, que estréia com o filme "Moleque Tião", interpretado por Grande Otelo, ator já conhecido, cuja vida foi o tema do filme. "Moleque Tião" mostra a intenção que a companhia tinha de adorar uma linha de cuidadosa filmagem de assuntos brasileiros. No entanto, tal intenção não se cumpre, e em breve, a Atlântida passa a se dedicar sobretudo à "chanchada", comédia ligeira e descompromissada, um gênero "fácil" e de grande aceitação popular. Geralmente recheada com números musicais, lançava freqüentemente as canções que se tomavam sucessos carnavalescos. Os grandes nomes da chanchada são Oscarito, Grande Otelo, Eliana Macedo, Zezé Macedo, Anselmo Duarte, e os diretores José Carlos Burlem, Lulu de Barros e Carlos Manga, entre outros. A intenção de se fazer um cinema de melhor nível, na época, aparece em filmes como 'O Cortiço' (baseado no romance do mesmo nome, de Aluísio Azevedo); "Inocência" (baseado no romance de Visconde de Taunay); ou em filmes baseados em textos de Jorge Amado, como "Terra Violenta" e "Estrela da Manhã". Em "Vinte e Quatro Horas de Sonho", apelou-se para o que possuía o teatro nacional de mais prestigioso no momento: o autor e ator teatral Silveira Sampaio - então em plena ascensão -, que sugeriu a possibilidade de uma comédia cinematográfica mais leve e sofisticada. Mas o que o público preferia realmente era a chanchada, que dominou o cinema nacional por quase 20 anos.
Brasil Contemporâneo (1946-95)
Durante este período, a História do Brasil conheceu três momentos importantes. Nos dezoito anos iniciais (1946-1964), o País viveu sob o signo da democracia populista, numa fase denominada República Liberal; seguiram-se depois os vinte e um anos do Estado Autoritário, iniciado com o golpe de 1964 e encerrado nas eleições indiretas de janeiro de 1985, com a vitória de Tancredo Neves. A partir daí, teve início a última fase, marcada pelo fim do autoritarismo e pelo retorno à :i1ormalidade democrática, chamada por muitos de Nova República.
A REPÚBLICA POPULlSTA (1946-1964)
A partir de 1930, a economia e a sociedade brasileiras passaram por transformações significativas. No aspecto político, com o colapso do sistema oligárquico da República Velha, iniciou-se o processo de modernização do Estado. A crise da economia agrário-exportadora, até en::ão dominante, permitiu o avanço da industrialização, especialmente na Região Sudeste. O aumento da população nos principais centros urbanos mostrou que as cidades estavam começando a predominar sobre o campo. A industrialização, a urbanização e a expansão do setor de serviços permitiram o crescimento de novas forças sociais: o empresariado industrial, a classe média e o operariado. Essas novas forças, embora possuíssem algumas aspirações comuns, também apresentavam interesses completamente divergentes; o primeiro, por exemplo, defendia o crescimento econômico a qualquer custo; o segundo, o poder de consumo; e o terceiro, o real valor dos salários.
Nessa época deu-se a proliferação dos partidos políticos (pluripartidarismo) refletindo os desencontros que envolviam os vários segmentos de uma nova sociedade urbana e industrial do século XX; as massas urbanas foram incorporadas ao processo político e, como suas aspirações não podiam ser ignoradas, passaram a ser manipuladas por políticos e pelo próprio Estado, dando origem ao populismo.
A República Populista, iniciada com o fim do Estado Novo (1945) e encerrada com o golpe militar de 1964, teve suas características moldadas a partir dessas transformações, mas também sofreu influência dos acontecimentos internacionais que marcaram o pós-guerra.
Após a II Guerra Mundial, dois blocos disputaram a liderança política, econômica, militar e ideológica do Mundo Contemporâneo: o Bloco Ocidental, capitalista, liderado pelos Estados Unidos, e o Bloco Oriental, socialista, dirigido pela União Soviética. Sendo o Brasil integrante do Bloco Ocidental, as manifestações populares ocorridas no País passaram a ser encaradas como "agitações comunistas".
Ainda na República Populista, os governos presidenciais adotaram diversos planos e programas econômicos, acentuando o papel do Estado como promotor e coordenador do desenvolvimento nacional. O País estava dividido entre duas propostas de desenvolvimento: a nacionalista-industrial, favorável à intervenção do Estado na economia (modelo getulista), e a desenvolvimentista-industrial, que defendia a participação do capital estrangeiro na economia brasileira.
1. Governo Eurico Gaspar Dutra (1946-1951 )
A vitória de Dutra colocou em execução uma política conservadora. Em seu governo, procurou unir os partidos de centro e formar "uma muralha ao perigo vermelho", rompendo relações diplomáticas com a URSS, colocando o Partido Comunista na ilegalidade e cassando seus representantes nas Câmaras Legislativas. Externamente, Dutra consolidou a aliança com os EUA. Neste sentido, durante a visita do presidente norte-americano, Harry Truman, ao Brasil, foi assinado o Tratado de Assistência Recíproca e criada a Comissão Mista Brasil-EUA.
Internamente, com o Plano SALTE (Saúde, Alimentação, Transporte e Energia), cuja finalidade era coordenar os gastos públicos, executou-se a pavimentação da Rodovia Rio-São Paulo (Via Presidente Dutra), a abertura da Rodovia Rio-Bahia e a instalação da Cia. Hidrelétrica do São Francisco (exploração da Cachoeira de Paulo Afonso). No início de seu mandato, a pauta de importação elevou-se extraordinariamente: importação de bens supérfluos e de materiais de reposição à maquinaria desgastada (a importação estivera bloqueada devido à Segunda Guerra Mundial). Ao mesmo tempo, a elevação dos preços internacionais do café e das matérias-primas resultaram em vultoso saldo na balança comercial, reequilibrando nossas contas externas. Transcorreu, assim, o qüinqüênio presidencial do General Dutra em relativa paz política, com o aparecimento de vários partidos, voltando o País à normalidade administrativa ao mesmo tempo em que procurava se recuperar das conseqüências econômicas e financeiras da Segunda Guerra Mundial.
Em 18 de setembro de 1946, foi promulgada uma nova Constituição, apresentando as seguintes características: federação, regime representativo, presidencialismo, fortalecimento da União, presidente eleito por cinco anos, três senadores por Estado, voto universal obrigatório para maiores de 18 anos (exceto analfabetos, soldados, cabos e índios), criação do Tribunal Federal de Recursos.
2. Segundo Governo de Getúlio Vargas (1951-1954)
Sem a emergência de uma nova liderança política, a divisão dos partidos e suas indecisões possibilitaram a candidatura de Getúlio Vargas. Getúlio venceu com grande margem de votos, obtendo 3.843.000 votos (48,7%), sustentado pelo PTB, PSP (Partido Social Progressista, agrupamento populista em tomo de Adhemar de Barros), vários setores do PSD e grupos de esquerda. Eduardo Gomes obteve 2.342.000 votos (29,7%), com o apoio da UDN e do PRP (Partido de Representação Popular - antigos integralistas de Plínio Salgado); e Cristiano Machado recebeu 1.697.000 votos (21,57%) representando parte do PSD. Getúlio iniciou seu mandato enfrentando uma inflação crescente, que minava as divisas nacionais.
Desenvolveu uma acentuada política nacionalista, limitando as inversões de capitais externos. Foi esse programa, através do slogan "O Petróleo é Nosso", que criou a Petrobrás e a expansão da siderúrgica de Volta Redonda. Corriam boatos de um próximo golpe de Estado de Vargas para implantar no Brasil uma República Sindicalista, nos moldes do peronismo argentino. Os opositores a Getúlio, pelo seu passado como ditador, ou aqueles que vinham se opondo a ele neste novo mandato, congregaram-se numa campanha antigetulista. O presidente, por sua vez, acirrava suas posições, como no discurso em Curitiba, em dezembro de 1953, denunciando a remessa de 'lucros para o estrangeiro como o fator crônico das dificuldades brasileiras. Sob tais circunstâncias, o quadriênio de Getúlio Vargas foi um dos mais agitados da História do Brasil. Getúlio tentou a aproximação com a "massa" (base-suporte) por meio da fixação do salário mínimo, consegui da pelo ministro do Trabalho João Goulart (Jango). Para muitos confirmavam-se os boatos. A oposição aumentava e escândalos vieram à tona: corrupção de pessoas ligadas ao governo e financiamentos subornados do Banco do Brasil. Carlos Lacerda, um dos líderes civis da oposição a Getúlio e diretor do jornal carioca "Tribuna da Imprensa", destacou-se na campanha contra Getúlio. De outro lado, os ferrenhos adeptos do presidente viam a sua figura política deteriorar-se. Foi nesse contexto que o atentado da Rua Toneleros contra Lacerda, no qual veio a falecer o major-do-ar Rubens Vaz, representou o estopim para a oposição.
A Aeronáutica, defendendo a tese de Honra Nacional, ultrapassou a ação da Justiça na apuração dos responsáveis pela morte de um dos seus membros.
Aos poucos, os resultados das investigações sobre os responsáveis pelo atentado levaram a elementos ligados à s Guarda do Catete. Surgiram notícias de que o atentado fora arquitetado por Gregório Fortunato, o fiel guarda pessoal do presidente. A tensão aumentava. A própria situação econômica interna, sofrendo com a inflação crescente, deixava o povo descontente. O Exército interferiu no processo, pressionando Getúlio a demitir Jango da frente do Ministério do Trabalho (Manifesto dos Coronéis).
No dia 21 de agosto de 1954, o vice-presidente Café Filho, que era um alvo especial para a tentativa da UD. De fomentar uma cisão dentro do governo, sugeriu a Getúlio que ambos renunciassem, deixando que o Congresso elegesse um sucessor interino para o restante do mandato Presidencial. Getúlio recusou-se, dizendo a Café Filho que não abandonaria o Palácio antes do fim do seu mandato, exceto se estivesse "morto". No dia 23 de agosto, Café Filho rompeu publicamente com o presidente.
No mesmo dia, 27 generais do Exército divulgaram um manifesto à Nação exigindo a renúncia de Getúlio. Na madrugada de 24 de agosto, Vargas suicidou-se com um :iro no coração.
3. Governo Café Filho (1954-1955)
Com a morte do presidente, subiu ao poder, de acordo com a Constituição, o vice-presidente Café Filho. No ano seguinte realizaram-se as eleições presidenciais. Juscelino Kubitschek (governador mineiro) venceu com 3.777.411 votos e, para a Vice-Presidência, foi eleito João Goulart com 3.591.409 votos, apoiados pelo PSD e PTB. A UDN lançara seu candidato, o general Juarez Távora, que recebeu 30% dos votos; pelo PSP, disputou Adhemar de Barros, com 26%, e, pelo PRP, Plínio Salgado, com 8% do total de votos.
Logo após as eleições, evidenciaram-se conflitos po:iticos. Afastado do cargo, por doença, Café Filho passou Presidência, de acordo com a Constituição, ao presidente da Câmara dos Deputados, Carlos Luz, em 8 de novembro de 1955.
Carlos Luz logo se indispôs com o marechal Henrique Teixeira Lott, ao negar seu pedido para repreender um coronel que proferira um discurso contrário à posse de Juscelino. Luz tomava-se, assim, cúmplice da atitude do coronel.
Lott, incitado por outros generais, e para manter a legalidade constitucional, depôs o presidente na manhã de 11 de novembro.
Declarado o impedimento de Carlos Luz, na tarde do' dia 11, subiu ao poder o vice-presidente do Senado, Nereu Ramos. O País foi mantido em estado de sítio até 31 de janeiro de 1956, data da posse de Juscelino Kubitschek.
4. Governo Juscelino Kubitschek (1956-1961)
Com a posse de Juscelino, sob a proteção do Exército, iniciou-se uma das fases mais importantes da história econômica do Brasil. Nos anos de 1956-60, realizou-se ampla e profunda transformação do sistema econômico do País. A política econômica governamental desses anos foi o Programa de Metas. E a execução provocou uma "transformação qualitativa" na economia brasileira, provavelmente a mais ampla ação orientada pelo Estado na América Latina, com vistas à implantação de uma estrutura industrial integrada.
O governo Kubitschek adotou uma política que consolidou e expandiu o "capitalismo associado ou dependente" brasileiro.
Durante a Era de Vargas, houve uma política destinada a criar um sistema capitalista nacional, e no governo de Jusce1ino, uma política orientada para o desenvolvimento econômico além de ter lançado as bases da indústria automobilística e naval, deu grande incentivo à indústria siderúrgica e ampliou o parque rodoviário. Juscelino impulsionou as grandes usinas hidrelétricas de Fumas e Três Marias. Foi ele o criador e promotor da "Operação Pan-Americana", que procurou alertar os EUA para a situação econômica e social da América Latina e que foi a precursora da "Aliança para o Progresso".
A construção de Brasília, a nova capital do País, prevista desde a Constituição de 1891, converteu-se em símbolo de sua política. A obra foi confiada ao famoso arquiteto Oscar Niemeyer e ao urbanista Lúcio Costa. Brasília foi inaugurada em 21 de abril de 1960.
Com seu slogan "Cinqüenta anos em cinco" (50 anos de progresso em 5 de governo), Juscelino foi bem-sucedido, ao menos no que se refere à produção industrial, que se expandiu amplamente (cerca de 80% entre 1955 e 1961) e, o que é mais importante, com predominância da produção de bens de capital (siderurgia, indústria mecânica, de material de transporte etc.).
Outra grande realização, ainda que de sucesso desigual, foi a Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene). De outro lado, as realizações de Juscelino produziram um amplo e profundo surto de internacionalização da economia brasileira.
O apoio financeiro estrangeiro para tais empreendimentos foi obtido com a instrução número 113 da SUMOC, atraindo grandes empresas internacionais. Em conseqüência disso, o controle externo sobre os mais importantes ramos industriais atingiu altas taxas.
Durante o seu governo, Juscelino enfrentou, além de forte oposição política, algumas tentativas de insurreição por parte de alguns militares (Levante de Jacareacanga e Rebelião de Aragarças), mas, ao terminar o seu mandato, anistiou todos os revoltosos. É evidente que o custo de suas realizações redundou em elevados índices de inflação, entretanto os benefícios sociais obtidos poderiam ser invocados como justificativa.
5. Governo Jânio Quadros (1961)
Em 1960 foi eleito Jânio da Silva Quadros, ex-governador de São Paulo, acompanhado na Vice-Presidência por João Goulart. Jânio venceu com 5.604.000 votos (48%), apoiado pela UDN. Enquanto seu principal concorrente, o marechal Lott, obteve 3.810.000 votos (28%), pelo PTB. Sua posse, a primeira em Brasília, deu-se em 31 de janeiro de 1961.
Uma vez no poder, Jânio Quadros encetou, com vistas ao restabelecimento do equilíbrio financeiro do País, uma pressão sobre o consumo e o reajustamento cambial. Criou os ministérios da Indústria e Comércio e das Minas e Energia. Jânio nomeou uma comissão para definir a limitação da remessa de lucros para o Exterior; instaurou inquéritos para apurar denúncias de corrupção administrativa e exigiu drásticas medidas antiinflacionárias. Jânio como presidente não e muito diferente do Jânio governador. Continuava com uma personalidade conflitante e muitas vezes difícil de ser entendida. Sua política externa (abertura comercial e diplomática) - incluindo sua inclinação a defender a Revolução Cubana, chegando a prestigiar "Che" Guevara com a alta condecoração nacional -, acabou criando e provocando forte reação contra ele. Carlos Lacerda, governador da Guanabara, denuncia um golpe janista. A própria opinião pública que o apoiava começa a reagir contra algumas de suas medidas (proibição do uso de biquíni, proibição da chamada "briga-de-galo" e regulamentação das corridas nos jóqueis-clubes) etc. O controverso político, que chegou à Presidência da República com a maior votação que um homem público jamais havia alcançado no Brasil até então, surpreendeu toda a Nação, no dia 25 de agosto de 1961, após quase 7 meses de governo, com a sua renúncia ao cargo de presidente. Este gesto nunca foi totalmente esclarecido. Na ausência do vice-presidente, João Goulart, que se encontrava visitando a República Popular da China, assumiu o posto o presidente da Câmara dos Deputados, Ranieri Mazilli. Estava deflagrado o processo que resultaria no Movimento Revolucionário de Março de 1964. Voltando de uma viagem à Europa, Jânio candidatou-se, em 1962, ao governo de São Paulo e foi derrotado.
Verificou-se uma radicalização acentuada dos partidos políticos de direita e de esquerda, relativa à orientação dada aos assuntos econômicos e políticos, nas relações internas e externas.
Após a renúncia de Jânio, os ministros da Guerra, Marinha e Aeronáutica julgaram inconveniente à Segurança Nacional o regresso do vice-presidente, acusado de comprometimento com os comunistas. Em oposição aos ministros militares levantou-se o governador Leonel Brizola, defendendo a "legalidade". Com a evolução da crise política e a radicalização dos grupos antagônicos, o País se viu diante da possibilidade de uma guerra civil. Diante da grave situação interna e visando contornar o veto dos ministros militares à posse do vice-presidente como chefe de um regime presidencialista, o Congresso aprovou a Emenda Constitucional n° 4 à Carta de 1946, que instaurava o regime parlamentarista no Brasil.
6. Governo João Goulart (1961-1964)
João Goulart era o herdeiro político de Getúlio e também alvo dos adversários de Vargas. Era o líder de um grande partido - o PTB. Rico estancieiro do Rio Grande do Sul, Jango carecia de visão política à longo prazo e não tinha a popularidade de um grande político.
Seu primeiro período de governo, enfraquecido pelo regime parlamentarista e tumultuado pelas sucessivas tentativas de se formar um Gabinete, representou uma época de manobras políticas para recuperar a plenitude dos poderes presidenciais. Procurou conquistar a confiança dos grupos conservadores e dos militares, revelando princípios que pudessem ser identificados como anticomunistas e comprometidos com o processo democrático. Mas, ao mesmo tempo, manobrava para garantir-se com a esquerda através de programas tipo "reformas de base" etc. Este seu jogo com a esquerda revelou-se perigoso, ante a multiplicidade de interesses e pressões que as lideranças deste grupo (fracionado em inúmeros subgrupos) procuraram impor a seu governo.
Em julho de 1962, Tancredo Neves renunciou ao cargo de primeiro-ministro. San Tiago Dantas, nomeado para substituí-lo, não foi aceito pela Câmara dos Deputados. Auro de Moura Andrade, indicado a seguir, não conseguiu formar um ministério, pedindo demissão. O professor Brochado da Rocha conseguiu finalmente articular um ministério. Governou apenas até o dia 17 de setembro de 1962, quando seu ministério renunciou, em virtude de não concordar quanto à estratégia do plebiscito para reimplantar o regime presidencialista.
O novo primeiro-ministro era o professor Hermes Lima, que se manteve no poder até janeiro de 1963, quando num plebiscito foi rejeitado o parlamentarismo, sendo restabelecido o presidencialismo com a revogação da Emenda Parlamentarista.
João Goulart iniciou sua fase presidencialista batendo-se pelas "reformas de base", uma plataforma populista e esquerdizante que objetivava atrair as massas e aumentar o seu prestígio político.
Em 12 de setembro de 1963, ocorreu em Brasília, por motivos eleitorais, um levante de sargentos da Marinha e da Aeronáutica, prontamente dominado. No mês seguinte frustrou-se uma tentativa de instauração do estado de sítio, proposta pelos ministros militares e encaminhada pelo presidente ao Congresso, mas rapidamente retirada, haja vista a hostilidade da opinião pública. A situação político-militar agravou-se rapidamente e no campo econômico Goulart já cogitava, em 1963, decretar uma moratória internacional, pois o País não poderia mais pagar seu débito externo.
A agitação de cunho esquerdizante, promovida pelo próprio governo, chegando mesmo a fomentar a indisciplina entre integrantes das Forças Armadas, inquietou a classe dirigente e chefes militares, já apreensivos com a inflação galopante e a queda da taxa de desenvolvimento.
Com a cooperação dos governadores dos Estados de Minas Gerais, São Paulo, Guanabara e Rio Grande do Sul, as Forças Armadas depuseram o presidente Goulart, aos 31 de março de 1964.
O Congresso Nacional, no dia 2 de abril, declarou a vacância da Presidência da República, assumindo a o presidente da Câmara, o deputado Ranieri Mazilli. Em 9 de abril, o Alto Comando Revolucionário, composto dos novos ministros da Guerra, Marinha e Aeronáutica - o general Costa e Silva, o vice-almirante Augusto Rademaker Grunewaid e o tenente-brigadeiro Correia de Melo -, editou o Ato Institucional Número 1, redigido por Francisco Campos.
De acordo com o Ato, o Congresso Nacional elegia para a Presidência da República o chefe do Estado-Maior do Exército, o general Humberto de Alencar Castelo Branco, que tomou posse em 15 de abril de 1964.
Regime Militar (1964-1985)
A Revolução democrática de 1964 foi desfechada para evitar a ameaça "comunista", e em defesa da democracia e da liberdade. Com ele, iniciavam-se os vinte e um anos do chamado "regime militar", marcado pelas restrições aos direitos e garantias individuais, pela extinção dos antigos partidos políticos. Procurando descaracterizar-se como um Estado de Exceção, a nova ordem, manteve algumas instituições democráticas: o Congresso Nacional. As eleições, em todos os níveis se processariam dentro das variadas regras e restrições, que se estabeleceriam a partir de 1964.
O novo regime tinha um dos seus mais importantes fundamentos na Doutrina de Segurança Nacional, fortemente influenciada pela conjuntura da Guerra Fria e pela crise do populismo. Segundo essa doutrina, que substituía o conceito de "defesa nacional" pelo de "segurança nacional", era preciso combater os comunistas e outras forças "subversivas" que se infiltravam em todos os setores da comunidade brasileira, visando desestabilizar o governo. as autoridades e as instituições nacionais. Para isso, deu-se início à planificação global do País, visando à superação dos problemas de natureza social, política e econômica, instrumentalizados pelas forças do comunismo. Foram criadas novas políticas, abrangendo todas as atividades nacionais, destacando-se, entre elas, a política econômica, cujo objetivo maior era o desenvolvimento econômico e a integração nacional centralizada, associada ao capital estrangeiro.
1. Governo Marechal Castelo Branco (1964-1967)
Ao tomar posse, em abril de 1964, Castelo Branco defrontou-se com quatro problemas básicos: a alta galopante dos preços, que ameaçava a economia; a estagnação da produção; a crise da balança de pagamentos e a desordem político-social. Toda essa situação levou virtual paralisação dos investimentos estrangeiros.
Após o período inicial de expurgos e cassações, o Governo Castelo Branco, constituído de uma mistura de poli ticos e tecnocratas, deu início a um amplo programa d estabilização econômica e combate inflacionário. Castelo Branco lançou as bases das reformas administrativa, eleitoral, bancária, tributária, habitacional, política e agrária. Criou o Cruzeiro Novo; implantou o Banco Central e o Banco Nacional de Habitação, unificou a Previdência Social através do INPS; integrou o Brasil nas comunica;ões por satélite e criou a Embratel. Foi ele o responsável pelo restabelecimento da ordem interna; reformou as instituições militares e os ministérios, procurou restaurar o País econômica e financeiramente; criou o Fundo de Ga:antia por Tempo de Serviço. Apesar das dificuldades surgidas durante o Governo Castelo Branco, ele criou condições para a elaboração de um plano de desenvolvimento que visava atender aos objetivos da Revolução. Mas o problema básico do Governo Castelo Branco era o de formular uma base política. Seu mandato, que terminaria em janeiro de 1966, foi prorrogado, em julho de 1964, até 15 de março de 1967. Por outro lado, os líderes políticos que apoiaram o Movimento de Março de 64 formavam um grupo extremamente heterogêneo e não demorou muito para começar a surgir divergências entre eles quanto aos destinos do movimento. Ante o posicionamento daqueles líderes políticos, viu-se o governo revolucionário diante da necessidade de modificar o processo eleitoral para resguardar o próprio Movimento de Março de 64. Nas eleições de outubro de 1965, por exemplo, dos onze Estados onde ocorreram eleições, em dois - Guanabara e Minas Gerais - venceu a oposição (Negrão de Lima e Israel Pinheiro). A ala radical do governo - a chamada "linha dura" - reagiu e em conseqüência o presidente promulgou o Ato Institucional Número 2 (27/10/1965), que extinguia os partidos políticos. Deu-se então a respectiva recomposição, constituindo-se dois partidos: a Aliança Renovadora Nacional (ARENA) e o Movimento Democrático Brasileiro (MDB), sendo o primeiro governista e o segundo da oposição. Em 5 de fevereiro de 1966, baixou o Ato Institucional Número 3, que regulou as eleições indiretas, a cargo das Assembléias Legislativas, para o governo de onze Estados brasileiros.
Nos dois últimos meses de 1966, o governo preparou e encaminhou ao Congresso o projeto de autoria de Carlos Medeiros da Silva, na época ministro da Justiça, para a nova Constituição - que seria a quinta da República e a sexta do Brasil-, e cuja tramitação foi fixada pelo AI-4.
A nova Constituição foi promulgada em janeiro de 1967. Nela mantinham-se o federalismo e o presidencialismo reforçado, com eleições indiretas para presidente e vice-presidente. Por outro lado, a Constituição permitia ao presidente: decretar estado de sítio sem consultar o Congresso durante 180 dias; decidir pela intervenção federal nos Estados para evitar perturbações internas ou para garantir o respeito às leis; decretar o recesso do Congresso; legislar por decretos; demitir funcionários civis ou militares, cassar mandatos e suspender por 10 anos os direitos políticos.
Em fevereiro de 1967, foi reformado o padrão monetário, criando-se o cruzeiro novo e reajustando-se a taxa do dólar em bases mais realistas. O último ato do Governo Castelo Branco foi a instituição da Lei de Segurança Nacional.
Pouco depois de deixar a Presidência, aos 18 de julho de 1967, Castelo Branco morreu num desastre de avião, perto de Fortaleza.
2. Governo Marechal Costa e Silva (1967-1969)
Arthur da Costa e Silva, que assumiu o poder em 15 de março de 1967, teve uma gestão bastante agitada. Articularam-se contra o regime várias alas oposicionistas que haviam formado a chamada Frente Ampla. Reagindo, providenciou o ministro da Justiça, o Prof. Gama e Silva, a sua supressão, de acordo com a Constituição.
Em 1968, sob a inspiração das violentas agitações estudantis que eclodiram na Europa e em particular na França, registraram-se graves tumultos de rua em várias capitais do País, que colocaram em risco o Movimento Revolucionário de 1964. A conduta contrária dos líderes políticos da oposição diante das medidas propostas pelo Executivo para conter a evolução da crise interna fez com que o governo reforçasse o Poder Executivo, através do AI-5. O Congresso foi colocado em recesso e o governo assinou mais sete Atos Institucionais e 24 complementares para preservar os objetivos revolucionários de 1964.
No Governo Costa e Silva, foi criada a Petroquisa, empresa subsidiária da Petrobrás, que visava acelerar o desenvolvimento da indústria petroquímica. Dotada de estrutura elástica, a nova companhia ficou autorizada a associar-se com empresas particulares para a realização de seus projetos. Além disso, foi iniciada a construção da ponte Rio-Niterói (que receberia o nome de Presidente Costa e Silva), reaparelhou-se a Marinha Mercante e iniciou-se a implantação da Previdência Rural.
Preocupado com o retomo à legalidade, Costa e Silva confiou ao vice-presidente Pedro Aleixo a missão de elaborar uma nova Constituição que conciliasse uma abertura democrática com os dispositivos contidos no AI-5. Essa segunda Constituição revolucionária estava pronta para ser assinada, quando o presidente foi acometido de súbita enfermidade (agosto de 1969) que o obrigou a afastar-se do cargo. Uma junta militar, composta pelo general Aurélio Lyra Tavares, pelo almirante Augusto Rademaker e pelo brigadeiro Márcio de Souza e Melo, assumiu o poder em lugar do vice-presidente Pedro Aleixo. O seqüestro do embaixador dos Estados Unidos por elementos da esquerda agravou a crise política. No dia 6 de outubro de 1969, diante de impossibilidade de recuperação de Costa e Silva, a junta militar considerou extinto o seu mandato - um ano e sete meses antes do término legal-, indicando o general Médici como o seu sucessor e o almirante Rademaker como vice-presidente. Em 17 de dezembro de 1969, faleceu Costa e Silva, vítima de um enfarte.
3. Governo General Garrastazu Médici (1969-1974)
No mesmo dia da posse (30/10/69), entrou em vigor a Emenda Número 1 à Constituição de 1967. Por essa emenda, 58 artigos foram acrescentados ou substituíram outros. As principais inovações introduzidas foram: mandato presidencial de 5 anos; confirmação de todos os Atos Institucionais, só suspensos por decretos presidenciais; eleições indiretas para governador em 1970, passando a diretas a partir de 1974; pena de morte para os casos de guerra revolucionária ou subversão; número de deputados calculado de acordo com o eleitorado e não mais com a população; alteração no estatuto da inviolabilidade parlamentar; ampliação das faculdades do Executivo em legislar por decreto-lei; e impedimento do Poder Judiciário em rever atos praticados com base nos Atos Institucionais e Complementares.
Um dos primeiros atos do novo presidente foi a assinatura do decreto-lei que estendeu para 200 milhas os limites do mar territorial brasileiro. Durante o seu governo foi criado o Plano de Integração Nacional, que incluía a construção das rodovias Transamazônica, Cuiabá-Santarém e Manaus-Porto Velho; foi implantado um programa de colonização às margens das rodovias; executou-se o Projeto Radam (levantamento das riquezas da Amazônia); foram desenvolvidos a irrigação do Nordeste, o Programa de Integração Social, determinando que parte do Imposto de Renda e uma parcela do faturamento das empresas privadas fossem destinadas à constituição de um fundo em benefício dos empregados, o Movimento Brasileiro de Alfabetização (Mobral), o Programa de Assistência ao Trabalhador Rural (Pró-Rural) etc.
O desenvolvimento atingido pelo País em diversas frentes e a conseqüente ampliação dos mercados de trabalho, os chamados grandes projetos de impacto lançados durante o Governo Médici, as vitórias esportivas do Brasil (a exemplo do Tricampeonato Mundial de Futebol, as sucessivas conquistas de Émerson Fittipaldi no automobilismo e de Éder Jofre no boxe), o trabalho desenvolvido pela Assessoria Especial de Relações Públicas da Presidência da República (AERP), no sentido de promover os valores cívicos e divulgar as realizações do governo, as campanhas institucionais do Conselho Nacional de Propaganda - CNP (entidade privada mantida por empresas particulares de comunicação social) - de estímulo às exportações, à educação, e diversos outros fatores fizeram com que o Governo Médici atingisse um alto grau de popularidade.
4. Governo General Ernesto Geisel (1974-1979)
Durante 1974, foram criados o Ministério da Previdência Social, a Secretaria do Planejamento e o Conselho de Desenvolvimento Econômico; decidiu-se a fusão do Rio de Janeiro com a Guanabara e estabeleceram-se as relações diplomáticas com a República Popular da China (15/08/74).
Nas eleições parlamentares (dezembro de 1974), verificou-se expressiva vitória do MDB, que, para o Senado, ganhou em 16 dos 22 Estados brasileiros. Devido a este resultado, o governo começou a preparar seu programa de ação para as eleições seguintes, em nível municipal, a serem realizadas em 1976. No dia 10 /07/76 foi aprovada a Lei n° 6.639 - cujo texto fora solicitado no Ministério da Justiça e logo batizada de "Lei Falcão" -, que estabelecia as seguintes diretrizes gerais para a campanha eleitoral através do sistema de radiodifusão: divisão em partes iguais para os partidos e seus candidatos de horário gratuito, apresentação do nome do candidato, sua legenda, seu número, seu currículo e sua fotografia. Com isso, o candidato a cargo eletivo via-se diante da necessidade de conquistar cada voto no contato direto com o eleitor.
Em dezembro de 1974, Geisel divulgou o II Plano Nacional do Desenvolvimento, que definia a política socioeconômica para 1975/79. Em janeiro de 1975, criaram-se a Comissão de Indústria da Construção Civil e o Polocentro (Programa de Desenvolvimento dos Cerrados). Em abril, foi aprovado o Plano Nacional de Saneamento; em junho, foi assinado o acordo de cooperação nuclear Brasil-Alemanha. Em dezembro, os presidentes Geisel e Stroessner assinaram o Tratado de Amizade Brasil-Paraguai, de colaboração econômica, tecnológica e cultural entre os dois países.
No dia 9 de outubro de 1975, foram anunciadas medidas para enfrentar os efeitos sobre o Brasil da crise econômica mundial: a Petrobrás ficou autorizada a assinar contratos com empresas estrangeiras para exploração de petróleo no Brasil. Nesses contratos existiam cláusulas que transferiam todos os riscos de despesas de pesquisa e exploração às empresas interessadas, caso estas não encontrassem petróleo nas áreas contratadas (são os popularmente conhecidos "contratos de risco"). Foram ainda pesadamente sobretaxadas as importações de artigos considerados supérfluos. Em fevereiro de 1976, o presidente da República instituiu o Programa Nacional de Alimentação e Nutrição; em maio, inaugurou a Hidrelétrica de Marimbondo, entre São Paulo e Minas Gerais, e assinou a ata de constituição da Siderúrgica de Tubarão. Em 05/06/1976, assinou o Decreto-lei n° 1.470, criando um depósito prévio de Cr$ 12.000,00 para os viajantes ao Exterior.
O ano de 1976 foi marcado por importantes viagens do presidente Geisel ao Exterior: à França, à Inglaterra e ao Japão.
O chamado "programa de aperfeiçoamento do regime democrático", que lenta e gradualmente o presidente Geisel vinha desenvolvendo, possibilitaria: a criação de novos partidos políticos no País; o aumento dos poderes Legislativo e Judiciário; a participação representativa dos integrantes do segmento civil em todos os níveis de decisão do Estado; e preparar o retomo às atribuições exclusivamente constitucionais de militares da ativa que, devido à conjuntura revolucionária, vinham ocupando cargos e funções tradicionalmente civis.
5. Governo General João Baptista de Figueiredo (1979-1985)
Considerado "o presidente da abertura", o general João Baptista de Oliveira Figueiredo foi eleito pelo Colégio Eleitoral, frustrando dois outros candidatos sem nenhuma chance de vitória: o senador Magalhães Pinto e o general Euler Bentes Monteiro. Pela primeira vez, um candidato do chamado "Ciclo Revolucionário" percorreu o País inteiro antes de tomar posse no Planalto. Como "homem da Revolução de 1964", Figueiredo sempre esteve ligado a seu predecessor, o general Geisel, tendo ainda sido chefe do Gabinete Militar do presidente Médici e chefe do Serviço Nacional de Informações (SNI).
O novo presidente aproveitou ex-ministros dos quatro governos pós-64, atraiu técnicos e aceitou algumas indicações políticas. A seu ministro do Planejamento, Antônio Delfim Neto, coube pôr em prática um programa de governo que previa a contenção das despesas, a descentralização administrativa, a diminuição da inflação, a privatização de empresas e serviços estatais e a concessão de prioridade à agricultura e às exportações.
No âmbito da política interna, Figueiredo assinou, em 27 de junho de 1979, o projeto de anistia que seria enviado para a aprovação do Congresso, sem, no entanto, beneficiar os terroristas e tampouco devolvendo aos funcionários e militares cassados os cargos e patentes perdidos. Em novembro do mesmo ano, a reforma partidária extinguiu o bipartidarismo no País, possibilitando a formação de novas agremiações político-partidárias. Conseqüentemente, uma nova ordem política começou a se delinear através do surgimento do PSD (Partido Social Democrático, composto pela maioria dos antigos arenistas), PMDB (Partido do Movimento Democrático Brasileiro, que manteve seu caráter de frente oposicionista criado em 1965, quando da fundação do antigo MDB), PTB (Partido Trabalhista Brasileiro, organizado pelo ex-governador Leonel Brizola, mas que acabou passando para o controle da ex-deputada Ivete Vargas, o que levou Brizola a criar o PDT - Partido Democrático Trabalhista) e PT (Partido dos Trabalhadores, liderado por muito tempo pelo metalúrgico Luís Inácio Lula da Silva).
Com as eleições diretas para os governos estaduais, em 1982, o mapa político do País foi profundamente alterado. A oposição elegeu 10 dos 22 governadores (entre eles, os de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro) e a maioria da Câmara dos Deputados.
A partir de 1983, sociedade civil participou ativamente do movimento das Diretas-Já. No ano seguinte, a Emenda Dante de Oliveira, que propunha o restabelecimento das eleições diretas para presidente da República, foi derrotada no Congresso Nacional. Nesse mesmo ano, as oposições decidiram enfrentar o regime militar nas eleições do Colégio Eleitoral, valendo-se da cisão dentro do PDS, que deu origem ao PFL (Partido da Frente Liberal). A aliança do PMDB e PFL resultou na Aliança Democrática, que lançou a chapa Tancredo Neves - José Sarney. Em 15 de janeiro de 1985, Tancredo Neves, candidato das oposições, derrotou Paulo Maluf, o candidato do governo, dentro do próprio Colégio Eleitoral.
Eleito presidente da República, Tancredo Neves não chegou a tomar posse, vindo a falecer em 21 de abril de 1985.
A NOVA REPÚBLICA
Desde 1985, o Brasil vive um momento da sua História que muitos chamam de Nova República. Com a redemocratização, as liberdades, direitos e garantias individuais foram restabelecidas, e uma nova Constituição assegurou várias conquistas sociais.
A nova Constituição Brasileira foi promulgada em 5 de outubro de 1988. Manteve a forma republicana de governo, o sistema presidencialista, a divisão harmônica dos Três Poderes e ampliou o mandato presidencial para 5 anos. Além disso, apresentou importantes inovações. O voto universal, secreto e obrigatório para ambos os sexos, dos 18 aos 70 anos, tornou-se facultativo entre os 16 e os 18 anos, bem como para os analfabetos. No plano eleitoral, foram estabelecidas as eleições diretas em dois turnos para presidente da República, governadores dos Estados e prefeitos das cidades com mais de 200 mil eleitores. No terreno social garantiu-se a livre criação de sindicatos, a ampliação do direito de greve, a ampliação da licença-gestante para 120 dias e as férias remuneradas com acréscimo de 1/3 sobre o salário.
1. Governo Sarney (1985-1990)
Quando Tancredo Neves não pôde tomar posse por motivo de doença, o vice-presidente José Sarney assumiu interinamente a Presidência da República e, com a morte de Tancredo, tornou-se presidente efetivo. Em seu governo teve início a transição democrática, enquanto se procurava uma solução para a crise econômica que se abatia sobre o País.
No processo de transição democrática, foram adotadas medidas para o pleno restabelecimento da democracia: eleições diretas em todos os níveis, legalização de partidos políticos de quaisquer tendências (inclusive os comunistas) e a convocação de uma Assembléia Constituinte.
Em 28 de janeiro de 1986, foi decretado o Plano Cruzado, que determinava a substituição do cruzeiro pelo cruzado na proporção de mil para um, congelava preços e aluguéis e reajustava automaticamente os salários, sempre que a inflação chegasse a 20%. O seu fracasso levou ao Plano Bresser (1987) e ao Plano Verão (1989), quando a moeda foi mudada para o cruzado novo; mas também esses projetos não deram resultado, e a inflação atingiu os maiores índices da História do Brasil.
2. Governo Collor (1990-1992)
Em 15 de março de 1990, Fernando Collor de Mello, ex-governador de Alagoas, tomou posse como o primeiro presidente eleito, de forma direta, depois de 25 anos. Iniciou imediatamente a luta contra a crise econômica, através do Plano Brasil Novo.
Mais conhecido como Plano Collor, o novo plano econômico extinguiu o cruzado novo e voltou ao padrão cruzeiro; congelou preços e salários e bloqueou a maior parte do dinheiro das contas bancárias, poupança e aplicações financeiras. Nos meses seguintes, o governo demitiu milhares de funcionários públicos e reduziu os impostos de importação de vários produtos, com o objetivo de forçar a queda dos preços dos produtos nacionais.
Entretanto, graves denúncias de corrupção, envolvendo altos escalões do governo e familiares do presidente levaram o Congresso a formar uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito), a qual constatou a existência de um esquema de corrupção que envolvia o próprio presidente. Diante da ameaça de sofrer um impeachment (impedimento de exercer a Presidência da República) e da pressão da sociedade civil, Collor renunciou após dois anos de governo.
3. Governo Itamar Franco (19921995)
O vice-presidente Itamar Franco assumiu oficialmente a Presidência em 29 de dezembro de 1992, procurando ajustar o seu Ministério às forças políticas do Congresso Nacional. Seu governo foi marcado pelo plebiscito de abril de 1993 e pela aplicação do Plano Real, criado pela equipe econômica do ministro da Fazenda Fernando Henrique Cardoso.
O plebiscito, consulta popular de 21 de abril de 1993, envolvia duas escolhas: entre a República e a Monarquia (formas de governo) e entre Parlamentarismo e Presidencialismo (sistemas de governo). A República e o Presidencialismo venceram o plebiscito com 55,45% do total dos votos.
A popularidade do Plano Real, que conseguiu baixar a inflação, deu a Fernando Henrique a vitória nas eleições presidenciais de 3 de outubro de 1994.
A produção cultural após 1945
A produção cultural brasileira, a partir dos anos 50, reflete em todas as suas manifestações as tendências que marcaram a cultura contemporânea do pós-Segunda Guerra Mundial. Assim, a cultura brasileira procurou se adequar às novas formas de linguagem e aos novos padrões estéticos que revolucionaram o convencionalismo, até então vigente. Contudo, buscava-se de forma crítica, compreender os problemas da nossa realidade social e política, com todas as suas características próprias. Iniciava-se nessa década o processo desenvolvimentista urbano-industrial que mudaria completamente as feições do País.
O Teatro
A partir do TBC (Teatro Brasileiro de Comédia) marco na história do teatro brasileiro - seriam geradas várias tendências e movimentos que inovaram a arte cênica nacional, procurando valorizar textos e autores brasileiros. Destaque-se nessa época, as montagens de "A Moratória", "Ossos do Barão", "Bonitinha mas Ordinária", "Auto da Compadecida" e outras peças do repertório nacional.
Nos anos 60, em meio à conjuntura de efervescência política, surgiu em São Paulo o Teatro de Arena; uma vigorosa tendência de reação à postura convencional do TBC. Nele foram encenados textos e autores afinados com o momento histórico brasileiro, suas contradições e seus problemas sociais e políticos, dentro de uma perspectiva do teatro despojado, caracterizado pelas montagens simplificadas. Na mesma linha surgiriam, ainda, o Teatro Oficina - também em São Paulo - e o Grupo Opinião, no Rio de Janeiro. Augusto Boal, Gianfrancesco Guarnieri e Oduvaldo Viana Filho - Vianinha - seriam as grandes expressões desse teatro essencialmente político e de grandes realizações, como "Revolução na América do Sul", "Eles não usam Black-Tie", "Chapetuba Futebol Clube" e os musicais "Arena conta Zumbi", "Roda Viva" e outros. O teatro crítico e de participação quebrava os limites entre público e atores e, assim, palco e platéia tomavam-se um único espetáculo.
Com a crise política da década de 1970, surgiram novos grupos teatrais, dentro de uma linha de vanguarda e com ênfase à produção coletiva, como Asdrubal Trouxe o Trombone, Pood Minoga e Ornitorrinco. Nas duas últimas décadas emergiram novos autores e encenadores, como Otávio Frias Filho e Valter Rasi; alternaram-se as montagens de textos clássicos com novos trabalhos voltados para problemas pontuais ou do cotidiano. Destaque-se, aí, o sucesso de montagens digestivas, como "Porca Miséria" e "Almanaque Brasil".
O Cinema
No cinema, por outro lado, os anos cinqüenta assistiram à falência das chanchadas e dos musicais ingênuos, imitação pobre das grandes produções de Hollywood, em voga desde a década anterior. O neo-realismo italiano, forjado na reconstrução de uma Europa destruída pela guerra e, ao final da década, a nouvelle vague francesa passaram a influenciar uma nova geração de cineastas brasileiros. Sob essa inspiração realizaram-se grandes filmes, ainda na década de 50, como "Rio 40 Graus", de Nelson Pereira dos Santos, por exemplo.
A década seguinte foi marcada pela evolução, na busca de um autêntico cinema brasileiro. O sucesso internacional de "O Cangaceiro" (1953), de Lima Barreto, e outras obras retratando o sertão e o cangaço, a possibilidade de realização de produções baratas e afinadas com a realidade brasileira criaram as condições para o surgimento do cinema novo, cuja máxima era: "uma câmera na mão e uma idéia na cabeça". A grande figura do cinema novo foi, sem nenhuma dúvida, o baiano Glauber Rocha, realizador de obras imortais, como "Deus e o Diabo na Terra do Sol" e "Terra em Transe" (1967).
A partir dos duros da repressão (década de 70), o cinema nacional voltou-se para os autores clássicos da literatura brasileira, disso resultando produções não menos famosas, como "São Bernardo", "Como era gostoso meu francês" e "Os Inconfidentes" etc.
Uma das tendências do cinema nacional nas duas últimas décadas é a valorização de temas relacionados às ocorrências da nossa História e aos tempos difíceis do autoritarismo, com destaque, respectivamente, para "Carlota Joaquina" e "Lamarca".
A Música
A música popular brasileira, por sua vez, apresentou uma série de transformações significativas. Na década de 1950, a estranha fusão do samba tradicional com o cool jazz (jazz frio) produziu a mais importante expressão musical do Brasil contemporâneo: a bossa nova. A harmonia jazística, as batidas sincopadas do violão e a interpretação suave e intimista de seus intérpretes, como João Gilberto, fizeram da bossa nova um gênero musical peculiar. Criticada pelos puristas como uma música de elite (de apartamentos da Zona Sul carioca), e alienada em relação aos problemas da época, a bossa nova tomou-se um importante referencial da música popular brasileira, com grande repercussão no Exterior.
Foi a partir da bossa nova, nos anos sessenta, que passou a se constituir a MPB (Música Popular Brasileira), fundindo elementos da música erudita, ritmos africanos e da música folclórica e de raízes, como a música caipira. Nessa década, os festivais foram importantes agentes reveladores das várias tendências da música popular brasileira, como a música urbana de Chico Buarque de Holanda, a toada sertaneja moderna, como "Disparada", de Geraldo Vandré, e "Ponteio", de Edu Lobo, entre outras. A produção musical dessa época foi marcada pelo protesto, pela denúncia, em plena passagem para a ditadura militar repressiva e intolerante. Nessa medida, a música - ao lado do teatro - foi um dos mais importantes núcleos de resistência ao autoritarismo dos anos 60 e 70. Esse caráter político pode ser explicado pelo surgimento de compositores e autores com reconhecida militância na política estudantil, vinculados ao Centro Popular de Cultura (CPC), da União Nacional dos Estudantes (UNE).
A década de sessenta conheceria ainda a tropicália, uma complexa fusão da MPB, bossa nova, ritmos latinos e ingredientes da música erudita, dando uma nova dimensão aos textos e versos de Oswald de Andrade e dos concretistas Haroldo e Augusto de Campos e Décio Pignatari; tudo dentro da concepção plástica de Hélio Oiticica. O tropicalismo, entendido como a busca de uma estética verdadeiramente brasileira (mesmo no seu universalismo, capaz de unir guitarras elétricas, elementos do pop internacional, violinos e atabaques africanos), teve em Torquato Neto, Tom Zé, Caetano Veloso, Gilberto Gil e no maestro Rogério Duprat suas grandes expressões. Sua forma caótica, identificando-se com a revolução comportamental e a contracultura, típicos do período, valeu-lhe pesadas críticas das esquerdas ligadas à UNE e dos cultores da MPB, tendendo cada vez mais a buscar, nos compositores da "velha guarda", a trilha da autêntica música brasileira.
Queda do Império, implantação e consolidação da República no Brasil
A queda do Império
A crise do Império brasileiro é explicada, essencialmente, pela inadequação do regime monárquico às transformações processadas na economia e na sociedade, a partir da segunda metade do século XIX. Com efeito, o remanejamento político-administrativo atenderia às necessidades do crescimento econômico do País, bem como aos interesses dos grupos sociais preponderantes. As questões abolicionista e religiosa, agravadas pelas tensões sociais e econômicas, precipitaram a Questão Política. A Questão Militar apresentou-se, num último momento, como o elemento catalisador de todos os problemas, no nível político.
Podemos concluir que a crise fundamental do Império ocorria em nível da base (sócio-econômico); entretanto, o encaminhamento para sua solução se fez na esfera política, conduzindo o País para a forma republicana de governo.
Questão Social: O abolicionismo
Desde o Período Colonial, o escravismo vinha sendo a fórmula adequada para o aproveitamento do imenso território brasileiro. A escravidão moderna foi a forma para o capitalismo se efetivar na periferia do sistema.
No Brasil Imperial, como em toda a América, subsistia o motivo justificativo do trabalho escravo: a predominância da grande propriedade. E, além de sustentáculo da estrutura econômica, o escravismo era também o vínculo da estrutura social.
Foram os próprios negros, com a formação dos quilombos, que pela primeira vez contestaram a escravidão. Nos movimentos emancipacionistas (Inconfidência Mineira, Conjuração Baiana e Revolução Pernambucana de 1817) foi cogitada a abolição da escravatura.
A pressão britânica para a suspensão do tráfico negreiro, desde o início do século XIX, culminou com o Bill Aberdeen (1845), pelo qual a Inglaterra se arrogava o direito de apresar navios negreiros. Esta decisão do Parlamento britânico, por sua vez, provocou a promulgação da primeira lei restritiva ao tráfico negreiro no II Reinado, a Lei Eusébio de Queirós (1850), complementada pela Lei Nabuco de Araújo (1854).
Como conseqüência da cessação do tráfico, elevou-se o preço dos escravos, intensificando-se o comércio interno de negros; paralelamente, apresentou-se a imigração européia como solução para o problema de mão-de-obra.
A Campanha Abolicionista
A abolição tornou-se um imperativo depois da extinção do tráfico, não só pelo decréscimo que se registrava na população escrava (em parte devido a suas precárias condições de vida material), mas porque era mais vantajoso o trabalho livre em virtude de sua maior produtividade e dos menores riscos de investimento. Para a economia cafeeira, o assalariado, além de atender à contínua expansão dos cafezais, constituía um elemento dinâmico na formação de um mercado de consumo e, portanto, de novas áreas de investimento de capital.
Em 1868, o Partido Liberal assumira, publicamente, o compromisso de bater-se pela emancipação dos escravos.
Os conservadores, então no poder, promulgaram, em 1871, uma lei contemporizadora, a Lei do Ventre Livre, obra do gabinete do Visconde do Rio Branco.
Em 1880, organizam-se no Rio as sociedades abolicionistas, posteriormente coordenadas pela "Confederação Abolicionista". Essas sociedades reuniam vultos importantes: Joaquim Nabuco, Rui Barbosa, José do Patrocínio, Luís Gama e André Rebouças.
Em 1884, Ceará e Amazonas antecipam-se, extinguindo totalmente, em seus territórios, o regime escravista.
Em 1885, mais uma tentativa mistificadora é realizada. Promulga-se, nesta data, a Lei Saraiva-Cotegipe (Lei dos Sexagenários), decretando a alforria dos escravos que atingissem a idade de 65 anos.
Multiplica-se a fuga de escravos. O Exército, convocado para dar-lhes caça, se recusa a prestar-se "à condição de capitão-do-mato" (representação de Deodoro da Fonseca em 1887).
A solução definitiva já não admitia maiores delongas.
Um levantamento feito da população escrava em 1887 revelava que, num total de cerca de 13.500.000 habitantes, havia somente 723.419 escravos.
O gabinete conservador de João Alfredo promoveu, então, a votação da Lei Áurea, sancionada pela Regente Princesa Isabel, a 13 de maio de 1888. A escravidão estava extinta no Brasil, mas o Império via definitivamente comprometida suas possibilidades de continuidade.
Com a abolição do escravismo, sem indenização aos proprietários, a aristocracia escravagistas, arruinada, lançou sobre a Monarquia a culpa por sua desgraça, passando a engrossar as fileiras do movimento republicano ("Republicanos de 13 de Maio"). A marginalização sócia econômica do negro liberto tomou-se um fenômeno nacional já nos fins do século XIX, pois à liberdade jurídica não corresponderam as demais liberdades essenciais à sua integração na sociedade.
A Questão Religiosa
A Constituição Imperial de 1824 preservou um dos mecanismos do Antigo Regime, submetendo a Igreja ao Estado (regalismo). Assim, concedeu ao Governo Imperial a faculdade de intervir na criação e preenchimento dos cargos eclesiásticos: o Padroado.
O Imperador exercia também o beneplácito, ou seja, a faculdade de examinar os atos de Santa Sé que, antes de entrar em execução no País, recebiam o placet do Imperador.
Por sua vez, a Maçonaria, atuante no Brasil por ocasião da Independência, assumira um papel mais beneficente que político, sendo composta inclusive pelos principais nomes da política imperial. Apesar de condenada pelo Papa, verificava-se no Brasil certa tolerância por parte das autoridades eclesiásticas, pois seus membros eram simultaneamente católicos e maçons.
A Questão Religiosa (ou Epíscopo-Maçônica) prende-se a vários incidentes ocorridos entre autoridades eclesiásticas e membros da Maçonaria, a partir de 1872: punição do Padre Almeida Martins (RJ), por haver pronunciado um discurso na Maçonaria; interdição, pelos bispos de Olinda (D. Vital Maria de Oliveira) e Belém (D. Antônio de Macedo Costa), de várias irmandades religiosas, pela não obediência ao disposto pela Encíclica Syllabus do Papa Pio IX, que exigia a eliminação dos elementos pertencentes à Maçonaria. Note-se, porém, que a Syllabus não recebera o placet do Governo Imperial.
Forte campanha foi iniciada pela imprensa contra a Igreja, tomando-se necessária a intervenção das autoridades imperiais. Como resultado, foram os bispos de Olinda e Belém condenados a quatro anos de prisão, por influência do Presidente do Conselho de Ministros, Visconde do Rio Branco (Grão-Mestre da Maçonaria). Apesar da anistia concedida em 1875, pelo Gabinete Caxias, evidenciou-se o conflito latente entre a Igreja e o Estado.
As Questões Militares
Até o término da Guerra do Paraguai, o Exército era politicamente ausente do Brasil; porém essa guerra exigiu uma força militar tecnicamente apta e com um quadro de oficiais profissionais, com preparo científico.
O Exército foi dessa sorte, reduzindo a Guarda Nacional a uma posição inexpressiva. Entretanto, o Exército era mantido numa posição de segundo plano político, determinando o descontentamento de muitos oficiais; o principal propagandista contra o governo era Benjamin Constant, oficial e professor da Escola Militar.
Vários fatores concorrem ainda para as questões: a proibição de os militares fazerem pronunciamentos através da imprensa; a influência do positivismo, propagado entre os militares; e o paisanismo do Imperador.
O espírito de classe manifestou-se vivamente entre os militares, não tolerando que os "casacas" pudessem ofender os "homens-de-farda", mesmo quando estes assumissem atitudes capazes de suscitar controvérsias.
A primeira questão refere-se ao tenente-coronel Sena Madureira, que se pronuncia pela imprensa, atacando o projeto de reforma do Montepio militar. Foi a partir desse episódio que o Governo proibiu que os militares se manifestassem pela imprensa.
A segunda questão prende-se à demissão de Sena Madureira do comando da Escola de Tiro de Campo Grande (Rio de Janeiro), pela recepção que dera, naquela entidade, ao jangadeiro cearense Francisco Nascimento, que evitara o embarque de escravos de Fortaleza para o Sul.
A terceira questão resultou de uma inspeção de rotina no Piauí, onde o coronel Cunha Matos verificara o extravio de fardamentos, além de negociatas com soldo das praças, e propusera a remoção do comandante do quartel; acusado de haver agido desonestamente, Cunha Matos defendeu-se pela imprensa, o que lhe valeu uma prisão de 48 horas.
A punição provoca enorme mal-estar, recebendo Cunha Matos a solidariedade de inúmeros oficiais de alta patente, inclusive do marechal Deodoro da Fonseca.
Um manifesto em termos enérgicos foi redigido e o Governo Imperial suspendeu as penas impostas.
A progressiva intervenção dos militares nas lides políticas caracteriza uma fase de acentuada decomposição do Império, motivada pelo enfraquecimento da base que o sustentava: a aristocracia escravista, profundamente abalada pelas campanhas abolicionistas. Aos poucos, surgia a preponderância do "poder militar" sobre o "poder civil".
A Proclamação da República
Durante a segunda metade do século XIX, o Império brasileiro conheceu mudanças na economia e na sociedade. Desenvolvia-se a lavoura do café, principalmente no Oeste Paulista. A exportação de borracha crescia. Esboçava-se um mercado interno, graças à maior utilização do trabalho assalariado, condicionando um "surto" industrial, a partir de 1874. Multiplicavam-se os organismos de crédito, enquanto os transportes se desenvolviam, principalmente através das ferrovias.
A população atingia 14 milhões de habitantes após 1880, ocorrendo, na região Centro-Meridional, entre outras, um fenômeno de urbanização.
O centralismo político-administrativo do regime imperial era incompatível com a nova realidade sócio-econômico. A solução seria a implantação de um sistema federativo, capaz de superar as discrepâncias regionais, impondo maior autonomia local.
Entre os fatores que levaram à República, assumem um papel de destaque os seguintes: predomínio das novas regiões cafeeiras na economia do País, projetando um novo e forte setor social: os modernos empresários do café, reivindicando o atendimento de seus interesses. O ideal de federação, que se adequava aos anseios dos vários grupos políticos do Brasil, só seria atingido com uma República Federativa. O receio do III Reinado, aliado à queda Napo1eão III na França, e o desprestigio da Monarquia em face das questões Religiosa, Militar e Social completam o quadro dos fatores explicativos do remanejamento institucional ocorrido em 1889.
O movimento republicano iniciou-se em 1870, com a fundação do Clube Republicano e do jornal "A República" e o lançamento de um "Manifesto Republicano".
Duas correntes se chocaram no Partido Republicano: a evolucionista (liderada pelos republicanos "históricos"), que preferia a via pacífica para conseguir o poder, e a revolucionária (liderada por Silva Jardim), que pregava a revolução popular. A corrente evolucionista predominou.
Por outro lado, eram também republicanos jovens oficiais do Exército, influenciados pela doutrina de Auguste Comte (positivismo) e liderados por Benjamin Constant.
O visconde de Ouro Preto, membro do Partido Liberal, foi nomeado Presidente do Conselho em junho de 1889. O novo governo precisava remover os obstáculos representados pelo republicanismo e pelos militares descontentes. Para vencer o primeiro, apresentou um programa de amplas reformas: liberdade de cultos, autonomia para as províncias, temporariedade dos mandatos dos senadores, ampliação do direito de voto e Conselho de Estado com funções meramente administrativas.
Acusado tanto de radical como de moderado, o programa foi rejeitado pela Câmara de Deputados. Diante disso, foi ela dissolvida, provocando protestos gerais.
Contra o Exército, Ouro Preto agiu, tentando reorganizar a Guarda Nacional e removendo batalhões suspeitos.
A situação tornou-se tensa. Os republicanos investigavam os militares contra o governo.
O golpe de 15 de Novembro resultou da conspiração na qual se uniram republicanos e militares, colocando-s como chefe ostensivo da mesma o marechal Deodoro da Fonseca, não republicano, mas de enorme prestígio no Exército.
A proclamação resultou da conjugação de duas forças: o Exército, descontente, e o setor cafeeiro da economia, pretendendo este eliminar a centralização vigente, através de uma República Federativa, que imporia ao País um sistema favorável a seus interesses. Portanto, a Proclamação não significou uma ruptura no processo histórico brasileiro: a economia continuou dependente, baseada no setor agroexportàdor; afora o trabalho assalariado, o sistema de produção continou o mesmo e os grupos dominantes continuaram a sair da camada social dos grandes proprietários. Houve apenas uma modernização institucional
A REPÚBLICA VELHA (1889-1930)
"O povo assistiu bestializado à Proclamação da República", escreveu o republicano Aristides Lobo, na época do evento. Referia-se ele ao fato de que a República nada mais foi que uma nova composição das classes dominantes. O novo regime foi uma transformação de cúpula; a velha aristocracia rural, de mentalidade colonial escravista, era substituída pelo setor empresarial cafeeiro, ansioso por apoderar-se do aparelho do Estado para colocá-lo inteiramente a seu serviço. Era, em suma, a ascensão de um governo burguês oligárquico.
No entanto, a República, rompendo com os quadros antiquados e conservadores do Império, abria novas perspectivas mais coerentes com a fase de prosperidade econômica em que o País entrara nos últimos anos do século XIX.
Os primeiros tempos da República brasileira, compreendidos entre 1889 e 1930, receberam a denominação de República Velha ou Primeira República. Esses 41 anos, porém, compreendem duas fases distintas: os cinco anos iniciais, de implantação e consolidação da nova ordem, são conhecidos como República da Espada; a partir de 1894 até 1930, deu-se a instalação do poder civil, configurando-se durante essa fase a República das Oligarquias.
1. A República da Espada
A República da Espada correspondeu ao período republicano de 1889/94, em que o governo foi exercido sucessivamente por dois militares. Isso, porém, não significa que as Forças Armadas tenham assumido o controle do País em seu próprio nome. Na verdade, o papel do Exército (com exclusão da Marinha, cuja ação política divergia do primeiro) foi antes o de consolidar as instituições republicanas e criar condições para que as lideranças políticas CIVIS, representantes das classes dominantes, pudessem assumir diretamente o poder.
Governo Provisório de Deodoro (1889-1891)
Instalado logo em seguida à proclamação de 15 de novembro, sob a chefia de Manuel Deodoro da Fonseca, o primeiro governo republicano foi marcado por uma série de conflitos, em razão de seus componentes representarem interesses antagônicos. Daí, a demissão coletiva do ministério, cujos principais membros tiveram estreitas ligações com a implantação do novo regime. Logo no início do Governo Provisório foram publicados os primeiros atos da República, uma série de medidas modernizadoras que introduziram importantes mudanças na organização institucional do País.
O Encilhamento
O governo republicano herdou do Império uma situação de grande endividamento externo; além disso, os preços do café estavam em baixa. Foi quando Rui Barbosa, o então ministro da Fazenda, procurou implementar uma política econômica e financeira, responsável pela crise conhecida como Encilhamento. O ministro tinha como objetivos o estímulo à produção agrícola e, principalmente, industrial, além da expansão dos negócios. Segundo ele, contudo, o pequeno volume de moeda em circulação era o grande inibidor de qualquer iniciativa econômica, sendo necessária, portanto, a ampliação do meio circulante. Com isso, iniciou-se a emissão desenfreada de papel-moeda por bancos autorizados e o crédito foi facilitado, permitindo-se a fundação indiscriminada de empresas, especialmente das sociedades anônimas cujas ações eram lançadas no mercado.
Com a entrada de um grande volume de dinheiro em circulação, os negócios aumentaram e o País conheceu um momento de euforia. Contudo, boa parte desse dinheiro não foi aplicado na produção, o que traria riquezas e empregos, mas sim na especulação de títulos e ações de empresas fantasmas. Como resultado, o País viveu uma verdadeira desordem financeira, com forte desvalorização da moeda e uma inflação acelerada e, por causa dela, uma acentuada elevação dos preços; na época verificou-se também um grande número de falências.
Muitos pequenos bancos quebraram embora os grandes tenham se fortalecido. Como a maioria desses negócios era realizada em plena rua, a agitação do local assemelhava-se à do Jóquei Clube. Isso porque, naquela época as apostas nas corridas de cavalos eram feitas no mesmo lugar em que os animais eram arreados, ou "encilhados", o que produzia uma grande confusão. Daí o nome Encilhamento dado a essa crise.
A Constituição de 1891
Durante o Governo Provisório, um Congresso Constituinte trabalhou na elaboração da primeira Constituição republicana. Sob a presidência de Prudente de Morais, os deputados constituintes, de uma maneira geral, eram fortemente influenciados pelo modelo norte-americano. Por fim, no dia 24 de fevereiro de 1891, foi promulgada uma nova Constituição do Brasil, confirmando os primeiros decretos do Governo Provisório, como os que instituíram a forma de governo republicana, o sistema presidencialista, a organização federativa do Estado e a extensão do direito de voto a todos os cidadãos.
A Constituição de 1891 estabelecia a tripartição dos poderes. O poder Executivo era exercido pelo presidente da República, eleito pelo voto direto para um mandato de quatro anos (sem direito à reeleição), ou no seu impedimento pelo vice-presidente, auxiliados pelos ministros de Estado, nomeados e demitidos livremente pela Presidência. O poder Legislativo passava a ser exercido pelo Congresso Nacional, formado pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal. Os deputados, representantes do povo, eram eleitos de forma direta para um mandato de três anos; o número de deputados era proporcional à população de cada unidade da Federação, ou seja, de cada estado. Os senadores, por sua vez, em número de três por estado e três pelo Distrito Federal, seriam eleitos para um mandato de 9 anos, renovando-se um terço a cada três anos. O Judiciário, por sua vez, tinha como órgão principal o Supremo Tribunal Federal, incluindo também outros tribunais e juízes federais.
Ficavam instituídas as eleições diretas em todos os níveis e o voto universal, masculino e a descoberto (ou seja, não-secreto) para os maiores de 21 anos. Não tinham direito de voto as mulheres, os soldados e cabos das Forças Armadas e dos corpos policiais, os analfabetos, os mendigos e os religiosos do clero regular.
As antigas províncias, agora transformadas em estados da União, passavam a ter ampla autonomia política, econômica e administrativa; o Município Neutro do Rio de Janeiro passou a se denominar Distrito Federal. e continuou sendo a capital da República. Ficava estabelecida a liberdade religiosa, com garantia para o exercício de todos os cultos. A Constituição assegurava, ainda, a liberdade, bem como os direitos e garantias individuais, abolindo a pena de morte. Contudo, nos casos de instabilidade política e social que comprometessem a ordem interna, esses direitos e garantias individuais poderiam ser suspensos temporariamente, com a decretação do estado de sítio.
A primeira eleição presidencial
As "Disposições Transitórias" da Constituição de 1891 determinaram que os primeiros presidente e vice-presidente da República deveriam ser eleitos indiretamente pelo Congresso Nacional, para um mandato de quatro anos. Essas eleições, reveladoras dos primeiros choques políticos da República Velha, envolvendo positivistas e republicanos históricos, foram disputadas por duas chapas. A primeira, de Deodoro, tendo como vice o almirante Eduardo Vandenkolk, tinha o amplo apoio dos militares, que aceitavam até a idéia de um golpe para garantir sua vitória. A segunda, correspondendo aos interesses dos políticos civis, em especial dos cafeicultores, surgia como a oposição à eleição do chefe do Governo Provisório, a quem responsabilizavam pela crise do Encilhamento. O seu candidato era o paulista Prudente de Morais, tendo como vice-presidente o marechal Floriano Peixoto, que, além de liderar a jovem oficialidade do Exército, tinha amplo apoio do setor cafeeiro.
Com isso, o setor cafeeiro procurava enfraquecer Deodoro, além de provocar a cisão do bloco militar. Na eleição, Deodoro derrotou Prudente, mas Vandenkolk perdeu para Floriano, cuja votação superou a do próprio presidente eleito. Isso porque, conforme previa a Constituição, o voto não era vinculado.
Governo Constitucional de Deodoro (1891)
O governo de Deodoro, autoritário e com tendências centralizadoras, sempre esteve em crise: não tinha o apoio da maioria do Congresso Nacional, sofria forte oposição do PRP (Partido Republicano Paulista, representante dos cafeicultores) e era atacado por setores militares ligados a Floriano; além disso, foi acusado de envolvimento em corrupção ao favorecer amigos pessoais, como por exemplo, a construção de um porto na cidade de Torres, no Rio Grande do Sul.
Nesse passo, o Congresso votou o projeto da Lei das Responsabilidades do Presidente da República, tornando possível o impeachment de Deodoro. Este, por sua vez, vetou o projeto e, sabendo que o Congresso poderia derrubar o seu veto e promulgar a Lei, deu um golpe de Estado: fechou o Congresso e decretou estado de sítio.
Deodoro pretendia implantar uma ditadura e, embora contasse com o apoio dos presidentes dos Estados da União (exceto o do Pará) e de alguns setores do Exército, não conseguiu concretizar o seu intento. Contra ele levantaram-se numerosos políticos, articulando a oposição nos estados, e os militares se dividiram; os florianistas posicionaram-se contra o presidente e o almirante Custódio de Melo sublevou a Marinha, apoiado pelo almirante Vandenkolk, e ameaçou bombardear o Rio de Janeiro.
Para evitar uma guerra civil, Deodoro renunciou à Presidência em 23 de novembro, sendo substituído interinamente por Floriano Peixoto, o vice-presidente.
Governo de Floriano Peixoto (1891-1894)
O marechal Floriano Peixoto assumiu o governo com a convicção de que só pela força conseguiria estabelecer a ordem na República. Por essa razão, foi apelidado de Marechal de Ferro.
O Congresso Nacional foi reaberto e os chefes de governos estaduais que haviam apoiado o fracassado golpe de Deodoro foram demitidos. Mesmo apoiado pelos republicanos civis, principalmente do PRP e por amplos setores do Exército e da Marinha, que apoiavam a permanência do vice-presidente à frente do governo até completar o mandato de Deodoro, o governo de Floriano foi considerado ilegal; o artigo 42 da Constituição determinava que, caso o presidente da República não chegasse a completar metade do seu mandato, o vice-presidente assumiria e, em noventa dias, deveria convocar novas eleições presidenciais. Floriano não acatou as determinações desse artigo e, decidido a continuar na Presidência, valeu-se das "Disposições Transitórias" da Constituição, que fixavam em quatro anos os mandatos dos primeiros presidente e vice-presidente, eleitos indiretamente; com isso, provocou o crescimento de uma acirrada oposição, envolvendo grupos civis e militares deodoristas.
O antiflorianismo ganhou amplo espaço durante todo o ano de 1892. Várias unidades do Exército e da Marinha revoltaram-se contra o governo tido como ilegítimo; alguns generais e almirantes publicaram um manifesto (Manifesto dos 13 Generais), exigindo do marechal a realização imediata de novas eleições presidenciais. Foram reformados, isto é, aposentados, presos e deportados para a Amazônia. Além disso, Floriano enfrentaria e reprimiria com violência a Revolução Federalista do Rio Grande do Sul e a Revolta da Armada no Rio de Janeiro.
A Revolução Federalista
Entre 1893 e 1895 a Região Sul do Brasil transformou-se em palco de uma violenta guerra civil. O conflito começou no Rio Grande do Sul, onde dois grupos oligárquicos disputavam o controle político, alcançando as regiões de Santa Catarina e Paraná. Essa foi a mais sangrenta revolta da República, devido à brutal repressão governista, fuzilando inúmeros adversários sem julgamento.
No Rio Grande do Sul, os federalistas, organizados no Partido Republicano Federalista (PRF) e liderados por Gaspar Silveira Martins e Gumercindo Saraiva, opunham-se ao domínio político dos castilhistas, grupo republicano chefiado por Júlio de Castilhos, sobre a política do Estado. Acusados de serem pactários com a monarquia, os maragatos (outra denominação dos federalistas) defendiam um poder central forte e a adoção do parlamentarismo e chegaram a estabelecer um governo em Bagé.
Os castilhistas, por sua vez, também conhecidos como pica-paus, controlavam a política rio-grandense com base em uma Constituição de caráter positivista, a única do País que previa a reeleição do presidente do Estado para o período seguinte, e perseguiam violentamente os adversários maragatos. O apoio do presidente aos castilhistas fez com que a oposição se tomasse francamente antiflorianista. Daí a ferocidade da ação do governo na sua sufocação.
A Revolta da Armada
A partir de novembro de 1891, várias foram as sublevações envolvendo a Marinha: primeiro contra a tentativa de golpe de Deodoro e, depois, em oposição ao continuísmo de Floriano, numa ampla ação dos deodoristas, como é o caso da revolta do encouraçado Primeiro de Março.
Em 1893, o almirante Custódio José de Melo, senador da República e ex-ministro da Marinha, rompeu com o governo Floriano, declarando-o ilegítimo, e deu início à Revolta da Armada. As motivações dessa revolta, entretanto, podem ser explicadas a partir da rivalidade entre a Marinha (Armada) e o Exército, da marginalização daquela no bloco de poder do novo regime, da ação dos florianistas, que viam na Armada a única força capaz de derrubar Floriano, e da própria candidatura frustrada de Custódio de Melo à sucessão presidencial.
Com a eclosão do movimento na capital da República, navios de guerra sob domínio dos rebeldes trocaram tiros com as fortalezas da Baía de Guanabara e chegaram a fazer ameaças, mais uma vez, de bombardear a cidade do Rio de Janeiro. Como o seu antiflorianismo coincidia com o da Revolução Federalista, no Sul, os dois movimentos acabaram fundindo-se, chegando a se fortalecer com a adesão do almirante Saldanha da Gama, chefe da Escola Naval. Como o levante maragato, a Revolta da Armada foi violentamente sufocada pelas forças florianistas.
Depois de governar a ferro e fogo por três anos, enfrentando e reprimindo com violência as reações ao seu mandato, Floriano conseguiu consolidar o novo regime, criando condições para que os civis assumissem o poder. Com a eleição de Prudente de Morais, em 1894, encerrou-se a República da Espada e teve início o segundo e mais importante período da República Velha: a República das Oligarquias.
2. A República das Oligarquias (1894-1930)
A República das Oligarquias recebeu essa denominação porque baseou toda sua ação político-administrativa na existência das oligarquias estaduais. Estas eram definidas como grupos bastante fechados, constituídos por elementos das classes dominantes (latifundiários e alta burguesia, com predominância dos primeiros), e que exerciam o monopólio da política em seus Estados. Naturalmente, as oligarquias mais poderosas, como a paulista e a mineira, tinham uma influência decisiva no cenário político nacional. Não obstante, cada unidade da Federação se encontrava sob o férreo controle de sua própria oligarquia. Assim sendo, o período que vai da posse de Prudente de Morais à Revolução de 1930 caracterizou-se pela defesa dos interesses desses grupos minoritários, com predomínio da oligarquia cafeeira, instituindo-se para isso um verdadeiro esquema oligárquico do qual faziam parte a Política dos Governadores, a Política do Café-com-Leite e o Coronelismo, entre outros. Mesmo com choques e cisões dentro das próprias oligarquias, como durante o governo Hermes da Fonseca ou na sucessão de Epitácio Pessoa, em nenhum momento, porém, a classe média - e muito menos as camadas inferiores da população - teve qualquer participação no processo político-administrativo desse esquema de minorias, apesar da existência do sufrágio universal masculino.
A Política dos Governadores
Delineada por Prudente de Morais e oficializada por Campos Sales, em 1900, a Política dos Governadores era um compromisso firmado entre o Governo Federal e os governos estaduais, representados por grupos oligárquicos regionais. Esses grupos passavam a gozar de ampla autonomia, contando com todo o apoio do presidente da República, sendo reconhecidos como seus únicos parceiros. Em troca, dariam total apoio ao Governo Federal; assim, os deputados federais e senadores, eleitos pelas oligarquias estaduais, não opunham nenhum embaraço à política presidencial no plano nacional.
Com isso, somente seriam empossados os parlamentares eleitos pelo grupo situacionista de cada Estado. Os candidatos das oposições que se elegessem seriam sistematicamente cortados das listas de votação pela própria Comissão Verificadora dos Poderes do Congresso Nacional. Na época, dizia-se que esses candidatos eram degolados, pois não chegavam a assumir seus cargos. Essa política garantiu a supremacia do Executivo Federal sobre o Legislativo e, simultaneamente, consolidou o poder local das oligarquias estaduais.
O coronelismo
Constituía a base do sistema oligárquico e estava assentado na atuação dos chefes políticos locais, os coronéis. Estes eram geralmente grandes proprietários rurais e, na sua maioria, possuidores do posto de coronel da antiga e tradicional Guarda Nacional. Controlando verdadeiros cercados ou currais eleitorais, garantiam a vitória dos candidatos de seu grupo através do voto de cabresto, numa relação de clientelismo político (troca de favores) com seu eleitorado.
O coronelismo foi possível graças à coexistência do voto universal aberto com uma estrutura socioeconômica de dominação arcaica fundada na ordem latifundiária, cujas raízes podem ser encontradas nos tempos coloniais.
A Política do Café-com-Leite
Definida no governo Campos Sales e testada pela primeira vez na eleição de Rodrigues Alves (1902), consistiu na aliança política entre São Paulo e Minas Gerais, visando ao controle da sucessão presidencial. Tinha como base o poder econômico desses dois Estados, conjugados com a união dos interesses de seus representantes políticos.
Afinal, São Paulo e Minas Gerais, ligados respectivamente à cafeicultura e à pecuária, sendo o segundo também um estado cafeeiro, além da grande força econômica alicerçada na importância do café, que era o principal produto das exportações brasileiras, tinham também maior representatividade, porque, sendo mais populosos, possuíam maior número de deputados na Câmara Federal. Daí, a hegemonia do setor cafeeiro durante a República Velha.
Isso permitiu que o mais importante setor da economia brasileira garantisse o seu nível de renda, assumindo o controle da política econômica do governo através da Política de Valorização do Café, com a socialização das perdas.
A Política de Valorização do Café
Ao iniciar-se a República, o setor cafeeiro enfrentava graves problemas. De um lado, as crises do mercado internacional e de outro, a superprodução. Nos dois casos, os preços do café tendiam a cair, diminuindo, assim, os lucros dos cafeicultores. Como o setor cafeeiro controlava a política da República Velha, os produtores procuraram garantir-se através da Política de Valorização do Café.
A valorização do café, em que o governo federal assumia diretamente a proteção dos interesses dos cafeicultores, dava-se através da compra ou da retenção dos excedentes de sua produção, o que mantinha, artificialmente, os preços do produto. Isso se dava através das sucessivas desvalorizações da moeda, da contração de empréstimos externos e das emissões constantes. Essas práticas que marcaram os governos de Rodrigues Alves, Afonso Pena e Venceslau Brás, entre outros, foram em grande parte responsáveis pela instabilidade econômico-financeira assinalada durante a Primeira República brasileira.
Sistema eleitoral fraudulento
Completava o sistema oligárquico um sistema político-eleitoral viciado. Isso porque, além do total desligamento entre o eleitorado e os políticos, o voto a descoberto e a inexistência da Justiça Eleitoral permitiam que as oligarquias praticassem todo tipo de fraudes, para assegurar a vitória de seus candidatos.
De uma maneira geral, a máquina eleitoral governista - fosse ela federal, estadual ou municipal - era sempre acionada, garantindo os resultados, sempre favoráveis, em quaisquer eleições. Assim, voto de cabresto, currais eleitorais ou eleições de bico-de-pena eram expressões comuns na política da época.
3. A sucessão presidencial
Prudente de Morais (1894-1898)
Eleito pelo voto direto em 1894, foi o primeiro presidente civil da República Velha. Denominado o "Pacificador da República", concedeu anistia aos envolvidos nas revoltas ocorridas contra o governo de Floriano Peixoto. Contudo, o seu governo conheceu forte oposição dos florianistas, responsáveis por vários levantes e agitações.
O principal acontecimento de seu quadriênio foi a Campanha de Canudos desenvolvida entre 1896 e 1897, no interior da Bahia. As condições de miséria do sertão nordestino acabaram por dar origem a um movimento de sertanejos caracterizado pelo messianismo e pelo fanatismo, tendo como líder o beato Antônio Conselheiro, fundador do arraial de Canudos, às margens do rio Vaza-Barris. Um incidente envolvendo moradores do arraial e forças policiais deu início a sucessivas expedições, inclusive com tropas federais, que acabaram por destruir Canudos, sempre referido na imprensa como uma revolta monarquista.
No plano econômico-financeiro a situação era grave: os preços do café estavam em queda, o déficit orçamentário crescia com os gastos militares, o balanço de pagamentos também era deficitário, agravado pelos empréstimos externos, o câmbio estava em baixa e a inflação descontrolada. Diante disso, Campos Sales (já eleito presidente) procurou renegociar a dívida externa brasileira com os credores estrangeiros, obtendo destes um acordo chamado Funding Loan. Por ele, o Brasil obteve uma moratória (os pagamentos das dívidas foram suspensos por 13 anos) e um empréstimo de 10 milhões de libras, garantido pelas rendas da Alfândega do Rio de Janeiro, comprometendo-se a não contrair novos empréstimos e a recolher parte do seu meio circulante.
Ao final do seu governo (5/11/1897) o Presidente sofreu um atentado, planejado por florianistas. O episódio, que resultou na morte do marechal Machado Bittencourt, ministro da Guerra, foi repudiado pela opinião pública, granjeando-lhe apoio popular. Ensejava-se, assim, a consolidação do poder civil.
Campos Sales (1898-1902)
Mesmo antes de ser eleito, na condição de ministro da Fazenda do governo anterior, foi o responsável pelas negociações com os credores externos que resultariam no Funding Loan. No seu mandato, Joaquim Murtinho, ministro da Fazenda, iniciou o saneamento financeiro da República, encetando uma política deflacionista, visando ao equilíbrio orçamentário e à valorização da moeda. Para isso empregou medidas austeras destinadas a aumentar a receita, destacando-se entre elas a maior incidência do imposto de consumo, o aumento dos impostos aduaneiros e da taxa-ouro sobre importações, redução das despesas governamentais e limitação do crédito.
Em conseqüência disso, o orçamento passou a apresentar superávit, o câmbio elevou-se, valorizando a moeda, e acumulou-se ouro nos depósitos brasileiros em Londres. O crédito externo também foi recuperado e a balança comercial apresentou saldo favorável, devido à menor importação. Em contrapartida, as atividades produtivas internas foram prejudicadas e o poder aquisitivo da população sofreu acentuada redução.
No plano político, criou a Política dos Governadores e a Política do Café-com-Leite, assegurando o domínio político das oligarquias estaduais e o controle da nação pela oligarquia cafeeira.
Rodrigues Alves (1902-1906)
Seu governo é conhecido como Quadriênio Progressista, devido à excelente administração que realizou, remodelando os portos, ampliando a rede ferroviária e desenvolvendo obras de urbanização e modernização da cidade do Rio de Janeiro, em que se destacou a atuação do prefeito Pereira Passos.
Nessas realizações foram utilizados recursos originários da política financeira desenvolvida na gestão anterior e do aumento das exportações de café e da borracha. O grande destaque do período foi a Campanha de Saneamento no Rio de Janeiro, dirigida por Osvaldo Cruz, e que visava à eliminação da febre amarela e outras doenças. Nesse processo, a imposição da vacinação obrigatória contra a varíola provocou descontentamento popular; disso se aproveitaram os militares e políticos da oposição ao governo, fazendo eclodir a Revolta da Vacina (1904), sob a liderança do senador Lauro Sodré, rapidamente dominada pelas forças legalistas.
Ainda no seu quadriênio foi assinado o Convênio de Taubaté (no qual o presidente, aliás, não teve participação direta), a primeira medida intervencionista em favor da manutenção dos preços internacionais do café, pela compra e estocagem dos excedentes da produção. Os Estados signatários do convênio (SP, MG e RJ) tiveram de recorrer a empréstimos externos, o que contrariava a austeridade deflacionária do governo Rodrigues Alves.
Afonso Pena (1906-1909)
Foi o primeiro mineiro a exercer a Presidência da República, dentro da alternância da Política do Café-com-Leite. Adotando o lema "Governar é povoar", Afonso Pena foi um estimulador da imigração; em 1908, chegaram ao Brasil os primeiros imigrantes japoneses.
Sua gestão foi marcada por atritos com o Morro da Graça, um importante grupo de políticos do Congresso Nacional, liderado pelo senador gaúcho Pinheiro Machado, onde nem mesmo a atuação da bancada governista liderada pelo deputado Carlos Peixoto Filho, denominada pelos primeiros de Jardim da Infância, conseguiu evitar o seu desgaste.
No âmbito econômico e financeiro, promoveu a primeira valorização do café, criando em 1907 a Caixa de Conversão; esta recebia toda a moeda estrangeira, trocando-a por bilhetes conversíveis mantidos a um câmbio baixo. Este instrumento favorecia o setor cafeeiro, pois possibilitava a percepção de um maior volume de dinheiro brasileiro, e, indiretamente, os industriais, graças ao encarecimento das importações.
Faleceu em 1909, tendo sido o seu quadriênio terminado por Nilo Peçanha, então vice-presidente da República.
Nilo Peçanha (1909-1910)
Apesar da brevidade de seu período administrativo, Nilo Peçanha tomou duas iniciativas importantes, criando o Serviço de Proteção aos Índios (SPI) por sugestão do tenente-coronel Cândido Rondon, que foi o primeiro diretor da entidade, e restabelecendo o antigo Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio, que fora extinto por Floriano Peixoto.
Ao final do seu governo, ocorreu a primeira eleição competitiva da República Velha, resultante da primeira ruptura do Café-com-Leite. Nesse pleito concorreram o marechal Hermes da Fonseca, apoiado por Minas Gerais, pelos velhos políticos capitaneados por Pinheiro Machado, o coronel dos coronéis, e pelo próprio presidente, e Rui Barbosa, candidato da oposição que congregava os Estados de São Paulo e da Bahia. Nessa eleição, Rui realizou a Campanha Civilista, na qual defendia a reforma eleitoral com o voto secreto, a necessidade de um Código Civil e a revisão constitucional. Apesar da boa votação, foi derrotado pelo candidato governista.
Marechal Hermes da Fonseca (1910-1914)
Eleito com 403.867 votos contra os 222.822 de Rui Barbosa, seu governo foi conturbado, com as constantes decretações de estado de sítio.
Numa tentativa de rompimento da Política dos Governadores, promoveu a intervenção federal em Estados da Federação, derrubando os grupos oligárquicos adversários, através da Política das Salvações: as velhas oligarquias foram substituídas por outras, inicialmente sob comando do gaúcho Pinheiro Machado, fundador do Partido Republicano Conservador, criado por este para dar sustentação à sua administração.
O fracasso das "salvações", levado a efeito pelo Governo Federal, ficou patente com a eclosão de movimentos de rebeldia contra a nova política presidencial. Entre eles, destacou-se a Revolta do Juazeiro, liderada pelo padre Cícero Romão Batista, responsável pela deposição dos grupos hermistas que controlavam o Ceará e pela recondução ao poder da velha oligarquia dos Accioli.
Em novembro de 1910, eclodiu a Revolta da Chibata, sob o comando do marinheiro João Cândido, o "almirante negro". Os marinheiros dos encouraçados "Minas Gerais" e "São Paulo", os mais modernos da Armada brasileira, rebelaram-se contra os maus-tratos, o excesso de trabalho e contra a chibata, que ainda era usada para punir infratores. A rebelião foi reprimida, mas vários oficiais foram assassinados durante o episódio.
No quadriênio Hermes da Fonseca, devem ser registradas ainda a queda nas exportações de café e borracha, levando o país a uma crise econômica, e uma nova renegociação da dívida externa: o segundo Funding Loan.
Venceslau Brás (1914-1918)
Com a reconciliação de São Paulo e Minas Gerais, selada com o Pacto de Ouro Fino, o mineiro Venceslau Brás foi mais um presidente eleito pelo Café-com-Leite; sem o apoio esperado, Rui Barbosa, mais uma vez encabeçando a chapa de oposição, retirou sua candidatura.
Em seu quadriênio, marcado em toda sua duração pela Primeira Guerra Mundial (na qual tivemos uma pequena participação ao lado dos Aliados), aumentaram as exportações de matérias-primas e alimentos e ocorreu um surto industrial. O conflito propiciou excelentes negócios, pois os Aliados compravam do Brasil tudo o que pudesse ser vendido. Por outro lado, a inibição das importações permitiu a criação de novas indústrias, estimulando a produção nacional, acumulando capitais e especializando um numeroso contingente de operários. O aumento da importância do operariado urbano fez com que eclodissem sucessivas greves, como a de 1917, quando a cidade de São Paulo ficou quase totalmente paralisada.
Seu governo também foi sacudido pela Guerra do Contestado, ao lado da Campanha de Canudos, um dos mais importantes movimentos sociais da República. O problema reportava-se à região limítrofe dos estados do Paraná e Santa Catarina, disputada por ambos. Em 1912, a construção de uma via férrea na região, desalojando milhares de posseiros, deflagrou um movimento de fundo messiânico, caracterizado pelo fanatismo religioso. Vivendo no abandono e oprimida pela miséria, a população sertaneja, liderada pelo "monge" João Maria, opôs forte resistência às forças federais. Em 1915, uma divisão de 6 mil soldados, sob o comando do general Setembrino de Carvalho, sufocou duramente o movimento; o litígio entre Paraná e Santa Catarina, contudo, só foi resolvido em 1916.
Delfim Moreira (1919)
Era o vice-presidente de Rodrigues Alves, candidato vitorioso na sucessão a Venceslau Brás. Embora eleito presidente pela segunda vez, Rodrigues Alves, vítima da gripe espanhola, faleceu antes de tomar posse.
Cumprindo o disposto pelo artigo 42 da Constituição de 1891, Delfim Moreira governou apenas alguns meses e convocou novas eleições.
Epitácio Pessoa (1919-1922)
Nas eleições de 1919, a oposição do Rio Grande do Sul a qualquer candidatura paulista ou mineira, bem como à chapa encabeçada por Rui Barbosa para a qual se inclinava o Café-com-leite, influiu na indicação do paraibano Epitácio Pessoa, que gozava de grande prestígio por sua participação na Conferência de Paz de Paris, após a Primeira Grande Guerra.
Com o objetivo de afastar os militares da vida política do país, o presidente colocou civis nas pastas militares: para os ministérios da Guerra e da Marinha, foram nomeados, respectivamente, Pandiá Calógeras e Raul Soares.
Sua política econômico-financeira no início foi austera, com restrições às despesas, às emissões e ao setor cafeeiro. Depois, porém, com a queda das exportações mudou a orientação: contraiu empréstimos, emitiu papel moeda e criou a Carteira de Redescontos, favorecendo mais uma vez o setor cafeeiro.
No final do seu governo, a oposição dos militares, a insatisfação contra o sistema político e a desmoralização da República Velha provocaram o surgimento do Movimento Tenentista, que apareceria pela primeira vez como manifestação armada no Levante do Forte de Copacabana (Os 18 do Forte), em 5 de julho de 1922. A revolta dos tenentes, parte dos conflitos entre o governo e o setor militar, está relacionada ao episódio das Cartas Falsas, cujo conteúdo eram ofensivas ao Exército e que, supostamente, teriam sido escritas por Artur Bernardes, já eleito presidente na sucessão de Epitácio Pessoa.
Artur Bernardes (1922-1926)
Em 1921, São Paulo já chancelara a candidatura de Artur Bernardes, presidente de Minas Gerais, dentro do velho sistema de alternância entre os dois estados. Contra o candidato governista organizaram-se as forças oposicionistas da Reação Republicana, tendo como candidato o ex-presidente Nilo Peçanha.
O novo presidente recebia, contudo, um país em crise, ameaçado pelas constantes rebeliões, em virtude das agitações militares e pelos primeiros efeitos da crise econômica aberta com o fim da Grande Guerra. Assim sendo, seu governo foi marcado pela decretação e constante renovação do estado de sítio.
Em São Paulo, os tenentes se sublevaram na Revolução de 1924, sob o comando de Isidoro Dias Lopes e dos irmãos Juarez e Joaquim Távora, chegando a ocupar a capital do Estado. No Rio Grande do Sul, a partir de 1924 a Coluna Prestes iniciou uma longa marcha pelo interior do País, que duraria até 1927, em permanente luta contra as força leais ao governo.
Antes desses levantes, no Rio Grande do Sul os antigos maragatos, agora organizados no Partido Libertador e chefiado por Assis Brasil, revoltaram-se contra a quinta reeleição de Borges de Medeiros para o governo estadual. A ampliação do conflito foi evitada com a mediação do general Setembrino de Carvalho. Em 1923, foi firmado o Acordo de Pedras Altas, permitindo a reforma da Constituição gaúcha, da qual era suprimida a reeleição do chefe de Executivo.
Em 1926, foi aprovada a reforma da Constituição Federal, estabelecendo a limitação do habeas-corpus, o veto parcial do presidente e ampliando os limites de intervenção nos Estados, fortalecendo, assim, o poder do Executivo Federal.
Com relação à economia, transferiu o problema do café para os Estados, criando, por exemplo, o Instituto do Café do Estado de São Paulo.
Washington Luís (1926-1930)
Foi o último presidente da República Velha e o seu lema era "Governar é abrir estradas".
Embora nascido no Estado do Rio de Janeiro, Washington Luís fizera sua carreira política no Partido Republicano Paulista (PRP) e, ao contrário de Artur Bernardes, que vivera fechado no Palácio do Catete, tomou-se popular depois que assumiu a Presidência, passeando a pé pela Avenida Rio Branco, no Rio de Janeiro. Conciliador suspendeu o estado de sítio, mas não decretou a anistia, embora tenha dado liberdade a presos civis e militares, desde os governos anteriores. Encetou uma cerrada perseguição a forças de esquerda, nucleadas pelos comunistas, provocando uma frente de oposição que se batia pela anistia e pela liberdade de pensamento. Como represália, promulgou a Lei Celerada de 1927, que se tomou um eficiente instrumento de repressão do governo.
No terreno das finanças, desenvolveu uma política visando ao equilíbrio monetário e cambial. Para tanto criou uma Caixa de Estabilização (1926), que emitia papel moeda de acordo com empréstimos externos ou entradas de ouro.
Seu governo foi marcado pela Crise de 1929, que obrigou o setor cafeeiro a pedir auxílio ao governo federal recusado por este, a fim de não prejudicar sua política de estabilização.
Ao definir sua sucessão na Presidência da República, regime rompeu com a Política do Café-com-Leite e enfrentou as forças oposicionistas que passaram a formar a Aliança Liberal, a qual lançou a candidatura da chapa Getúlio Vargas e João Pessoa. No seu governo deu-se ainda a quebra da Política dos Governadores, jogando por terra o esquema oligárquico.
Foi deposto pela Revolução de 1930, a qual pôs fim à República Velha.
4. A política externa da República Velha
Durante a República Velha, a diplomacia brasileira foi marcada por três tendências gerais. O eixo diplomático deslocou-se de Londres para Washington; os diplomatas brasileiros demarcaram, com êxito, as controvertidas e vagas fronteiras do país e o Brasil começou a representar um papel mais ativo nos assuntos do hemisfério e do mundo.
O grande responsável por tais mudanças foi o ministro das Relações Externas José Maria da Silva Paranhos Júnior, Barão do Rio Branco. Podemos dizer que o período de sua gestão diplomática, entre 1902 e 1912, representa o momento decisivo das relações exteriores da República Velha.
Reconhecimento da República
O primeiro país a reconhecer o novo regime foi à Argentina, apenas quatro dias depois da Proclamação. Na. Europa, entretanto, os países retardaram o reconhecimento da República, à espera de que fossem realizadas as eleições para o Congresso Constituinte. Com a promulgação da Constituição de 1891, as nações européias reconheceram o novo governo brasileiro, tendo sido a França o primeiro país a fazê-lo. A última nação a aceitar o regime republicano foi a Rússia, que só o fez após a morte de D. Pedro II, ocorrida em 1891.
Rompimento com Portugal
Durante a Revolta da Armada - março de 1894 -, Saldanha da Gama asilou-se com seus oficiais e marinheiros a bordo de duas corvetas portuguesas. Como o governo português negou-se a entregar os revoltosos para julgamento e como as embarcações lusas rumaram para o Rio da Prata, Floriano rompeu as relações diplomáticas com Portugal. As relações só foram restabelecidas no ano seguinte, já no governo de Prudente de Morais.
As relações Brasil-Estados Unidos
Nas últimas décadas do século XIX, estreitaram-se as relações entre Brasil e Estados Unidos. Os norte-americanos tomaram-se nossos maiores compradores de café, borracha e cacau. Em 1912, por exemplo, os Estados Unidos compravam 36% das exportações do Brasil, ao passo que a Grã-Bretanha adquiria apenas 15%, situando-se em segundo lugar.
Em 1915, o National City Bank de Nova York fundou duas agências no Brasil. No mesmo ano, instalava-se no Rio de Janeiro a primeira Câmara de Comércio Norte-Americana para o Brasil.
Os investimentos norte-americanos aumentaram consideravelmente a partir da Grande Guerra, ao mesmo tempo em que declinava a preponderância econômica e diplomática da Grã-Bretanha.
Na primeira década do século XX o Brasil vendeu aos Estados Unidos quatro vezes mais do que comprou, formando-se aos poucos, no Rio de Janeiro, um excedente de dólares que permitiu a aquisição de produtos europeus. Todavia, a ligação cada vez maior com o mercado norte-americano aumentou ainda mais a dependência do Brasil em relação àquela nação.
As Questões Limites
O Brasil Republicano herdou da Monarquia várias questões de fronteiras, algumas com suas origens na Época Colonial. Todas foram solucionadas mediante acordos diplomáticos, havendo na maioria delas arbitramento internacional. O principal representante brasileiro nessas questões foi o Barão do Rio Branco.
A Questão de Palmas ou das Missões
O problema, que remontava aos tempos coloniais, era um ponto de atrito entre o Brasil e a Argentina, que disputavam a posição de primeira potência da América do Sul. Os argentinos afirmavam que sua fronteira com o Brasil eram os rios Iguaçu e Chapecó e reivindicavam a posse da região de Palmas, uma área de aproximadamente 30 mil quilômetros quadrados localizada entre os Estados do Paraná e Santa Catarina.
A questão foi resolvida pelo arbitramento do presidente norte-americano, Grover Cleveland, favorável ao Brasil, cuja defesa esteve a cargo do Barão do Rio Branco. De acordo com o laudo arbitral, os limites seriam determinados pelos rios Pepiri-Guaçu e Santo Antônio, o que assegurou ao Brasil a manutenção do território de Palmas ou das Missões.
A Questão do Amapá
Em 1895 surgiram constantes conflitos entre brasileiros e franceses, habitantes da região fronteiriça entre o Brasil e a Guiana Francesa. Isso porque, desde meados do século XIX, a França recusava-se a reconhecer o rio Oiapoque como limite entre o Amapá e a Guiana. Resolveu-se a questão mediante o arbitramento do presidente do Conselho Federal Suíço.
Mais uma vez defendeu os direitos do Brasil o Barão do Rio Branco. Sua argumentação (apresentada nas "Memórias"), fartamente acompanhada de mapas e documentos, convenceu o presidente suíço Walter Hauser, em 1900, da legitimidade de nossos direitos. A sentença reconhecia o rio Oiapoque como o limite tradicional com a possessão francesa, garantindo ao Brasil a soberania sobre uma área aproximada de 260.000 quilômetros quadrados, no atual Amapá.
A Questão da Ilha da Trindade
Em 1895, a Inglaterra, alegando que a Ilha da Trindade, ao largo da costa do Espírito Santo, estava desocupada havia mais de um século, resolveu ocupá-la. O Brasil protestou logo que teve conhecimento do fato, mas recusou-se a resolver o assunto por arbitramento, dado a legitimidade de seus títulos; aceitou, entretanto, a mediação oferecida por D. Carlos I, rei de Portugal, país onde existiam documentos comprobatórios do descobrimento e posse da Trindade pelos portugueses.
Os direitos brasileiros foram defendidos em Londres pelo ministro João Artur de Sousa Correia e pelo representante português, Marquês de Soveral. No ano seguinte, a Inglaterra retirou os marcos de sua efêmera ocupação da Ilha da Trindade.
A Questão do Pirara
A disputa pela região do Pirara - nome dado ao pequeno afluente do rio Maú - arrastava-se desde o início do século XIX, quando a Inglaterra ocupou a região fronteiriça com a Guiana Inglesa.
Com o advento da República, o caso foi submetido ao arbitramento do rei da Itália, Vitor Emanuel m. Apesar da argumentação de Joaquim Nabuco, o soberano italiano favoreceu os ingleses; a região foi dividida, em 1904, entre o Brasil e a Guiana Inglesa, que ganhou uma saída fluvial para o Amazonas.
A Questão do Acre
A região ocupada por seringueiros brasileiros legalmente pertencia à Bolívia, de acordo com os Tratados de 1777 e 1867. A questão apresentava-se extremamente delicada, pois se a Bolívia tinha a posse legal daquele território, a região rica em borracha era essencial para o Brasil.
Em 1902, a Bolívia tentou expulsar os brasileiros da região. Estes resistiram e, sob a chefia de Plácido de Castro, proclamaram o Estado Independente do Acre, com a intenção de anexá-lo posteriormente ao Brasil. Diante do conflito iminente, o Barão do Rio Branco, ministro das Relações Exteriores, deu início às negociações que resultaram no Tratado de Petrópolis: por ele, o Brasil recebia o Acre (cerca de 152.000 km2), em troca de um pagamento de 2 milhões de libras, cederia à Bolívia uma área de 3.200 km2 em Mato Grosso e construiria a Estrada de Ferro Madeira-Mamoré, garantindo assim o escoamento da produção boliviana pelo rio Amazonas.
O Brasil e o Pan-Americanismo
Diferenciado do resto da América durante o século XIX, em virtude de suas instituições monárquicas, o Brasil juntou-se à comunidade das repúblicas americanas em 1889, no mesmo ano em que se iniciou o movimento pan-americano com a Primeira Conferência Internacional dos Estados Americanos, nos EUA, realizada entre 1889 e 1890.
Foi decisiva para a consolidação da harmonia pan-americana a atuação de Rio Branco, por atenuar, contornar e resolver atritos entre as Américas portuguesa e espanhola, bem como para aproximá-las dos Estados Unidos na Conferência do Rio de Janeiro, em 1906.
O Brasil na Conferência de Haia
O Brasil marcou seu primeiro aparecimento importante numa conferência mundial, em 1907, quando se realizou a Segunda Conferência Internacional da Paz em Haia. Naquela ocasião, Rui Barbosa chefiou a delegação brasileira e ocupou a posição de Presidente de Honra.
As manobras das potências mundiais para criar uma Corte Internacional de Justiça ofenderam as suscetibilidades e contrariaram as aspirações brasileiras. Rui Barbosa lançou-se na defesa de uma Corte de Justiça, na qual o princípio de igualdade de todas as nações seria preservado. Com essa atitude, o Brasil despontou como líder das nações latino-americanas, assim como de várias nações européias menores, na luta pela igualdade de representação. Daí o cognome de Rui Barbosa: Águia de Haia.
O Brasil na Primeira Guerra Mundial
Após o afundamento do terceiro navio mercante brasileiro, em outubro de 1917, o Brasil declarou guerra à Alemanha, configurando assim sua participação direta no conflito. Essa posição está vinculada, entre outras, à entrada dos Estados Unidos na guerra, nessa mesma época, e à crescente dependência brasileira das exportações para aquele país.
A participação brasileira, contudo, ficou restrito ao envio de uma unidade médica e de um esquadrão de aviadores à Europa, além da cooperação com os ingleses no patrulhamento do Atlântico Sul.
Em reconhecimento à participação brasileira, Grã-Bretanha, Itália e Bélgica elevaram suas legações no Rio de Janeiro à categoria de embaixadas e o Brasil fez o mesmo em relação àqueles países. Além disso, o Tratado de Versalhes, elaborado durante a Conferência de Paz de Paris, da qual o Brasil participou com uma delegação chefiada por Epitácio Pessoa, incorporou duas reivindicações do governo brasileiro: pagamento, com juros, do café vendido à Alemanha em 1914 e apropriação de navios alemães apresados em portos brasileiros durante a guerra.
O Brasil participou ainda da formação da Liga das Nações, retirando-se desta em 1926, por não ver reconhecida sua importância no hemisfério ocidental.
A penetração econômica estrangeira
Durante a Primeira República, o predomínio do capital estrangeiro foi encarado como um fenômeno natural num país em expansão, necessitando dele e de suas técnicas superiores.
O capitalismo inglês foi o grande privilegiado por esta política: o London & River Plate Bank, do grupo Rotschild, foi o intermediário entre o governo brasileiro e a Inglaterra nos empréstimos negociados durante o período. Além dos benefícios financeiros, a indústria inglesa vai ser favoreci da com as possibilidades abertas pela crise industrial de 1901 e cujo resultado foi o aumento da exportação industrial britânica para o Brasil.
Rodrigues Alves consolidou ainda mais esta ligação com sua política de prosperidade e estabilidade cambial; definiu-se por uma política de moeda estável, para satisfazer a entrada de capitais e braços estrangeiros. Como conseqüência, instalou-se no Brasil um grande número de empresas estrangeiras: das 201 empresas fundadas entre 1889 e 1910, 160 eram estrangeiras.
Os fatos se repetiram no decorrer de toda a Primeira República, numa concordância entre as classes dirigentes brasileiras e o capital internacional: em 1915, representantes do grupo Rotschild telegrafaram diretamente a Venceslau Brás para saber se haveria intervenção no Rio de Janeiro, pois tinham interesses naquele estado.
Durante a Grande Guerra verificou-se uma natural retração de capital estrangeiro. Contudo, a necessidade de abastecer os países em conflito possibilitou a instalação de um grande número de frigoríficos estrangeiros no Brasil, como o Armour e o Swift.
Com o fim da Primeira Guerra Mundial, os países europeus e os Estados Unidos voltaram a investir maciçamente no Brasil.
No Amazonas concederam-se terras ao empresário norte-americano Henry Ford. Este, com o objetivo de participar do comércio da borracha, feito até então por ingleses e holandeses, apresentou em 1928 um projeto para a plantação científica da borracha. Conseguiu então o privilégio para explorar certas áreas da Amazônia brasileira por 50 anos. Daí, a origem de povoações como Fordlândia e Belterra.
Outro ramo marcado pela penetração, de capitais americanos e ingleses foi o da eletricidade. Desde o começo do século, a Light and Power, empresa anglo-canadense, dominou sua produção e distribuição em São Paulo e Rio de Janeiro. Entre 1928 e 1929 a Electric Bond & Share adquiriu as pequenas companhias de eletricidade de todo o Brasil.
De 1889 a 1930, a dependência econômica brasileira perante as potências estrangeiras cresceu. Os empréstimos constituíram formas de controle das receitas do País. Durante boa parte do período, alfândegas e estradas de ferro ficaram sob o controle dos capitais estrangeiros, como garantia dos juros e prestações devidas.
5. A cultura brasileira na República Velha
Durante a República Velha a produção cultural brasileira refletia nas suas várias modalidades, a influência dos padrões e modismos estrangeiros; a cultura, como na época da Monarquia, continuava restrita a uma pequena parcela da população, uma vez que a instrução continuava sendo um privilégio das elites.
Na literatura, salvo exceções, predominavam o diletantismo acadêmico e o preciosismo vocabular dos parnasianos, erigindo um obstáculo intransponível entre a linguagem literária e a fala das ruas; as artes plásticas obedeciam ainda aos rígidos cânones da pintura acadêmica européia e o teatro, seguindo as pegadas do teatro francês, demonstrava a preferência do público pelas operetas, vaudevilles e revistas com acento parisiense. As encenações eram, em sua maioria, de textos importados traduzidos e adaptados ao público brasileiro.
Os limites da Educação
Durante o período, a Educação enfrentou diversos problemas: inexistiam dispositivos constitucionais que garantissem um projeto amplo e sistemático de educação, bem como órgãos especializados (ministérios e secretarias) para tratar exclusivamente do assunto nos seus vários níveis; faltava um Plano Nacional de Educação e um sistema escolar que integrasse graus e ramos.
Apesar dessa situação, alguns intelectuais mostraram suas preocupações com a questão educacional. É o caso de Olavo Bilac, que em 1915 iniciou suas pregações cívico-patrióticas, defendendo o Serviço Militar, para fazer frente ao perigo externo (representado pela cobiça internacional), e o aprimoramento da instrução para combater o perigo interno (manifestado pela quebra da unidade nacional, pelo depauperamento do caráter e pelo definhamento do patriotismo).
No plano das realizações, o agrupamento das Escolas Politécnica e de Medicina e uma das Faculdades Livres de Direito deu origem à Universidade do Rio de Janeiro, a primeira universidade pública do País, criada em 1920.
Quanto à escola primária, cabia aos Estados, de acordo com a Constituição de 1891, o cumprimento dos seus deveres com a instrução, coisa que nunca acontecia. De acordo com o Relatório de 1922, a matrícula nas escolas primárias de todo o País era de 1.030.752 alunos; a freqüência, contudo, era de apenas 29% da população escolar.
% 41 43 44 56 94 95
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A Escola Normal, por sua vez, destinada à formação de professores primários, era basicamente voltada para a formação geral. Não constava de seu programa o ensino de disciplinas como Metodologia, Pedagogia e Psicologia, específicas da formação de professores. Em 1907, dos 5.020 matriculados no "ensino pedagógico" apenas 786 eram do sexo masculino; essa tendência predominará posteriormente, pois em 1929, para 23.808 alunos matriculados, somente 3.401 eram do sexo masculino. Portanto, a escola normal era uma instituição destinada fundamentalmente à educação de moças burguesas.
A Literatura
Com o advento da República, mesmo com a influência européia, surgiram os primeiros autores cujas obras tratavam da realidade brasileira: Euclides da Cunha, Lima Barreto e Monteiro Lobato. Coube a estes escritores revelar, com profundo senso crítico, as tensões existentes na sociedade brasileira da época. O primeiro, em Os Sertões (1902), descreveu toda a campanha de Canudos; a visão do drama urbano, por sua vez, é fornecida pela obra de Lima Barreto, cujo cenário é o Rio de Janeiro, onde focaliza os subúrbios cariocas. Na sua obra Triste Fim de Policarpo Quaresma (1915), ridiculariza o nacionalismo ufanista através da figura do major Quaresma, cuja visão fragmentária da realidade o conduz a situações patéticas, como personagem típica da tradição quixotesca.
Como último representante dessa literatura realista tem-se Monteiro Lobato, autor de uma coletânea de contos, Urupês (1918), na qual imortalizou a figura do "Jeca Tatu", símbolo da miséria e ignorância do camponês brasileiro. Na coletânea seguinte, Cidades Mortas (1919), retratou a decadência do Vale do Paraíba, outrora uma próspera região cafeeira. Caracterizador de tipos, de gestos e ambientes, chegando muitas vezes ao anedótico, deve-se destacar sua literatura para crianças, associando objetivos pedagógicos à ficção.
Na década de 1920, contra o elitismo e o europeísmo que marcavam a cultura brasileira, rebelou-se o movimento modernista brasileiro. Seu ponto alto foi a Semana de Arte Moderna (1922), realizada em São Paulo com o objetivo de criar uma cultura moderna, baseada em elementos genuinamente brasileiros.
Os modernistas foram buscar inspiração nas imagens da indústria, da máquina, da metrópole, do burguês e do proletário, do homem da terra e do imigrante.
Entre os escritores modernistas, o que melhor reflete o espírito da Semana é Oswald de Andrade. De maneira geral, sua produção literária reflete a sociedade em que se forjou sua formação cultural: o momento de transição que une o Brasil agrário e patriarcal ao Brasil que caminha para a modernização.
Ao lado de Oswald de Andrade, destaca-se como ponto alto do Modernismo a figura de Mário de Andrade, principal animador do movimento modernista e seu espírito mais versátil. Cultivou a poesia, o romance, o conto, a crítica, a pesquisa musical e folclórica.
Poetas de relevo da época foram também Manuel Bandeira, Cassiano Ricardo e Antônio de Alcântara Machado. Este, inovando a estrutura do conto, em suas coletâneas Brás, Bexiga e Barra Funda (1927) e Laranja da China (1928) retrata, numa linguagem que se aproxima da jornalística, a vida social de São Paulo, destacando a figura do imigrante, sobretudo do italiano, responsável por marcantes alterações na fisionomia cultural de São Paulo.
As Artes Plásticas
Até 1922, as artes plásticas eram marcadas pelo predomínio dos modelos europeus, principalmente da França. Logo após a Primeira Grande Guerra surgiram duas novas correntes: o Art Nouveau e o Nativismo, este último uma campanha iniciada por Ricardo Severo e Lúcio Costa.
Com o crescimento urbano e industrial de São Paulo no início do século - para onde convergiam numerosos imigrantes -, os meios artísticos nacionais entraram em contato com as mais recentes tendências da arte européia. Em 1913, Lasar Segall mostrou em São Paulo, para um público ainda apático, telas expressionistas de intenso conteúdo dramático.
Pouco depois, em 1917, a capital paulista foi agitada pela revolucionária pintura fauve, introduzida no Brasil por Anita Malfatti, que voltava de viagem de estudos pela Alemanha e Estados Unidos. Sua obra, apesar de duramente criticada por Monteiro Lobato, contou com o apoio de um grupo de literatos e artistas que, mais tarde, desencadearam o Movimento Modernista no País.
A esse grupo de artistas pertenciam Rego Monteiro, Di Cavalcanti (o pintor da mulata brasileira), Ismael Néri (primeiro surrealista do Brasil), Tarsila do Amaral e Cândido Portinari, que utilizou como temas de sua obras as estradas secas do Nordeste e seus retirantes.
Na escultura, a figura de relevo foi Victor Brecheret, autor da famosa obra Monumento às Bandeiras, atualmente exposta no Parque do lbirapuera, em São Paulo.
A Arquitetura
Na virada do século XIX, a alta burguesia paulistana, ainda dependente do café, mas com vistas à indústria nascente, tratou de fazer suas construções de acordo com as novidades européias; procurava-se acompanhar o cenário cultural do Velho Continente, inspirado, sobretudo em Paris, a "meca" dos ricos fazendeiros paulistas.
Os estilos variados, combinados entre si e até inventados pelo ecletismo romântico, sempre permitindo manifestações personalistas e evocações da' terra de origem, surgiam às vezes puros e concretos em sua concepção original, a exemplo da casa Art Nouveau projetada pelo sueco Carlos Eckman para o cafeicultor e industrial Álvares Penteado (Vila Penteado, o bairro de Higienópolis, em São Paulo). Nem sempre, porém, as misturas de soluções arquitetônicas foram felizes. Exemplo disso é o palacete projetado em 1896 pelo alsaciano Matheus Haussler para o fazendeiro Elias Chaves (hoje Palácio dos Campos Elíseos), que misturava soluções renascentistas com elementos alsacianos.
No início do século XX, Vítor Dubugras e outros introduziram o neocolonial, estilo que não ultrapassou o simples uso da ornamentação portuguesa palaciana barroca estilizada. Surgiram, assim, exemplares como o que foi construído no Caminho do Mar, entre Santos e São Paulo em 1922.
A partir da segunda metade dos anos 20 e durante a década de 30, as manifestações modernistas resumiram-se, praticamente, a trabalhos personalistas. Ainda não havia uma consciência de modernidade unindo os arquitetos em tomo de uma tendência. O primeiro exemplo de um projeto desligado dos padrões culturais da época foi à casa de Warchavichk, de 1927. No seu exterior a influência é do cubismo, enquanto nos interiores sobressai o estilo da moda, o art déco.
Warchavchik, no entanto, não fez escola, nem teve seguidores. Comparáveis a ele são: Flávio de Carvalho, arquiteto de poucos projetos e raras obras, Júlio de Abreu, Luís Nunes e também Vital Brazil.
A Música
Na música erudita, coube a Heitor Villa-Lobos, ainda hoje o compositor brasileiro mais conhecido no Exterior, a consolidação de uma linguagem musical caracteristicamente brasileira. Aproveitando elementos do folclore dos mais diversos pontos do Brasil, coletados durante suas inúmeras viagens, Villa-Lobos deixou uma vasta produção que abarca quase todos os gêneros musicais. São suas obras mais famosas: "Choros", "Bachianas Brasileiras", "Cirandas" e os ciclos da "Prole do Bebê".
A Semana de Arte Moderna de 1922 iria estimular as discussões sobre os caminhos que deveriam ser trilhados pela música brasileira. Dessas discussões, que procuravam definir uma posição de distanciamento em relação às tendências européias presentes na música brasileira, resultaram na publicação, em 1928, do Ensaio Sobre a Música Brasileira, de Mário de Andrade. A proposta central do livro era que os compositores buscassem a inspiração prioritariamente na realidade nacional, com especial atenção para o rico folclore musical brasileiro.
Na música popular, firmaram-se cada vez mais os elementos da nossa herança africana. Em 1889, surge a marcha "ô Abre Alas", de Chiquinha Gonzaga, a primeira composição destinada especialmente às festas de Carnaval.
Na época, a música era divulgada principalmente nos teatros de ópera ou então ao ar livre, em apresentações que exigiam dos cantores uma série de recursos vocais, para evitar que fossem abafados pela massa orquestral ou pelas bandas. A marcha de Chiquinha Gonzaga também refletia essa preocupação, exigindo para a sua interpretação uma voz possante. Por outro lado, a simplicidade da letra e a descontração rítmica permitiam que todos entoassem, nas ruas, a nova marcha, que teve assim uma rápida aceitação popular.
Até às vésperas da Primeira Grande Guerra, o Carnaval ainda não ganhara o ritmo capaz de lhe conferir um denominador musical comum. Porém, a partir de 1917, quando Ernesto dos Santos, o Donga, gravou em disco a música "Pelo Telefone", o primeiro "samba autêntico" (cujo rótulo, entretanto, classificava-o como marcha carnavalesca), as músicas nitidamente brasileiras popularizaram-se rapidamente.
Durante a República Velha, davam seus primeiros passos musicais Alfredo Viana Filho - Pixinguinha -, Noel Rosa e Ari Barroso, que no período seguinte (Segunda República) seriam os responsáveis pela época de ouro da música popular brasileira.
O Teatro
No final do século XIX e início do século XX, o teatro no Brasil não passava de uma imitação dos modelos europeus.
Nesse panorama surgiu Artur Azevedo, que reagiu contra o teatro da época através de sátiras musicais, nas quais apontava e analisava problemas sociais. Autor de quase duzentas peças, Artur Azevedo encerrou um ciclo do teatro brasileiro, iniciado com as comédias de Martins Pena. Duas de suas peças, O Mambembe e A Capital Federal, são consideradas obras-primas da literatura dramática nacional.
Com a Grande Guerra interrompendo o contato com os centros culturais europeus, surgiram as companhias teatrais brasileiras, encenando peças que valorizavam a vida do campo - seus homens são fortes e sadios, em oposição à vida nas cidades - ou que retratavam o conflito entre a "nascente" classe média e os latifundiários, o Brasil era valorizado como o melhor país do mundo.
Foi nesse período que apareceram três atores do teatro brasileiro: Procópio Ferreira, Apolônia Pinto e Leopoldo Fróes. Os autores mais encenados foram: Cláudio de Sousa (Flores de Sombra), Gastão Tojeiro (Onde Canta o Sabiá) e Armando Gonzaga (Cala a Boca Ete1vina).
No entanto, o espetáculo teatral continuava sendo, basicamente, um roteiro sobre o qual as "estrelas" improvisavam. O teatro brasileiro era um teatro de ator, não existindo a idéia de um diretor que coordenasse o espetáculo, respeitando as idéias do autor.
Em 1927, Eugênia e Álvaro Moreyra fundaram, no Rio de Janeiro, o Teatro de Brinquedo, que estreou com a peça "Adão, Eva e Outros Membros da Família". Foi uma tentativa de trazer para o teatro brasileiro as proposições estéticas da Semana de Arte Moderna.
O Cinema
Em 1896, os jornais do Rio de Janeiro noticiavam a chegada do primeiro aparelho de projeção ao País - o omniógrapho, numa sala da Rua do Ouvidor -, que exibia "vistas naturais". Como o grande sucesso do novo invento (Irmãos Lumière) exigia a renovação constante dos programas, o proprietário do salão da Rua do Ouvidor, Pascoal Segreto, enviava periodicamente emissário a Paris ou Nova York, a fim de obter novas 'vistas' e aparelhos mais modernos. Retornando de uma dessas viagens, Afonso Segreto, irmão de Pascoal, filmou algumas cenas da Baía de Guanabara, a bordo do navio francês Brésil. Esta data, 19 de junho de 1898, marca o início das primeiras cenas filmadas no Brasil.
Até 1907, a produção cinematográfica brasileira resumia-se às "vistas naturais". Somente a partir do ano seguinte começaram a surgir filmes de enredo, ou "filmes posados". O primeiro filme de ficção realizado no Brasil (1908) foi Nhô Anastácio Chegou de Viagem, um curta-metragem que contava as aventuras de um caipira no Brasil. Vinte dias após a sua exibição, foi apresentado ao público o filme Os Estranguladores, baseado num crime ocorrido no Rio de Janeiro e produzido pela firma Photo Cinematographia Brasileira, de Antônio Leal e José Labanca. O sucesso desse filme fez surgir outros que relatavam a crônica policial da época: Noivado de Sangue ou Tragédia Paulista, Um Drama na Tijuca, A Mala Sinistra.
De 1914 a 1918, mais de doze firmas produtoras foram criadas em São Paulo e Minas Gerais. Nesse período, vários técnicos em direção teatral e em cinegrafia chegaram ao Brasil, fugindo do conflito europeu. Em 1915, Paulo Benedetti montou o primeiro laboratório profissional do País e lançou o primeiro filme sonoro brasileiro. A partir de 1918, ocorreu um surto de filmes inspirados na literatura brasileira e na participação do Brasil na Grande Guerra.
Na década de 20, aumentou a produção de filmes, agora com sensível melhora na qualidade; importante, neste último aspecto, foi a atuação de Pedro de Lima e Adhemar Gonzaga, que através da revista Cinearte procuravam orientar o trabalho dos vários grupos que atuavam no campo cinematográfico.
Na época, Cristóvão Guilherme Auler e Frederico Serrador, concorrentes de Leal e Labanca, realizaram filmes "cantantes" e "falantes", isto é, filmes cujas cenas eram acompanhadas, na hora da projeção, pela voz de artistas escondidos atrás da tela. Além de filmarem operetas, produziam também o "filme-revista", inspirado na tradição teatral das "revistas de fim de ano" que satirizavam os principais acontecimentos políticos do ano. O maior sucesso artístico-financeiro da época foi o filme Paz e Amor, escrito por José do Patrocínio Filho, filmado por Alberto Botelho e produzido por Guilherme Auler. Outro grande sucesso foi a película O Crime dos Banhados, um longa-metragem que contava o massacre de toda uma família do Rio Grande do Sul, em conseqüência de lutas políticas recentes à época.
A Imprensa
O Estado de S. Paulo, dirigido por Júlio de Mesquita, foi o grande órgão político na capital paulista, onde se desenvolviam mais rapidamente as atividades industriais e burocráticas. Em 1907, o jornal tinha tiragens diárias de 35 mil exemplares, com 16 a 20 páginas, tendo como colaboradores, entre outros, Coelho Neto e Euclides da Cunha.
Em 16 de maio de 1906, começava a circular, em São Paulo, A Gazeta, dirigida inicialmente por Adolfo Araújo e, a partir de 1918, por Cásper Líbero.
A imprensa estrangeira de São Paulo, cidade de imigrantes, particularmente italianos, foi reforçada com o aparecimento, em 1908, de II Picolo.
Um exemplo que caracteriza o engajamento político da imprensa na época foi o da Campanha Civilista de 1909; a imprensa dividiu-se: tomaram posição em favor de Hermes da Fonseca o Jornal do Brasil, O País e O Malho; ao lado da candidatura de Rui Barbosa, ficaram o Correio da Manhã, O Estado de S. Paulo e Careta.
As revistas (na maior parte humorísticas) mais famosas da época eram O Malho (1902), O Tico-Tico (1905), Fon-Fon (1907) e Careta (1908).
Dentre os jornais estrangeiros publicados em São Paulo, destacou-se o italiano Fanfulla.
A Propaganda
Na primeira década do século XX, apareceram as primeiras revistas semanais ilustradas. Nelas, os pequenos classificados do século anterior foram substituídos pelos anúncios de página inteira impressa em até sete cores.
As figuras do governo, parlamentares e até mesmo personalidades ilustres e internacionais passaram a ser explorados pela propaganda, através de caricaturas e de diálogos que davam a aparência de testemunhos; os versos reforçavam o tom de glosa, com humor e uma certa alegria extremamente liberal.
Imagine um presidente da República fazendo referências elogiosas aos artigos de uma loja ou posando com seus ministros diante de um bazar, todos vestidos de quimonos, dizendo que acabaram de fazer compras fabulosas. Foi o que aconteceu com Afonso Pena em 1909, nas páginas da revista Fon-Fon.
O Barão do Rio Branco, ministro das Relações Exteriores, apareceu em um anúncio tendo a seu lado um menino que lhe perguntava: "Seo Barão, o que devo fazer para ficar forte e bonito como o senhor?" Respondia Rio Branco: "Deves te alimentar com o milagroso Manah, que, além de ser atualmente a salvação das crianças, ainda oferece um prêmio de $500.000".
Há muitos outros exemplos utilizando-se das personalidades mais em voga de cada fase. Como o desta frase de um quadrinho famoso, atribuída a Olavo Bilac: "Aviso a quem é fumante / Tanto o Príncipe de Gales como o Dr. Campos Salles / Usa Fósforo Brilhante".
Em 1914, instalou-se em São Paulo a primeira agência de publicidade do Brasil: A Eclética, que em 1918 abriu uma filial no Rio de Janeiro, a qual acumulava também as funções de representante do jornal O Estado de S. Paulo. Mais tarde surgiram agências publicitárias norte-americanas, como a Thompson e a Ayer, desenvolvendo e atualizando a publicidade de estradas e melhorando o acabamento gráfico dos anúncios.
Nessa época, os anúncios de moda apareciam em páginas em cores. A Nestlé vendia sua Farinha Láctea em três palavras: "Força, Vigor, Robustez". A Colgate-Palmolive promovia o Extract Vision de Fleurs como sendo um perfume "agradável, persistente e delicioso"; o Colgate's Baby Talc Powder era "indispensável na toalete das crianças". Anúncios de remédios eram constantes, como por exemplo os da Adalina, Bayaspirina, Instantina, Rapé Medicinal Oxau, Mitigau e Tônico Bayer.
É importante salientar o aparecimento do personagem "Jeca Tatu", de Monteiro Lobato, que nos anúncios do Biotônico Fontoura, Ankilostomina e Maleitosan foi chamado de Jeca-Tatuzinho. Era a história de "um pobre caboclo que morava no mato, numa casinha de sapé. Vivia na maior pobreza em companhia da mulher, muito magra e feia e de vários filhinhos pálidos e tristes. Quando a família bebeu os produtos do Laboratório Fontoura, todos se tomaram saudáveis, fortes, felizes e até melhoraram seu padrão de vida". As histórias de Jeca- Tatuzinho tomaram-se extremamente populares. Seu autor, Monteiro Lobato, aproveitava para, além de anunciar o produto, também ensinar alguns princípios básicos de higiene, como por exemplo, escovar os dentes etc. Vendiam, ensinando. Atualmente, nos Laboratórios Fontoura, existe uma sala especial, onde estão os originais, desenhos, aquarelas e layouts para capas de almanaques, feitos por Monteiro Lobato.
6. As Telecomunicações
O Rádio
Marconi, inventor do rádio, teve como precursor um padre brasileiro: o padre Landell de Moura, verdadeiro inventor da válvula de três pólos (ou tríodo), que conseguiu transmitir notas musicais a longa distância, sem fios. em 1893. No entanto, na época, o sacerdote foi acusado por seus contemporâneos de "lunático, louco, bruxo e diabólico", sofrendo inclusive perseguições de seus superiores. Na verdade, há poucos documentos sobre os trabalhos científicos do padre Landell de Moura. Mas esses poucos papéis e anotações são suficientes para comprovar suas idéias no que tange ao telégrafo sem fio e ao rádio. Já em 1894, ele fazia experiências na Avenida Paulista, transmitindo suas mensagens para outra estação no Morro de Santana. Em 1901, viajou para os Estados Unidos e lá patenteou seus inventos no U.S. Patent Office, onde se encontram até hoje suas patentes de números 771.917 (transmissor de ondas), 775.337 (modelo original de telégrafo sem fio) e 775.846 (telefone sem fio).
Oficialmente, o rádio nasceu no Brasil no dia do centenário da Independência, no Rio de Janeiro. Aos 7 de setembro de 1922 havia o grande desfile no Campo de São Cristóvão. O discurso do Presidente Epitácio Pessoa foi ouvido no recinto da Exposição do Centenário, em Niterói, Petrópolis e em São Paulo, graças à instalação de uma estação transmissora no Corcovado. O serviço fora feito pela Rio de Janeiro and São Paulo Telephone Company, pela Westinghouse Internacional Company e pela Western Electric Company.
À noite, no recinto da Exposição, em frente ao posto de "Telephone Público", por meio do "telephone-alto-falante", a multidão teve uma sensação inédita. A ópera "O Guarani", de Carlos Gomes, que estava sendo apresentada no Teatro Municipal, "foi ali, distintamente ouvida, bem como os aplausos aos artistas", como descreveu o jornal "A Noite do dia 9 de setembro de 1922".
Essa transmissão pioneira foi o coroamento dos esforços de homens como Roquete Pinto, que liderou o movimento para a instalação da primeira estação de Rádio do Brasil: a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro, com estações transmissoras no Corcovado e na Praia Vermelha. A emissora foi inaugurada no dia 20 de abril de 1923.
A primeira emissora paulista nasceu em 1924: a Rádio Educadora Paulista, cujo presidente-fundador foi Steidel. Ainda naquele ano, foi fundada no Recife a Rádio Clube de Pernambuco, graças à iniciativa dos irmãos Moreira Pinto.
A CRISE DA REPÚBLICA VELHA
1. Introdução
Durante a Primeira Guerra Mundial, a economia brasileira alcançou um relativo grau de diversificação; desse modo, a estrutura da sociedade diferenciou-se, desenvolvendo as camadas sociais urbanas: classe média e operariado. A classe média era a mais prejudicada pelas medidas defensivas da economia cafeeira, pois as contínuas desvalorizações cambiais, ao encarecerem os produtos importados, atingiam diretamente suas possibilidades de consumo.
A estrutura política da República Velha, como vimos, foi marcada pela dominação das oligarquias agrárias lideradas pelo setor cafeeiro e a corrupção eleitoral excluía, os grupos urbanos de qualquer representação. Foram, na década de 1920, as camadas médias urbanas e o proletariado que mais pressionaram por uma abertura política, questionando o poder da velha oligarquia do café-com-leite.
2. O Tenentismo
Características
Dessa forma, a década de 1920 foi marcada por agudas tensões políticas e sociais. Descontente com o aumento do custo de vida, o povo reclamava voto direto e secreto, eleições controladas pelo Poder Judiciário; em suma, a "verdade eleitoral".
No âmbito militar, ocorria um forte descontentamento em certos setores do Exército. A alta oficialidade freqüentemente se chocava com os grupos dominantes, como durante o governo de Epitácio Pessoa, ao apoiar o candidato oposicionista Nilo Peçanha contra a candidatura oficial de Artur Bernardes.
Paralelamente, os oficiais jovens formavam um movimento que predominou a partir de 1922: o Tenentismo.
O Tenentismo representou, dentro do Exército, uma cisão entre os oficiais mais graduados, que após suas desavenças com Epitácio Pessoa haviam se acomodado no governo de Artur Bernardes, e os jovens oficiais que pretendiam mudanças políticas e sociais.
Do ponto de vista ideológico, o movimento tinha, até 1930, as seguintes características:
Ideal de Salvação Nacional - Os tenentes viam-se como agentes da regeneração, defensores das instituições republicanas, em nome de um povo ignorante e infeliz.
Elitismo - A insurreição caberia a um grupo, e não ao povo, despreparado e incapaz. Os tenentes, contraditoriamente, defendiam a "verdade eleitoral", mas entendiam que as camadas populares votavam mal, e que seria mais razoável substituir o voto universal pelo voto de uma "elite eleitoral".
Reformas - Centralização dos poderes do Estado, moralização, nacionalismo econômico, novo sistema de ensino.
Os participantes
Alguns tenentes pertenciam à classe média, outros vinham de farm1ias tradicionais. Levar em conta sua origem social é importante, mas não basta para explicar o movimento. É preciso considerar também o fato de os tenentes pertencerem às Forças Armadas, uma instituição peculiar da sociedade, o que dava ao movimento a característica do "ideal de salvação nacional" e a possibilidade de utilização da via armada para atingir seus objetivos.
Dentre os principais componentes do movimento, podemos citar: Luís Carlos Prestes, Joaquim e Juarez Távora, Isidoro Dias Lopes, Eduardo Gomes, Siqueira Campos, João Cabanas e Miguel Costa.
As etapas do Tenentismo
Os "18 do Forte" de Copacabana, 1922
A sucessão presidencial em 1922 provocara uma cisão interna no Exército. Parte da alta oficialidade apoiava Nilo Peçanha em oposição ao candidato oficial, Artur Bernardes. Mesmo encerradas as eleições, que, é claro, deram vitória a este último, a agitação continuava. Hermes da Fonseca, então presidente do Clube Militar e anteriormente envolvido no episódio das Cartas Falsas, incitou as guarnições de Pernambuco a não obedecerem a Epitácio Pessoa.
Repreendido pelo ministro da Guerra, o civil Pandiá Calógeras, Hermes confirmou a incitação e não aceitou a repreensão. Foi, então, preso e o Clube Militar fechado por seis meses, o que agravou a tensão. Em 5 de julho de 1922, dezoito elementos jovens do Forte de Copacabana rebelaram-se contra o governo. Da luta que se seguiu, restaram apenas dois sobreviventes: Eduardo Gomes e Siqueira Campos.
A Revolução de 1924 - São Paulo
Desde o célebre episódio das Cartas Falsas, as quais lhe haviam sido atribuídas antes mesmo de sua eleição para a Presidência da República, Artur Bernardes despertara a animosidade de numerosos oficiais do Exército, sobretudo entre os mais jovens. Na qualidade de representante típico da República das Oligarquias o presidente era um alvo natural para os ataques dos tenentes. Quanto aos oficiais-generais, porém, a maioria o apoiava, pois eram militares perfeitamente identificados com o sistema, ao qual serviam e do qual recebiam benefícios.
A Revolução de 1924 foi um movimento de cunho essencialmente tenentista, embora seu chefe fosse o general Isidoro Dias Lopes (daí a denominação popular de Revolta do Isidoro). O levante irrompeu em São Paulo no dia 5 de julho de 1924, exatamente dois anos após a revolta dos 18 do Forte. O presidente do Estado, Carlos de Campos, resistiu aos revolucionários, apoiado em algumas unidades da Força Pública até a chegada de tropas federais. Aumentando a pressão governista, os revolucionários decidiram retirar-se da cidade, após 22 dias de ocupação. A retirada ocorreu em boa ordem, em direção ao interior do Estado de São Paulo, e depois para o oeste do Paraná. Nas proximidades da foz do Iguaçu, em abril de 1925, a coluna paulista efetuou sua junção com outra coluna revolucionária que, sob a chefia do capitão Luís Carlos Prestes, vinha do Rio Grande do Sul.
A Coluna Prestes - 1924/1927
Assim se chamou a coluna que, sob o comando de Miguel Costa e tendo Luís Carlos Prestes como chefe de Estado-maior, percorreu mais de 24.000 km (somando-se os itinerários de seus quatro destacamentos) pelo interior brasileiro. A marcha da Coluna Prestes representou o momento máximo do Movimento Tenentista, com seu objetivo de conscientizar a população do País e incitá-la contra as estruturas políticas vigentes.
Militarmente, a Coluna Prestes pode ser considerada um sucesso. Com efetivos que jamais ultrapassaram 1.500 homens (as perdas geralmente eram compensadas por novas adesões) e sempre prejudicados pela insuficiência de munições, os revolucionários conseguiram evitar o cerco e a captura por parte das forças, numericamente superiores, que os perseguiam. Ao todo, a Coluna Prestes travou 53 combates, sem ter sido derrotada em nenhum deles.
Politicamente, porém, a Coluna fracassou. O povo, de um modo geral, permaneceu apático (exceto certos elementos da classe média e membros de oligarquias dissidentes), quando não, hostil ao movimento. Os "coronéis", com suas forças irregulares, deram um importante apoio às unidades do Exército que lutavam contra a Coluna. Até mesmo cangaceiros, como o célebre Lampião, foram mobilizados contra os rebeldes.
Em fevereiro de 1927, já no governo de Washington Luís, os últimos remanescentes da Coluna Prestes (cerca de 800 homens) internaram-se na Bolívia. O Tenentismo provara, definitivamente, sua incapacidade em conquistar o poder apenas com seus recursos.
A Revolução de 1930 e a Era de Vargas (1930 – 1945)
A REVOLUÇÃO DE 1930
1. Introdução
No fim da década de 1920, os setores que contestavam as instituições da República Velha não tinham possibilidade de êxito: os tenentes, após vários insucessos, estavam marginalizados ou no exI1io; as classes médias urbanas não tinham autonomia para se organizar. Todavia, uma oportunidade abrir-se-ia para esses setores: uma nova divergência entre as oligarquias regionais e o golpe sofrido pelo setor cafeeiro com a crise mundial de 1929.
2. Fatores da Revolução de 1930
• A dissidência regional: a indicação de Júlio Prestes pelo presidente Washington Luís como candidato do governo à Presidência na eleição de 1930, ao que parece, para que sua política de estabilização financeira não fosse interrompida, não foi aceita por Antônio Carlos Ribeiro de Andrade, presidente do Estado de Minas Gerais. Rompia-se a Política do Café-com-Leite.
Antônio Carlos, a fim de enfrentar o governo federal, realizou uma aliança com o Rio Grande do Sul e a Paraíba. No Rio Grande do Sul, o Partido Republicano e o Partido Libertador tinham chegado a um relativo acordo, o que fortalecia o Estado no plano nacional. Ao Rio Grande do Sul foi oferecida a candidatura à Presidência, e à Paraíba, a candidatura à Vice-Presidência. Juntaram-se a eles o Partido Democrático de São Paulo e outras oposições dos Estados, dando origem a uma coligação denominada Aliança Liberal (1929). Dela faziam parte velhos políticos como Borges de Medeiros e Antônio Carlos Ribeiro de Andrade, e os ex-presidentes Epitácio Pessoa, Artur Bernardes e Venceslau Brás. Foram lançadas as candidaturas de Getúlio Vargas para presidente e de João Pessoa para vice.
O programa da Aliança Liberal satisfazia as aspirações dos setores opostos ao cafeeiro, ao proclamar que todos os produtos nacionais deveriam ser incentivados, e não somente o café, cujas valorizações prejudicavam financeiramente o País. Outrossim, pretendendo sensibilizar as classes médias urbanas, o programa defendia as liberdades individuais, o voto secreto, a participação do Poder Judiciário no processo eleitoral, leis trabalhistas e anistia política.
Apesar da grande repercussão de sua campanha nos centros urbanos, os candidatos da Aliança Liberal foram derrotados, pois a grande maioria dos Estados alinhava-se com o presidente Washington Luís.
• A crise de 1929: embora seja certo que a crise mundial repercutiu com mais intensidade no Brasil em 1931, é preciso considerar que seus efeitos iniciais já abalavam o setor cafeeiro. Esse fato foi percebido pelos adversários da oligarquia cafeicultora, que nele viram uma oportunidade de derrubá-la.
Por outro lado, o setor cafeeiro e o governo federal estavam distanciados por este ter recusado auxílio no início da crise. Os grupos dominantes de São Paulo, embora tivessem marchado com a candidatura de Júlio Prestes, não estavam dispostos a uma luta armada.
3. O movimento
Com a derrota eleitoral, os velhos políticos da Aliança Liberal - como Borges de Medeiros - pretenderam compor-se com os vitoriosos, como geralmente acontecia na República Velha. Mas existia na Aliança uma ala de políticos jovens (Maurício Cardoso, Osvaldo Aranha, Lindolfo Collor, João Neves, Flores da Cunha, Virgílio de Melo Franco e Francisco Campos) que não se conformava com uma situação na qual sua ascensão política permanecia dependente. Portanto, optaram eles pela via armada e, para isso, aproximaram-se dos tenentes, como Juarez Távora, Ricardo Hall e João Alberto.
A conspiração sofreu várias oscilações por causa da posição conciliatória dos velhos oligarcas da Aliança Liberal, inclusive do próprio Getúlio Vargas, o que provocou seu esfriamento. Porém, foi alentada pela "degola" de deputados federais eleitos por Minas Gerais e Paraíba (maio de 1930), quebrando a Política dos Governadores e pelo assassinato de João Pessoa (julho de 1930) em Recife, por motivos ligados a problemas locais, mas explorado politicamente pelos conspiradores, e pela adesão do gaúcho Borges de Medeiros, em agosto do mesmo ano.
Os tenentes foram aproveitados por sua experiência revolucionária, mas a chefia militar coube ao tenente-coronel Góis Monteiro, elemento de confiança dos políticos gaúchos.
No dia 3 de outubro eclodiu a revolta no Rio Grande do Sul, e no dia seguinte, sob a chefia de Juarez Távora, no Nordeste. Dela participavam tropas das milícias estaduais e forças arregirnentadas por "coronéis". Das tropas do Exército, várias aderiram ao movimento, algumas mantiveram-se neutras, e poucas resistiram. Em vários Estados os governantes puseram-se em fuga. Quando se esperava um choque de grandes proporções entre as tropas que vinham do Sul e as de São Paulo, o presidente Washington Luís foi deposto, no dia 24, por um grupo de altos oficiais das Forças Armadas, que tinham a intenção de exercer um papel moderador. Formou-se uma Junta Governativa Provisória, intitulada Junta Pacificadora, integrada pelos generais Mena Barreto e Tasso Fragoso, e pelo almirante Isaías Noronha.
Após algumas hesitações, a Junta passou o poder para Getúlio Vargas no dia 3 de novembro.
4. Conclusão
Em 1930, a crise que se configurara ao longo da década atingiu sua culminância: as oligarquias regionais dissidentes optavam pela luta armada, o descontentamento militar ganhava novo alento, as classes médias urbanas, insatisfeitas, constituíam um amplo setor de apoio. Nesse momento, o setor cafeeiro era atingido pelos primeiros efeitos da Crise de 1929 e se distanciava do Governo Federal. Daí a possibilidade de vitória de uma revolução.
Portanto, um fator externo - a Crise Mundial de 1929 - combinou-se com o agravamento de contradições internas.
O setor cafeeiro continuou representando o papel fundamental na economia do País, mas, com a derrota, perdeu a hegemonia política.
A Revolução levou a uma nova composição de equilíbrio entre setores da classe dominante. Não houve uma ruptura no processo histórico, e sim apenas uma acomodação de interesses e uma atualização de instituições.
A ERA DE VARGAS (1930-1945)
1. Introdução
A mudança de liderança política resultante da ascensão de Vargas à Presidência tomou-se conhecida como a Revolução de 1930. O movimento tinha dois objetivos. Em primeiro lugar, pôr fim à estrutura republicana criada a partir de 1889. Por outro lado, modernizar o aparelho governamental para atender às necessidades criadas pelo crescimento do País.
A Revolução de 1930 pôs fim à hegemonia da burguesia do café. O episódio revolucionário representava a necessidade de reajustar a estrutura do País, cujo funcionamento, voltado essencialmente para um único gênero de exportação, tomava-se extremamente precário.
O agravamento das tensões no curso da década de 1920, as peripécias eleitorais de 1930 e os primeiros efeitos da crise econômica mundial propiciaram a criação de uma frente difusa e heterogênea, cujo único denominador comum era a derrubada da velha República Oligárquica.
A classe dirigente paulista - onde o setor cafeeiro era predominante - perdia a hegemonia política com a Revolução de 1930. Daí para a frente - como tendência - São Paulo ampliaria sua importância econômica, mas a representação política fugiria de suas mãos.
O "tenentismo" - que desde 1922 se apresentara como sintoma das transformações estruturais da sociedade brasileira, conseguindo catalisar os descontentamentos de vários grupos nacionais - a partir de 1930 perde sua força autônoma. Derrubadas as velhas instituições, é para a figura de Getúlio Vargas que se voltam as esperanças, esvaziando a imagem dos tenentes. Individualmente, com raras exceções, os tenentes foram atraídos para a órbita do Poder Central, onde sua ação e influência têm papel significativo mas subordinado.
O novo governo revelou a disposição de centralizar progressivamente em suas mãos tanto as decisões econômico-financeiras como as de natureza política, mostrando-se inovador mais na forma que no conteúdo.
É importante frisar que a Revolução de 30 e o Governo de Vargas levaram a uma acomodação, um rearranjo no próprio seio de oligarquia dominante, sem, contudo, destruir o poder deste grupo. Testemunha disso foi, como veremos, a política de proteção ao café.
2. O governo provisório
"Assumo provisoriamente o governo da República, como delegado da Revolução, em nome do Exército, da Marinha e do Povo". Com estas palavras, Vargas recebia da Junta Governativa Provisória, em 3 de novembro de 1930, a chefia do Governo Provisório da República. Contudo, jamais um provisório foi tão permanente, pois uma vez no poder, Vargas iria permanecer por quinze anos à frente dos destinos do País.
A organização política
Em 11 de novembro de 1930, por força da Lei Orgânica que conferia plenos poderes a Vargas, era declarada suspensa a Constituição de 1891 e dissolvidos todos os órgãos legislativos: Congresso Nacional, Assembléias Legislativas Estaduais e Câmaras Municipais, pois "a Revolução não reconhece direitos adquiridos". Assim, Vargas tinha o direito de exercer não apenas o Poder Executivo, mas também o Legislativo, "até que uma Assembléia Constituinte, eleita, estabeleça a reorganização constitucional do País". Da mesma forma, todos os antigos governadores, com exceção do novo governador eleito de Minas Gerais, foram demitidos e em seu lugar nomeados interventores federais. Os interventores, escolhidos entre os tenentes, recebiam plenos poderes e eram diretamente responsáveis perante o Governo Provisório. O Código dos Interventores (agosto de 1931) limitava a área de ação dos Estados, que ficavam proibidos de contrair empréstimos externos sem a autorização do Governo Federal; gastar mais de 10% da despesa ordinária com os serviços da Polícia Militar; dotar as polícias estaduais de artilharia, aviação ou armá-las em proporção superior ao Exército.
O primeiro ministério de Vargas exprimia bem o conjunto de forças diversas que o presidente tinha de manipular: a Osvaldo Aranha, gaúcho e amigo íntimo do presidente, coube o Ministério da Justiça; ao "tenente" Juarez Távora, cearense, foi dado por três semanas o Ministério da Viação e Obras Públicas, que depois foi ocupado pelo paraibano José Américo de Almeida; ao mineiro Francisco Campos, futuro ideólogo do Estado Novo, foi entregue o recém-criado Ministério da Educação e Saúde Pública. Com Lindolfo Collor, gaúcho e protegido de Borges de Medeiros, ficou o novo Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, enquanto a José Maria Withaker, banqueiro e membro do Partido Democrático Paulista, que mantinha boas relações com grupos financeiros internacionais, foi entregue a pasta da Fazenda.
Quanto aos ministérios militares, os tenentes não conseguiram controlá-los, pois estes foram entregues à alta oficialidade do Exército e da Marinha.
A política trabalhista
No plano social destacaram-se, ainda em 1930, a criação do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio (também foi criado o Ministério da Educação e Saúde Pública) e a decretação da Lei dos Dois Terços, chamada vulgarmente de Lei da Nacionalização do Trabalho; diante do desemprego crônico, as empresas de origem estrangeiras eram obrigadas a ter em seus quadros, pelo menos, dois terços de trabalhadores brasileiros natos.
Em 19 de março de 1931, o governo decretou a Lei de Sindicalização, reguladora dos direitos das classes patronais e operárias. De acordo com ela, os estatutos dos sindicatos deveriam, a partir de então, ser aprovados pelo Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, ficando a ele atrelados. Com isso, delineava-se o sentido da política trabalhista de Vargas, rumo ao controle do movimento operário e à criação de condições para o desenvolvimento da indústria, fazendo dessa lei uma mera adaptação da Carta del Lavoro de Mussolini, em que a participação política dos sindicatos era cerceada.
Em 1931, foi apresentado o anteprojeto da Lei do Salário Mínimo, que só se tomaria realidade durante o Estado Novo. Algumas medidas, entretanto, foram implementadas: o trabalho feminino foi regulamentado, assim como trabalho de menores e o trabalho noturno; a carteira profissional foi instituída em março de 1932, para pessoas maiores de 16 anos que exercessem um emprego, tendo valor idêntico à carteira de identidade; a jornada de trabalho foi fixada em 8 horas de serviço diário, com obrigatoriedade de descanso semanal remunerado e o direito das férias anuais, já estabelecido em 1926, mas não cumprido, foi reafirmado com quinze dias úteis sem prejuízo dos vencimentos.
A Revolução Constitucionalista de São Paulo (1932)
Em meio a grande instabilidade, com a sucessão de quatro interventores, em menos de dois anos, São Paulo, que perdera a hegemonia política no plano nacional e a autonomia em virtude da nomeação de interventores, começou a articular os mais diferentes grupos para derrubar Vargas. As reivindicações paulistas iam desde a nomeação de um interventor civil e paulista, passando pela exigência de eleições até a reconstitucionalização imediata do País.
Vargas, por sua vez, procurava "atender" ao desejo dos paulistas, nomeando como interventor em São Paulo o ex-embaixador Pedro de Toledo, um civil e paulista. O atendimento desse pleito, no entanto, não aliviou a tensão e o mal-estar existente entre os paulistas; tampouco adiantaram as medidas que tomara, criando comissões para elaborar o Código Eleitoral e o anteprojeto de Constituição, marcando até a data das eleições para maio de 1933. Para as lideranças de São Paulo, tais atos eram tidos como suspeitos.
Na verdade, a insatisfação dos paulistas devia-se à extensão da crise cafeeira e à política governamental de proteção ao café, que não atendia totalmente aos interesses dos cafeicultores. A insatisfação da elite cafeeira estendeu-se pelo Estado, contagiando os mais variados segmentos da população. Numa atmosfera de entusiasmo, alimentada por marchas militares, criaram-se batalhões e recrutou-se a juventude das escolas, exacerbando o sentimento regionalista de São Paulo, sob a égide do constitucionalismo.
Uma revolução em marcha
No dia 23 de maio de 1932, uma grande manifestação popular investiu contra a sede da Legião de Outubro agremiação política ligada a Getúlio. No tiroteio que então se travou, morreram quatro manifestantes (Martins, Miragaia, Dráusio, Camargo), cujas iniciais serviram para designar o grupo mais extremado do constitucionalismo paulista: MMDC.
Desencadeou-se, então, intensa campanha de agitação contra Vargas, baseada em slogans, como: "Convocação imediata da Constituinte!", "São Paulo conquistado!", "São Paulo dominado por gente estranha!" ou, ainda, "Tudo pela Constituição!"
Em 9 de julho desse mesmo ano irrompia em São Paulo a Revolução Constitucionalista que contava, segundo seus líderes, com o apoio do Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Pernambuco e outros Estados do Nordeste.
São Paulo tomava-se uma praça de guerra: estudantes, profissionais liberais e até trabalhadores se preparavam para a luta; as mulheres, "senhoras da alta sociedade", se ofereciam para seguir para as frentes de batalha; fábricas transformavam-se, do dia para a noite, em produtoras de armas e munições e as patrióticas campanhas, como a do Ouro Para o Bem de São Paulo, procuravam levantar os recursos necessários para a luta.
O núcleo militar dos paulistas estava sob o comando dos generais Bertoldo K1inger e Isidoro Dias Lopes, auxiliados pelo coronel Euclides Figueiredo e era constituído pela tropa da Força Pública do Estado de São Paulo e por tropas federais rebeladas.
Entretanto, foi tudo inútil, pois Vargas fechou as fronteiras paulistas valendo-se de forças policiais, batalhões provisórios e de forças do Exército do Sul e do Norte, sufocando as comunicações e bloqueando as possibilidades de abastecimento. A "grande Revolução" transformou-se numa pequena guerra de trincheiras, que durou apenas três meses.
Nos principais confrontos armados as forças legalistas, comandadas pelo general Góis Monteiro, conseguiram vitórias decisivas; no início de outubro os revolucionários aceitavam os termos da rendição. Os generais K1inger e Isidoro Dias Lopes e os principais responsáveis pelo governo revolucionário de São Paulo se renderam em Cruzeiro, daí seguindo para o Rio de Janeiro como prisioneiros. Euclides Figueiredo não se rendeu; com alguns companheiros fugiu para o Sul num barco de pesca, onde foi capturado pela Marinha e em seguida exilado em Portugal, juntamente com Artur Bernardes, Júlio de Mesquita Filho, Bertoldo K1inger e Pedro de Toledo. A pacificação completou-se quando Armando de Sales de Oliveira (civil e paulista), diretor do jornal "O Estado de S. Paulo", foi nomeado interventor federal em São Paulo, em cuja administração foi criada a Universidade de São Paulo (25/01/1934).
Costuma se dizer que, não obstante a derrota dos paulistas, o espírito da Revolução de 1932 prevaleceu, obtendo em 1934 a almejada Constituição.
Na verdade, a Revolução Constitucionalista de São Paulo não foi a explosão do sentimento liberal pelo Estado de Direito. Foi um ato deliberado e calculado da velha oligarquia visando à retomada do poder, do qual havia sido desalojada em 1930.
3. O Governo Constitucional (1934-1937)
A Assembléia Constituinte
As eleições para a Assembléia Constituinte foram realizadas, conforme programado, a 3 de maio de 1933. Uma novidade no tradicional método de representação era a inclusão de 40 deputados classistas (representantes eleitos pelos sindicatos profissionais) ao lado dos 214 deputados estaduais eleitos diretamente pelo povo.
A Assembléia Constituinte foi transformada na primeira Câmara de Deputados com poderes para eleger pelo voto indireto o presidente da República.
Instalada a 15 de novembro de 1933, sob a presidência de Antônio Carlos Ribeiro de Andrade, a Assembléia Constituinte discutiu o anteprojeto elaborado por Góis Monteiro, Osvaldo Aranha e João Mangabeira, aprovando-o em 16 de julho de 1934.
No dia seguinte, 17 de julho, foram realizadas as eleições para a escolha do presidente da República. Getúlio Vargas foi eleito por 175 votos, enquanto os outros candidatos, Borges de Medeiros (59 votos), Góis Monteiro (4 votos) e mais 8 outros nomes receberam um voto cada.
No dia 20 de julho, Vargas foi à Assembléia sendo recebido com aplausos e pétalas de rosas. Prometeu publicamente defender a nova Constituição, mas não refletiu sua opinião sobre o documento. Vargas deveria exercer seu mandato presidencial até 3 de maio de 1938.
A polarização ideológica
Quando, em julho de 1934, Vargas foi eleito presidente pelo Congresso, a situação estava longe de estabilizar-se. As lutas regionais ainda prosseguiam. Havia ameaças, de esquerda e de direita, ao regime. As próprias Forças Armadas estavam divididas.
O Estado definira uma política conservadora em relação aos operários e às camadas rurais, o que tranqüilizou os velhos grupos dominantes, especialmente os de São Paulo. Embora a política trabalhista de Vargas houvesse, de início, alarmado esses setores, acabou, por final, a acalmá-los, pois nem sequer tocou no problema da propriedade rural.
O modelo político instituído em 1934 seria transitório. A tendência centralizadora esboçada em 1930 se afirmaria rapidamente, frente às radicalizações ideológicas de direita e de esquerda.
O chamado período constitucional de Vargas (1934 a 1937) foi marcado pelo aparecimento de duas forças ideológicas no Brasil: a Aliança Nacional Libertadora (ALN) de tendências esquerdizantes e a Ação Integralista Brasileira (AIB) de caráter fascista. Enquanto isso, a política de Vargas vai se mostrando cada vez mais centralizadora e autoritária, até o desfecho final em novembro de 1937, quando Vargas implantou a ditadura do Estado Novo.
A Ação Integralista Brasileira
Liderada pelo jornalista Plínio Salgado, a Ação Integralista Brasileira era fundamentalmente um movimento social e político de orientação fascista e reivindicava um governo ditatorial com um partido único e um chefe único.
As paradas de "camisas-verdes" (integralistas) eram um espetáculo comum. Por toda parte, viam-se integralistas cumprimentando-se no seu estilo habitual: com o braço direito erguido e a saudação indígena "Anauê". Crescia cada vez mais o número dos que juravam lealdade a Plínio e a seu lema "Deus, Pátria e Farrníla".
Os integra1istas tinham esperança de que um dia o Brasil tivesse um único partido nacional - o seu - e que, a partir desse dia, não haveria mais eleições diretas.
A AIB pretendia estabelecer o Estado totalitário ou integral estruturado mediante as corporações, representativas das profissões, em uma rígida hierarquia sob o controle do Chefe, subordinando todos os elementos à construção do ideal de nação identificada com o próprio Estado.
A AIB era apoiada por muitos representantes das Forças Armadas e sobretudo pela Igreja Católica.
A Aliança Nacional Libertadora (ANL)
Uma tradição oral que vem do Estado Novo identifica a Aliança Nacional Libertadora, fundada em março de 1935, com o Partido Comunista. Há aí uma simplificação. Na verdade, a ANL correspondeu ao encontro de algumas correntes ideológicas que até então haviam seguido caminhos independentes e mesmo opostos: tenentismo esquerdizante, socialistas, comunistas e outros.
As reivindicações básicas da ANL eram:
1) suspensão definitiva do pagamento das dívidas externas "imperialistas" do Brasil;
2) nacionalização de todas as empresas estrangeiras;
3) proteção aos pequenos e médios proprietários e lavradores; entrega das terras dos grandes proprietários aos camponeses e trabalhadores rurais que as cultivam;
4) gozo das mais amplas liberdades populares pelo povo brasileiro;
5) constituição de um governo popular.
No dia 5 de julho de 1935, aniversário das revoltas de 1922 e 1924, Luís Carlos Prestes, líder da ANL, pronunciou violento discurso denunciando o fracasso de Vargas ante os ideais de 1922. O discurso terminou com o grito:
"Abaixo o governo odioso de Vargas! Abaixo o fascismo! Por um governo popular nacional revolucionário! Todo o poder à Aliança Nacional Libertadora!"
A reação governamental foi imediata. O chefe de Polícia do Rio de Janeiro, Filinto Müller, revelou em seu relatório ao ministro da Justiça as ligações da ANL com os grupos comunistas internacionais.
A 12 de julho, com base na Lei de Segurança Nacional, recém-decretada, determinou-se o fechamento da sede da ANL por seis meses e muitos de seus líderes foram presos.
Enquanto isso, outros membros da ANL conduzidos por Prestes, secretamente conspiravam a revolta que redundaria na Intentona Comunista.
4. O Estado Novo (1937-1945)
Por sucessivas prorrogações da Câmara dos Deputados, o Brasil viveu em estado de emergência, logo equiparado a estado de guerra, de novembro de 1935 a junho de 1937. A criação de um clima de tensão justificava os pedidos. O estado de sítio, inicialmente foi concedido por 30 dias; antes de seu término o governo pediu prorrogação de 90 dias e a autorização para equiparação a estado de guerra. Isso se devia ao exagero e à amplificação da ameaça comunista. Em 1936, enquanto prosseguia a "caça aos comunistas", os políticos preparavam-se para a eleição presidencial marcada para 3 de janeiro de 1938. Em meados de 1937 já estavam definidos os candidatos. Armando de Sales Oliveira, governador de São Paulo, autêntico porta-voz do constitucionalismo liberal, era apoiado pela União Democrática Brasileira. Outra candidatura era a de José Américo de Almeida, um antigo tenentista, romancista e político da Paraíba. Era, de modo geral, considerado candidato do governo, apesar de Getúlio não se pronunciar sobre o assunto.
Os integralistas, em junho de 1937, apresentaram a candidatura de seu líder, Plínio Salgado. Desenvolveram intensa propaganda, pela imprensa e pelo rádio, onde se propunham a salvar a democracia por meio da autoridade integralista. Afirmando que se inspirava em Cristo, Plínio Salgado declarava: "Por Cristo quero um grande Brasil! Por Cristo vos conduzo! Por Cristo batalharei".
A impressão era de que Getúlio havia perdido o controle da situação e era obrigado a "engolir" essas candidaturas. No Palácio do Catete, porém, a conspiração avançava. No dia 30 de setembro, os jornais e estações de rádio de todo O País alarmaram o povo com informações sobre a descoberta do Plano Cohen. O texto do documento encheu as páginas dos jornais, acompanhado pela mensagem do ministro da Guerra: a visão da tomada violenta do poder pelos comunistas, em que as igrejas seriam queimadas e centenas de pessoas massacradas, apavoravam a população.
As versões sobre a origem do Plano Cohen são as mais variadas. Segundo o historiador John W. Foster Dulles, "um capitão integralista (Olímpio Mourão Filho) tinha sido encontrado datilografando um Plano Comunista no gabinete de um oficial do Estado-Maior (Góis Monteiro)".
Durante o mês de outubro, os preparativos para o golpe arquitetado pela cúpula governamental foram acelerados. O mineiro Francisco Campos preparava já algum tempo, o esboço de uma nova Constituição. O general Eurico Gaspar Dutra persuadia o Alto-Comando das Forças Armadas a assinar uma declaração de apoio à mudança de regime. O deputado Negrão de Lima foi enviado com a missão de convencer os Estados indecisos a apoiarem medidas federais mais fortes. Os integralistas organizaram um impressionante desfile de 50.000 "camisas-verdes" para "afirmar sua solidariedade com o presidente da República e com as Forças Armadas, na luta contra comunismo e a democracia anárquica e para proclamar os princípios de um novo regime." O discurso que Plínio Salgado proferiu nessa ocasião marcou sua retirada da competição pela Presidência: "Desejo ser não o presidente da República, mas simplesmente o conselheiro d meu País."
Tudo estava pronto.
Na madrugada chuvosa de 10 de novembro de 1937, as portas do Senado e da Câmara dos Deputados estavam fechadas e guardadas por soldados, que impediram a entrada dos legisladores.
Não houve muitos protestos. Oitenta congressistas federais enviaram congratulações a Vargas. Somente seis expediram mensagem de protestos. Um dos poucos militares que se opôs ao golpe foi o coronel Eduardo Gomes; outros opositores foram Júlio de Mesquita Filho e Armando de Sales Oliveira.
Nesta mesma manhã entrou em vigor a Constituição de 1937.
À noite Vargas falou à Nação pelo rádio, do Palácio a Guanabara, anunciando e justificando o novo regime.
O golpe fora dado, o Estado Novo estava instaurado.
A organização política do Estado Novo
Preparada desde fins de 1936, a Constituição de 1937 foi chamada de "A Polaca", por ter sido inspirada na Constituição autoritária da Polônia. A nova Carta Magna beneficiava-se de muitos elementos da Constituição de 1934, alguns deles tirados da Carta del Lavoro e da Constituição fascista italiana. O trabalho de Francisco Campos era uma mistura de fórmulas fascistas, nacionalistas e até mesmo liberais (estas últimas como solução de camuflagem).
O presidente (com mandato de 6 anos) seria a autoridade suprema da Nação e a preponderância do Poder Executivo facultava-lhe legislar através de Decretos-Leis. A Constituição continha disposições sobre salário mínimo, horas de trabalho, férias etc. Proibia greves e instituía a pena de morte. Os recursos minerais, fontes de energia, bancos, companhias de seguro e as indústrias de base foram nacionalizados.
A palavra escrita ou oral era passível de censura, exercida pelo Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), do Ministério da Justiça.
Todas as lojas, restaurantes e outros locais de negócio deviam exibir a fotografia de Vargas, que preferia ser chamado de "Presidente" em vez de "Ditador".
Os principais órgãos surgidos durante o Estado Novo foram: DASP (Departamento Administrativo do Serviço Público) de caráter aparentemente burocrático, encarregado de supervisionar os interventores nos Estados, além de funcionar como cabide de empregos; e o DIP (Departamento de Imprensa e Propaganda), grande arma ideológica do Estado Novo, atuando como órgão de censura, planejando a propaganda de governo e controlando a opinião pública. A ação de propaganda do governo incluía a “Hora do Brasil", que os inimigos do regime chamavam "Hora do Silêncio".
O “Putsch" Integralista
Com o advento do Estado Novo, os integralistas pensavam, erroneamente, que iriam ser os beneficiados pelo novo governo. No entanto, Vargas, desde o começo da ditadura, mostrou que não tinha nenhuma inclinação para “camisas-verdes". Além de tudo, Getúlio queria prover um forte vínculo de lealdade do povo para com o “Brasil Unido"; lealdade não a grupos nem a lemas propostos por Plínio Salgado.
Em dezembro de 1937, os partidos políticos foram suprimidos, assim como o uso de uniformes, estandartes, distintivos e outros símbolos, o integralismo era posto fora da lei. As decisões nacionalistas do presidente e do ministro da Justiça afetaram também as colônias estrangeiras: italiana, japonesa e alemã. Os diretores de jornais de língua alemã foram convidados a abandonar a propaganda hitlerista. Tornou-se obrigatório o ensino primário em língua portuguesa.
As atitudes do governo levaram os integralistas a prepararem o golpe de maio de 1938. O preparo contou também com a colaboração de alas liberais dissidentes e militares descontentes - Otávio Mangabeira, Júlio de Mesquita Filho (que em janeiro de 1938 foram presos por atividades subversivas), coronel Euclides Figueiredo, Aureliano Leite e general Castro Júnior.
O grupo de conspiradores, liderado pelo tenente Severo Fournier, planejou um ataque ao Palácio Guanabara na noite de 10 de maio. Por motivos vários, o que quase sempre acontece nesse tipo de "quartelada", o plano não pôde ser seguido à risca pois os assaltos aos quartéis, ao Ministério da Marinha, a chefes políticos e generais haviam fracassado antes de haverem começado, pelo pavor que se apoderou dos assaltantes. Mas o ataque ao Palácio Guanabara, onde residia Getúlio, foi levado a efeito com violência, embora com pouca decisão, pois não conseguiram superar a minguada resistência que lhes foi oposta. Cercados, os insurretos abandonaram as armas, tratando de fugir pelos morros vizinhos. Muitos foram presos e sumariamente fuzilados nos fundos dos jardins do palácio.
Severo Fournier acabou entregando-se às forças governamentais. Condenado há dez anos de prisão, morreu tuberculoso, antes de cumprir toda a sentença.
Plínio Salgado, refugiado em uma fazenda do interior de São Paulo, foi convidado, em 1939, a abandonar o País, partindo para Portugal, onde se dedicaria ao ensino na Universidade de Coimbra. Armando de Sales Oliveira e Júlio de Mesquita Filho (diretores de "O Estado de S. Paulo") - democratas irrecuperáveis - foram induzidos. a deixar o Brasil. Partiram para a França, onde denunciaram a ditadura brasileira.
No Brasil, o jornal de Mesquita, "O Estado de S. Paulo", tentava continuar a luta contra Vargas, a despeito da censura - usando, por exemplo, o termo "interventor federal" sem iniciais maiúsculas. Mas, em março de 1940, o governo se apoderou do jornal e transformou-o no porta-voz do regime.
O Brasil na Segunda Guerra Mundial
No final da década de 30, delineava-se no cenário internacional o quadro de antagonismos que levaria à II Guerra Mundial. De um lado, os regimes fascistas europeus (Alemanha e Itália); de outro, as democracias ocidentais, lideradas pelos Estados Unidos, Grã-Bretanha e França.
Do ponto de vista estratégico, o extenso litoral brasileiro era um ponto nevrálgico cobiçado tanto pelos Estados Unidos como pela Alemanha. Por outro lado, é importante lembrar a existência, no Brasil, de significativos núcleos alemães e italianos, engajados no movimento político de seus países de origem. A Alemanha defendia os interesses desses grupos, enquanto os Estados Unidos pressionavam o Brasil no sentido de cercear a infiltração nazi-fascista.
A política externa de Vargas, nessa delicada questão, dirigia-se no sentido de tirar o máximo proveito tanto dos Estados Unidos, como das potências do Eixo. Um exemplo elucidativo do duplo jogo de Vargas foram as viagens em janeiro de 1939 de oficiais da FAB à Alemanha (onde foram efusivamente recebidos por Goering e Hitler) e de Osvaldo Aranha aos Estados Unidos, para discutir assuntos financeiros. Meses depois, o Brasil era visitado pelo general Marshall (chefe do Estado-Maior do Exército Norte-Americano) e por Edda Ciano (filha de Mussolini).
O duplo jogo de Vargas era uma forma de aproveitar as possibilidades da conjuntura mundial para consegui: recursos para a implantação de indústrias de base r Brasil. Assim, em maio de 1940, quando chegou a Washington a notícia de que o grupo Krupp, da Alemanha, estava disposto a construir a usina siderúrgica reivindicada pelos brasileiros, o Export-Import Bank (Eximbank) dos Estados Unidos, adiantou-se, aprovando o financiamento norte-americano para o projeto. A Usina Siderúrgica de Volta Redonda começou a ser construída em 19 graças, a um empréstimo de 45 milhões de dólares.
A posição política de Vargas não se definira ainda. ,'tomava medidas para a contenção do nazismo no Brasil por outro lado, discursava a bordo do "Minas Gerai louvando as vitórias de Hitler. Segundo sua filha Alzira. objetivo do ditador era forçar os Estados Unidos a concluírem os acordos para a construção de Volta Redonda. Getúlio achava que Estados Unidos demonstrariam maior interesse pelo Brasil, se pairasse no ar alguma dúvida sobre a posição internacional do País.
Conseguindo assim preservar sua neutralidade, mantendo-se parcialmente afastado da Segunda Guerra Mundial de 1942, o Brasil rompeu relações diplomáticas com o Eixo (Alemanha, Itália e Japão), após a II Reunião de Consulta dos Chanceleres americanos, realizada no Rio de Janeiro, em janeiro de 1942.
O afundamento de navios brasileiros por submarinos, presumivelmente alemães, determinou a declaração do estado de guerra entre o Brasil e as potências do Eixo. A contribuição brasileira ao esforço de guerra dos Aliados efetivou-se através da instalação de bases aéreas e navais no Nordeste brasileiro e do fornecimento de gêneros e matérias-primas para as tropas aliadas, além da participação direta no conflito, através da FEB (Força Expedicionária Brasileira) e de um grupo de caça da FAB (Força Aérea Brasileira).
Devido à guerra, o Brasil foi vítima de todo o tipo de pressão inflacionária, e o custo de vida subiu muito, comparado com os padrões dos anos do pós-guerra. Por outro lado, o retomo de nossas tropas trouxe também a certeza da insustentação da ditadura de Vargas. A vitória dos Aliados sobre o Eixo significou a vitória das democracias e o questionamento da ditadura de Vargas.
A redemocratização do País
A derrubada de Vargas em 1945, pelas mesmas forças que o haviam levado ao poder absoluto, quando do Golpe de Estado de 1937, deve ser entendida como mais uma manobra política de acomodação ou, em outras palavras, a atualização institucional. As bases dessa "atualização" estão relacionadas com a queda do totalitarismo europeu. A queda do fascismo italiano em 1943 estabelecera um marco na mudança da linha política de Vargas. A vitória final dos Aliados estabeleceu o questionamento da ditadura.
Vargas já percebera, desde 1943, que o fim da guerra e a derrota do Eixo colocariam um fim em sua ditadura. Getúlio procurou assim legitimar ideologicamente o seu regime, através da aproximação das massas urbanas. A partir de então, a política populista de Vargas acionou todos os seus mecanismos: peleguismo (política sindical a serviço dos interesses do governo); política trabalhista (Consolidação das Leis do Trabalho).
O ano de 1943 foi marcante pelos sintomas de abertura democrática: Vargas prometeu eleições para o fim da guerra. Em outubro do mesmo ano, tomou-se público o Manifesto dos Mineiros: timidamente, os assinantes do manifesto - entre eles Magalhães Pinto - exigiam a redemocratização do País. Em janeiro de 1945, os protestos começaram a se avolumar: o Primeiro Congresso Brasileiro de Escritores pedia liberdade de expressão e eleições livres. Em 28 de fevereiro, Vargas, através de um Ato Adicional, assegurava as eleições a serem marcadas em prazo de 90 dias, com sufrágio universal (excluindo-se os analfabetos). As eleições foram marcadas para 2 de dezembro do mesmo ano, com a campanha eleitoral ganhando vulto e animação, pelo surgimento dos partidos políticos
A UDN (União democrática Nacional) foi o primeiro partido político a surgir, dentro da reabertura do processo político, já em abril. Agrupava a oposição liberal a Vargas, radicalizando-se na luta contra o comunismo. Apoiava, para a sucessão presidencial, o nome do brigadeiro Eduardo Gomes.
Em junho foi lançado o PSD (Partido Social Democrático) - o partido dos interventores - liderado por Benedito Valadares e que apoiava a candidatura do general Eurico Gaspar Dutra.
O PTB (Partido Trabalhista Brasileiro) surgiu em agosto, organizado pelo Ministério do Trabalho e presidido pelo próprio Vargas.
Plínio Salgado fundou o PRP (Partido de Representação Popular), que conservava algumas linhas políticas do integralismo.
Houve também a legalização do PCB (Partido Comunista Brasileiro), que lançou um candidato próprio à Presidência, o engenheiro Yedo Fiúza.
O populismo de Vargas atingiu o seu auge em 1945 com o queremismo. As massas populares foram agitadas por lideranças trabalhistas e comunistas e passaram a exigir a permanência do ditador, aos gritos de "queremos Getúlio". Isto acelerou sua queda, uma vez que as oposições o acusavam de querer permanecer no poder.
Outros elementos apressaram o fim do Estado Novo: o discurso do embaixador norte-americano Adolf Bearle Jr. (29/09/1945), aconselhando a normalização do processo eleitoral; um decreto antitruste (que contrariava violentamente os interesses estrangeiros) e o célebre decreto-pretexto (nomeação do irmão de Getúlio, Benjamin Vargas, para o cargo de chefe da Polícia do Distrito Federal).
Pretextando a ameaça de uma "guinada" de Vargas para a esquerda, em função de sua política populista, os generais Eurico Gaspar Dutra e Góis Monteiro colocaram um fim na ditadura, através de um golpe militar, na noite de 29 de outubro de 1945. Assumiu interinamente o poder o presidente do Supremo Tribunal Federal, José Linhares.
O resultado das eleições deu a vitória ao candidato representante do PSD / PTB - Eurico Gaspar Dutra eleito com 3.251.000 votos, contra 2.039.000 de Eduardo Gomes (UDN) e 579.000 de Yedo Fiúza (PCB).
A ECONOMIA E O DESENVOLVIMENTO NA SEGUNDA REPÚBLICA
1. Introdução
Desde a Revolução de 1930, o nacionalismo econômico tomara-se o centro da política econômica brasileira. Isso pode ser explicado em virtude da crise do setor agroexportador, e pela necessidade de atender às aspirações dos setores sociais urbanos, muito sensíveis às aspirações nacionalistas.
Em 1929, a lavoura cafeeira, base da nossa economia, já se encontrava abalada por uma crise de superprodução. A Crise Mundial refletiu diretamente sobre a economia brasileira, diminuindo nossas exportações, aumentando nossos estoques de café e baixando o preço do produto, o que levou em 1931 à crise do café. Nesse clima econômico, eclodira a Revolução de 1930.
O intervencionismo estatal na ordem econômica acentuou-se nos anos 30 e início da década de 40, estimulado depois da proclamação do Estado Novo, em 1937.
Procurou-se criar no País uma política econômica que permitisse impulsionar o desenvolvimento. O projeto de Vargas era levar o Brasil à modernização econômica, integrando-o no capitalismo industrial. Nesse sentido pode-se apontar na política de Vargas: 1930 - criação do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio. 1931 Conselho Nacional do Café e Instituto do Cacau da Bahia. 1932 - Ministério da Educação e Saúde Pública. 1933 Departamento Nacional do Café e Instituto do Açúcar e do Álcool. 1934 - Conselho Federal do Comércio Exterior, Instituto Nacional de Estatística, Código de Minas, Código de Águas, Plano Geral de Viação Nacional e Instituto de Biologia Animal. 1937 - Conselho Brasileiro de Geografia e Conselho Técnico de Economia e Finanças. 1938 - Conselho Nacional do Petróleo, Departamento Administrativo do Serviço Público (DASP). Instituto Nacional do Mate e Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). 1939 - Plano de Obras Públicas e Aparelhamento da Defesa. 1940 - Comissão de Defesa da Economia Nacional, Instituto Nacional do Sal e Fabrica Nacional de Motores. 1941 - Companhia Siderúrgica Nacional e Instituto Nacional do Pinho. 1942 - Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI). 1943 - Coordenação da Mobilização Econômica, Usina Siderúrgica de Volta Redonda, Consolidação das Leis do Trabalho, Serviço Social da Indústria (SESI). Plano de Obras e Equipamentos e I Congresso Brasileiro de Economia. 1944 - Conselho Nacional da Política de Desenvolvimento Industrial e Comercial e Serviço de Expansão do Trigo. 1945 - Superintendências da Moeda e do Crédito (SUMOC).
2. A política cafeeira
Em 1931, Vargas criou o Conselho Nacional do Café, substituindo em suas funções o Instituto do Café de São Paulo. Foi posta em prática a política de sustentação do produto, através da compra e queima parcial das safras. Entre 1930 e 1932, as compras de café atingiram o valor de 39% da receita de exportação, destruindo-se aproximadamente 12,1 milhões de sacas, em operações financiadas por impostos, Banco do Brasil e Tesouro Nacional.
Por volta de 1937, adotaram-se medidas radicais visando à manutenção do equilíbrio dos preços. Partindo de um esforço gigantesco, prosseguiu o governo a política de compra e queima de excedentes. A queima de 17,2 milhões de sacas de café, em 1937 e nos anos que se seguiram, contribuiu para melhores preços, principalmente a partir da fixação das taxas de exportação para os EUA, em 1940.
Capitais que antes eram investidos no setor cafeeiro foram desviados para outros setores importantes da agricultura, como por exemplo o algodão.
3. A industrialização
Vários fatores alinham-se na explicação do impulso dado à industrialização do Brasil, na Era de Vargas.
A guerra, em que se envolveram os nossos principais fornecedores de artigos industrializados, contribuiu diretamente para a redução da oferta desses bens, em cerca de 40%.
Isso propiciou a substituição das importações pelo fornecimento das indústrias locais, em desenvolvimento. Ao lado dessa situação conjuntural, podemos citar a grande quantidade de matéria-prima - entre elas, o algodão, com a diversificação agrícola, elemento importante do surto industrial. A desvalorização da moeda, encarecendo as importações, e o crescimento do mercado consumidor urbano completaram o quadro de fatores ligados ao processo de industrialização do Brasil nesse período.
Aliados aos elementos acima dispostos, surgiram as medidas inovadoras de Vargas, elaboradas dentro de um Plano Qüinqüenal em 1939. Uma usina de aço, fábricas de aviões, usina hidrelétrica em Paulo Afonso eram alguns dos itens constantes do Plano. Em 1942, quando se tomaram amistosas as relações Brasil/EUA, e após a espetacular manobra de Vargas junto ao Departamento de Estado americano, teve início com empréstimos do Eximbank a aplicação de investimentos estatais em indústrias de base. Em 1941, instalou-se a Usina de Volta Redonda, criando-se a Companhia Siderúrgica Nacional. Ansioso por "colaborar" no esforço de mobilização de Vargas, o governo norte-americano enviou ao Brasil a Missão Técnica de Moris Llewellyn Cooke, em 1942, que culminou com a realização em nível de infra-estrutura, instalando-se a Cia. Vale do Rio Doce e a Hidrolétrica de Paulo Afonso. Vargas garantia assim o controle da matéria-prima para a siderurgia e a iniciava a produção energética estatal.
4. A política do petróleo
Já no Governo Provisório (1933), esboçava-se a definição da política estatal no setor das riquezas minerais, consolidada em 1934 pelo Código de Minas. Em 1938, criou-se o Conselho Nacional do Petróleo, organismo autônomo subordinado ao presidente da República. O governo declarava de utilidade pública toda a importação, transporte, distribuição e comércio de petróleo e derivados, em território nacional.
Garantia-se, assim, o programa de ampliação dos meios de transporte e de desenvolvimento industrial, procurando prover a distribuição, em todo o território nacional, de petróleo e seus derivados, em condições de preço mais uniformes possíveis.
5. A legislação trabalhista
Entre 1930 e 1937, iniciou-se a promulgação das leis sociais, atendendo às reivindicações trabalhistas dos operários. Essas leis sociais que se acumulavam desde 1930, entravam, às vezes, em choque com a Constituição Fascista de 1937, e tomou-se necessário atualizar e codificar todo esse conjunto. Em 1943, promulga-se a Consolidação das Leis do Trabalho. De forma geral, a política trabalhista de Vargas revelou os interesses das classes dominantes em estabilizar a camada operária e criar condições para a modernização industrial do País, buscando o reajuste das relações entre patrões e empregados. A política paternalista de Vargas tentou anular o operariado, transformando-o num setor controlado no jogo das forças sociais.
A CULTURA NA SEGUNDA REPÚBLICA
1. Introdução
Terminados os alegres anos 20, começavam os sombrios anos 30. A recessão mundial e a situação política nacional e internacional favoreceram no Brasil a Revolução de 1930, consolidando o poder de Vargas. Os intelectuais cindiram-se entre o centrismo católico, a ordem fascista e as tendências socialistas. Tudo isso favoreceu o golpe de Estado (1937) que prolongaria o governo Vargas até 1945.
O movimento modernista rompeu de vez, separando nacionalistas críticos e acríticos. Entre os primeiros, Tarsila do Amaral substituía as cores alegres de suas paisagens caipiras pelos tons terrosos da "Paisagem Proletária". E nascia o romance nordestino, social e regionalista, com os cangaceiros desesperados de José Lins do Rego (1901-1957), a Bahia romântica e rebelde de Jorge Amado, a angústia da seca e da vida interiorana esboçados por Graciliano Ramos (1892-1953).
Parte dos nacionalistas deixou-se atrair pela retórica do regime. Vila-Lobos, por exemplo, defendeu sinceramente a obra de Vargas, mesmo depois de sua queda. A "Sinfonia Brasileira" que compôs exprimia a idéia de grandeza nacional, como era concebida no período.
Outros artistas, finalmente, por identificarem Vargas com o fascismo, sem maiores sutilezas, mantiveram-se distantes, empenhados na construção de uma lírica própria, como ocorreu a Carlos Drummond de Andrade e Murilo Mendes.
À margem da polêmica política, manteve-se tão-somente a arquitetura, talvez porque seus impulsos modernizadores só tivessem ocorrido após a ascensão de Vargas ao poder. De fato, só em 1929 é que Le Corbusier introduziu no Brasil o conceito de funcionalidade e idéias sobre a "máquina de morar"; Lúcio Costa, nomeado diretor da Escola Nacional de Belas Artes em 1931, aderiu à tendência imprimindo-lhe suas próprias concepções, com as quais veio a criar o edifício do Ministério da Educação (1939), que revolucionaria os rumos da arquitetura nacional.
Em 1939 Oscar Niemeyer associou-se a Lúcio Costa no projeto para a construção do pavilhão brasileiro na feira internacional de Nova York. Décadas depois, a mesma dupla de arquitetos projetaria a cidade de Brasília (inaugurada em 1960), levando às últimas conseqüências as idéias dos anos 40. Nesses anos, contudo, Niemeyer limitava-se a testar a elasticidade do concreto armado em obras como o Corsino e a Igreja de Pampulha (Minas Gerais), em cuja decoração o pintor Cândido Portinari (1903-1962) recorreria à tradição colonial, empregando o ladrilho pintado com cenas bíblicas (no Ministério da Educação, já se usaram azulejos decorados).
A vitória das democracias na II Guerra Mundial condenou ao fracasso o regime ditatorial de Vargas, que em 1945 era apeado do poder. A queda de Vargas foi seguida por um período de intenso desenvolvimento cultural e artístico.
2. A Literatura
A partir de 1930, o Modernismo brasileiro entrou em nova fase. A poesia afastou-se do primitivismo e nacionalismo, predominantes entre 1922 e 1930, e volta-se agora para questões relativas à existência humana. Também a construção formal passa por uma série de transformações; restauraram-se formas poéticas tidas como ultrapassadas: o soneto, os versos longos e o recurso às rimas. Sobressaem, nessa nova fase do Modernismo, Carlos Drummond de Andrade, Cecília Meireles e Vinícius de Morais.
Carlos Drummond de Andrade, considerado um dos maiores poetas da literatura nacional, caracteriza-se pela capacidade de recriar em seus versos as vivências do cotidiano, num tom ao mesmo tempo lírico e humorístico, Sob a influência da II Guerra Mundial, abandona o traço irônico de suas primeiras obras e evolui para uma poesia participante, incorporando o "Sentimento do Mundo". A essa fase de Drummond pertencem as coletâneas "Sentimento do Mundo" (1940), "José" (1942) e "Rosas do Povo" (1945).
Enquanto Drummond expressa de forma dramática o drama coletivo, Cecília Meireles (1901-1964) representa o ponto alto da poesia intimista. Suas obras "Nunca mais..." e "Poema dos Poemas" (1923) e "Baladas para El-Rei" (1925) revelam a influência neo-simbolista; mas, a partir de "Viagem" (1939), sua poesia se liberta dos esquemas anteriores e ganha força inovadora. Nesse momento, delineiam-se com nitidez as características literárias que serão constantes em sua obra: técnica esmerada, misticismo e universalismo. Empenhada em alcançar o máximo de perfeição, Cecília Meireles não vacila em utilizar recursos tradicionais, como no "Romanceiro da Inconfidência", onde articula, de forma original, elementos líricos e épicos para reconstituir o clima de tragédia inerente a esse episódio da História do Brasil.
Como Cecília Meireles, Vinícius de Morais (1913-1980) iniciou sua obra poética influenciado pelo Neo-Simbolismo. Dessa fase são "O Caminho para a Distância" (1933), "Forma e Exegese" (1935) e "Arina, a Mulher" (1936), nas quais já transparece a temática de fundo erótico que percorrerá toda a sua produção poética. Com a publicação de "Cinco Elegias" (1943), a força sensual de sua poesia se acentua e encontra expressão através de uma linguagem livre e direta. Após 1945, sua linguagem e sua temática vão ganhando novos contornos, sua poesia se amplia, adquirindo conotação social e política.
O ano de 1930 marca o início de uma nova fase também na ficção brasileira. Passado o período experimental do Modernismo, a prosa segue novos caminhos, acompanhando as mudanças políticas e sociais do País. Uma das mais fecundas tendências literárias da época foi o romance nordestino. Armados de rigorosa consciência crítica e adotando um estilo neo-realista, os prosadores ligados ao romance nordestino analisam a realidade social e os problemas do homem do Nordeste. Seu ponto de partida é a publicação de "A Bagaceira" (1928), romance regionalista do paraibano José Américo de Almeida.
José Lins do Rego (1901-1957), baseado nas recordações da infância e da adolescência passadas no engenho do avô, traçou um vasto painel da decadência da aristocracia açucareira, quando o primitivo engenho de açúcar foi substituído pela usina moderna. O "ciclo da cana-de-açúcar", como ficou conhecida parte da obra de José Lins do Rego, é formado por seis romances que alcançam sua maior expressão literária em "Fogo Morto". Uns do Rego também abordou outros aspectos da vida nordestina, como o messianismo ("Pedra Bonita", 1938) e o cangaço ("Cangaceiros", 1953), elementos que compõem a saga da região.
O movimento mais significativo da ficção nordestina está na obra de Graciliano Ramos (1892-1953). Compõem sua produção literária quatro romances, contos, crônicas, narrativas populares, recordações da infância e memórias ligadas à sua experiência de vida, com a paisagem física e social da região agreste do Estado de Alagoas, mundo em que se desenrola o drama de seus personagens. Seu romance de estréia foi "Caetés" (1933). A essa obra seguiu-se "São Bernardo" (1934). "Angústia" (1936) e "Vidas Secas" (1938).
Ainda dentro do romance nordestino ganha importância a obra de Jorge Amado, o romancista brasileiro mais conhecido no Exterior. Realismo crítico e lirismo romântico, documento e fantasia unem-se ao humor, para compor seu mundo artístico, alicerçado na diversidade da vida social da Bahia. No chamado "ciclo-do-cacau", Jorge Amado registra a saga da luta pela posse da terra no início da lavoura cacaueira, "terra adubada com sangue", que tem em "Terras do Sem-Fim" (1942) sua expressão mais perfeita. Em "Suor" (1933), "Cacau" (1937) e "Capitães de Areia" (1937), manifesta preocupação com os oprimidos e clama por justiça social. Em "Jubiabá" (1935) e "Mar Morto" (1936), introduz um clima de magia e sentimentalismo lírico, atitudes revolucionárias, sincretismo religioso e tragédia ligada à vida do mar.
É ainda na década de 30 que a produção literária do extremo sul do Brasil passa a ocupar um lugar de destaque no panorama literário brasileiro, com a ficção de Érico Veríssimo (1905-1975). Numa primeira fase, representada pela temática urbana, girando em tomo dos dramas da pequena burguesia, Érico Veríssimo escolhe como ambiente a capital da província ou pequena cidade do interior. Nessa linha temática, estrutura "Clarissa" (1933), "Música ao Longe" (1935), "Olhai os Lírios do Campo" (1938), "Saga" (1940) e "O Resto é Silêncio" (1943), romances nos quais os mesmos personagens aparecem e desaparecem segundo as necessidades do desenvolvimento da história.
3. A Pintura
Após a Semana de Arte Moderna
O período de crise econômica internacional do início dos anos 30, coincidindo com a ascensão de Vargas ao poder abriu novos caminhos à produção artística pelo enriquecimento de sua temática. A preocupação que surgiu em todos os meios com o operário e com o homem do campo levou os pintores a transportá-los para as suas telas. Sem grandes cuidados de ordem formal, passou-se a focalizar o cotidiano das cidades, dos subúrbios e as festas populares do interior.
As novas tendências mostradas na Semana de Arte Moderna se desenvolveram e se firmaram. No entanto, o público freqüentador de exposições permaneceu hostil às novidades. As reações agressivas do público, o não amparo da crítica e as promessas não cumpridas acabaram por abafar e desanimar os novos artistas brasileiros. Anita Malfatti, a grande esperança do expressionismo brasileiro, depois de duramente criticada por Monteiro Lobato, passou a ser pintora de modestas telas folclóricas. Tarsila do Amaral, criticadora da plástica do antropofagismo, depois de ver suas telas serem recusadas acabou por mudar seu estilo para torná-lo mais aceitável e compreensível do público. Antônio Gomide sobreviveu abrindo uma escola de pintura para moças em expectativa de casamento. Vicente do Rego Monteiro, depois de grande sucesso em Paris, quando voltou ao Brasil, apresentou suas telas em Recife, obtendo fracasso total; acabou montando um engenho e produzindo a pinga Guaratá.
Apesar deste quadro desolador, alguns artistas não esmoreceram. Flavio de Carvalho, pintor de estilo expressionista, organizou os Salões de Maio, a partir de 1937, na tentativa de angariar freguesia para a idéia modernista. Com esta mesma intenção, o arquiteto Lúcio Costa realizou no Rio de Janeiro uma exposição coletiva de artistas modernos.
Ismael Néri também se recusou a abandonar seus propósitos modernistas. Personalidade excepcional, o contato com Paris contribuiu de maneira decisiva para a definição de sua pintura: captação de intimidades espirituais, sonhos e marcações de caracteres. Suas pinturas são mais desenhos fantásticos, com melancolia e pesadelos.
A ação de Emiliano Di Cavalcanti se traduz na pintura de raça, cuja surpreendente poética exalta a mulata, produto da miscigenação das etnias coloniais.
Os pintores dos anos 40
Cândido Portinari foi o grande destaque entre os pintores dos anos 40, criando uma figuração onde expressou os sentimentos humanos que mais o preocuparam. Pintou a terra, as aldeias, os meninos numa animada "pelada" de bola de meia, os retirantes, os dramas e as alegrias populares. Pintor também alegórico (exemplo é sua tela Tiradentes), Portinari foi o autor de "Guerra e Paz", na sede da ONU e "Descoberta e Colonização", na Biblioteca do Congresso em Washington. Em 1935, sua tela Café obteve a segunda menção honrosa na I Exposição Internacional de Arte Moderna, realizada nos Estados Unidos. O estilo de Portinari é bastante pessoal, apesar da utilização de recursos cubistas e expressionistas.
Em São Paulo, teve atuação um círculo de pintores apelidado de Grupo Santa Helena (num edifício com este nome, alguns deles tinham atelier), como Alfredo Volpi, Francisco Rebolo Gonzales, Mário Zanini, Paulo Rossi Osir, Fúlvio Pennacchi, Joaquim Lopes Figueira Júnior e outros. De todos, destacou-se Volpi, que soube acompanhar os tempos mediante mutações lógicas e boa intuição. Colorista de gosto, pintou paisagens, aldeias e exaltou-se em solenes telas repletas de bandeirinhas, o mesmo espírito do povo que enfeita as ruas nos dias de festa.
4. A Arquitetura
O primeiro agrupamento de arquitetos brasileiros em torno de novas idéias ocorreu no Rio de Janeiro, a partir da década de 30. O ensino da Arquitetura, ministrado na Escola Nacional de Belas-Artes, passou por uma total reformulação, graças, em grande parte, à presença renovadora de Lúcio Costa. Por outro lado, as visitas de Le Corbusier ao Rio de Janeiro e a divulgação de suas concepções funcionalistas contribuíram para o surgimento de obras marcadas por uma grande preocupação plástica, traduzidas nos critérios de composição e nos sistemas estruturais de concreto armado, que seguem uma orientação funcional. A sede da Associação Brasileira de Imprensa, projetada pelos irmãos Mílton e Marcelo Roberto, é uma construção pioneira dessa época. Nesse edifício, pela primeira vez, são empregados racionalmente quebra-sóis de concreto armado, para moderar a luz e controlar o calor ambiente. Esses novos conceitos deram origem a várias outras obras representativas, como o Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro.
Em São Paulo, a arquitetura modernizou-se com as soluções empregadas por Vital Brasil. Autor do primeiro prédio moderno e apartamentos em São Paulo - o Edifício Esther - construído entre 1935 e 1936, segundo as concepções racionalistas da nova arquitetura.
Oscar Niemeyer teve seu nome projetado definitivamente com sua obra em Minas Gerais. Em 1943, concebeu um conjunto de construções em torno do Lago da Pampulha, em Belo Horizonte. Essa obra é considerada a primeira criação inteiramente livre na moderna arquitetura brasileira. Desse conjunto da Pampulha faz parte a Igreja de São Francisco de Assis, que representa o nascimento da moderna arquitetura religiosa brasileira.
Em 1942, estava concluído o edifício do Ministério de Educação e Cultura, considerado o marco inaugural da nova arquitetura brasileira. O risco original desse edifício pertence a Le Corbusier e foi desenvolvido com alterações que deram origem a novos conceitos de área livre na implantação urbana de prédios em lotes restritos. Essa obra marca a adoção dos princípios de Le Corbusier pelos arquitetos cariocas ali representados por Lúcio Costa (o líder), Oscar Niemeyer, Carlos Leio, E. Vasconcelos, Affonso Eduardo Reidy, Sérgio Bernardes e outros.
5. A Música A Música Eruditra
A partir da obra de Mário de Andrade - Ensaio Sobre a Música Brasileira (1928) -, começou a se delinear no Brasil duas tendências musicais; a primeira delas representada por aqueles que se apoiavam na obra de Mário de Andrade. Encabeçados por Camargo Guarnieri, aluno de Mário de Andrade, os principais representantes dessa tendência, conhecida como "nacionalista", são: Luciano Gallet (1893-1931), Oscar Lorenzo Fernandes (1897-1948), Francisco Mignone, Radamés Gnattali e Guerra Peixe. Apresentando uma produção muito diversificada, esses autores tinham em comum a procura de uma linguagem nacional, que ao mesmo tempo não perdesse a característica universalista da linguagem musical.
Adotando uma postura estética radicalmente oposta, uma outra tendência começou a se afirmar no Brasil, a partir de 1939, como resultado, principalmente, do trabalho efetuado por Hans Joachim Koellreuter, criador do "Grupo Música Viva". As idéias desse grupo - formado por Guerra Peixe, Cláudio Santoro, Eunice Catunda, Edino Krieger e outros - assentavam-se sobre a premissa do universalismo da linguagem musical, e seus adeptos apoiavam-se na utilização de recursos composicionais do atonalismo e do dodecafonismo. Estes compositores iniciaram um intenso trabalho de divulgação de suas idéias, que culminou com o lançamento, em 1946, do Manifesto Música Viva. Tempos depois, porém, Guerra Peixe e Cláudio Santoro abandonaram o "Grupo Música Viva" para adotar outras posições estéticas.
Com respeito à instrução musical no Brasil, a partir da década de 30 começaram os primeiros passos. Em 1931 a declamadora Helena Magalhães de Castro fundava a Instrução Artística do Brasil (IAB), com a finalidade de promover concertos em todo o território nacional. Seus artistas eram itinerantes, percorriam vários pontos do País, e em cada cidade deixavam instalada uma IAB local.
Em 1932, Vila-Lobos foi nomeado Diretor da Superintendência de Educação Musical e Artística (SEMA) da Prefeitura do então Distrito Federal. Neste mesmo ano, ele cria o Curso de Pedagogia da Música e Canto Orfeônico. Institui o Orfeão de Professores e realizou corais com milhares de jovens, chegando a reunir 44.000 elementos sob sua direção.
A necessidade de uma infra-estrutura, consistente na formação de magistério especializado, levou-o à criação em 1942 do Conservatório Nacional de Canto Orfeônico, pois fora decidida a introdução do ensino de música e canto orfeônico nas escolas do Distrito Federal.
A prática de suas idéias foi consubstanciada na Portaria Ministerial n° 300 de 1946, que orientava o ensino de música nas escolas secundárias.
Música popular
Juntando aos instrumentos herdados da tradição musical européia (violão, piano, flauta) e toda uma variedade rítmica produzida por frigideiras, cuícas e tamborins, a música popular se enriqueceu e alcançou na década de 30 sua "época de ouro". Para isso também contribuiu o rádio que, a partir dessa época, passa a se impor no Brasil como um poderoso veículo de comunicação de massas.
Destacou-se nesse período o compositor e instrumentista Alfredo Viana Filho, Pixinguinha (1898-1973). Iniciando sua carreira na década de 20, como integrante dos pequenos grupos orquestrais que acompanhavam os filmes mudos nos cinemas, organizou o conjunto Oito Batutas, destinado a se exibir na sala de espera do Cine Palais, no Rio de Janeiro. Flautista de talento e dono de sólidos conhecimentos técnicos, Pixinguinha foi o autor do primeiro "choro orquestral". Capitalizando para a sua técnica a escrita orquestral da época, forneceu os dados básicos para a formação de uma linguagem instrumental caracteristicamente brasileira. Como solista de flauta, gravou várias músicas consideradas verdadeiras obras primas pelos críticos. Entre elas destacam-se "Carinhoso", "Teu Cabelo não Nega" e "Linda Morena".
Da mesma época, também, é o chamado compositor de Vila Isabel, Noel Rosa (1910-1937). Explorando temas sentimentais ("O Último Desejo"), o aspecto social ("O Orvalho Vem Caindo" e "Três Apitos") ou a caracterização de tipos populares ("Conversa de Botequim"), Noel Rosa abriu caminho para a evolução temática da música popular. Sua influência se faz notar até hoje em vários cantores e compositores, como Chico Buarque de Holanda, Maria Bethânia e Martinho da Vila.
Um dos compositores populares brasileiros mais conhecidos internacionalmente Ari Barroso (1903-1964) também viveu "a época de ouro" da música popular. As composições de Ari Barroso caracterizaram-se pela elaboração metódica, pela ênfase dada ao aspecto rítmico e pela exaltação à terra brasileira, como se pode notar em sambas como "Aquarela do Brasil", "No Tabuleiro da Baiana", e outras. Suas obras obtiverem boa receptividade no Exterior, 1evando-o ao estabelecimento de vínculos com orquestras, gravadoras e com o cinema norte-americano. O samba "Aquarela do Brasil" serviu de fundo musical para o desenho de Walt Disney "Alô, Amigos" que conta as aventuras de Zé Carioca. Entusiasmado com as músicas de Ari Barroso, Walt Disney mais tarde incluiu "No Tabuleiro da Baiana" e “Os Quindins de raia” no desenho "Os Três Cavaleiros". A ligação de Ari Barroso com o cinema norte-americano desencadeou uma série de críticas por parte dos nacionalistas da época. No entanto, Ari Barroso apenas refletiu o clima de ufanismo que então se vivia, não se podendo negar o seu importante papel na divulgação da música brasileira no Exterior. Essa divulgação se deu sobretudo através de sua principal intérprete, Carmen Miranda, que se tomou internacionalmente conhecida ao estrelar uma série de filmes em Hollywood.
Outros grandes nomes da música popular brasileira desta época foram Ismael Silva ("Se Você Jurar", "Para me Livrar do Mal", "Nem é Bom Falar" etc.), Ataulfo Alves ("Ai, que Saudades da Amélia", "A Você", "Mulata Assanhada" etc.) e Lamartine Babo ("No Rancho Fundo", "Eu Sonhei Que Tu Estavas Tão Linda", "O Teu Cabelo Não Nega" etc.).
6. O Teatro
Em 1932, Joracy Camargo (1898-1973), do Teatro de Brinquedo, estréia sua comédia "Deus lhe Pague", interpretada por Procópio Ferreira. Sem grandes qualidades dramáticas, a peça, no entanto, obteve êxito, pois refletia um estado de espírito da época, marcada por preocupações políticas provocadas pela crise econômica mundial.
A verdadeira renovação do teatro brasileiro se daria em 1933, quando Oswald de Andrade (1890-1954), um dos porta-vozes da Semana de 22, escreve "O Rei da Vela". A peça, que viria a ser encenada na década de 60, investe contra as imagens idealizadas e preconceituosas existentes na época sobre a cultura e a sociedade brasileira. Ao "O Rei da Vela" vieram se juntar "O Homem e o Cavalo" (1934) e "A Morta" (1937). Anticonvencionais e revolucionárias, as peças de Oswald de Andrade representam o que causaria, na ocasião, a grande transformação do teatro nacional. No entanto, não encontraram encenadores, tendo sido apenas publicadas em livro.
O teatro brasileiro continuava carente de profundas mudanças formais e começaram a surgir algumas experiências nesse sentido. Um dos pioneiros foi Renato Viana (1894-1953) que, junto com Ronald de Carvalho e o compositor Heitor Vila-Lobos, criou o movimento teatral "Batalha da Quimera". Pela primeira vez no Brasil tentava-se fazer um espetáculo integrado em todos os seus aspectos, usando-se luz, som e planos diferentes para obter efeitos dramáticos. Para escândalo do público, pela primeira vez num palco brasileiro, um ator dava as costas à platéia. Surgiu aí a primeira tentativa de direção, com o objetivo de se fazer um teatro de síntese. É nessa época que Antoine, Copeau, Max Reinhardt, Stanislawsky, Gordon Craig e outros inovadores do teatro europeu se tomam conhecidos e comentados nos meios teatrais brasileiros. Sob a influência da revolução cênica que ocorria na Europa, surge o Teatro do Estudante, fundado em 1938 no Rio de Janeiro por Paschoal Carlos Magno. A partir daí o teatro encontraria um novo terreno fértil.
A formação do grupo "Os Comediantes" em 1938, no Rio de Janeiro, dá início ao teatro contemporâneo no Brasil. A princípio, um grupo de amadores. "Os Comediantes", imbuídos do espírito de renovação que caracterizava a época, trabalharam no sentido de reformar esteticamente o espetáculo de teatro. Sem programa traçado, seu objetivo era fazer, de qualquer peça, um bom espetáculo. Para isso, contrariando o que acontecia no Brasil, onde o ator principal garantia o sucesso do espetáculo, transferiram para o encenador a responsabilidade por esse sucesso. Entretanto, o trabalho de "Os Comediantes" não foi suficiente para mudar o panorama do teatro nacional. Isso só veio a acontecer em 1941, quando, fugindo do nazismo, chegou ao Brasil o polonês Zbigniew Ziembinsk.
7. O Cinema
Nos finais da década de 20, foi criada a Companhia Cinédia, cujo primeiro filme, "Lábios sem Beijos", foi realizado por Humberto Mauro em 1930. No estúdio da Cinédia, logo depois nasceria o lendário filme "Limite", de Mário Peixoto. Objeto de classificações diferentes obra de vanguarda, filme surrealista - "Limite" aborda os conflitos gerados pelos condicionamentos que impedem a realização humana. Em 1933 Humberto Mauro termina a filmagem de sua mais importante obra: "Ganga Bruta", produzido pela Cinédia. Considerado um clássico da cinematografia brasileira, este filme penetra profundamente no meio social em que transcorre a ação. Ao mesmo tempo, delineia todo o contexto simbólico sugerido pela história do engenheiro que mata a mulher na noite de núpcias, absolvido, tenta esquecer tudo trabalhando na construção de uma fábrica, mas não consegue resistir ao envolvimento de uma adolescente. A mesma companhia lança, ainda em 1933, "A Voz do Carnaval", filme de estréia de Carmen Miranda e prenúncio de um dos rumos que tomaria o cinema brasileiro.
A partir de 1933, o Rio de Janeiro entra numa fase de intensa produtividade, passando a dominar por muito tempo a cinematografia nacional. Um dos nomes de maior destaque continua sendo Humberto Mauro, já agora na Brasil Vita Film, fundada no início dos anos 30 pela atriz e empresária Carmen Santos. O principal filme da nova empresa, "Favela dos Meus Amores", é uma visão sentimental dos morros cariocas, assinada pelo cineasta de Cataguases. Entretanto, a produção cinematográfica da época girou mesmo em tomo da Cinédia, que realizou o primeiro grande sucesso do cinema falado brasileiro: o musical "Coisas Nossas", do americano Wallace Downey. Nesse período, já começava a se desenvolver a chanchada, gênero que dominaria durante muito tempo a cinematografia nacional,
Em 1945, a Cinédia produziu "O Ébrio", dirigido por Gilda de Abreu, e tendo como ator o cantor Vicente Celestino. História folhetinesca sem grande valor cinematográfico, "O Ébrio" alcançou enorme popularidade, sendo o filme nacional do qual mais cópias se tirou até hoje. Paralelamente, a Cinédia tentava fazer um cinema de nível mais elevado - uma de suas realizações nesse sentido foi a filmagem do romance "Pureza", de José Uns do Rego. No início dos anos 40, foram realizadas pouquíssimas fitas de enredo, mas esse panorama iria mudar no decorrer dessa década.
Em 1943, funda-se a companhia Atlântida, que estréia com o filme "Moleque Tião", interpretado por Grande Otelo, ator já conhecido, cuja vida foi o tema do filme. "Moleque Tião" mostra a intenção que a companhia tinha de adorar uma linha de cuidadosa filmagem de assuntos brasileiros. No entanto, tal intenção não se cumpre, e em breve, a Atlântida passa a se dedicar sobretudo à "chanchada", comédia ligeira e descompromissada, um gênero "fácil" e de grande aceitação popular. Geralmente recheada com números musicais, lançava freqüentemente as canções que se tomavam sucessos carnavalescos. Os grandes nomes da chanchada são Oscarito, Grande Otelo, Eliana Macedo, Zezé Macedo, Anselmo Duarte, e os diretores José Carlos Burlem, Lulu de Barros e Carlos Manga, entre outros. A intenção de se fazer um cinema de melhor nível, na época, aparece em filmes como 'O Cortiço' (baseado no romance do mesmo nome, de Aluísio Azevedo); "Inocência" (baseado no romance de Visconde de Taunay); ou em filmes baseados em textos de Jorge Amado, como "Terra Violenta" e "Estrela da Manhã". Em "Vinte e Quatro Horas de Sonho", apelou-se para o que possuía o teatro nacional de mais prestigioso no momento: o autor e ator teatral Silveira Sampaio - então em plena ascensão -, que sugeriu a possibilidade de uma comédia cinematográfica mais leve e sofisticada. Mas o que o público preferia realmente era a chanchada, que dominou o cinema nacional por quase 20 anos.
Brasil Contemporâneo (1946-95)
Durante este período, a História do Brasil conheceu três momentos importantes. Nos dezoito anos iniciais (1946-1964), o País viveu sob o signo da democracia populista, numa fase denominada República Liberal; seguiram-se depois os vinte e um anos do Estado Autoritário, iniciado com o golpe de 1964 e encerrado nas eleições indiretas de janeiro de 1985, com a vitória de Tancredo Neves. A partir daí, teve início a última fase, marcada pelo fim do autoritarismo e pelo retorno à :i1ormalidade democrática, chamada por muitos de Nova República.
A REPÚBLICA POPULlSTA (1946-1964)
A partir de 1930, a economia e a sociedade brasileiras passaram por transformações significativas. No aspecto político, com o colapso do sistema oligárquico da República Velha, iniciou-se o processo de modernização do Estado. A crise da economia agrário-exportadora, até en::ão dominante, permitiu o avanço da industrialização, especialmente na Região Sudeste. O aumento da população nos principais centros urbanos mostrou que as cidades estavam começando a predominar sobre o campo. A industrialização, a urbanização e a expansão do setor de serviços permitiram o crescimento de novas forças sociais: o empresariado industrial, a classe média e o operariado. Essas novas forças, embora possuíssem algumas aspirações comuns, também apresentavam interesses completamente divergentes; o primeiro, por exemplo, defendia o crescimento econômico a qualquer custo; o segundo, o poder de consumo; e o terceiro, o real valor dos salários.
Nessa época deu-se a proliferação dos partidos políticos (pluripartidarismo) refletindo os desencontros que envolviam os vários segmentos de uma nova sociedade urbana e industrial do século XX; as massas urbanas foram incorporadas ao processo político e, como suas aspirações não podiam ser ignoradas, passaram a ser manipuladas por políticos e pelo próprio Estado, dando origem ao populismo.
A República Populista, iniciada com o fim do Estado Novo (1945) e encerrada com o golpe militar de 1964, teve suas características moldadas a partir dessas transformações, mas também sofreu influência dos acontecimentos internacionais que marcaram o pós-guerra.
Após a II Guerra Mundial, dois blocos disputaram a liderança política, econômica, militar e ideológica do Mundo Contemporâneo: o Bloco Ocidental, capitalista, liderado pelos Estados Unidos, e o Bloco Oriental, socialista, dirigido pela União Soviética. Sendo o Brasil integrante do Bloco Ocidental, as manifestações populares ocorridas no País passaram a ser encaradas como "agitações comunistas".
Ainda na República Populista, os governos presidenciais adotaram diversos planos e programas econômicos, acentuando o papel do Estado como promotor e coordenador do desenvolvimento nacional. O País estava dividido entre duas propostas de desenvolvimento: a nacionalista-industrial, favorável à intervenção do Estado na economia (modelo getulista), e a desenvolvimentista-industrial, que defendia a participação do capital estrangeiro na economia brasileira.
1. Governo Eurico Gaspar Dutra (1946-1951 )
A vitória de Dutra colocou em execução uma política conservadora. Em seu governo, procurou unir os partidos de centro e formar "uma muralha ao perigo vermelho", rompendo relações diplomáticas com a URSS, colocando o Partido Comunista na ilegalidade e cassando seus representantes nas Câmaras Legislativas. Externamente, Dutra consolidou a aliança com os EUA. Neste sentido, durante a visita do presidente norte-americano, Harry Truman, ao Brasil, foi assinado o Tratado de Assistência Recíproca e criada a Comissão Mista Brasil-EUA.
Internamente, com o Plano SALTE (Saúde, Alimentação, Transporte e Energia), cuja finalidade era coordenar os gastos públicos, executou-se a pavimentação da Rodovia Rio-São Paulo (Via Presidente Dutra), a abertura da Rodovia Rio-Bahia e a instalação da Cia. Hidrelétrica do São Francisco (exploração da Cachoeira de Paulo Afonso). No início de seu mandato, a pauta de importação elevou-se extraordinariamente: importação de bens supérfluos e de materiais de reposição à maquinaria desgastada (a importação estivera bloqueada devido à Segunda Guerra Mundial). Ao mesmo tempo, a elevação dos preços internacionais do café e das matérias-primas resultaram em vultoso saldo na balança comercial, reequilibrando nossas contas externas. Transcorreu, assim, o qüinqüênio presidencial do General Dutra em relativa paz política, com o aparecimento de vários partidos, voltando o País à normalidade administrativa ao mesmo tempo em que procurava se recuperar das conseqüências econômicas e financeiras da Segunda Guerra Mundial.
Em 18 de setembro de 1946, foi promulgada uma nova Constituição, apresentando as seguintes características: federação, regime representativo, presidencialismo, fortalecimento da União, presidente eleito por cinco anos, três senadores por Estado, voto universal obrigatório para maiores de 18 anos (exceto analfabetos, soldados, cabos e índios), criação do Tribunal Federal de Recursos.
2. Segundo Governo de Getúlio Vargas (1951-1954)
Sem a emergência de uma nova liderança política, a divisão dos partidos e suas indecisões possibilitaram a candidatura de Getúlio Vargas. Getúlio venceu com grande margem de votos, obtendo 3.843.000 votos (48,7%), sustentado pelo PTB, PSP (Partido Social Progressista, agrupamento populista em tomo de Adhemar de Barros), vários setores do PSD e grupos de esquerda. Eduardo Gomes obteve 2.342.000 votos (29,7%), com o apoio da UDN e do PRP (Partido de Representação Popular - antigos integralistas de Plínio Salgado); e Cristiano Machado recebeu 1.697.000 votos (21,57%) representando parte do PSD. Getúlio iniciou seu mandato enfrentando uma inflação crescente, que minava as divisas nacionais.
Desenvolveu uma acentuada política nacionalista, limitando as inversões de capitais externos. Foi esse programa, através do slogan "O Petróleo é Nosso", que criou a Petrobrás e a expansão da siderúrgica de Volta Redonda. Corriam boatos de um próximo golpe de Estado de Vargas para implantar no Brasil uma República Sindicalista, nos moldes do peronismo argentino. Os opositores a Getúlio, pelo seu passado como ditador, ou aqueles que vinham se opondo a ele neste novo mandato, congregaram-se numa campanha antigetulista. O presidente, por sua vez, acirrava suas posições, como no discurso em Curitiba, em dezembro de 1953, denunciando a remessa de 'lucros para o estrangeiro como o fator crônico das dificuldades brasileiras. Sob tais circunstâncias, o quadriênio de Getúlio Vargas foi um dos mais agitados da História do Brasil. Getúlio tentou a aproximação com a "massa" (base-suporte) por meio da fixação do salário mínimo, consegui da pelo ministro do Trabalho João Goulart (Jango). Para muitos confirmavam-se os boatos. A oposição aumentava e escândalos vieram à tona: corrupção de pessoas ligadas ao governo e financiamentos subornados do Banco do Brasil. Carlos Lacerda, um dos líderes civis da oposição a Getúlio e diretor do jornal carioca "Tribuna da Imprensa", destacou-se na campanha contra Getúlio. De outro lado, os ferrenhos adeptos do presidente viam a sua figura política deteriorar-se. Foi nesse contexto que o atentado da Rua Toneleros contra Lacerda, no qual veio a falecer o major-do-ar Rubens Vaz, representou o estopim para a oposição.
A Aeronáutica, defendendo a tese de Honra Nacional, ultrapassou a ação da Justiça na apuração dos responsáveis pela morte de um dos seus membros.
Aos poucos, os resultados das investigações sobre os responsáveis pelo atentado levaram a elementos ligados à s Guarda do Catete. Surgiram notícias de que o atentado fora arquitetado por Gregório Fortunato, o fiel guarda pessoal do presidente. A tensão aumentava. A própria situação econômica interna, sofrendo com a inflação crescente, deixava o povo descontente. O Exército interferiu no processo, pressionando Getúlio a demitir Jango da frente do Ministério do Trabalho (Manifesto dos Coronéis).
No dia 21 de agosto de 1954, o vice-presidente Café Filho, que era um alvo especial para a tentativa da UD. De fomentar uma cisão dentro do governo, sugeriu a Getúlio que ambos renunciassem, deixando que o Congresso elegesse um sucessor interino para o restante do mandato Presidencial. Getúlio recusou-se, dizendo a Café Filho que não abandonaria o Palácio antes do fim do seu mandato, exceto se estivesse "morto". No dia 23 de agosto, Café Filho rompeu publicamente com o presidente.
No mesmo dia, 27 generais do Exército divulgaram um manifesto à Nação exigindo a renúncia de Getúlio. Na madrugada de 24 de agosto, Vargas suicidou-se com um :iro no coração.
3. Governo Café Filho (1954-1955)
Com a morte do presidente, subiu ao poder, de acordo com a Constituição, o vice-presidente Café Filho. No ano seguinte realizaram-se as eleições presidenciais. Juscelino Kubitschek (governador mineiro) venceu com 3.777.411 votos e, para a Vice-Presidência, foi eleito João Goulart com 3.591.409 votos, apoiados pelo PSD e PTB. A UDN lançara seu candidato, o general Juarez Távora, que recebeu 30% dos votos; pelo PSP, disputou Adhemar de Barros, com 26%, e, pelo PRP, Plínio Salgado, com 8% do total de votos.
Logo após as eleições, evidenciaram-se conflitos po:iticos. Afastado do cargo, por doença, Café Filho passou Presidência, de acordo com a Constituição, ao presidente da Câmara dos Deputados, Carlos Luz, em 8 de novembro de 1955.
Carlos Luz logo se indispôs com o marechal Henrique Teixeira Lott, ao negar seu pedido para repreender um coronel que proferira um discurso contrário à posse de Juscelino. Luz tomava-se, assim, cúmplice da atitude do coronel.
Lott, incitado por outros generais, e para manter a legalidade constitucional, depôs o presidente na manhã de 11 de novembro.
Declarado o impedimento de Carlos Luz, na tarde do' dia 11, subiu ao poder o vice-presidente do Senado, Nereu Ramos. O País foi mantido em estado de sítio até 31 de janeiro de 1956, data da posse de Juscelino Kubitschek.
4. Governo Juscelino Kubitschek (1956-1961)
Com a posse de Juscelino, sob a proteção do Exército, iniciou-se uma das fases mais importantes da história econômica do Brasil. Nos anos de 1956-60, realizou-se ampla e profunda transformação do sistema econômico do País. A política econômica governamental desses anos foi o Programa de Metas. E a execução provocou uma "transformação qualitativa" na economia brasileira, provavelmente a mais ampla ação orientada pelo Estado na América Latina, com vistas à implantação de uma estrutura industrial integrada.
O governo Kubitschek adotou uma política que consolidou e expandiu o "capitalismo associado ou dependente" brasileiro.
Durante a Era de Vargas, houve uma política destinada a criar um sistema capitalista nacional, e no governo de Jusce1ino, uma política orientada para o desenvolvimento econômico além de ter lançado as bases da indústria automobilística e naval, deu grande incentivo à indústria siderúrgica e ampliou o parque rodoviário. Juscelino impulsionou as grandes usinas hidrelétricas de Fumas e Três Marias. Foi ele o criador e promotor da "Operação Pan-Americana", que procurou alertar os EUA para a situação econômica e social da América Latina e que foi a precursora da "Aliança para o Progresso".
A construção de Brasília, a nova capital do País, prevista desde a Constituição de 1891, converteu-se em símbolo de sua política. A obra foi confiada ao famoso arquiteto Oscar Niemeyer e ao urbanista Lúcio Costa. Brasília foi inaugurada em 21 de abril de 1960.
Com seu slogan "Cinqüenta anos em cinco" (50 anos de progresso em 5 de governo), Juscelino foi bem-sucedido, ao menos no que se refere à produção industrial, que se expandiu amplamente (cerca de 80% entre 1955 e 1961) e, o que é mais importante, com predominância da produção de bens de capital (siderurgia, indústria mecânica, de material de transporte etc.).
Outra grande realização, ainda que de sucesso desigual, foi a Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene). De outro lado, as realizações de Juscelino produziram um amplo e profundo surto de internacionalização da economia brasileira.
O apoio financeiro estrangeiro para tais empreendimentos foi obtido com a instrução número 113 da SUMOC, atraindo grandes empresas internacionais. Em conseqüência disso, o controle externo sobre os mais importantes ramos industriais atingiu altas taxas.
Durante o seu governo, Juscelino enfrentou, além de forte oposição política, algumas tentativas de insurreição por parte de alguns militares (Levante de Jacareacanga e Rebelião de Aragarças), mas, ao terminar o seu mandato, anistiou todos os revoltosos. É evidente que o custo de suas realizações redundou em elevados índices de inflação, entretanto os benefícios sociais obtidos poderiam ser invocados como justificativa.
5. Governo Jânio Quadros (1961)
Em 1960 foi eleito Jânio da Silva Quadros, ex-governador de São Paulo, acompanhado na Vice-Presidência por João Goulart. Jânio venceu com 5.604.000 votos (48%), apoiado pela UDN. Enquanto seu principal concorrente, o marechal Lott, obteve 3.810.000 votos (28%), pelo PTB. Sua posse, a primeira em Brasília, deu-se em 31 de janeiro de 1961.
Uma vez no poder, Jânio Quadros encetou, com vistas ao restabelecimento do equilíbrio financeiro do País, uma pressão sobre o consumo e o reajustamento cambial. Criou os ministérios da Indústria e Comércio e das Minas e Energia. Jânio nomeou uma comissão para definir a limitação da remessa de lucros para o Exterior; instaurou inquéritos para apurar denúncias de corrupção administrativa e exigiu drásticas medidas antiinflacionárias. Jânio como presidente não e muito diferente do Jânio governador. Continuava com uma personalidade conflitante e muitas vezes difícil de ser entendida. Sua política externa (abertura comercial e diplomática) - incluindo sua inclinação a defender a Revolução Cubana, chegando a prestigiar "Che" Guevara com a alta condecoração nacional -, acabou criando e provocando forte reação contra ele. Carlos Lacerda, governador da Guanabara, denuncia um golpe janista. A própria opinião pública que o apoiava começa a reagir contra algumas de suas medidas (proibição do uso de biquíni, proibição da chamada "briga-de-galo" e regulamentação das corridas nos jóqueis-clubes) etc. O controverso político, que chegou à Presidência da República com a maior votação que um homem público jamais havia alcançado no Brasil até então, surpreendeu toda a Nação, no dia 25 de agosto de 1961, após quase 7 meses de governo, com a sua renúncia ao cargo de presidente. Este gesto nunca foi totalmente esclarecido. Na ausência do vice-presidente, João Goulart, que se encontrava visitando a República Popular da China, assumiu o posto o presidente da Câmara dos Deputados, Ranieri Mazilli. Estava deflagrado o processo que resultaria no Movimento Revolucionário de Março de 1964. Voltando de uma viagem à Europa, Jânio candidatou-se, em 1962, ao governo de São Paulo e foi derrotado.
Verificou-se uma radicalização acentuada dos partidos políticos de direita e de esquerda, relativa à orientação dada aos assuntos econômicos e políticos, nas relações internas e externas.
Após a renúncia de Jânio, os ministros da Guerra, Marinha e Aeronáutica julgaram inconveniente à Segurança Nacional o regresso do vice-presidente, acusado de comprometimento com os comunistas. Em oposição aos ministros militares levantou-se o governador Leonel Brizola, defendendo a "legalidade". Com a evolução da crise política e a radicalização dos grupos antagônicos, o País se viu diante da possibilidade de uma guerra civil. Diante da grave situação interna e visando contornar o veto dos ministros militares à posse do vice-presidente como chefe de um regime presidencialista, o Congresso aprovou a Emenda Constitucional n° 4 à Carta de 1946, que instaurava o regime parlamentarista no Brasil.
6. Governo João Goulart (1961-1964)
João Goulart era o herdeiro político de Getúlio e também alvo dos adversários de Vargas. Era o líder de um grande partido - o PTB. Rico estancieiro do Rio Grande do Sul, Jango carecia de visão política à longo prazo e não tinha a popularidade de um grande político.
Seu primeiro período de governo, enfraquecido pelo regime parlamentarista e tumultuado pelas sucessivas tentativas de se formar um Gabinete, representou uma época de manobras políticas para recuperar a plenitude dos poderes presidenciais. Procurou conquistar a confiança dos grupos conservadores e dos militares, revelando princípios que pudessem ser identificados como anticomunistas e comprometidos com o processo democrático. Mas, ao mesmo tempo, manobrava para garantir-se com a esquerda através de programas tipo "reformas de base" etc. Este seu jogo com a esquerda revelou-se perigoso, ante a multiplicidade de interesses e pressões que as lideranças deste grupo (fracionado em inúmeros subgrupos) procuraram impor a seu governo.
Em julho de 1962, Tancredo Neves renunciou ao cargo de primeiro-ministro. San Tiago Dantas, nomeado para substituí-lo, não foi aceito pela Câmara dos Deputados. Auro de Moura Andrade, indicado a seguir, não conseguiu formar um ministério, pedindo demissão. O professor Brochado da Rocha conseguiu finalmente articular um ministério. Governou apenas até o dia 17 de setembro de 1962, quando seu ministério renunciou, em virtude de não concordar quanto à estratégia do plebiscito para reimplantar o regime presidencialista.
O novo primeiro-ministro era o professor Hermes Lima, que se manteve no poder até janeiro de 1963, quando num plebiscito foi rejeitado o parlamentarismo, sendo restabelecido o presidencialismo com a revogação da Emenda Parlamentarista.
João Goulart iniciou sua fase presidencialista batendo-se pelas "reformas de base", uma plataforma populista e esquerdizante que objetivava atrair as massas e aumentar o seu prestígio político.
Em 12 de setembro de 1963, ocorreu em Brasília, por motivos eleitorais, um levante de sargentos da Marinha e da Aeronáutica, prontamente dominado. No mês seguinte frustrou-se uma tentativa de instauração do estado de sítio, proposta pelos ministros militares e encaminhada pelo presidente ao Congresso, mas rapidamente retirada, haja vista a hostilidade da opinião pública. A situação político-militar agravou-se rapidamente e no campo econômico Goulart já cogitava, em 1963, decretar uma moratória internacional, pois o País não poderia mais pagar seu débito externo.
A agitação de cunho esquerdizante, promovida pelo próprio governo, chegando mesmo a fomentar a indisciplina entre integrantes das Forças Armadas, inquietou a classe dirigente e chefes militares, já apreensivos com a inflação galopante e a queda da taxa de desenvolvimento.
Com a cooperação dos governadores dos Estados de Minas Gerais, São Paulo, Guanabara e Rio Grande do Sul, as Forças Armadas depuseram o presidente Goulart, aos 31 de março de 1964.
O Congresso Nacional, no dia 2 de abril, declarou a vacância da Presidência da República, assumindo a o presidente da Câmara, o deputado Ranieri Mazilli. Em 9 de abril, o Alto Comando Revolucionário, composto dos novos ministros da Guerra, Marinha e Aeronáutica - o general Costa e Silva, o vice-almirante Augusto Rademaker Grunewaid e o tenente-brigadeiro Correia de Melo -, editou o Ato Institucional Número 1, redigido por Francisco Campos.
De acordo com o Ato, o Congresso Nacional elegia para a Presidência da República o chefe do Estado-Maior do Exército, o general Humberto de Alencar Castelo Branco, que tomou posse em 15 de abril de 1964.
Regime Militar (1964-1985)
A Revolução democrática de 1964 foi desfechada para evitar a ameaça "comunista", e em defesa da democracia e da liberdade. Com ele, iniciavam-se os vinte e um anos do chamado "regime militar", marcado pelas restrições aos direitos e garantias individuais, pela extinção dos antigos partidos políticos. Procurando descaracterizar-se como um Estado de Exceção, a nova ordem, manteve algumas instituições democráticas: o Congresso Nacional. As eleições, em todos os níveis se processariam dentro das variadas regras e restrições, que se estabeleceriam a partir de 1964.
O novo regime tinha um dos seus mais importantes fundamentos na Doutrina de Segurança Nacional, fortemente influenciada pela conjuntura da Guerra Fria e pela crise do populismo. Segundo essa doutrina, que substituía o conceito de "defesa nacional" pelo de "segurança nacional", era preciso combater os comunistas e outras forças "subversivas" que se infiltravam em todos os setores da comunidade brasileira, visando desestabilizar o governo. as autoridades e as instituições nacionais. Para isso, deu-se início à planificação global do País, visando à superação dos problemas de natureza social, política e econômica, instrumentalizados pelas forças do comunismo. Foram criadas novas políticas, abrangendo todas as atividades nacionais, destacando-se, entre elas, a política econômica, cujo objetivo maior era o desenvolvimento econômico e a integração nacional centralizada, associada ao capital estrangeiro.
1. Governo Marechal Castelo Branco (1964-1967)
Ao tomar posse, em abril de 1964, Castelo Branco defrontou-se com quatro problemas básicos: a alta galopante dos preços, que ameaçava a economia; a estagnação da produção; a crise da balança de pagamentos e a desordem político-social. Toda essa situação levou virtual paralisação dos investimentos estrangeiros.
Após o período inicial de expurgos e cassações, o Governo Castelo Branco, constituído de uma mistura de poli ticos e tecnocratas, deu início a um amplo programa d estabilização econômica e combate inflacionário. Castelo Branco lançou as bases das reformas administrativa, eleitoral, bancária, tributária, habitacional, política e agrária. Criou o Cruzeiro Novo; implantou o Banco Central e o Banco Nacional de Habitação, unificou a Previdência Social através do INPS; integrou o Brasil nas comunica;ões por satélite e criou a Embratel. Foi ele o responsável pelo restabelecimento da ordem interna; reformou as instituições militares e os ministérios, procurou restaurar o País econômica e financeiramente; criou o Fundo de Ga:antia por Tempo de Serviço. Apesar das dificuldades surgidas durante o Governo Castelo Branco, ele criou condições para a elaboração de um plano de desenvolvimento que visava atender aos objetivos da Revolução. Mas o problema básico do Governo Castelo Branco era o de formular uma base política. Seu mandato, que terminaria em janeiro de 1966, foi prorrogado, em julho de 1964, até 15 de março de 1967. Por outro lado, os líderes políticos que apoiaram o Movimento de Março de 64 formavam um grupo extremamente heterogêneo e não demorou muito para começar a surgir divergências entre eles quanto aos destinos do movimento. Ante o posicionamento daqueles líderes políticos, viu-se o governo revolucionário diante da necessidade de modificar o processo eleitoral para resguardar o próprio Movimento de Março de 64. Nas eleições de outubro de 1965, por exemplo, dos onze Estados onde ocorreram eleições, em dois - Guanabara e Minas Gerais - venceu a oposição (Negrão de Lima e Israel Pinheiro). A ala radical do governo - a chamada "linha dura" - reagiu e em conseqüência o presidente promulgou o Ato Institucional Número 2 (27/10/1965), que extinguia os partidos políticos. Deu-se então a respectiva recomposição, constituindo-se dois partidos: a Aliança Renovadora Nacional (ARENA) e o Movimento Democrático Brasileiro (MDB), sendo o primeiro governista e o segundo da oposição. Em 5 de fevereiro de 1966, baixou o Ato Institucional Número 3, que regulou as eleições indiretas, a cargo das Assembléias Legislativas, para o governo de onze Estados brasileiros.
Nos dois últimos meses de 1966, o governo preparou e encaminhou ao Congresso o projeto de autoria de Carlos Medeiros da Silva, na época ministro da Justiça, para a nova Constituição - que seria a quinta da República e a sexta do Brasil-, e cuja tramitação foi fixada pelo AI-4.
A nova Constituição foi promulgada em janeiro de 1967. Nela mantinham-se o federalismo e o presidencialismo reforçado, com eleições indiretas para presidente e vice-presidente. Por outro lado, a Constituição permitia ao presidente: decretar estado de sítio sem consultar o Congresso durante 180 dias; decidir pela intervenção federal nos Estados para evitar perturbações internas ou para garantir o respeito às leis; decretar o recesso do Congresso; legislar por decretos; demitir funcionários civis ou militares, cassar mandatos e suspender por 10 anos os direitos políticos.
Em fevereiro de 1967, foi reformado o padrão monetário, criando-se o cruzeiro novo e reajustando-se a taxa do dólar em bases mais realistas. O último ato do Governo Castelo Branco foi a instituição da Lei de Segurança Nacional.
Pouco depois de deixar a Presidência, aos 18 de julho de 1967, Castelo Branco morreu num desastre de avião, perto de Fortaleza.
2. Governo Marechal Costa e Silva (1967-1969)
Arthur da Costa e Silva, que assumiu o poder em 15 de março de 1967, teve uma gestão bastante agitada. Articularam-se contra o regime várias alas oposicionistas que haviam formado a chamada Frente Ampla. Reagindo, providenciou o ministro da Justiça, o Prof. Gama e Silva, a sua supressão, de acordo com a Constituição.
Em 1968, sob a inspiração das violentas agitações estudantis que eclodiram na Europa e em particular na França, registraram-se graves tumultos de rua em várias capitais do País, que colocaram em risco o Movimento Revolucionário de 1964. A conduta contrária dos líderes políticos da oposição diante das medidas propostas pelo Executivo para conter a evolução da crise interna fez com que o governo reforçasse o Poder Executivo, através do AI-5. O Congresso foi colocado em recesso e o governo assinou mais sete Atos Institucionais e 24 complementares para preservar os objetivos revolucionários de 1964.
No Governo Costa e Silva, foi criada a Petroquisa, empresa subsidiária da Petrobrás, que visava acelerar o desenvolvimento da indústria petroquímica. Dotada de estrutura elástica, a nova companhia ficou autorizada a associar-se com empresas particulares para a realização de seus projetos. Além disso, foi iniciada a construção da ponte Rio-Niterói (que receberia o nome de Presidente Costa e Silva), reaparelhou-se a Marinha Mercante e iniciou-se a implantação da Previdência Rural.
Preocupado com o retomo à legalidade, Costa e Silva confiou ao vice-presidente Pedro Aleixo a missão de elaborar uma nova Constituição que conciliasse uma abertura democrática com os dispositivos contidos no AI-5. Essa segunda Constituição revolucionária estava pronta para ser assinada, quando o presidente foi acometido de súbita enfermidade (agosto de 1969) que o obrigou a afastar-se do cargo. Uma junta militar, composta pelo general Aurélio Lyra Tavares, pelo almirante Augusto Rademaker e pelo brigadeiro Márcio de Souza e Melo, assumiu o poder em lugar do vice-presidente Pedro Aleixo. O seqüestro do embaixador dos Estados Unidos por elementos da esquerda agravou a crise política. No dia 6 de outubro de 1969, diante de impossibilidade de recuperação de Costa e Silva, a junta militar considerou extinto o seu mandato - um ano e sete meses antes do término legal-, indicando o general Médici como o seu sucessor e o almirante Rademaker como vice-presidente. Em 17 de dezembro de 1969, faleceu Costa e Silva, vítima de um enfarte.
3. Governo General Garrastazu Médici (1969-1974)
No mesmo dia da posse (30/10/69), entrou em vigor a Emenda Número 1 à Constituição de 1967. Por essa emenda, 58 artigos foram acrescentados ou substituíram outros. As principais inovações introduzidas foram: mandato presidencial de 5 anos; confirmação de todos os Atos Institucionais, só suspensos por decretos presidenciais; eleições indiretas para governador em 1970, passando a diretas a partir de 1974; pena de morte para os casos de guerra revolucionária ou subversão; número de deputados calculado de acordo com o eleitorado e não mais com a população; alteração no estatuto da inviolabilidade parlamentar; ampliação das faculdades do Executivo em legislar por decreto-lei; e impedimento do Poder Judiciário em rever atos praticados com base nos Atos Institucionais e Complementares.
Um dos primeiros atos do novo presidente foi a assinatura do decreto-lei que estendeu para 200 milhas os limites do mar territorial brasileiro. Durante o seu governo foi criado o Plano de Integração Nacional, que incluía a construção das rodovias Transamazônica, Cuiabá-Santarém e Manaus-Porto Velho; foi implantado um programa de colonização às margens das rodovias; executou-se o Projeto Radam (levantamento das riquezas da Amazônia); foram desenvolvidos a irrigação do Nordeste, o Programa de Integração Social, determinando que parte do Imposto de Renda e uma parcela do faturamento das empresas privadas fossem destinadas à constituição de um fundo em benefício dos empregados, o Movimento Brasileiro de Alfabetização (Mobral), o Programa de Assistência ao Trabalhador Rural (Pró-Rural) etc.
O desenvolvimento atingido pelo País em diversas frentes e a conseqüente ampliação dos mercados de trabalho, os chamados grandes projetos de impacto lançados durante o Governo Médici, as vitórias esportivas do Brasil (a exemplo do Tricampeonato Mundial de Futebol, as sucessivas conquistas de Émerson Fittipaldi no automobilismo e de Éder Jofre no boxe), o trabalho desenvolvido pela Assessoria Especial de Relações Públicas da Presidência da República (AERP), no sentido de promover os valores cívicos e divulgar as realizações do governo, as campanhas institucionais do Conselho Nacional de Propaganda - CNP (entidade privada mantida por empresas particulares de comunicação social) - de estímulo às exportações, à educação, e diversos outros fatores fizeram com que o Governo Médici atingisse um alto grau de popularidade.
4. Governo General Ernesto Geisel (1974-1979)
Durante 1974, foram criados o Ministério da Previdência Social, a Secretaria do Planejamento e o Conselho de Desenvolvimento Econômico; decidiu-se a fusão do Rio de Janeiro com a Guanabara e estabeleceram-se as relações diplomáticas com a República Popular da China (15/08/74).
Nas eleições parlamentares (dezembro de 1974), verificou-se expressiva vitória do MDB, que, para o Senado, ganhou em 16 dos 22 Estados brasileiros. Devido a este resultado, o governo começou a preparar seu programa de ação para as eleições seguintes, em nível municipal, a serem realizadas em 1976. No dia 10 /07/76 foi aprovada a Lei n° 6.639 - cujo texto fora solicitado no Ministério da Justiça e logo batizada de "Lei Falcão" -, que estabelecia as seguintes diretrizes gerais para a campanha eleitoral através do sistema de radiodifusão: divisão em partes iguais para os partidos e seus candidatos de horário gratuito, apresentação do nome do candidato, sua legenda, seu número, seu currículo e sua fotografia. Com isso, o candidato a cargo eletivo via-se diante da necessidade de conquistar cada voto no contato direto com o eleitor.
Em dezembro de 1974, Geisel divulgou o II Plano Nacional do Desenvolvimento, que definia a política socioeconômica para 1975/79. Em janeiro de 1975, criaram-se a Comissão de Indústria da Construção Civil e o Polocentro (Programa de Desenvolvimento dos Cerrados). Em abril, foi aprovado o Plano Nacional de Saneamento; em junho, foi assinado o acordo de cooperação nuclear Brasil-Alemanha. Em dezembro, os presidentes Geisel e Stroessner assinaram o Tratado de Amizade Brasil-Paraguai, de colaboração econômica, tecnológica e cultural entre os dois países.
No dia 9 de outubro de 1975, foram anunciadas medidas para enfrentar os efeitos sobre o Brasil da crise econômica mundial: a Petrobrás ficou autorizada a assinar contratos com empresas estrangeiras para exploração de petróleo no Brasil. Nesses contratos existiam cláusulas que transferiam todos os riscos de despesas de pesquisa e exploração às empresas interessadas, caso estas não encontrassem petróleo nas áreas contratadas (são os popularmente conhecidos "contratos de risco"). Foram ainda pesadamente sobretaxadas as importações de artigos considerados supérfluos. Em fevereiro de 1976, o presidente da República instituiu o Programa Nacional de Alimentação e Nutrição; em maio, inaugurou a Hidrelétrica de Marimbondo, entre São Paulo e Minas Gerais, e assinou a ata de constituição da Siderúrgica de Tubarão. Em 05/06/1976, assinou o Decreto-lei n° 1.470, criando um depósito prévio de Cr$ 12.000,00 para os viajantes ao Exterior.
O ano de 1976 foi marcado por importantes viagens do presidente Geisel ao Exterior: à França, à Inglaterra e ao Japão.
O chamado "programa de aperfeiçoamento do regime democrático", que lenta e gradualmente o presidente Geisel vinha desenvolvendo, possibilitaria: a criação de novos partidos políticos no País; o aumento dos poderes Legislativo e Judiciário; a participação representativa dos integrantes do segmento civil em todos os níveis de decisão do Estado; e preparar o retomo às atribuições exclusivamente constitucionais de militares da ativa que, devido à conjuntura revolucionária, vinham ocupando cargos e funções tradicionalmente civis.
5. Governo General João Baptista de Figueiredo (1979-1985)
Considerado "o presidente da abertura", o general João Baptista de Oliveira Figueiredo foi eleito pelo Colégio Eleitoral, frustrando dois outros candidatos sem nenhuma chance de vitória: o senador Magalhães Pinto e o general Euler Bentes Monteiro. Pela primeira vez, um candidato do chamado "Ciclo Revolucionário" percorreu o País inteiro antes de tomar posse no Planalto. Como "homem da Revolução de 1964", Figueiredo sempre esteve ligado a seu predecessor, o general Geisel, tendo ainda sido chefe do Gabinete Militar do presidente Médici e chefe do Serviço Nacional de Informações (SNI).
O novo presidente aproveitou ex-ministros dos quatro governos pós-64, atraiu técnicos e aceitou algumas indicações políticas. A seu ministro do Planejamento, Antônio Delfim Neto, coube pôr em prática um programa de governo que previa a contenção das despesas, a descentralização administrativa, a diminuição da inflação, a privatização de empresas e serviços estatais e a concessão de prioridade à agricultura e às exportações.
No âmbito da política interna, Figueiredo assinou, em 27 de junho de 1979, o projeto de anistia que seria enviado para a aprovação do Congresso, sem, no entanto, beneficiar os terroristas e tampouco devolvendo aos funcionários e militares cassados os cargos e patentes perdidos. Em novembro do mesmo ano, a reforma partidária extinguiu o bipartidarismo no País, possibilitando a formação de novas agremiações político-partidárias. Conseqüentemente, uma nova ordem política começou a se delinear através do surgimento do PSD (Partido Social Democrático, composto pela maioria dos antigos arenistas), PMDB (Partido do Movimento Democrático Brasileiro, que manteve seu caráter de frente oposicionista criado em 1965, quando da fundação do antigo MDB), PTB (Partido Trabalhista Brasileiro, organizado pelo ex-governador Leonel Brizola, mas que acabou passando para o controle da ex-deputada Ivete Vargas, o que levou Brizola a criar o PDT - Partido Democrático Trabalhista) e PT (Partido dos Trabalhadores, liderado por muito tempo pelo metalúrgico Luís Inácio Lula da Silva).
Com as eleições diretas para os governos estaduais, em 1982, o mapa político do País foi profundamente alterado. A oposição elegeu 10 dos 22 governadores (entre eles, os de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro) e a maioria da Câmara dos Deputados.
A partir de 1983, sociedade civil participou ativamente do movimento das Diretas-Já. No ano seguinte, a Emenda Dante de Oliveira, que propunha o restabelecimento das eleições diretas para presidente da República, foi derrotada no Congresso Nacional. Nesse mesmo ano, as oposições decidiram enfrentar o regime militar nas eleições do Colégio Eleitoral, valendo-se da cisão dentro do PDS, que deu origem ao PFL (Partido da Frente Liberal). A aliança do PMDB e PFL resultou na Aliança Democrática, que lançou a chapa Tancredo Neves - José Sarney. Em 15 de janeiro de 1985, Tancredo Neves, candidato das oposições, derrotou Paulo Maluf, o candidato do governo, dentro do próprio Colégio Eleitoral.
Eleito presidente da República, Tancredo Neves não chegou a tomar posse, vindo a falecer em 21 de abril de 1985.
A NOVA REPÚBLICA
Desde 1985, o Brasil vive um momento da sua História que muitos chamam de Nova República. Com a redemocratização, as liberdades, direitos e garantias individuais foram restabelecidas, e uma nova Constituição assegurou várias conquistas sociais.
A nova Constituição Brasileira foi promulgada em 5 de outubro de 1988. Manteve a forma republicana de governo, o sistema presidencialista, a divisão harmônica dos Três Poderes e ampliou o mandato presidencial para 5 anos. Além disso, apresentou importantes inovações. O voto universal, secreto e obrigatório para ambos os sexos, dos 18 aos 70 anos, tornou-se facultativo entre os 16 e os 18 anos, bem como para os analfabetos. No plano eleitoral, foram estabelecidas as eleições diretas em dois turnos para presidente da República, governadores dos Estados e prefeitos das cidades com mais de 200 mil eleitores. No terreno social garantiu-se a livre criação de sindicatos, a ampliação do direito de greve, a ampliação da licença-gestante para 120 dias e as férias remuneradas com acréscimo de 1/3 sobre o salário.
1. Governo Sarney (1985-1990)
Quando Tancredo Neves não pôde tomar posse por motivo de doença, o vice-presidente José Sarney assumiu interinamente a Presidência da República e, com a morte de Tancredo, tornou-se presidente efetivo. Em seu governo teve início a transição democrática, enquanto se procurava uma solução para a crise econômica que se abatia sobre o País.
No processo de transição democrática, foram adotadas medidas para o pleno restabelecimento da democracia: eleições diretas em todos os níveis, legalização de partidos políticos de quaisquer tendências (inclusive os comunistas) e a convocação de uma Assembléia Constituinte.
Em 28 de janeiro de 1986, foi decretado o Plano Cruzado, que determinava a substituição do cruzeiro pelo cruzado na proporção de mil para um, congelava preços e aluguéis e reajustava automaticamente os salários, sempre que a inflação chegasse a 20%. O seu fracasso levou ao Plano Bresser (1987) e ao Plano Verão (1989), quando a moeda foi mudada para o cruzado novo; mas também esses projetos não deram resultado, e a inflação atingiu os maiores índices da História do Brasil.
2. Governo Collor (1990-1992)
Em 15 de março de 1990, Fernando Collor de Mello, ex-governador de Alagoas, tomou posse como o primeiro presidente eleito, de forma direta, depois de 25 anos. Iniciou imediatamente a luta contra a crise econômica, através do Plano Brasil Novo.
Mais conhecido como Plano Collor, o novo plano econômico extinguiu o cruzado novo e voltou ao padrão cruzeiro; congelou preços e salários e bloqueou a maior parte do dinheiro das contas bancárias, poupança e aplicações financeiras. Nos meses seguintes, o governo demitiu milhares de funcionários públicos e reduziu os impostos de importação de vários produtos, com o objetivo de forçar a queda dos preços dos produtos nacionais.
Entretanto, graves denúncias de corrupção, envolvendo altos escalões do governo e familiares do presidente levaram o Congresso a formar uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito), a qual constatou a existência de um esquema de corrupção que envolvia o próprio presidente. Diante da ameaça de sofrer um impeachment (impedimento de exercer a Presidência da República) e da pressão da sociedade civil, Collor renunciou após dois anos de governo.
3. Governo Itamar Franco (19921995)
O vice-presidente Itamar Franco assumiu oficialmente a Presidência em 29 de dezembro de 1992, procurando ajustar o seu Ministério às forças políticas do Congresso Nacional. Seu governo foi marcado pelo plebiscito de abril de 1993 e pela aplicação do Plano Real, criado pela equipe econômica do ministro da Fazenda Fernando Henrique Cardoso.
O plebiscito, consulta popular de 21 de abril de 1993, envolvia duas escolhas: entre a República e a Monarquia (formas de governo) e entre Parlamentarismo e Presidencialismo (sistemas de governo). A República e o Presidencialismo venceram o plebiscito com 55,45% do total dos votos.
A popularidade do Plano Real, que conseguiu baixar a inflação, deu a Fernando Henrique a vitória nas eleições presidenciais de 3 de outubro de 1994.
A produção cultural após 1945
A produção cultural brasileira, a partir dos anos 50, reflete em todas as suas manifestações as tendências que marcaram a cultura contemporânea do pós-Segunda Guerra Mundial. Assim, a cultura brasileira procurou se adequar às novas formas de linguagem e aos novos padrões estéticos que revolucionaram o convencionalismo, até então vigente. Contudo, buscava-se de forma crítica, compreender os problemas da nossa realidade social e política, com todas as suas características próprias. Iniciava-se nessa década o processo desenvolvimentista urbano-industrial que mudaria completamente as feições do País.
O Teatro
A partir do TBC (Teatro Brasileiro de Comédia) marco na história do teatro brasileiro - seriam geradas várias tendências e movimentos que inovaram a arte cênica nacional, procurando valorizar textos e autores brasileiros. Destaque-se nessa época, as montagens de "A Moratória", "Ossos do Barão", "Bonitinha mas Ordinária", "Auto da Compadecida" e outras peças do repertório nacional.
Nos anos 60, em meio à conjuntura de efervescência política, surgiu em São Paulo o Teatro de Arena; uma vigorosa tendência de reação à postura convencional do TBC. Nele foram encenados textos e autores afinados com o momento histórico brasileiro, suas contradições e seus problemas sociais e políticos, dentro de uma perspectiva do teatro despojado, caracterizado pelas montagens simplificadas. Na mesma linha surgiriam, ainda, o Teatro Oficina - também em São Paulo - e o Grupo Opinião, no Rio de Janeiro. Augusto Boal, Gianfrancesco Guarnieri e Oduvaldo Viana Filho - Vianinha - seriam as grandes expressões desse teatro essencialmente político e de grandes realizações, como "Revolução na América do Sul", "Eles não usam Black-Tie", "Chapetuba Futebol Clube" e os musicais "Arena conta Zumbi", "Roda Viva" e outros. O teatro crítico e de participação quebrava os limites entre público e atores e, assim, palco e platéia tomavam-se um único espetáculo.
Com a crise política da década de 1970, surgiram novos grupos teatrais, dentro de uma linha de vanguarda e com ênfase à produção coletiva, como Asdrubal Trouxe o Trombone, Pood Minoga e Ornitorrinco. Nas duas últimas décadas emergiram novos autores e encenadores, como Otávio Frias Filho e Valter Rasi; alternaram-se as montagens de textos clássicos com novos trabalhos voltados para problemas pontuais ou do cotidiano. Destaque-se, aí, o sucesso de montagens digestivas, como "Porca Miséria" e "Almanaque Brasil".
O Cinema
No cinema, por outro lado, os anos cinqüenta assistiram à falência das chanchadas e dos musicais ingênuos, imitação pobre das grandes produções de Hollywood, em voga desde a década anterior. O neo-realismo italiano, forjado na reconstrução de uma Europa destruída pela guerra e, ao final da década, a nouvelle vague francesa passaram a influenciar uma nova geração de cineastas brasileiros. Sob essa inspiração realizaram-se grandes filmes, ainda na década de 50, como "Rio 40 Graus", de Nelson Pereira dos Santos, por exemplo.
A década seguinte foi marcada pela evolução, na busca de um autêntico cinema brasileiro. O sucesso internacional de "O Cangaceiro" (1953), de Lima Barreto, e outras obras retratando o sertão e o cangaço, a possibilidade de realização de produções baratas e afinadas com a realidade brasileira criaram as condições para o surgimento do cinema novo, cuja máxima era: "uma câmera na mão e uma idéia na cabeça". A grande figura do cinema novo foi, sem nenhuma dúvida, o baiano Glauber Rocha, realizador de obras imortais, como "Deus e o Diabo na Terra do Sol" e "Terra em Transe" (1967).
A partir dos duros da repressão (década de 70), o cinema nacional voltou-se para os autores clássicos da literatura brasileira, disso resultando produções não menos famosas, como "São Bernardo", "Como era gostoso meu francês" e "Os Inconfidentes" etc.
Uma das tendências do cinema nacional nas duas últimas décadas é a valorização de temas relacionados às ocorrências da nossa História e aos tempos difíceis do autoritarismo, com destaque, respectivamente, para "Carlota Joaquina" e "Lamarca".
A Música
A música popular brasileira, por sua vez, apresentou uma série de transformações significativas. Na década de 1950, a estranha fusão do samba tradicional com o cool jazz (jazz frio) produziu a mais importante expressão musical do Brasil contemporâneo: a bossa nova. A harmonia jazística, as batidas sincopadas do violão e a interpretação suave e intimista de seus intérpretes, como João Gilberto, fizeram da bossa nova um gênero musical peculiar. Criticada pelos puristas como uma música de elite (de apartamentos da Zona Sul carioca), e alienada em relação aos problemas da época, a bossa nova tomou-se um importante referencial da música popular brasileira, com grande repercussão no Exterior.
Foi a partir da bossa nova, nos anos sessenta, que passou a se constituir a MPB (Música Popular Brasileira), fundindo elementos da música erudita, ritmos africanos e da música folclórica e de raízes, como a música caipira. Nessa década, os festivais foram importantes agentes reveladores das várias tendências da música popular brasileira, como a música urbana de Chico Buarque de Holanda, a toada sertaneja moderna, como "Disparada", de Geraldo Vandré, e "Ponteio", de Edu Lobo, entre outras. A produção musical dessa época foi marcada pelo protesto, pela denúncia, em plena passagem para a ditadura militar repressiva e intolerante. Nessa medida, a música - ao lado do teatro - foi um dos mais importantes núcleos de resistência ao autoritarismo dos anos 60 e 70. Esse caráter político pode ser explicado pelo surgimento de compositores e autores com reconhecida militância na política estudantil, vinculados ao Centro Popular de Cultura (CPC), da União Nacional dos Estudantes (UNE).
A década de sessenta conheceria ainda a tropicália, uma complexa fusão da MPB, bossa nova, ritmos latinos e ingredientes da música erudita, dando uma nova dimensão aos textos e versos de Oswald de Andrade e dos concretistas Haroldo e Augusto de Campos e Décio Pignatari; tudo dentro da concepção plástica de Hélio Oiticica. O tropicalismo, entendido como a busca de uma estética verdadeiramente brasileira (mesmo no seu universalismo, capaz de unir guitarras elétricas, elementos do pop internacional, violinos e atabaques africanos), teve em Torquato Neto, Tom Zé, Caetano Veloso, Gilberto Gil e no maestro Rogério Duprat suas grandes expressões. Sua forma caótica, identificando-se com a revolução comportamental e a contracultura, típicos do período, valeu-lhe pesadas críticas das esquerdas ligadas à UNE e dos cultores da MPB, tendendo cada vez mais a buscar, nos compositores da "velha guarda", a trilha da autêntica música brasileira.
Um comentário:
Muito bom Prof. Américo! O Sr. sempre quer nos ajudar de uma forma ou de outra! É muito gratificante ter um Disciplinador como você...Parabéns pelo seu trabalho!
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